domingo, outubro 16, 2011

Atordoar, Congelar e Extorquir

Artigo do economista Eugénio Rosa, publicado em 14.10.2011. O título do post é de minha autoria.

Mais 7.000 milhões € de riqueza para os patrões, nada para os trabalhadores, corte de 1.682 milhões € no rendimento dos pensionistas e de 952 milhões € aos trabalhadores da função pública, mas os rendimentos do capital continuam a ser poupados aos sacrificios: eis o que Passos Coelho anunciou

Tal como sucedeu com o subsidio do Natal em que praticamente os atingidos pelo IRS extraordinário foram apenas os trabalhadores e pensionistas, que têm de pagar ainda este ano mais 800 milhões € de IRS segundo as contas do próprio governo, tendo sido poupado os rendimentos do capital (dividendos, juros, mais-valias), também agora Passos Coelho anunciou para 2012 mais medidas de austeridade em que os atingidos são outra vez os trabalhadores, os pensionistas e os aposentados. Novamente os rendimentos de capital (dividendos, juros e mais-valias) ficam imunes aos sacrifícios.

A sobretaxa de IRC a aplicar às empresas com lucros elevados e o novo escalão de IRS aos rendimentos mais elevados foi criada por este governo com o objectivo de enganar a opinião pública. Em primeiro lugar, os valores a obter com elas são irrisórios (menos de 100 milhões € em cada) quando comparamos com os sacrifícios que estão a ser impostos aos trabalhadores e pensionistas. Em segundo lugar, porque não atinge a principal fonte de enriquecimento dos grandes patrões, que são os rendimentos de capital, ou seja, dividendos, mais-valias, juros, etc., E estes rendimentos ou continuam isentos (a maioria), ou então aqueles que pagam IRS (apenas uma pequena parcela) estão sujeitos a uma taxa liberatória de 21,5% ou ainda menos que não é aumentada.

Para os grandes patrões não são as remunerações sujeitas a IRS que, embora gigantescas quando comparadas com as recebidas pela generalidade dos trabalhadores, constituem a principal fonte da sua riqueza, já que elas representam apenas uma pequeníssima parcela quando as comparamos com os dividendos, juros, e mais-valias que são recebidas através de sociedades gestoras de participações sociais (SGPS) ou de Fundos, ou que são transferidas para empresas que criaram no estrangeiro, como a Amorim Energia sediada na Holanda através da qual recebe os dividendos da GALP, e que, de acordo com a lei fiscal portuguesa (artº 14 e 51 do Código do IRS, e artº 22º, 23º, 27º e 32º do Estatuto dos Benefícios Fiscais), todos eles estão isentas de pagamento de impostos. Para além disso, os grandes patrões facilmente fogem ao escalão mais elevado de IRS: Para isso, basta que reduzam a sua remuneração (até dão um “ar” de que estão a fazer também sacrifícios) e depois recebem esse valor através de dividendos cuja esmagadora maioria continuarão isentos

É evidente que ao poupar novamente os rendimentos do capital, este governo, para além de mostrar o seu espírito de classe, e que interesses defende, vai aumentar ainda mais as desigualdades e a injustiça em Portugal, e as dificuldades das famílias das classes médias e de baixos rendimentos 

Para que se possa ficar com uma ideia clara da dimensão desse ataque, e dos benefícios para os patrões, vamos quantificar apenas três das medidas anunciadas por Passos Coelho: o aumento de meia hora de trabalho por dia cuja produção reverte integralmente para os patrões, o corte no subsidio de férias e de Natal aos reformados e aposentados com pensões superiores a 1000€/mês e também aos trabalhadores da Função Pública.com remunerações superiores a 1000 euros/mês.

O aumento de meia hora no horário de trabalho diário dá por ano aos patrões mais 7.002 milhões € de riqueza

Se dividirmos o valor do PIB previsto pelo INE para 2011 (171.320,6 milhões €) pela população empregada (4.893.000 portugueses no 2º Trimestre de 2011 segundo o INE) obtém-se 35.013 €/ ano por empregado. Dividindo este valor pelo número médio anual de horas de trabalho obtém 19€/PIB/por hora. Se multiplicarmos este valor pelo número médio de dias de trabalho por ano, e depois por meia hora dia e seguidamente pelo número de trabalhadores por conta de outrem (3.200.000 sem incluir os trabalhadores da Função Pública) obtém-se 7.002.681.382 de euros. E ainda mais que a redução prevista pelo governo na Taxa Social Única paga pelos patrões. É esta gigantesca riqueza que o governo PSD/CDS pretende dar de mão - beijada aos patrões. Tudo para os patrões, nada para os trabalhadores produtores de riqueza: - este é o lema do governo PSD/CDS. 

O governo do PSD/CDS pretende fazer mais um corte de 1.682 milhões nos rendimentos dos pensionistas e de 952 milhões nos trabalhadores da função pública

Em 2011, as pensões de todos os reformados e aposentados foram congeladas. E os preços até Setembro deste ano já aumentaram 3,6%. Em 2012, o governo pretende congelar novamente a esmagadora maioria das pensões (apenas as inferiores ao limiar da pobreza é que poderão ser actualizadas). Como tudo isto já não fosse suficiente o governo pretende ficar com o subsídio de férias e de Natal dos reformados e aposentados com pensões superiores a 1000€. Em 2012, na Segurança Social estimamos que sejam atingidos cerca de 200.000 reformados com uma pensão média ponderada que rondará os 1890€/mês, e na CGA 235.000 com uma pensão média ponderada de 1970€/mês. Dois meses de pensão para estes 435.000 pensionistas representarão um corte nos seus rendimentos que estimamos em 1.682 milhões euros por ano. Também é intenção do governo ficar com o subsídio férias e de Natal dos trabalhadores da Função Pública em 2012 com remunerações superiores a 1000€/mês. Se tal intenção se concretizar, estes trabalhadores, que nos últimos anos, já perderem cerca de 14% no seu poder de compra sofrerão mais um corte nos seus rendimentos que estimamos em 952,6 milhões € em 2012. Em 2011 estes trabalhadores tiveram suas remunerações congeladas, e  em 2012 e em 2013 as suas remunerações continuarão congeladas. Para além disso, os trabalhadores da Função Pública e os pensionistas que recebem mais de 485€ e menos de 1000€ sofrerão um aumento da taxa de IRS igual a um subsídio.       

sexta-feira, outubro 14, 2011

Então e os Ricos, Pá?

Colagem sobre o discurso do primeiro-ministro Pedro Passos Coelho na apresentação do Orçamento do Estado para 2012

 (...) Não preciso de vos dizer que vivemos momentos da maior gravidade. Todos os Portugueses estão a sentir nas suas vidas os efeitos de um terrível estrangulamento financeiro da nossa economia.

- Todos os portugueses não! Então e os ricos, pá?

(...) O ajustamento terá de ser muito profundo. Isso implica um esforço adicional aos objetivos já exigentes a que estávamos comprometidos para 2012. E significa que neste orçamento que será apresentado aos Portugueses nos próximos dias teremos de fazer um esforço redobrado de consolidação.

- Esforço redobrado de consolidação é uma expressão muito vaga! Então e os ricos, pá?

(...) Por tudo isto, o orçamento para 2012 é absolutamente decisivo e coincide com o momento em que muito duramente enfrentamos a realidade. Em tempos de emergência, o tempo é ainda mais precioso, o rigor ainda mais indispensável, a coesão interna ainda mais necessária.

- Coesão para os beneficiários do costume se rirem da austeridade, não! Então e os ricos, pá?

(...) o Governo decidiu permitir a expansão do horário de trabalho no setor privado em meia hora por dia durante os próximos dois anos, e ajustar o calendário dos feriados.

- Trabalhar de borla não! Então e os ricos, pá?

(...) Estas medidas respondem diretamente à necessidade de recuperar a competitividade da nossa economia e evitam o desemprego exponencial que a degradação da situação das nossas empresas produziria. Este é o modo mais eficaz e mais seguro de operar um efeito de competitividade.

- Onde é que já se viu aumentar a jornada de trabalho para evitar o desemprego? Então e os ricos, pá?

