sexta-feira, outubro 05, 2012

Enganos que Falam Verdade

A BANDEIRA nacional é o símbolo da soberania da República, da independência, da unidade e integridade de Portugal é a adoptada pela República instaurada pela Revolução de 5 de Outubro de 1910. Exibida de forma invertida, equivale a um pedido de socorro, significando que o país está sob ocupação. Foi o que aconteceu ao ser hasteada hoje, 5 de Outubro de 2012, última vez em que é feriado nacional.

quinta-feira, outubro 04, 2012

Registo para Memória Futura (73)


O Governo PSD/CDS-PP ignorou deliberadamente estas quatro (4) propostas da CGTP Intersindical, destinadas a alargar às grandes empresas, às grandes fortunas e aos rendimentos do capital, a tão apegoada equidade nos sacrifícios, decorrentes do défice e da dívida soberana, e que permitiria arrecadar 5.965,6 milhões de euros.
Embora já saibamos o que valem as promessas na boca do Governo, este acabou por adiantar, timidamente, que iria (talvez) rever as taxas as transações financeiras, sendo logo apupado com um coro de protestos pelos senhores banqueiros. Nada mais foi preciso para que remetesse para as calendas a tal distribuição equitativa dos sacrifícios. Em compensação, e com os olhos postos em quem trabalha, seja pensionista ou reformado, o Governo - e não esqueçamos que todos eles são gente abjecta e vingativa - foi peremptório: ai não quisesteis o nosso remédio da TSU? Pois então tomai lá disto, para saberem como elas mordem! E assim fez. Aplicou um agravamento generalizado de 35% no IRS, e prometeu uma escalada alucinada no IMI, tudo isto anunciado pela voz pausadamente inexpressiva do ministro Victor “powerpoint” Gaspar, que veio substituir o ausente Coelho, que anda lá por fora em descontraída digressão, isto para não falar no manifesto desprezo pelos cidadãos portugueses, que foi colocá-los no fim da fila das suas preocupações comunicacionais. Entre ajustamentos, reajustamentos e consolidações orçamentais, a verdade é que este bando de malfeitores continua a exercer represálias sobre quem trabalha, levando o país ao desastre e à miséria.

Entretanto, faltou acrescentar a este pacote, um pormenor, que não é tão pequeno como isso. É que até ao final de Dezembro de 2012, os contribuintes portugueses ainda terão que desembolsar 3.4 mil milhões de euros, para saldar (?) a grande falcatrua que foi o caso BPN, o que significa, contas feitas, que os contribuintes irão ser espoliados de 6.5 mil milhões de euros, mais juros e contingências, tudo em benefício de uns quantos facínoras que se bamboleiam por aí, mais os novos proprietário que ficaram com o “bem-bom” do que restou, por uns simpáticos 40 milhões de euros. É obra! É bom relembrar, conforme o fez o jornal PÚBLICO, que a falência do BPN foi provocada por uma megafraude que teve repercussões políticas, pois o banco tinha políticos no activo, nomeadamente da esfera do PSD, entre os seus clientes, accionistas ou nos seus órgãos sociais. Os casos mais emblemáticos são os de Oliveira Costa e do ex-ministro de Cavaco Silva e ex-conselheiro de Estado Manuel Dias Loureiro. Quanto a Cavaco Silva, é bom lembrá-lo, também provou do pote, gostou e ficou a lamber os beiços.
O que acontece é que este episódio do BPN tem a ver (e muito) com todos os assaltos que são perpetrados ao bolso dos portugueses, apesar de haver a intencional preocupação de o descontextualizar da crise portuguesa. Por essas e outras, e bem vistas as coisas, eu acho que os portugueses, independentemente da Greve Geral de 14 de Novembro, têm razões de sobra para se indignarem, e deviam voltar à rua já hoje.

ADENDA - Depois de o Governo ter andado a repetir, dia sim, dia sim, que os portugueses andaram a fazer vida de lordes, a gastarem à tripa forra, mais do que permitiam as possibilidades do país, isto apesar de terem os mais baixos salários da Europa, foi a vez do patriarca Policarpo vir botar faladura e dizer que os portugueses são também parte responsável pelo descalabro em que se encontra o país. Na sua magnânima avaliação, disse ele, que tudo isto é resultado de exigirmos do Estado, mais do que ele pode dar, mas não referiu a obrigação que cabe a esse mesmo Estado de bem administrar e melhor redistribuir. Esqueceu-se de assinalar e enumerar a corja de bandoleiros que desviaram e gastaram em beneficio dos outros bandos que por aí andam, o que por direito pertencia aos supostos mal comportados e gastadores contribuintes. Sua Eminência devia persignar-se, confessar-se, recitar um milhão de pais-nossos como penitência, depois recolher-se em retiro espiritual, e deixar de dizer homilias recheadas de patacoadas, que só ofendem quem está desempregado, quem tem que sobreviver com salários miseráveis ou anda a respigar nos caixotes do lixo.

quarta-feira, outubro 03, 2012

A Coerência da Incoerência

EM 1 de Outubro de 2012, o vice-presidente da bancada do Partido Socialista José Junqueiro acusou Jerónimo de Sousa, secretário-geral do PCP, de andar de "mão dada com a direita", a propósito de aquele ter afirmado que o PS se demitiu de ser força de oposição à coligação PSD/CDS-PP. Disse isto sem se rir, e foi ainda mais longe, acusando Jerónimo de Sousa de ser um dos responsáveis por existir actualmente um governo de direita, na medida em que ao votar ao lado da direita, contra o PEC IV (Plano de Estabilidade e Crescimento) - produto de um suposto governo de esquerda, apenas no espírito mas não de facto - levou a que José Sócrates se demitisse.

Dois dias depois, em 3 de Outubro de 2012, o PS (partido submisso) do mesmo José Junqueiro, ancorado num pretenso sentido de responsabilidade por ter subscrito o memorando da troika, por se considerar oposição responsável e alternativa ao Governo, e rejeitar “populismos fáceis”, declarou que se irá abster (expressão máxima de coerente incoerência) na votação das Moções de Censura do PCP e do BE, dirigidas contra o Governo da coligação PSD/CDS-PP, as quais irão ser discutidas e votadas na sessão da Assembleia da República de 4 de Outubro de 2012.

A ver vamos o que resultará desta estrábica “lucidez” política.

terça-feira, outubro 02, 2012

Gente Sinistra e Perigosa (3)

OS PACOTES de austeridade, bem como o futuro de Portugal, decidem-se e são aprovados em Bruxelas, e os bandoleiros do Governo de Passos Coelho escondem-se e calam-se, já nem se dignando informar os portugueses, de quais as novas desgraças que planearam e contrataram.

BE e PCP respondem com moções de censura, ao passo que o PS (partido submisso) continua a sentir-se confortável com a sua teoria da "austeridade inteligente", no "sentido de responsabilidade", e a refugiar-se nas "abstenções violentas", provávelmente à espera de entrar para o tal governo de salvação nacional, de iniciativa presidencial, para continuar a ajudar à missa.

segunda-feira, outubro 01, 2012

Regressem ao Sítio de Onde Vieram!

«Estado deu benefícios fiscais a empresas de 2,6 mil milhões em dois anos. Valor dos benefícios fiscais a empresas em 2010 e 2011 equivale a mais de metade da austeridade exigida em 2013.

Os benefícios fiscais concedidos pelo Estado português ascenderam a 2,6 mil milhões de euros, entre 2010 e 2011. Os incentivos fiscais concedidos em dois anos representam assim mais de metade do esforço de consolidação previsto para o próximo ano que, segundo o ministro das Finanças é da ordem dos 4,9 mil milhões de euros para atingir a meta do défice orçamental de 4,5%.

No ano em que Portugal pediu a assistência financeira internacional foram até concedidos benefícios em sede de IRC a mais 3.353 empresas, ainda que a despesa fiscal total, no final desse ano, tenha registado uma diminuição de 133 milhões de euros face a 2010.

A publicitação da lista com as empresas que tiveram benefícios fiscais e respectivos montantes referentes a 2011, no Portal das Finanças, surge um dia depois de ter sido publicada informação relativa a 2010. No ano passado, os benefícios fiscais somaram 1.237 milhões de euros, menos 9,7% face à despesa fiscal do ano anterior que foi de 1.370 milhões de euros. Entre as duas listas mantêm-se uma constante: a maior fatia de benefícios concedidos pelo Estado continuou a ir para a Zona Franca da Madeira.

Zona Franca absorve maiores benefícios.

Em 2011, o universo de empresas abrangidas somou as 14.189 as entidades, mais 3.353 face a 2010.

Na lista disponibilizada, as principais beneficiárias continuam na Zona Franca da Madeira. No topo da lista, surge a CSN Europe Lda que recebeu 187 milhões de euros, seguindo-se Namisa Europe, Unipessoal Lda com 120 milhões de euros e em terceiro lugar vem o Millennium BCP Participações SGPS, Sociedade Unipessoal Lda, também da Zona Franca, com incentivos fiscais de 98,3 milhões de euros. Em quarto lugar da lista de entidades que tiveram mais benefícios fiscais surge a Caixa Económica Montepio Geral com 53,4 milhões de euros.

Segundo os dados das Finanças, no top 50 dos incentivos fiscais constam empresas como a VW AutoEuropa, a Efacec Capital SGPS, a Corticeira Amorim SGPS, a Universidade Aberta, a SIBS SGPS, GalpEnergia e Pingo Doce Distribuição Alimentar. Todas acima dos três milhões de euros de benefícios em sede de IRC.»

Notícia de Lígia Simões e Paula Cravina de Sousa, publicada no DIÁRIO ECONÓMICO on-line de 28/09/12 - 17:30

Meu comentário: Ver os apoios de recapitalização que a banca tem recebido com as tranches da troika, não estarem a ser aplicados no financiamento das empresas e da economia em geral, saber que o Governo não extinguiu a Fundação Social Democrata da Madeira, que está a ser investigada pelo Ministério Público, no âmbito de uma generalizada infecção de corrupção e desvios de dinheiros públicos, saber que a Segurança Social apresenta um défice de 694 milhões, depois das transferências de fundos de pensões da banca, destinadas a salvar as contas de 2011, suspeitar que o Governo tem em estudo um corte generalizado no subsídio de desemprego, bem como estar a preparar uma proposta de aumento de impostos para o próximo ano, incluindo o IRS, para compensar a devolução parcial dos subsídios de Natal e de férias retirados ao sector público e pensionistas, ao mesmo tempo que mantem simbólicamente colectadas, quando não fiscalmente ignoradas, as grandes fortunas e os lautos rendimentos de capital, ouvir o economista, eminente cavaquista e também conselheiro de Estado Victor Bento, que já em 2009 defendia a descida dos salários, reclamar agora que a idade de reforma deve ser alargada, para que os portugueses trabalhem até tombarem para o lado, para depois ouvir Passos Coelho, e mais uns quantos facínoras da política, dizerem com aquela conhecida expressão de falso martírio e comiseração, que os sacrifícios estão a ser partilhados por todos e que não há alternativas, dá vontade de dizer: - Façam meia volta e regressem ao sítio de onde vieram!