(...) Este Governo não se limita a pedir sacrifícios e a impor limites. Queremos resolver os nossos problemas com mais trabalho, mais ideias, mais espírito de entreajuda e cooperação entre todos. Este é o meio mais adequado para, no meio de tantas restrições, ampliarmos a nossa capacidade económica de criação de riqueza.

- A propósito de cooperação e sacrifícios, então e os ricos, pá?

(...) Não nos devemos permitir decisões de último recurso. Temos de salvaguardar o emprego. É a pensar na conjugação das necessidades financeiras com a prioridade do emprego que o orçamento para 2012 prevê a eliminação dos subsídios de férias e de Natal para todos os vencimentos dos funcionários da Administração Pública e das Empresas Públicas acima de 1000 euros por mês.

- Então os rendimentos de capitais não contribuem para nada, pá?

(...) Os vencimentos situados entre o salário mínimo e os 1000 euros serão sujeitos a uma taxa de redução progressiva, que corresponderá em média a um só destes subsídios. Como explicaremos em breve aos partidos políticos, aos sindicatos e aos parceiros sociais, esta medida é temporária e vigorará apenas durante a vigência do Programa de Assistência Económica e Financeira.

- Então as grandes fortunas não contribuem para nada, pá?

(...) No orçamento para 2012 haverá cortes muito substanciais nos sectores da Saúde e da Educação. Neste aspecto, fomos até onde pudemos ir - no combate ao desperdício, nos ganhos de eficiência.

- Não foram até onde deviam ir! Então e os ricos, pá?

(...) No caso do IVA, teremos de obter mais receitas do que o que estava desenhado no Memorando de Entendimento. Para este efeito, o orçamento para 2012 reduz consideravelmente o âmbito de bens da taxa intermédia do IVA, embora assegure a sua manutenção para um conjunto limitado de bens cruciais para sectores de produção nacional, como a vinicultura, a agricultura e as pescas.

- Então e os ricos, pá?

(...) Como sabem, a redução das pensões de reforma era uma medida prevista no Memorando de Entendimento. Tal como para os salários da Administração Pública e das Empresas Públicas, teremos de eliminar os subsídios de férias e de Natal para quem tem pensões superiores a 1000 euros por mês. As pensões abaixo deste valor e acima do salário mínimo sofrerão em média a eliminação de um só destes subsídios.

- Então e os ricos, pá?

(...) Compreendo muito bem a frustração de todos os Portugueses que olham para trás, para estes últimos anos, e se perguntam como foi possível acumular tantos erros e somar tantos excessos. Tivemos tantas oportunidades para inverter o rumo e limitámo-nos a encolher os ombros.

- Então e os ricos, pá?

(...) Um orçamento do Estado é muito mais do que um simples exercício de contabilidade. Nele estão vertidas escolhas políticas fundamentais. Escolhas para o nosso presente e para o nosso futuro.

- As escolhas políticas fundamentais, esqueceram um pormenor! Então e os ricos, pá?

(...) Está inscrito um novo rigor no respeito pela lei e pelo Estado de Direito, pelo princípio da responsabilidade social, o que significa que seremos implacáveis com a evasão fiscal e agravaremos a tributação das transferências para off-shores e paraísos fiscais.

- De promessas temos nós um saco cheio! Então e os ricos, pá?

(...) Temos de olhar para os exemplos recentes de países que, optando por fazer os seus processos de ajustamento com inteligência e responsabilidade, souberam ultrapassar as suas dificuldades bem mais rapidamente do que diziam as previsões e abriram um período de prosperidade que seria impossível de outro modo.

- Então e a Grécia não te diz nada, pá?

(...) Quis nesta ocasião falar a todos os Portugueses porque mais do que nunca o cumprimento dos objetivos nacionais, a cabal execução do orçamento para 2012, a superação da emergência nacional depende em absoluto do contributo de todos.

- Do contributo de todos, não! Então e os ricos, pá?

(...) Depende da competência e liderança do Governo, da diligência e dedicação das Administrações Públicas, da inovação e criatividade dos empresários, da confiança e serenidade dos investidores, do profissionalismo e energia dos trabalhadores. Depende da cooperação dos parceiros sociais, do dinamismo das instituições da sociedade civil, do diálogo construtivo com os partidos da oposição, em particular com o maior partido da oposição que tem nesta matéria uma oportunidade de evidenciar um elevado sentido de responsabilidade e de serviço ao País.

- Ah sim, então e os ricos, pá?

terça-feira, outubro 11, 2011

Registo para Memória Futura (52)


"Alguma coisa está a acontecer. O que é, não é exactamente claro, mas podemos, finalmente, estar a ver o surgimento de um movimento popular que, ao contrário do Tea Party (*), está irritado com as pessoas certas."

Comentário do economista norte-americano Paul Krugman, galardoado com o Prémio Nobel da Economia de 2008, sobre o movimento Occupy Wall Street, o qual, tendo-se iniciado no centro financeiro de Nova Iorque, rapidamente se estendeu a outras cidades dos E.U.A., tais como Boston, Chicago, Los Angeles, Portland, São Francisco, entre outras, manifestando-se contra a ausência de repercussões legais sobre os responsáveis e beneficiários da crise financeira nos Estados Unidos, Europa e outras partes do mundo, e exigindo medidas contra as desigualdades sociais, a voracidade empresarial e o sistema capitalista como um todo.
 
(*) Tea Party – Movimento social e político norte-americano, populista, conservador, de ultradireita, constituído em 2009 após a eleição do presidente Barack Obama. Embora seja uma miscelânea de variados grupos ultra-radicais, as suas opiniões coincidem, em linhas gerais, com as do Partido Republicano. Defende uma política fiscal conservadora e tem por objectivo contestar as principais medidas de cariz social da administração Obama, nomeadamente os pacotes de estímulo para o relançamento da economia e, fundamentalmente, o projecto de reforma do sistema de Saúde. Consideram que os Estados Unidos estão à beira de resvalar para uma experiência socialista, e sob essa pretensa ameaça, trabalham afincadamente para evitar a reeleição de Barack Obama.

segunda-feira, outubro 10, 2011

Chamar os Bois pelos Nomes

«(...) As coisas estão neste estado porque se fizeram (e continuam a fazer) escolhas políticas criminosas. Porque os governos são estúpidos? Não. Porque são politicamente corruptos. Quando vemos António Borges a dirigir o Departamento Europeu do FMI e Mario Draghi à frente do Banco Central Europeu e sabemos que os dois foram vice-presidentes da Goldman Sachs - que foi quem ganhou com a crise do "subprime" e que ajudou a Grécia a mascarar a verdadeira dimensão do seu défice -, percebemos de quem estamos reféns. De gente com um currículo que deveria ser considerado cadastro.»

Excerto do artigo de opinião de Daniel Oliveira, intitulado "Capitalismo de Candonga", e publicado no semanário EXPRESSO de 8 de Outubro de 2011. O título do post é de minha autoria.

domingo, outubro 09, 2011

O Protectorado sob Ocupação


«(...) O Diário Económico avançou na sua edição "online" de hoje que Pedro Passos Coelho escreveu uma carta a Durão Barroso a pedir o envio de uma equipa de técnicos da Comissão Europeia para acompanhar em permanência, no Ministério das Finanças, as reformas impostas pelo memorando com a "troika" (Comissão, Banco Central Europeu e Fundo Monetário Internacional), tendo fonte comunitária confirmado à Lusa que o presidente do executivo comunitário deu o seu parecer favorável.

De acordo com o Diário Económico, a equipa de cinco técnicos, liderada por Herve Carré, antigo diretor do gabinete oficial de estatísticas da UE (Eurostat), irá ajudar as autoridades portuguesas a "agilizar a aplicação das reformas estruturais que estão a ser impostas pelo BCE, Comissão e FMI, ajudando a potenciar a aplicação dos cerca de 15 mil milhões de euros de fundos estruturais, de que Portugal beneficiará nos próximos anos, nas várias alterações legislativas que saltarão para o terreno com o Orçamento do Estado do próximo ano".»