domingo, setembro 30, 2012

O Borges é Três Vezes FDP

A CRIATURA não merece muitas palavras, mas convém estarmos atentos à sua loquacidade fecal, porque o meliante tem lugar cativo à mesa do orçamento e emparceira com o Governo, influenciando (ou arquitectando) as suas perversas decisões. Assim, sem receio de errar, podemos dizer que o Borges é três vezes um refinado FDP; a primeira porque é um Figurão Dos Poderosos (desde que não sejam ignorantes, claro está!), a segunda porque é um Fanático Das Privatizações, e a terceira porque é um Fabricante De Precariedade. E mais não digo.

quinta-feira, setembro 27, 2012

Austeridade ao Retardador


É GARANTIDO que as novas medidas de austeridade que o Governo já tem delineadas, apenas chegarão ao domínio público depois de ocorrer a manifestação da CGTP, a ter lugar no sábado, dia 29 de Setembro. Percebe-se que o Governo queira retardar a sua divulgação para não potenciar os protestos e a indignação dos portugueses, mas talvez venham a ter mais uma surpreza.

domingo, setembro 23, 2012

Cantar e Acordar


ALGÉM disse um dia destes que os portugueses se sentiam desiludidos e atraiçoados pelos políticos da oposição, e que o resultado era as manifestações de protesto serem cada vez menos concorridas, dando a sensação que o povo, apesar de estar a ser selváticamente espoliado pelo governo, mantinha-se ancorado nos tradicionais brandos costumes, estava possuído de grande desânimo, tinha baixado os braços e desistido de lutar. Na verdade, também eu já começava a duvidar que alguma vez, por mais faíscas que saltassem, não chegavam para incendiar a indignação, trazendo os protestos para a rua, com a adequada força, expontaneidade e determinação. Nesse aspecto, e em situações semelhantes, a resposta rápida, a audácia e arrojo dos espanhóis, sempre me impressionou.

Finalmente, por cá, a fervura começou a levantar, primeiro a 15 de Setembro, e depois a 21, pela madrugada dentro, com uma participação verdadeiramente inovadora e desafiante, frente ao Palácio de Belém (com várias réplicas espalhadas pelo resto do país), enquanto decorria o Conselho de Estado, e não tanto por causa da tal suposta traição dos políticos da oposição. E quando digo inovadora, isso significa que a população decidiu tomar a iniciativa da contestação, e com isso restituiu aos partidos da oposição a força que lhes estava a faltar, embora possa parecer que se inverteram os papeis, passando os partidos de condutores a conduzidos. Ora, por vezes, em política, acontecem destes fenómenos; é de baixo que irrompe impetuosamente a força da razão, ao passo que as cúpulas não têm outro remédio senão subscrevê-la e dar-lhe expressão política.

É certo que o caldo se entornou com aquela tentativa de voltar a expoliar os trabalhadores com o criminoso aumento da TSU, mas o governo não vai desistir dos seus intentos. Se não é por via da TSU, outros expedientes eles encontrarão, para subtrair a quem trabalha ou está reformado, aquele apetecivel mês de salário ou de reforma de que eles se querem apropriar à viva força (sempre quero ver que posição irão assumr o PS e a UGT), um passo importante para impor a austeridade como modelo dominante e definitivo, baseado no empobrecimento generalizado, na erosão dos direitos sociais e na supressão de expectativas, mantendo incólumes as grandes fortunas e os rendimentos do capital. Portanto, convém manter à mão aquela letra de José Gomes Ferreira, e a música de Fernando Lopes Graça, para nos mantermos despertos, e voltarmos a sair à rua, sempre que os salteadores sejam tentados a repetir a proeza. Nesta altura, voltar a adormecer, é um risco que o povo não pode correr.

Acordai
acordai
homens que dormis
a embalar a dor
dos silêncios vis
vinde no clamor
das almas viris
arrancar a flor
que dorme na raíz

Acordai
acordai
raios e tufões
que dormis no ar
e nas multidões
vinde incendiar
de astros e canções
as pedras do mar
o mundo e os corações

Acordai
acendei
de almas e de sóis
este mar sem cais
nem luz de faróis
e acordai depois
das lutas finais
os nossos heróis
que dormem nos covais
Acordai!

sábado, setembro 22, 2012

Aberrações e Originalidades

VAI HAVER um grupo de acompanhamento, denominado "conselho de coordenação da coligação", olarilolé, destinado a gerir o relacionamento dos parceiros da coligação PSD/CDS-PP, para já, com a obrigação de diáriamente se beijarem e abraçarem. A partir de agora os portugueses já podem voltar a dormir descansadíssimos, pois as relações e a oscilação dos humores entre os membros do Governo passarão a ser filtrados, amortecidos e normalizados pelo tal conselho, o que significa que quando um ministro propõe que se mate o contribuinte, e outro diga que o melhor é esfolá-lo vivo, para evitar discórdias, lá virá o "grupo de acompanhamento" aconselhar que se fiquem por umas escoriações ou pequenas mutilações, mas nunca soluções radicais.

Acho que era mesmo um orgão deste tipo que o governo estava a precisar, evitando que suas excelências andem por aí desacompanhadas, ausentes, instáveis, irritadiças, indecisas, deprimidas e intratáveis, esquecendo tanto as suas obrigações recíprocas, bem como as que devem ser asseguradas com o país. Parece que a Presidência da República vê com muito bons olhos esta inciativa, e se o Presidente for do mesmo partido dos da coligação, melhor ainda, pois é como se fosse Deus com os anjos. Por isso, seja uma aberração ou uma originalidade, que venha o diabo e escolha.

sexta-feira, setembro 21, 2012

Mistificações

A COMUNICAÇÂO social, escrita e audio-visual, continua a ter uma escolha muito restrita nos seus paineis de comentadores. Parece que o pais está reduzido a meia dúzia de "sábios", escolhidos a dedo. Tudo gente que dá opiniões redondas, pitorescas e inofensivas, como se estivessem a encher chouriços. São sempre os mesmos que palestram e botam faladura, "madrinhas" e "padrinhos" do tipo Helena Matos e Ângelo Correia, este último a terçar armas pelo "afilhado" Coelho, garantindo que tudo isto à volta da TSU, são mal-entendidos e garotadas dos inexperientes CDSs, parceiros de coligação do PSD, a confirmar uma teoria de desculpabilização que continua a ganhar corpo, e que eu já tinha vindo a referir.

A estes soma-se o sempre omnipresente caga-sermões Mário Soares, a debitar uma solução "à grega", para solucionar a crise política portuguesa, isto é, muda-se de protagonistas sem se mudar de políticas, sem consulta eleitoral, logo sem gastos, sem propostas nem soluções, para darmos um salto em frente e chegarmos à mesma situação da Grécia, mais depressa do que imaginávamos. Acrescente-se a isto o caga-sentenças Marcelo Rebelo de Sousa, o impagável Camilo Lourenço, o sempre-em-pé António Barreto e o honorável Medina Carreira. Todos a mistificarem, receitando emplastros para desinfectarem uma estabilidade e realidade que o Governo todos os dias se encarrega de dinamitar, a quererem impingir-nos gato por lebre, e a dizerem que o grande problema do Governo é uma insuficiência de comunicação (só falta culpar o acordo ortográfico!). Se bem percebo, está na hora de passar a modelar e calibrar as medidas de austeridade, bem como a forma de as transmitir (ou não transmitir) a quem vai sofrer na pele os seus efeitos, de forma suave e adoçicada, para abafar os protestos, não fazer ondas nem provocar estragos.

No meio de tudo isto, fica-me a dúvida se o Presidente da República convocou o Conselho de Estado (mais o Gaspar e a sua folha de Excel) para se aconselhar e tentar controlar os danos provocados pelas alterações na TSU, dando um puxão de orelhas ao Coelho, se para dar um ralhete à troika, se apreensivo com a fraca popularidade e credibilidade do Governo (e já agora, também da sua) ou se motivado pelo facto da coligação PSD/CDS-PP estar presa por arames, não se ouvir falar de conselhos de ministros, substituídos por cimeiras dos generais Pedro e Paulo, acusados de andarem a convocar os seus estados-maiores e conselhos de guerra, e apenas comunicarem entre si por meio de mensagens cifradas e estafetas.

No meio dos improvisos da classe política e das badalhoquices dos comentadores de meia-tijela, nota positiva para a escritora Maria Tereza Horta, por rejeitar ser agraciada por Pedro Passos Coelho, "uma pessoa empenhada em destruir o país", muito embora se considere honrada com o Prémio D. Dinis, pelo seu romance "As Luzes de Leonor". Isto prova que ainda há pessoas decentes, que não se disponibilizam para salamaleques nem se dobram por dez réis de mel coado.

quarta-feira, setembro 19, 2012

Aprender com os Filmes





«Os juízes servem para fazer justiça, aplicando a lei, só que a lei nem sempre é justa»

Opinião do juiz Philippe, desempenhado pelo actor Philippe Noiret (1930-2006) no filme A Grande Farra (La Grande Bouffe) de 1973, realizado por Marco Ferreri.

terça-feira, setembro 18, 2012

Pedro e Paulo, mais o António


PEDRO decide garrotar os trabalhadores portugueses com o agravamento da TSU e do IRS, dizendo que não há alternativa. Vem depois o Paulo (após um grande silêncio, para finalmente fazer coro com o resto do mundo), dizer que não concorda e a brandir o seu desvelado patriotismo para justificar a continuação no governo, digamos que sob protesto. Ao ver que a solução deu para o torto, Paulo sacaneia o parceiro Pedro da coligação, fazendo-se passar por virgem púdica e ofendida, a fim de se desvincular das malfeitorias perpetradas por Pedro, e com isso vir a colher dividendos junto dos portugueses. Pelo meio, alguém que me explique o que é isso de um imposto extraordinário sobre as PPPs, solução alternativa defendida pelo António da abstenção violenta, que logo serviu para aparecerem os defensores de um governo de salvação nacional a três, uma coisa que até dava muito jeito ao Pedro e ao Paulo, para diluir responsabilidades. Então e a renegociação das rendas das tais PPPs? E os rendimentos do capital? E os lucros das grandes empresas? E os dividendos dos accionistas? E as grandes fortunas que se andam a passear, cá dentro e lá fora?

Quanto ao povo, no passado 15 de Setembro, à margem de convocatórias partidárias e sindicais, e com um enérgico protesto a nível nacional, levantou-se e deu sinal de que não quer continuar a ser albardado.

Entretanto, fica por explicar como é que esta coligação funciona, e se o seu objectivo é governar ou apenas tiranizar o povo. Não acredito muito na teoria da ingenuidade, da inexperiência ou da incompetência dos seus membros. Penso que embrulhados e desculpabilizados por essa teoria, passo a passo, com muita paciência e alguma turbulência artificial pelo meio, vão levando a água ao seu moinho. Para dramatizar, Bruxelas já vai ameaçando que se a TSU não for para a frente, suspendem a próxima tranche, em nome da Merkel, do Euro e do raio que os parta a todos. A crise política que se avizinha serve para pôr o país de quarentena, na calha para abandonar o Euro, e se repararmos bem, na Grécia o percurso foi mais ou menos o mesmo.

quinta-feira, setembro 13, 2012

Gente Sinistra e Perigosa (2)


FALHOU a troika, o Governo reincide, vai mais longe que a troika e falha também, porém, o tratamento escolhido continua a ser uma desalmada fuga em frente, feita de receitas extraordinárias (as privatizações) e outras permanentes (as reduções salariais), até ao descalabro total. Nessa altura já estaremos todos (menos os do costume) vestidos de andrajos e calçados de alparcatas, a dormirmos debaixo da ponte e a irmos buscar o saquinho de géneros à Caritas ou ao Banco Alimentar Contra a Fome. Por este andar teremos consultas nos hospitais só às segundas, quartas e sextas, e aulas do ensino público obrigatório só às terças, quintas e sábados. Às quartas-feiras, à noite - conhecida como noite do optimista - teremos que ouvir a homilia do Coelho, acolitado pelo Gaspar com o seu discurso "robótico", em que eles prometem uma terra de mel e fartura, à custa de novas medidas de austeridade, até que apareça a luz ao fundo túnel. Ao domingo vai-se à missa, para não cairmos em tentação, e agradecermos o pão que o diabo amassou por conta do Passos Coelho.