Excerto da notícia do DIÁRIO DE NOTÍCIAS de 8 de Outubro de 2011

Meu comentário: Passos Coelho vai lavando as mãos, ao mesmo tempo que deixa no ar a ideia de que não lhe compete governar, na verdadeira acepção da palavra, mas sim fazer cumprir os compromissos assumidos com a "troika", acrescidos de mais umas coisitas de sua iniciativa, para não haver razões de queixa e deixar boa impressão. Assim, os censores e questores da EU, virão até ao protectorado para supervisionarem o cozinhado do Orçamento de Estado para 2012, e alinhavarem as condições para um segundo empréstimo, com o seu cortejo de mais austeridade e empobrecimento generalizado, o tal que os optimistas do costume, em planeada manobra de contra-informação, continuam a garantir que não será necessário.

quinta-feira, outubro 06, 2011

Uma História de Maçãs


A primeira maçã desprendeu-se de uma macieira, e por ter batido na cabeça de Isaac Newton, levou a que este tivesse a ideia de formular as leis da gravitação universal. Com isso prendeu-nos à Terra.

A segunda maçã veio pela mão de Steve Jobs, tornou-se o logotipo de todos os produtos da Apple Macintosh por ele criada, ajudando com isso a dar asas à nossa criatividade e imaginação.

Steven Paul Jobs nasceu em São Francisco, Califórnia, em 24 de Fevereiro de 1955 e faleceu em Palo Alto, Califórnia, em 5 de Outubro de 2011, vítima de cancro. Foi inventor e empresário do sector informático, sendo grande inovador nesta área. Em 2005, frente a uma plateia de estudantes da Universidade de Stanford, nos EUA, disse que  “a morte é muito provavelmente a melhor invenção da vida, e lembrar-me de que todos estaremos mortos em breve é a ferramenta mais importante que encontrei para me ajudar a fazer as grandes escolhas na vida”.

Sua Truculência


APESAR de fazer figura disso, deve evitar-se chamar “palhaço” a Sua Truculência, o régulo Alberto João Jardim, pois isso é estar a ofender, gravemente, os verdadeiros profissionais da nobre arte de fazer rir. Já quanto ao dedo em riste que ele costuma sacudir furiosamente, no auge dos seus discursos, deixo à imaginação de cada um, o que ele poderá fazer com ele.

quarta-feira, outubro 05, 2011

O Exemplo que vem da Islândia


O Landsdomur, tribunal especial de Reykjavik, vai julgar o ex-primeiro-ministro islandês, Geeir Haarde, pela sua implicação e responsabilidade no colapso do sistema financeiro do país, em 2008, quando chefiava o governo. Há situações que não se suplantam nem satisfazem com a mera invocação da responsabilidade política, e este é um bom exemplo, que não requer mais comentários. Apenas que frutifique.

sábado, outubro 01, 2011

A Paródia da Justiça

«As quase 23 horas que Isaltino Morais passou na cadeia - entre as 20h de quinta-feira e as 18h52 de ontem [sexta-feira] - abriram mais uma brecha na credibilidade da Justiça portuguesa. Com base numa decisão do Tribunal Constitucional (TC), que rejeitou um recurso da defesa de Isaltino, um procurador do Ministério Público (MP) promoveu a prisão do presidente da Câmara de Oeiras e uma juíza ordenou a sua execução. Sem que nenhum dos dois soubesse que havia outro recurso no TC, com efeitos suspensivos sobre a condenação - cujo prazo para entrega de alegações só termina na próxima quinta-feira. Quando souberam, por inciativa dos advogados e por diligências próprias, nenhum se opôs à libertação. (...)»

Excerto da notícia do semanário EXPRESSO de 1 de Outubro de 2011

Meu comentário: Ainda hei-de ouvir dizer que o culpado da falta de informação e do desnorte da Justiça, neste e noutros casos, seja imputado a algum problema informático, talvez ao incipiente Citius, pois os computadores sempre tiveram as costas largas, e os informáticos sabem bem do que se fala. Isaltino tem advogados competentes, que conhecem o terreno que pisam, e não rejeitam tirar partido destes desleixos da justiça portuguesa, ao traduzirem-nos em pedidos de indemnização ao Estado,  que se reflectirão, fatalmente, no bolso dos contribuintes, os quais serão convocados para colmatar a ofensa. Isto já não falando na aposta, desenhada ao pormenor, pelos ditos, competentíssimos e certeiros causidíacos, da prescrição dos crimes de que Isaltino é acusado. Conclusão: A Justiça portuguesa é uma paródia, continuando a contribuir substancialmente para o anedotário nacional, e Isaltino, e outros quejandos, riem-se perdidamente.

sexta-feira, setembro 30, 2011

Marco Catão vs Isaltino Morais


«Isaltino Morais, presidente da Câmara Municipal de Oeiras, foi detido, por volta das 20 horas de quinta-feira, pelo Grupo de Investigação Criminal da PSP de Oeiras, no "cumprimento de um mandado de detenção". O autarca foi levado para a zona prisional anexa à Polícia Judiciária (PJ), na Rua Gomes Freire, em Lisboa, onde deverá cumprir os dois anos de cadeia a que foi condenado pelo Supremo Tribunal de Justiça, por fraude fiscal, abuso de poder, corrupção passiva para acto ilícito e branqueamento de capitais. (...)»

Excerto da notícia do DIÁRIO DE NOTÍCIAS on-line de 30 de Setembro de 2011

Meu comentário: Isaltino Morais não seguiu os conselhos de Marco Pórcio Catão, magistrado, político e militar romano que viveu entre 234 e 149 A.C., quando dizia que não censurava os que tiravam partido dos saques dos inimigos derrotados, mas que, no seu caso, preferia rivalizar em virtude com os mais virtuosos a competir em riqueza com os ricos ou em cobiça com os rapaces.

quinta-feira, setembro 29, 2011

Memórias de uma Aula no Liceu de Setúbal

Barreiro, 4 de Outubro de 1967 (Quarta-feira)

SEGUNDO dia de aulas. Continua o desassossego, com o pessoal a trocar beijos, abraços e confidências, depois desta longa separação que foram 3 meses e meio de férias. Estávamos todos fartos do verão, com saudades uns dos outros. A sala é a mesma do ano passado, no 1º andar e cheirava a nova, tudo encerado e polido, apesar do material já ser mais do que velho. Somos o 7.º A e como não chumbou nem veio ninguém de novo, a pauta é exactamente igual à do ano passado. Eu sou o n.º 34, e fico sentada na segunda fila, do lado da janela, cá atrás, que é o lugar dos mais altos. Hoje tivemos, pela primeira vez, Organização Política e apareceu-nos um professor novo, acho que é a primeira vez que dá aulas em Setúbal, dizem que veio corrido de um liceu de Coimbra, por causa da política.
Já ontem se falava à boca cheia dele, havia malta muito excitada e contente porque dizem que ele é um fadista afamado. Tenho realmente uma vaga ideia de ouvir o meu tio Diamantino falar dele, mas já não sei se foi por causa da cantoria se por causa da política. A Inês contou que ouviu o pai comentar, em casa, que o homem é todo revolucionário, arranja sarilhos por todo o lado onde passa. Ela diz que ele já esteve preso por causa da política, é capaz de ser comunista. Diferente dos outros professores, é de certeza. Quando entrou na sala, já tinha dado o segundo toque, estava quase no limite da falta. Entrou por ali a dentro, todo despenteado, com uma gabardine na mão e enquanto a atirava para cima da secretária, perguntou-nos:

- Vocês são o 7.º A, não são? Desculpem o atraso mas enganei-me e fui parar a outra sala. Não faz mal. Se vocês chegarem atrasados também não vos vou chatear.

Tinha um ar simpático, ligeiro, um visual que não se enquadrava nada com a imagem de todos os outros professores. Deu para perceber que as primeiras palavras, aliadas à postura solta e descontraída, começavam a cativar toda a gente. A Carolina virou-se para trás e disse-me que já o tinha visto na televisão, a cantar Fado de Coimbra. Realmente o rosto não me era estranho. É alto, feições correctas, embora os dentes não sejam um modelo de perfeição e é bem parecido, digamos que um homem interessante para se olhar. O Artur soprou-me que ele deve ter uns 36 anos e acho que sim, nota-se que já é velho. Depois das primeiras palavras, sentou-se na secretária, abriu o livro de ponto, rabiscou o que tinha a escrever e ficou uns cinco minutos, em silêncio, a olhar o pátio vazio, através das janelas da sala, impecavelmente limpas.