O problema é que os portugueses têm estado a avaliar incorrectamente este Governo PSD/CDS-PP, pensando que eles não passam de um grupelho de miúdos do jardim infantil, que decidiram brincar aos governos, fazendo do país um laboratório, e da vida das pessoas uma bancada exprimental das suas teorias económicas. Nada mais errado! Não são amadores, nem trambolhos, nem incompetentes; esta gente sabe perfeitamente o que está a fazer e ao que vão. São fanáticos austeritários, insensíveis ao facto de estarem a vandalizar pessoas. Na verdade, estamos a ficar sequestrados por malfeitores de grosso calibre, muito mais que candidatos a delinquentes, que sabem perfeitamente o que querem, o que estão a fazer, e para benefício de quem. Isto é o que dá quando começa a tardar dar-lhes a resposta adequada, remetendo-os para o sítio de onde vieram.

terça-feira, setembro 11, 2012

Uma História para a História


EM 20 de Julho de 2012 e com o título "Vulnerabilidades" teci algumas considerações sobre o historiador Rui Ramos, enquanto autor de comentários na imprensa, e que por arrastamento me levaram à História de Portugal, de que ele foi coordenador e co-autor, que estava a ser oferecida pelo semanário EXPRESSO, e cuja leitura só naquela altura eu estava a iniciar. Estava longe de imaginar que se iria instalar, tanto na imprensa como na blogosfera, uma acesa polémica sobre a tal História de Portugal, a propósito das críticas que o historiador Manuel Loff fez da obra. Algumas semanas decorridas, o artigo que o professor Fernando Rosas dedicou à polémica, parece-se que a encerra, pouco mais havendo a dizer, mas mesmo mau foi quando no seu início, uma polémica que se adivinhava boa, se tentou matá-la com acusações de calúnia pessoal, ou ainda quando Maria Filomena Mónica sugeriu que Manuel Loff fosse ostracizado e os seus escritos censurados. Para tirar dúvidas, no CARTÓRIO DO ESCREVINHADOR estão coligidos alguns dos escritos que alimentaram a controvérsia.

Quanto à obra (a tal História de Portugal) propriamente dita, cuja leitura só agora estou a terminar, sobretudo nos capítulos pós-implantação da República, e no que respeita ao período da ditadura do Estado Novo, não gostei do que li, pois Rui Ramos ao enveredar pelo artifício da sistemática comparação do modelo português, com outros regimes seus contemporâneos, socorrendo-se da citação de muitos autores que encaravam a ditadura salazarista, com alguma benevolência, e não querendo expor-se demasiado, eu diria, quase desresponsabilizando-se, deixando a pairar no ar um "estão a ver, não fui eu que disse!", acaba por fazer uma História asséptica, branqueada, amena, descaracterizada, desbastada, desvinculada de ideias, que nada tem a ver com uma visão desapaixonada e questionadora da verdade histórica. Não é propriamente uma falsificação da História, mas sim uma criativa e aligeirada interpretação da História, além de que os factos históricos baseados em opiniões e testemunhos, viciados ou contaminados por preconceitos, tal como as pequenas e grandes omissões, não são propriamente falsificações, mas podem levar a que sejam manipulados resultados e conclusões. A minuciosa escolha das fontes e das citações, pelo facto de terem sido pronunciadas por outros, não liberta o historiador de responsabilidades. O historiador é mais médico legista que cirurgião estético ou anestesista. Tal como não basta dizer meias verdades; uma coisa é dizer apenas que um automóvel anda porque tem rodas, outra coisa é dizer que um automóvel anda porque tem rodas, um motor que as faz faz rodar e alguém que o conduz. Bem, e quanto ao período posterior à revolução do 25 de Abril de 1974, esta História deixa um bocado a desejar, e o facto de ser uma síntese não é desculpa. É mais panfleto que História propriamente dita, pois o senhor historiador Rui Ramos não esteve com meias medidas, e decidiu mesmo acertar contas com os ventos da História e com as pessoas de quem não gosta. Em resumo: nove fascículos depois, prevalece a minha opinião inicial. Gosto menos de Rui Ramos como comentador do que como historiador, muito embora como historiador também não o considere grande espingarda.

E já que falamos de História e de historiadores, e da tentação que é fazer cirurgia estética sobre os períodos históricos mais negros e controversos, queria terminar com dois apontamentos.

O primeiro tem a ver com uma notícia que chegou até nós,  em Janeiro de 2012, e que dava conta que o Presidente do Chile, Sebastian Piñera, fez aprovar pelo Conselho Nacional de Educação, uma disposição destinada a permitir a alteração da palavra “ditadura” nos manuais escolares, substituindo-a por "regime militar", sempre que era referido o período em que o general Augusto Pinochet governou o país entre 1973 e 1990, depois de ter deposto com um golpe militar o legítimo governo de Salvador Allende, deixando atrás de si mais de 3.000 mortos e desaparecidos, a par de uma repressão feroz, com perseguições e graves violações dos direitos humanos. De uma assentada, uma simples mudança de expressão, pretende varrer para debaixo do tapete todas as ignomínias praticadas durante aquele período negro. O objectivo é provocar a banalização e diluição, junto das camadas jovens, daquele período da História Chilena. E já agora, não me venham contrapor, como desculpa, os crimes e os "apagões" levados a cabo sobre a história soviética, durante o período estalinista, pois isso é matéria que já foi devidamente posta no seu lugar, e não serve para equilibrar os pratos da balança, antes pelo contrário.

O segundo apontamento, é mais um convite. Que leiam o excelente texto que o escritor Mário de Carvalho publicou no Facebook, e que tomei a liberdade de transcrever no CARTÓRIO DO ESCREVINHADOR. Intencional ou não, como forma de remate da polémica Manuel Loff vs Rui Ramos, deixo que cada um faça o seu julgamento, e que no fim prevaleça, indiferente a ventos e marés, a sempre omnipresente verdade, pois a História dita "normalizada", maquilhada, adoçada ou sujeita a reconstruções plásticas, é coisa que não se deve tolerar.

Ilustração: “História” do pintor grego Nikolaos Gysis (1892)

domingo, setembro 09, 2012

Gente Sinistra e Perigosa


AS NOVAS medidas de austeridade são clarividentes e quase não precisam de ser descodificadas. Ao passarem a ter a Taxa Social Única agravada em 7%, são os trabalhadores que passam a financiar  com um mês de ordenado os desv(ar)ios orçamentais, ao passo que os patrões são contemplados com uma redução de 5,75% dessa mesma Taxa Social Única. Quanto aos rendimentos da riqueza, lucros das grandes empresas e do sacrossanto capital, mantêm-se intocáveis, e os bancos que deveriam aprestar-se a financiar a economia, continuam a passar incólumes e fazerem ouvidos de mercador às necessidades daquela. Cortes nas Fundações e renegociação das rendas das Parcerias Público-Privadas, é coisa para se ver mais tarde, com calma, depois de amigavelmente sopesada. Diz Pedro Passos Coelho, o sinistro primeiro-ministro deste flibusteiro governo PSD/CDS-PP, que o agravamento para os trabalhadores se destina a promover a equidade dos sacrifícios (equidade é a tua tia, pá!) e a compensar o chumbo que afectou os anteriores cortes de subsídios, decretado pelo Tribunal Constitucional, ao passo que o desconto para as empresas se destina a reduzir os custos do trabalho, fomentando o emprego e estancando o desemprego. Depois do anúncio destas medidas, o atrevido Coelho ainda teve o descaramento de ir para o Facebook fazer mais uma promessa: "Amigos, os sacrifícios ainda não terminaram...". Amigo era a tua tia, pá!

Entretanto, configura-se no horizonte mais um assalto ao bolso dos contribuintes, com a prometida redução do número de escalões do IRS, medida que foi "vendida" como sendo destinada a simplificar o sistema fiscal e a promover a sempre omnipresente competitividade (não se sabe bem de quê), mas que na realidade se vai traduzir num agravamento generalizado daquele imposto, como consequência do alargamento dos parâmetros de incidência dos escalões.

A fazerem política de corso, esta gente é sinistra, e Pedro Passos Coelho passa de político potencialmente perigoso, a perigoso de facto.

sexta-feira, setembro 07, 2012

Só Me Apetece Dizer Coisas Desagradáveis


Alberto da Ponte, ex-administrador da Sociedade Central de Cervejas, numa manobra táctica de incomensurável alcance, foi nomeado pelo imprevisível ministro Relvas, administrador da RTP. Olhos nos olhos, e para quem o quis ouvir, o senhor da Ponte sentenciou que Pedro Passos Coelho é o melhor primeiro-ministro que Portugal teve, depois de Francisco Sá Carneiro. Cá para mim, que ninguém nos ouve, acho que a prolongada exposição ao malte e a inalação dos vapores do lúpulo e da cerveja, provoca perturbações do raciocínio.

quarta-feira, setembro 05, 2012

A Anedota Continua Dentro de Momentos

PORQUE lhe foi solicitado, o Ministério Público (MP), na pessoa da directora do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP), Cândida Almeida (a mesma que garante que em Portugal não há corrupção nem políticos corruptos), assegurou ao líder do CDS-PP e também ministro dos Negócios Estrangeiros Paulo Portas, que não foram recolhidos, afectando a sua pessoa,  indícios da prática de ilícito de natureza criminal no processo dos submarinos. Esta é a terceira vez, nos últimos sete anos, que o líder do CDS-PP formula o mesmo pedido ao MP, e é a terceira vez que a resposta é sempre a mesma, fazendo lembrar as actas adicionais de um seguro de vida que é peródicamente renovado.

Se eu ou o meu vizinho do lado, pedíssemos amanhã ao mesmo Ministério Público, em nosso nome, uma declaração igual, a resposta seria provávelmente a mesma, isto caso o MP se dignasse responder. Ora o que eu e o meu vizinho do lado gostávamos de saber primeiro, é se houve comissões, luvas, corrupção, isto é, se houve dolo, se o MP continua a investigar e se a investigação faz progressos, e não se recaem suspeitas sobre o senhor A ou o senhor B.

Entretanto, se confrontado com outras perguntas incómodas, este mesmo MP não terá problemas em dizer que o processo e as investigações estão sob a alçada do segredo de justiça... isto enquanto não sobrevier algum  arquivamento, seja pelo motivo X ou a razão Y...
A anedota continua dentro de momentos; só vamos ter que esperar.

terça-feira, setembro 04, 2012

Mais Ortografices


É RARO o dia em que não tropeço em mais uma aberração, fruto das simplificadoras emanações ortográficas dos nossos preclaros linguistas, inspirados inventores de uma maquineta que produz frases com duplo sentido, ou de sentido duvidoso. Atente-se no seguinte exemplo:

Apesar de limpos e asseados, de fato não se pode entrar,

que tanto pode significar que apesar de limpos e asseados, a verdade é que não se pode entrar,

como também pode significar que apesar de limpos e asseados, com este tipo de vestuário não se pode entrar.