Enquanto ele estava nesta espécie de marasmo nós começámos a bichanar uns com os outros, cada um emitindo a sua opinião, fazendo conjecturas. Às tantas, o bichanar foi subindo de tom e já era uma algazarra tão grande que parece tê-lo acordado. Outro qualquer professor já nos teria pregado um raspanete, coberto de ameaças, mas ele não disse nada, como se não tivesse ouvido ou, melhor, não se importasse. Aliás, aposto que nem nos ouviu. O ar dele, enquanto esteve ausente, era tão distante que mais parecia ter-se, efectivamente, evadido da sala. Quando recomeçou a falar connosco, em pé, em cima do estrado, já tinha ganho o primeiro round de simpatia. Depois, veio o mais surpreendente:

- Bem, eu sou o vosso novo professor de Organização Política, mas devo dizer-vos que não percebo nada disto. Vocês já deram isto o ano passado, não foi? Então sabem, de certeza, mais que eu.

Gargalhada geral.

- Podem rir porque é verdade. Eu não percebo nada disto, as minhas disciplinas, aquelas em que me formei, são História e Filosofia, não tenho culpa que me tivessem posto aqui, tipo castigo, para dar uma matéria que não conheço, nem me interessa. Podia estudar para vir aqui desbobinar, tipo papagaio, mas não estou para isso. Não entro em palhaçadas.

Voltámos a rir, numa sonora gargalhada, tipo coro afinado, mas ele ficou impávido e sereno. Continuava a mostrar um semblante discreto, calmo, simpático.

- Pois é, não vou sobrecarregar a minha massa cinzenta com coisas absolutamente inúteis e falsas. Tudo isto é uma fantochada sem interesse. Não vou perder um minuto do meu estudo com esta porcaria.

Começámos a olhar uns para outros, espantados; nunca na vida nos tinha passado pela frente um professor com tamanha ousadia.

- Eu estudaria, isso sim, uma Organização Política que funcionasse, como noutros países acontece, não é esta fantochada que não passa de pura teoria. Na prática não existe, é uma Constituição carregada de falsidade. Portugal vive numa democracia de fachada, este regime que nos governa é uma ditadura desumana e cruel.

Não se ouvia uma mosca na sala. Os rostos tinham deixado cair o sorriso e estavam agora absolutamente atónitos, vidrados no rosto e nas palavras daquele homem ímpar. O que ele nos estava a dizer é o que ouvimos comentar, todos os dias, aos nossos pais, mas sempre com as devidas recomendações para não o repetirmos na rua porque nunca se sabe quem ouve. A Pide persegue toda a gente como uma nuvem de fumo branco, que se sente mas não se apalpa.

- Repito: eu não percebo nada desta disciplina que vos venho leccionar, nem quero perceber. Estou-me nas tintas para esta porcaria. Mas, atenção, vocês é outra coisa. Vocês vão ter que estudar porque, no final do ano, vão ter que fazer exame para concluírem o vosso 7.º ano e poderem entrar na Faculdade. Isso, vocês têm que fazer. Estudar. Para serem homens e mulheres cultos para poderem combater, cada um onde estiver, esta ditadura infame que está a destruir a vossa pátria e a dos vossos filhos. Vocês são o amanhã e são vocês que têm que lutar por um novo país.

- Não vão precisar de mim para estudar esta materiazinha de chacha, basta estudarem umas horas e empinam isto num instante. Isto não vale nada. Eu venho dar aulas, preciso de vir, preciso de ganhar a vida, mas as minhas aulas vão ser aulas de cultura e política geral. Vão ficar a saber que há países onde existem regimes diferentes deste, que nos oprime, países onde há liberdade de pensamento e de expressão, educação para todos, cuidados de saúde que não são apenas para os privilegiados, enfim, outras coisas que a seu tempo vos ensinarei. Percebem? Nós temos que aprender a não ser autómatos, a pensar pela nossa cabeça. O Salazar quer fazer de vocês, a juventude deste país, carneiros, mas eu não vou deixar que os meus alunos o sejam. Vou abrir-lhes a porta do conhecimento, da cultura e da verdade. Vou ensinar-lhes que, além fronteiras, há outros mundos e outras hipóteses de vida, que não se configuram a esta ditadura de miséria social e cultural.

- Outra coisa: vou ter que vos dar um ponto por período porque vocês têm que ter notas para ir a exame. O ponto que farei será com perguntas do vosso livro que terão que ter a paciência de estudar. A matéria é uma falsidade do princípio ao fim, mas não há volta a dar, para atingirem os vossos mais altos objectivos. Têm que estudar. Se quiserem copiar é com vocês, não vou andar, feita toupeira, a fiscalizá-los, se quiserem trazer o livro e copiar, é uma decisão vossa, no entanto acho que devem começar a endireitar este país no sentido da honestidade, sim porque o nosso país é um país de bufos, de corruptos e de vigaristas. Não falo de vocês, jovens, falo dos homens da minha idade e mais velhos, em qualquer quadrante da sociedade. Nós temos sempre que mostrar o que somos, temos que ser dignos connosco para sermos dignos com os outros. Por isso, acho que não devem copiar. Há que criar princípios de honestidade e isso começa em vocês, os futuros homens e mulheres de Portugal. Não concordam? Bem, por hoje é tudo, podem sair. Vemo-nos na próxima aula.

Espantoso. Quando ele terminou estava tudo lívido, sem palavras. Que fenómeno é este que aterrou em Setúbal? Já me esquecia de escrever. Esta ave rara, o nosso professor de Organização Política, chama-se Zeca Afonso.

NOTA – Texto não assinado, recebido por e-mail.

O Jardim é como uma Madeira sem Flores


EMBORA continue a pavonear-se, de inauguração em inauguração, com o taxímetro da dívida sempre em contagem crescente, o régulo Alberto João Jardim, já não diz coisa com coisa. Num dia diz que não há nenhum buraco nas contas, para no dia seguinte dizer que escondeu esse buraco em legítima defesa. Num dia diz que o buraco é qualquer de coisa como 5 mil milhões euros, para logo a seguir dizer que é uma coisita pequena, uma coisita de nada. Num dia pede que o Estado português dê a independência à Madeira, para no dia seguinte dizer que é contra a independência da Madeira e que as suas palavras foram um desabafo contra os interesses financeiros e económicos do cont'nente. Logo a seguir veio agradecer a decisão da Procuradoria-Geral da República de abrir um inquérito-crime ao caso de ocultação da dívida pública da região, nada temendo e que até é um favor que lhe fazem. E todas estas contradições desenrolaram-se no curto espaço de uma semana, entre entrevistas, comícios, sandochas e copos de três.
E no meio desta bandalheira, lá vem o régulo multi-usos, todo lampeiro, depois de ter despachado mais uma inauguração, desta vez as patéticas obras de alargamento de uma rua, sempre rodeado pela moldura de tropa indígena, ataviada de fatinhos domingueiros e com perucas cheias de laca, cuja função é debitarem risos aparvalhados de aprovação pelas graçolas badalhocas do homenzinho que tanto faz de rei como de bobo, que logo remata que é preciso dar pancada em quem ofende o povo madeirense, comprometendo-se a continuar a lutar contra o Estado central até a região conseguir os seus direitos. Por cá, o governo garante que na próxima sexta-feira irão ser divulgados todos os pormenores do cambalacho madeirense, muito embora fique para mais tarde a decisão, assaz importante, de quem vai assumir os custos daquela jardinada, que por omissão só beneficia o infractor nas eleições legislativas regionais.
É por estas e por outras que acho que o presidente do Governo Regional da Madeira se está a tornar uma aberração botânica, uma espécie de Jardim sem flores. E a Madeira que se cuide, pois corre o risco de ficar sem norte, sem siso, sem dinheiro e com um tresloucado à solta…

quarta-feira, setembro 28, 2011

Ponto da Situação

TODOS os dias há novidades. Estão a vir às pinguinhas, com pézinhos de lã, para não assustarem e não doerem muito. Grão a grão vamo-nos habituando, ficando insensíveis, vendo desfilar os buracões no orçamento e aceitando os apertos sem tugir nem mugir, até chegarmos ao patamar da Grécia.