É por estas e outras que cada vez se torna mais urgente a revogação deste Acordo Ortográfico 90, ou pelo menos, a sua revisão nos aspectos mais conflituosos, levada a cabo por técnicos habilitados e competentes, para que não se transforme em mais um instrumento de desentendimento entre os portugueses.

NOTA - Felizmente que é a língua inglesa que é usada nas reuniões conjuntas que ocorrem entre os técnicos portugueses do Ministério das Finanças, e os que acompanham a troika, nas suas deslocações trimestrais, para avaliação do estado de cumprimento do memorando de resgate, porque então não sei o que seria, com os técnicos portugueses a dizerem "alhos" e os membros da troika a perceberem "bugalhos", ou outra coisa ainda pior.

domingo, setembro 02, 2012

Registo para Memória Futura (72)


«(...) Em algumas instituições da nossa vida pública e privada, vai sendo muito penalizador dizer-se o que se pensa, mesmo em instituições em que a verdade e a liberdade deviam estar antes de tudo, como é o caso das Universidades.»

Parágrafo final da missiva do professor António Manuel Hespanha dirigida aos seus alunos, após ter sido dispensado (saneado) de dar aulas na Universidade Autónoma de Lisboa, na sequência de críticas que terá formulado no programa "Prós e Contras" da RTP1, sobre a falta de investimento no ensino superior privado, e de lá ter dito o que passo a citar:

«Portugal é dominado por cerca de 1.500 a 2.000 pessoas que funcionam em circuito fechado - passam da oposição para a situação, depois para o Governo de onde saltam para empresas públicas, para bancos, para empresas privadas ligadas ao Estado, para conselhos de administração de televisões e empresas de média, para a direcção de jornais, voltam de novo ao Governo, etc. - sempre as mesmas pessoas em animado carrossel, que falam entre si e para si, e tratam fundamentalmente dos seus interesses, enquanto o resto dos habitantes de Portugal são a Gleba a quem tudo é retirado e nada tem.»

Não comento. Mais palavras são desnecessárias.

sexta-feira, agosto 31, 2012

Expliquem-me, Como Se Eu Fosse Muito Burro!


NUMA ALTURA em que ainda nada está decidido (isto a fazer fé nas afirmações do primeiro-ministro Coelho) sobre o modelo de alienação da RTP, e sendo a actual administração daquela entidade, uma mera gestora do actual modelo, logo não lhe cabendo posicionar-se, institucionalmente, em relação às eventuais soluções que aí vierem, custa-me a perceber o seu público repúdio de uma hipotética concessão ou privatização do serviço, demitindo-se em bloco, o que para além de parecer uma curiosa forma de pressão do gerente sobre o patrão, também dá a ideia de estar a exorbitar nas suas funções. Ou então - e aí já começo a perceber mais qualquer coisa - com a sua demissão, e ao assumir-se como virgem ofendida, está a disfarçar um frete ao Governo, abrindo-lhe o caminho e facilitando-lhe as manobras futuras.

Independentemente de eu considerar que se está na presença de mais um escandaloso ataque aos direitos constitucionalmente consagrados, desmembrando sem cerimónia um serviço público de televisão, que o país paga e reclama, fico à espera do comunicado daquela pitoresca administração, divulgando os prosaicos fundamentos da sua decisão, e estou curioso quanto ao desenvolvimento dos futuros episódios desta telenovela.

quarta-feira, agosto 29, 2012

Terão Ficado Esquecidos no Parque Infantil?


«A exigência de identificação fiscal dos dependentes nas declarações de IRS entregues a partir de 2010 motivou uma forte descida do número de pessoas alegadamente a cargo dos contribuintes. A redução foi tão acentuada que o Fisco admite que milhares de filhos declarados, até 2009, eram ‘fictícios’, tendo sido portanto atribuídos benefícios indevidos.

Em 2009, as famílias declararam ter 2.173.270 filhos menores de 25 anos a cargo. Volvidos dois anos - e já com a obrigação de colocar o número de identificação fiscal na declaração de IRS -,este número baixou para 2.038.796. São menos 134,474 dependentes de 2009 para 2011, de acordo com os dados obtidos pelo Económico junto do Ministério das Finanças. (...)»

Excerto da notícia do DIÁRIO ECONÓMICO on-line de 28 Agosto de 2012

Meu comentário: Assim sendo, e com os meios informáticos que tem à sua disposição, a Direcção Geral de Contribuições e Impostos não podia tirar isso a limpo, não vão os petizes terem-se perdido numa ida às compras, ou terem ficado esquecidos no parque infantil?

segunda-feira, agosto 27, 2012

Os Grandes Negócios da Austeridade

A PAR do buraco do ozono, do aquecimento global e do derretimento das calotas polares, começam a aparecer as más notícias, as primeiras anunciadas pela eminência parda das privatizações (António Borges), e as segundas, ditas pausadamente pela eminência parda das finanças (Victor Gaspar).

Nas primeiras incluem-se a perspectiva da privatização dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, o encerramento do canal RTP2 e a privatização ou concessão a privados do canal RTP1, que os cidadãos irão continuar a financiar com o dinheiro da taxa de audiovisual cobrada nas suas facturas da energia, engordando as pobres, sacrificadas e coitadinhas das entidades privadas que vierem a ser contempladas. Neste suspeito negócio o governo garante um lucro de 20 milhões de euros a quem ficar com a RTP, o que significa que o governo garante aos outros aquilo que não consegue assegurar enquanto gestor de um serviço público, constitucionalmente consagrado. Está prometido que quando o delfim Miguel Relvas voltar a pisar triunfalmente os relvados, será ele (quem afinal tutela a comunicação social), que irá anunciar ao povo qual é o modelo adoptado para mais esta expropriação.