O Governo quer isentar as empresas do dever de informarem a Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) sobre as alterações aos horários laborais. Assim sendo, as crianças vão deixar de ver o pais, os divórcios vão disparar, em contraste com a indústria de sacos-cama que vai ganhar um grande impulso.

O ministro da Economia, Álvaro Santos Pereira, afirmou que o aumento das tarifas de electricidade vai ser muito menor do que os 30 e os 55 por cento que têm andado a ser anunciados, respectivamente para os consumidores particulares e as empresas. Seja muito ou pouco, o aumento prepara-se para levar à falência mais uns milhares de empresas, e por arrastamento, muitos mais portugueses e respectivas famílias.

Carlos Moedas, secretário de estado adjunto do Primeiro-ministro, admite que para 2012 a recessão irá ser mais profunda que o previsto.

Victor Gaspar, Ministro das Finanças, conclui que o pior ainda está para vir.

Embora Hillary Clinton tenha vaticinado que Portugal está no caminho certo para a resolução da dívida soberana, e o Presidente norte-americano Barack Obama tenha atribuído o fracasso do Euro à ausência de regulação do sector financeiro, por cá ainda não se conseguiu apurar quem é o responsável pelo que está a acontecer, havendo quem prefira simplificar, continuando a deitar as culpas para os sindicatos e os trabalhadores portugueses, que continuam a ser o principal obstáculo à competitividade das empresas, preferindo receber subsídios em vez de trabalharem, a serem gastadores e a terem um nível de vida superior às suas possibilidades.

segunda-feira, setembro 26, 2011

O Confessionário


OS PROJECTOS apresentados pela maioria PSD/CDS, pelo PCP e pelo BE para criminalizar o enriquecimento ilícito dos titulares de altos cargos públicos, foram todos aprovados na generalidade, na sessão da passada sexta-feira na Assembleia da República. Quanto ao projecto do PS, foi rejeitado por esses mesmos partidos (com excepção do PEV que se absteve), pois consideraram que apenas criminalizava as falsas declarações ou a inexistência de declarações sobre rendimentos. Entretanto, António José Seguro veio lamentar-se para o Facebook - que parece ter-se tornado o confessionário, por excelência, de alguns políticos cá do burgo - a propósito da insensibilidade dos outros partidos, em relação à proposta do PS, que teria tanto de bem-intencionada como de inócua.

Já João Marcelino, director do DIÁRIO DE NOTÍCIAS, em editorial, veio acrescentar mais algumas achegas à questão, isto é, que "o PS, quinze dias depois do Congresso de Braga, onde o combate à corrupção andou de boca em boca, (...) continua a ser o partido que não quer que os portugueses titulares de cargos públicos tenham de eventualmente explicar de onde lhes vieram as casas, os carros topo de gama e as contas bancárias incompatíveis com os ordenados praticados pelo Estado. Porquê?"

A resposta talvez não seja difícil de encontrar, se atendermos aos incontáveis casos de súbito, veloz e avantajado enriquecimento, que por cá têm proliferado, difíceis de explicar apenas através dos vencimentos auferidos com o desempenho de cargos públicos, e de umas episódicas quanto inofensivas ofertas de caixas de robalos. Há também quem diga que a lei, a ser aplicada com rigor, faria triplicar a população dos estabelecimentos prisionais do país, com o consequente agravamento do défice. Outros ainda, mais radicais, são peremptórios: se me oferecessem o lugar e a oportunidade, eu cá aproveitava-me também…

domingo, setembro 25, 2011

Auto do Jardim das Delícias

O JULGAMENTO do processo-crime contra os quatro ex-administradores do Banco Comercial Português (BCP), incluindo Jardim Gonçalves e Filipe Pinhal, foi adiado 'sine die' devido à sobreposição de datas com o processo movido pela CMVM, que também abrange estes arguidos, os quais têm direito a estar presentes em ambos os julgamentos. Embora estes senhores sejam conhecidos por possuírem muitos e valiosos talentos, não se lhes conhece o dom da ubiquidade. Quanto à Justiça portuguesa, continua a ser fértil em atrasos, erros e incidentes processuais, que quando bem explorados pelos senhores advogados, transformam os processos em comédias para todos os gostos. Esta acusação do Ministério Público data de Junho de 2009, e mais de dois (2) anos depois ainda estamos neste impasse. Gil Vicente se por cá aparecesse, teria assunto de sobra para mais um dos seus admiráveis autos; talvez um Auto do Jardim das Delícias…

quinta-feira, setembro 22, 2011

Prémio Nobel da Paz

O PRESIDENTE norte-americano, Barack Obama, confirmou ao líder da Autoridade Palestiniana, Mahmoud Abbas, que vai vetar a tentativa de os palestinianos serem reconhecidos como Estado pela Organização das Nações Unidas.

Assim, o primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, sensibilizado com tanto apoio, fez um sonoro elogio a Obama, declarando-o merecedor de uma “medalha de honra”. Face a esta postura do presidente dos E.U.A. (que foi, espantem-se, Prémio Nobel da Paz em 2009), em relação à pretensão dos palestinianos, os israelitas vão respirar de alívio, aprofundar a ocupação da Cisjordânia e ao mesmo tempo continuar a matar neles. Entre a defesa de uma causa justa, e a satisfação dos interesses judaicos, que podem condicionar a sua futura recondução na presidência, Obama escolheu a opção que mais contradiz o que dele se esperava: ser um símbolo de mudança e um construtor de PAZ.

terça-feira, setembro 20, 2011

Segredos de Estado


CAVACO Silva e Passos Coelho reuniram e fecharam-se em copas, tratando o assunto das "acções directas" e dos encobrimentos do Alberto João, como se não passassem de palhaçadas e traquinices de um fulano mal comportado, a quem tudo se desculpa e que convém manter sob reserva, como se a coisa merecesse o tratamento equivalente a um segredo de estado. Cavaco e Coelho acabaram por optar por um silêncio comprometedor, como se nada se passasse, dando corpo à ideia de que quem cala, consente. Onde é que eu já vi isto? Ah, já sei! Foi na sequência do envolvimento com o caso BPN, quando Cavaco Silva teve igual relutância em sanear Dias Loureiro do Conselho de Estado.

Entretanto, o Tribunal de Contas detectou que há mais 220 milhões de euros descobertos nas contas públicas da Madeira, elevando o buraco financeiro para valores próximos dos mil e novecentos milhões de euros, enfim, coisa pouca, apenas mais uns trocos para arredondar o buraco. Em resumo: tudo isto fede...

segunda-feira, setembro 19, 2011

Brincar às Laranjadas

O SOBA Alberto João, vinte e quatro horas depois de ter negado a existência de uma dívida oculta nas contas do Governo Regional da Madeira, deu o dito por não dito, reconhecendo que afinal sempre a dissimulou, diz ele que numa manobra de "legítima defesa", contra a nova Lei das Finanças Regionais que não tolera gastos à "tripa forra", e o governo do Sócrates, que não era sério, talvez porque mentia tanto ou mais do que ele.
É fácil de ver que este cavalheiro, empoleirado em mais de trinta anos de poder ininterrupto, e sempre bem guardado e protegido, já experimentou de tudo. Faltava-lhe apenas dar o golpe de mestre e brincar às escondidas com a legalidade. Estou com grande curiosidade para ver quais vão ser os resultados práticos da laranjada doméstica que vai ter lugar, para debater o assunto, entre os correligionários Cavaco Silva e Passos Coelho em pessoa, e com a figura tutelar do atrevido e insolente Alberto João Jardim a pairar entre eles.

sábado, setembro 17, 2011

Eclipses Orçamentais

É MUITO difícil que o encobrimento orçamental de 1,6 mil milhões de euros da Região Autónoma da Madeira, tenha passado despercebido, sem ninguém ter dado por ele. Na minha terra, contas são contas, e não se pode gastar o que não há, assim como não é possível esconder os gastos do que se tinha e deixou de ter. Por isso, apreciei sobremaneira, o encolher de ombros e a expressão de papalvo desentendido de Victor Constâncio, o ex-governador de um Banco de Portugal que fez tanta regulação bancária, ao ponto de deixar o BPN andar à deriva por aí, servindo de fachada para uma gigantesca roubalheira, e que agora se foi acoitar no BCE como vice-presidente de Jean-Claude Trichet. Já o "economista" Cavaco Silva, ex-apoiante e subscritor da saga BPN, defensor intransigente do são tomense emigrante de luxo Dias Loureiro, e agora Presidente da República, diz que o assunto é grave, exibe os seus habituais esgares de consternação artificial, mas fica-se por aí, à espera que os próximos eclipses astronómicos, sejam eles do Sol ou da Lua, sirvam para esconder mais qualquer coisita. A verdade é que talvez seja oportuno relembrar que a Grécia está como está, porque houve grandes encobrimentos orçamentais, que foram dando como saudável, ao longo dos anos, um país à beira do colapso, ao ponto de estar como hoje se encontra.

O descalabro madeirense, velho de tanto tempo quantos os anos de caciquismo jardinista, e respectivas cumplicidades, não pode ser varrido para debaixo de tapete, ou disso lavar-se as mãos, como cínicamente o faz Pedro Passos Coelho, ao dizer que aquele é um problema das escolhas políticas da Madeira e do PSD-Madeira, e que ambos vão ter que o resolver, o que não é verdade, pois quem vai ser chamado para isso, voltando a revirar os bolsos do avesso, são os "cubanos" do costume. 0 problema é que a Madeira não se pode "extinguir", como se fosse uma qualquer direcção-geral ou organismo público, mas o mesmo já não digo do seu intragável, cabotino e impenitente presidente do governo regional, e de todos aqueles que lhe têm dado apoio e cobertura.

quarta-feira, setembro 14, 2011

Preocupações

MARIA de Belém Roseira, a novel presidente do PS (mas ainda sua líder parlamentar interina), diz que o partido está "preocupadíssimo" com a actualização do memorando de entendimento assinado com a 'troika', ao mesmo tempo que lamenta a falta de "cortesia" do Governo, ao não dar a "mínima das informações" sobre tal matéria, fazendo por ignorar que o PS também está envolvido nos compromissos assumidos. 

Maria de Belém já devia saber que os fretes que se fazem não exigem reciprocidade, e não vale a pena estar a mostrar-se ofendida com a tal desconsideração, ensaiando uma espécie de choro sobre o leite derramado. Nas votações ocorridas na Assembleia da República, na passada semana, e excluindo todos os discursos recheados de intenções, para o observador atento, continua a não haver dúvidas, de que lado do espectro político o "novo" PS se continua a posicionar, reforçando uma folgada maioria de direita.

domingo, setembro 11, 2011

Qual 11 de Setembro?

DE HÁ uma semana a esta parte, temos vindo a ser bombardeados (passe a expressão!) pelos habituais comentadores residentes - não por falta de outros temas, mas porque este “vende” sempre bem - que voltam a perorar sobre o 11 de Setembro de 2001 (não confundir com o chileno 11 de Setembro de 1973), aquela data fatídica que o indigesto filho dos Bush resolveu instituir como o "dia em que o mundo mudou" (como se o mundo não mudasse todos os dias...), e que depois foi ficando como emblema para introduzir a planetária "guerra ao terrorismo", outra coisa que é tão velha, como a mais velha profissão do mundo. Há outras datas bem mais marcantes e mensageiras de mudança que o tal 11 de Setembro de 2001, como a implosão da União Soviética, essa sim, data que imprimiu uma mudança de rumo à Humanidade, e por sinal, sem derramamento de sangue, embora com não poucos efeitos perversos. Citando outras maldades, são afloradas, de vez em quando, e de raspão, as carnificinas da Primeira Guerra Mundial, do Holocausto, dos sucessivos genocídios que têm brotado por esse mundo fora, mas nada que se compare à veemência com que é tratado o 11 de Setembro. E já que se fala de carnificinas, porque não recuarmos até às fogueiras da Santa Inquisição, outra barbaridade praticada em nome de Deus, e com a chancela da Santa Madre Igreja?

Assim, todos os anos, o 11 de Setembro é evocado, porém, este ano com mais acutilância, passada que correu uma década, como se fosse uma peregrinação obrigatória, à semelhança de quem vai até à Cova da Iria. E na nossa praceta, até há uma senhora escrevinhadora que arranca uma conclusão de antologia, quando garante que aquilo não foi apenas um massacre de pessoas, mas sim o primeiro que visou uma civilização, e ao falar de civilização, penso eu que estaria a referir-se à civilização dos MacDonalds, da Coca Cola, de Wall Street, da CIA, do Pentágono, de Guantánamo e outras tantas marcas de prestígio. Infelizmente, esqueceu-se de falar de umas quantas contabilidades que faltam fazer sobre as vítimas civis que a guerra do Afeganistão e do Iraque provocaram (e que deixam as 2.982 vítimas nova-iorquinas a uma grande distância), à sombra do pretexto e da retaliação, tanto do 11 de Setembro, como daquela ameaça fantasma de umas quantas armas de destruição maciça, que foram fabricadas pelas mentes perversas de um punhado de políticos, tão criminosos e alucinados como aqueles que andam por aí a brandir o sagrado Corão.

Face a este débito opinativo, apenas posso deixar registada a minha mágoa e comiseração, em relação aos cidadãos americanos (e não só) que naquele dia 11 de Setembro foram engolidos pela voragem da destruição das Torres Gémeas, sem saberem o que lhes estava a acontecer, bem como em relação a todos os civis afegãos e iraquianos, que antes e depois de 11 de Setembro deixaram de estar entre nós, vítimas inocentes de drones e bombardeamentos cirúrgicos, sem saberem o que lhes estava a acontecer. Eu sei!

quinta-feira, setembro 08, 2011

Aviso


O QUE será que Pedro Passos Coelho quis insinuar, quando disse que "em Portugal, há direito de manifestação, há direito à greve. São direitos que estão consagrados na Constituição e que têm merecido consenso alargado em Portugal, mas nós não confundiremos o exercício dessas liberdades com aqueles que pensam que podem incendiar as ruas e ajudar a queimar Portugal". E mais ainda: "Pode haver quem se entusiasme com as redes sociais e com aquilo que vê lá fora, esperando trazer o tumulto para as ruas de Portugal".

Provavelmente, não houve ninguém que dissesse a Passos Coelho que os meninos não devem brincar com fósforos, e já sendo crescidos, nos tempos que correm, ameaçar com a intimidação, polícia de choque e afins, não é a melhor forma de governar um país.

quarta-feira, setembro 07, 2011

Registo para Memória Futura (51)

«O Ministério da Educação nomeou novos directores regionais de Educação no dia 2, no preciso dia em que anunciou a extinção daqueles órgãos. Entre os nomeados destaca-se o até agora presidente da Associação Nacional de Professores, João Grancho, que vai liderar a Direcção Regional de Educação do Norte até ao final de 2012, altura em que o processo [de extinção] fica concluído.»

Notícia do DIÁRIO DE NOTÍCIAS on-line de 6 de Setembro de 2011

Meu comentário: Para quê novas indigitações, se os organismos têm a morte anunciada? Terá sido a necessidade premente de dar emprego aos boys alaranjados, mesmo que com um contrato a prazo, o que motivou estas nomeações?

terça-feira, setembro 06, 2011

Más Companhias

Anders Fogh Rasmussen, o novel secretário-geral da NATO, desloca-se na próxima quinta-feira a Lisboa, estando previstos encontros com o primeiro-ministro, o Presidente da República e os ministros dos Negócios Estrangeiros e da Defesa, durante os quais, além dos habituais cumprimentos, serão abordados assuntos relacionados com a situação na Líbia, as mudanças no Comando de Oeiras, a vinda da STRIKEFORNATO para Portugal, a reconfiguração da participação portuguesa nas missões da NATO e a futura participação dos caças F-16 da Força Aérea Portuguesa, no policiamento aéreo da Islândia, tudo iniciativas tão necessárias a Portugal como o pão para a boca. Como é óbvio, estas iniciativas não estão abrangidas por qualquer plano de austeridade, pois uma coisa é a inadiável e perpétua guerra contra o terrorismo e os inimigos da civilização, e outra coisa é a luta contra o subdesenvolvimento, o empobrecimento, a miséria, e as nefastas consequências do obsoleto estado social, que como toda a gente sabe é de inspiração comunistóide.
Aliás, o senhor Rasmussen, é a pessoa certa no lugar certo. Oriundo da família política do centro-direita, foi um corajoso e resoluto primeiro-ministro da Dinamarca durante oito anos. Sendo um teórico da linha neo-liberal e inimigo declarado do estado social, enquanto teve poder para isso, dedicou-se à sua demolição. Foi também um convicto e fervoroso crente de que Saddam Houssein era detentor de um poderoso arsenal de armas de destruição maciça, logo exacerbado apoiante da invasão do Iraque de 2003, tendo feito questão de que a Dinamarca se empenhasse na participação da força multinacional estacionada em Camp Danevang, perto de Bassora, com meio milhar de militares. Como é fácil de ver, é uma pessoa que não deixa os seus créditos por mãos alheias, sendo os seus atributos muito apreciados entre os seus pares.
A avó Bernarda, com a sua habitual propensão para o gracejo, quando viu a foto do senhor, saiu-se com um curioso comentário: "ai Jesus, abrenúncio, o homem coitadinho não tem culpa da cara que tem, mas o certo é que não ficava nada a destoar em qualquer filme de gangsters...

segunda-feira, setembro 05, 2011

Fácil, Mais Fácil, Cada Vez Mais Fácil


O Partido Comunista Português e o Bloco de Esquerda apresentaram no plenário da Assembleia da República, através de iniciativas independentes, as suas propostas para solucionar o problema dos trabalhadores a falsos recibos verdes. Na passada sexta-feira, 2 de Setembro, PS, PSD e CDS-PP, cada um com os seus argumentos, chumbaram ambas as iniciativas, embora, ironia das ironias, manifestem que estão empenhados na sua erradicação, mas não dando um único passo nesse sentido.

O PSD utilizou o já normal argumento da chantagem do desemprego para justificar a continuação da precariedade, isto é, antes a precariedade que mais desemprego, só faltando dizer que acabar com esta ignomínia, no meio da crise que o país o vive, seria desrespeitar e pôr em causa os objectivos traçados e acordados com a troika. Contudo, não se dispensou de dizer que a concretizar-se a aprovação de tais iniciativas, aquelas iriam tirar o ganha-pão aos milhares de trabalhadores que são efectivamente independentes, o que corresponde a um rotundo disparate.

O CDS põe trabalhadores e patrões em pé de igualdade - como se nas relações laborais não existisse uma parte mais fraca - justificando que a inversão do ónus da prova não pode ser utilizada, havendo que fazer prova de que os recibos verdes correspondem a uma forma de subversão dos modelos e regras de contratação. Tanto o PSD como o CDS-PP, além de hipocrisia e argumentos falaciosos, manifestam ignorância da realidade e dos mecanismos subjacentes às relações laborais, ficando a pairar a ideia de que o conhecimento e as suas relações com este meio, sempre foram, e continuam a ser, muito superficiais.

O PS, na sua nova linha política (versão António José Seguro), mais comedida em relação à precariedade, reconhece-a agora como má, depois de anos a suportar um Governo (a versão José Sócrates) que ajudou a implementá-la como modelo no mundo do trabalho, contudo, sugere que o problema possa ser solucionado por consenso entre as partes (trabalhadores e empregadores) e não através de iniciativas legislativas, como se as ilegalidades pudessem ser objecto de qualquer negociação particular. À falta de melhor argumento, a bancada rosa fez dissertações à volta de nódoas de gordura.

Conclusão: vai continuar a ser fácil despedir, mais fácil pagar menos, e cada vez mais fácil explorar muitíssimo.

No meu blog CARTÓRIO DO ESCREVINHADOR podem ser consultadas as propostas do Partido Comunista Português e do Bloco de Esquerda.

domingo, setembro 04, 2011

O Preço da Salvação

«(…) Quando se trata de taxar grandes fortunas os analistas tornam-se filosóficos: mas o que é um rico?, perguntam. Fazia falta um destes analistas no Evangelho segundo São Mateus. Quando Jesus dissesse que é mais fácil um camelo entrar pelo buraco de uma agulha do que um rico entrar no Reino de Deus, o analista havia de contrapor: “Mas, Senhor, o que raio é um rico? Abstendo-vos de usar conceitos vagos e populistas”. No entanto, Jesus Cristo, talvez por ser filho de quem é, pode dizer o que lhe apetece sem ser acusado de demagogia. Uma sorte que Jerónimo de Sousa não tem. (…) Américo Amorim constitui, por isso, um mistério tanto para a fiscalidade como para a teologia. Sendo o homem mais rico de Portugal, talvez não entre no reino de Deus. No entanto, na qualidade de pobre de espírito, tem entrada garantida.»

Excerto do artigo de opinião de Ricardo Araújo Pereira, intitulado “Ceci n’est pas un riche”, publicado na revista VISÃO de 1 de Setembro de 2011. O título do post é de minha autoria.

sábado, setembro 03, 2011

«O director, o gerente, a mulher deles e as lojas dela»

Artigo integral de João Semedo, médico e deputado do BE, publicado no jornal PÚBLICO em 30 de Agosto de 2011. Os comentários são desnecessários.

«Aquilo que o director de um serviço não faz no seu hospital público, põe a sua empresa privada a fazer.

A história conta-se em poucas palavras. O Conselho de Administração da Unidade Local de Saúde da Guarda (que integra hospital e centros de saúde do distrito) autorizou uma empresa privada de serviços médicos de oftalmologia a realizar, nesses centros de saúde, rastreios à visão para despiste das principais causas de cegueira. A empresa em questão (M.A. Dias dos Santos, Lda) tem como sóciogerente o director do serviço de oftalmologia do hospital da Guarda (M. A. Dias dos Santos, dr).

Em resumo, aquilo que o director de um serviço não faz no seu hospital público põe a sua empresa privada a fazer e a administração do hospital aprova e aplaude. Como deputado, questionei o Governo sobre esta estranha situação e o PÚBLICO disso deu notícia. Até hoje, nem o Governo respondeu, nem a administração da ULS disse fosse o que fosse.


Apenas o promotor dos rastreios se queixou quer da notícia quer das minhas perguntas. E para que não se tome por igual aquilo que é diferente, diga-se que quem se queixou foi o director da oftalmologia e não o sócio-gerente da empresa. O que tem a sua lógica: que razão levaria uma empresa privada a queixar-se de ser chamada por um hospital público? Em geral, esse é o maior desejo de qualquer privado.

De que se queixa o director da oftalmologia? De ter tido necessidade de recorrer a uma empresa privada para fazer um rastreio que o hospital e os centros de saúde deviam fazer, consumindo, mais uma vez, recursos públicos para pagar a privados? Não, disso o director não se queixa. Aliás nem podia porque, segundo consta, a empresa MADS não cobrou nada ao hospital do director MADS. O próprio confessa ter sido um “serviço cívico”, isto é, uma borla desinteressada, altruísmo em estado puro: o director MADS reconheceu a necessidade, o sócio-gerente MADS comoveu-se e o rastreio fez-se.

O director queixa-se pelo sócio-gerente, chorando as dores deste que é o mesmo que aquele. Porque, apesar das suas boas intenções, acusam malevolamente a empresa de que é sócio-gerente de ser “proprietária, sócia ou de qualquer forma associada de quaisquer ópticas existentes no país”, afirmação que desmente.

Diga-se que aquela empresa não é nem podia ser proprietária ou sócia de lojas de óptica porque, em Portugal, é proibida qualquer relação societária ou equivalente entre quem faz oftalmologia e quem vende óculos e lentes. Mas, claro, não se pode exigir que a lei impeça ou previna simples coincidências.

Primeira coincidência: em cinco localidades – Guarda, Trancoso, Sabugal, Pinhel e Belmonte – há cinco lojas da mesma rede de ópticas, Óptica Lince, SA, passe a publicidade. Nessas mesmas localidades – por vezes na mesma rua – funcionam cinco consultórios da empresa de serviços médicos de oftalmologia MADS. Segunda coincidência: na gerência da Óptica Lince está a esposa de MADS. Sem bigamia: para este efeito, director e sócio-gerente são a mesma pessoa.

Em resumo: quem decide o rastreio e quem o realiza, quem prescreve os óculos e quem os vende é tudo da mesma família. Só não vê quem não quer ver. Não é preciso pôr óculos para ver que isto não está certo e que este cruzamento de interesses colide com os princípios e as boas práticas dos serviços públicos de saúde.

Este caso é um caso mas, infelizmente, não é único. O SNS está poluído por promiscuidades em tudo semelhantes. Degradam a qualidade dos serviços e promovem o despesismo. Eliminá-los favoreceria a sustentabilidade financeira do SNS e evitaria muitos dos cortes que o Governo está a fazer e que afectam a capacidade do SNS e prejudicam os doentes.

No SNS, contas equilibradas e qualidade assistencial são incompatíveis com o amiguismo nas decisões e a promiscuidade com os interesses privados. O Governo exige e promete rigor, seriedade e determinação na gestão da coisa pública. Este caso da Guarda põe à prova a coerência deste discurso.»

sexta-feira, setembro 02, 2011

Um Rico Senhor no País das Maravilhas


Depois de confirmar que é autêntico, passo a transcrever este requerimento, tal como chegou à minha caixa de correio (e-mail). A ser verdade, o senhor Américo Amorim não será apenas o homem mais rico de Portugal, cuja fortuna e património ficaram livres de serem tributados, por obra e graça dos fastios do senhor Coelho, mas será também o respeitável beneficiário - entre mais uns quantos – de um monumental logro, que só é possível ter acontecido com muitas cumplicidades, e que só a muito custo chegou ao domínio público. Américo Amorim já veio desmentir que tenha havido artimanha, garante que mal conhece o BPN e nunca recorreu aos seus serviços. Porém, considerando que até agora, já me obrigaram a “contribuir” com perto de 1.000 euros, não sei se para tapar as “colossais” crateras do BPN, se para engrossar o mealheiro do senhor Amorim, é óbvio que também estou interessado em saber como isto vai acabar, ou se não acabou já, sem disso nos apercebermos.
Então vejamos:
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«Exmo. Senhor Presidente da Assembleia da República
O Bloco de Esquerda tomou conhecimento, através da comunicação social, da possível existência de um crédito concedido pelo BPN à Amorim Energia para a compra de uma participação na Galp.
Segundo a notícia, o crédito, da ordem dos 1600 milhões de euros, teria sido concedido pelo BPN à Amorim Energia em 2006, antes do processo de nacionalização. A mesma fonte avança que o empréstimo não chegou a ser pago pela holding ao BPN, mantendo-se assim a divida de 1600 milhões de euros durante todo o período em que o Banco esteve na posse do Estado.
Acresce a esta informação o facto de a Amorim Energia ser uma holding detida, não apenas por Américo Amorim, mas que tem como accionistas a Santoro Holding Financial, de Isabel dos Santos, e a Sonangol. Como é conhecido, a Santoro Holding Financial, para além de accionista da Amorim Energia, é também accionista maioritária do Banco Internacional de Crédito, a quem o Estado irá vender o BPN. Desta forma, a venda do BPN, com os seus créditos, ao BIC, poderá implicar que o crédito de 1600 milhões de euros seja pago pela Amorim Energia a um banco que tem como principal accionista a própria devedora.
A confirmar-se, a situação acima descrita configura mais um episódio inaceitável de falta de transparência associado ao processo de reprivatização do BPN. O Banco Português de Negócios, nacionalizado em 2008, representa, neste momento, cerca de 1000 euros por contribuinte em Portugal, e um prejuízo directo para o Estado de pelo menos 2,4 mil milhões de euros.
Em nome da transparência e do direito à informação que assiste a todos os contribuintes que pagaram e estão a pagar o prejuízo do BPN, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda gostaria de ver esclarecidas algumas questões relacionadas com a situação acima descrita.
Atendendo ao exposto, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda vem por este meio dirigir ao Governo, através do Ministério das Finanças, as seguintes perguntas:
1. Confirma o Governo a existência de um crédito, por liquidar, da Amorim Energia ao BPN? Em caso afirmativo, qual o seu valor?
2. Caso exista, como explica o Governo a não execução do referido crédito para fazer face aos prejuízos associados ao BPN, durante os anos em que o banco esteve na posse do Estado?
3. Confirma o Governo que o referido activo se encontra num dos três veículos constituídos pela Caixa e transferidos para o Tesouro?
4. Perante o cenário de venda do BPN ao BIC, qual a situação do referido activo? Ficará em posse do Estado ou será incluído no pacote a privatizar?
5. Pode o Governo divulgar a lista de todos os créditos, incluídos nos veículos transferidos para o Tesouro, acima dos 250 milhões de euros?

Palácio de São Bento, 08 de Agosto de 2011.
O Deputado
João Semedo»

quinta-feira, setembro 01, 2011

O Coelho saiu da Toca

DE VISITA a Espanha, Pedro Passos Coelho, em entrevista ao jornal EL PAIS, e manifestando cobardia política, acabou por dizer lá fora, aquilo que não teve coragem para dizer cá dentro, isto é, que quem é detentor das grandes fortunas e quem aufere rendimentos de capital pode respirar fundo e ir de fim-de-semana descansado, pois Passos Coelho já manifestou a sua discordância em tributá-los, porque isso, garante ele, em vez de atrair fortunas para investirem no país e criar riqueza (onde, onde?), conduziria à fuga de capitais para o estrangeiro (como se isso não acontecesse já). Curiosamente, o seu “delfim” Ângelo Correia, à margem de uma conferência na Universidade de Verão do PSD, afinou pelo mesmo diapasão, que não senhor, que estas medidas são um mal necessário e que os mais ricos, quanto a impostos, pois claro, já têm a sua conta, e coisa e tal.
Dito isto, fiz umas contas por alto e cheguei à conclusão que cada vez que um senhor accionista vai levantar os dividendos das suas acções, não é difícil imaginar quantas dezenas, centenas ou milhares de postos de trabalho ele vai criar, contribuindo para a reanimação da economia nacional, ou então, quantos "porches" e "lamborghinis" vai encomendar, em quantas "regatas" vai participar, quantas propriedades e obras de arte vai acrescentar ao seu património, quantas festanças vai frequentar, quantas empresas-fantasma vai criar, assim contribuindo (à sua maneira) para a reanimação da economia nacional.
Ao mesmo tempo que o Coelho saía da toca por terras de Espanha, cá em Portugal, o ministro das finanças, Vítor Gaspar, num exercício deveras demorado e muito sincopado, tocou uma música diferente: sentenciou que a estratégia orçamental é carregar a população trabalhadora com mais impostos, sobretudo a função pública e trabalhadores com salários elevados (como se quem é bem remunerado a trabalhar por conta de outrem, tivesse pretensões a ser rico), fazer cortes nos benefícios fiscais das despesas com a habitação, a saúde e a educação, ao passo que os cortes na despesa do Estado (e não nas prestações sociais) vão aguardar melhores dias. Quanto às mais-valias mobiliárias são timidamente agravadas em 1% (uma insignificância!). Entretanto, fazendo um jeito ao PS, que tinha reclamado a medida, as empresas com lucros superiores a 1,5 milhões de euros pagarão, no próximo ano, um imposto extra de 3%, o que quer dizer por via disso, haverá justificação para não haver reinvestimentos, e o pretexto para mais uma mão cheia de falências e despedimentos. A receita a conseguir com as sete medidas principais ronda os 1300 milhões de euros. Para além do que ontem foi anunciado, as receitas do aumento no IVA darão ao Estado mais 1190 milhões de euros.
Entretanto, o senhor Coelho, antes de voltar para a toca, achou por bem fechar a sua lengalenga com mais um aviso sério: ainda faltam as restantes 70 (setenta) medidas para concretizar…