As segundas más notícias vieram embrulhadas no anúncio de que a execução orçamental entrou numa derrapagem de 3,9 mil milhões de euros, e que para tapar o buraco irão ser descarregadas mais medidas de austeridade sobre os trabalhadores e cidadãos contribuintes. Conforme prometido na festarola do PSD do Pontal, será o eminente e condoído primeiro-ministro que dirá ao povo, com a mão no peito e a voz embargada, como será concretizado mais este confisco. Os tratantes deste governo continuam a tentar iludirmos com as causas da crise, escondendo que tudo tem que ver com os convivas escolhidos, com os vinhos, iguarias e acepipes servidos à mesa do banquete do orçamento, mais a incompetência dos chefes de mesa, bem como o dissimulado propósito de aproveitar a maré para liquidar tudo o que tenha a ver com o estado social. Depois, fingem não perceber que é a própria imposição da austeridade que é a causa do colapso das receitas fiscais, logo geradora da impossibilidade de cumprimento da tal mirífica promessa de um défice orçamental de 4,5%. Qualquer merceeiro semi-analfabeto sabe que com empresas a fecharem as portas, estas a deixarem de ser colectadas em impostos, colocando os seus trabalhadores no desemprego, e estes por sua vez, sem rendimentos de trabalho, não podendo pagar impostos, estão reunidas as condições, não para a prometida e apressada recuperação económica já em 2013, mas sim para que a crise continue a engrossar imparável, até um ponto irreversível.

Na verdade, tudo o que este bando de gente desavergonhada vai dizendo e fazendo, fingindo que o seu propósito é a domesticação do défice orçamental e o regresso aos mercados, mais não são do que pretextos para levarem a cabo o mais desbragado empobrecimento do país e dos portugueses, a liquidação do estado social, a par do sistemático desmantelamento do tecido económico e do sector empresarial do Estado, a favor dos abutres que pairam à espreita do convite para o festim das privatizações, com os seus saldos e pechinchas. Podemos não acreditar, mas as crises e a austeridade que habitualmente lhes anda associada, sempre foram potenciadoras de óptimas oportunidades de negócio, tanto para as elites do costume, como para os outros que também querem engordar e progredir na vida, mesmo que à custa da miséria alheia.

domingo, agosto 26, 2012

Nunca Nenhum Homem Tinha Chegado Tão Longe

 
NEIL Armstrong, nascido a 5 de Agosto de 1930 em Wapakoneta, Ohio, E.U.A., falecido em Columbus em 25 de Agosto de 2012, foi o primeiro homem a pisar a superfície lunar em 20 de Julho de 1969. Foi um privilegiado; depois disso, todas as noites, com os pés assentes na Terra e olhando o céu, podia contemplar o local onde era quase certo nunca mais voltaria.

sábado, agosto 25, 2012

Se Estou Errado, Emendem-me!


NÃO SÃO amigáveis nem recomendáveis, sejam eles quais forem, os governos e regimes intolerantes que perseguem, seja de que forma for, os seus incómodos poetas e cantores de intervenção, sejam eles Zecas, Reginas, Alegres, Buarques ou Pussys Riots.

quinta-feira, agosto 23, 2012

Registo para Memória Futura (71)

A PROPÓSITO de Julian Assange se ter refugiado na embaixada do Equador em Londres, e ter formulado um pedido asilo político àquele país, o semanário EXPRESSO publicou um destaque numa passada edição, onde referia os casos de alguns portugueses que recorreram ao mesmo tipo de solução, como forma de escaparem às pereseguições da polícia política da ditadura de Salazar. Lamentávelmente, entre vários nomes, esqueceram-se de referir a atribulada fuga do comandante Henrique Carlos da Mata Galvão (1895-1970) que em 1959, já então detido pela P.I.D.E., e aproveitando uma ida ao Hospital de Santa Maria, fugiu das instalações hospitares disfarçado de médico, tendo-se refugiado na embaixada da Argentina, e depois conseguido o estatuto de exiliado político na Venezuela.
 
Posteriormente, em 22 de Janeiro de 1961, ainda no exílio e em conjunto com Humberto Delgado, foi o organizador e comandante do espectacular assalto e sequestro do paquete Santa Maria, que andava em cruzeiro pelas Antilhas Holandesas, levado a cabo por uma luso-espanhola Direcção Revolucionária Ibérica de Libertação, e que tinha por finalidade o derrube das ditaduras de Lisboa e Madrid. Baptizada de "Operação Dulcineia", a operação, embora tivesse falhado os seus objectivos, ganhou grande repercussão internacional, colocando a ditadura salazarista nas primeiras páginas da imprensa estrangeira.
 
A 7 de Novembro de 1991 Henrique Galvão foi agraciado postumamente com a Grã-Cruz da Ordem da Liberdade.

quarta-feira, agosto 22, 2012

Descubra as Diferenças


Imagem do blog CONVERSA AVINAGRADA de Rogério Pereira. O título deste post é de minha autoria. Clique para aumentar.

terça-feira, agosto 21, 2012

Massacre dos Mineiros de Marikana


SOBRE as razões e motivações do massacre dos mineiros de Marikana, melhor dizendo, sobre as razões e motivações de todos os massacres que pululam por esse mundo fora, venham os entendidos de onde vierem, digam o que disserem, façam o que fizerem, a verdade é que o que se passou é insuportável e imperdoável.

segunda-feira, agosto 20, 2012

Reler Sophia - Painéis do Infante


Píncipes do silêncio ó taciturnos
Por quem chamava nos longínquos céus nocturnos
A verdade das estrelas nunca vista.

A vossa face é a face dos elementos,
Solitária como o mar e como os montes
Vinda do fundo de tudo como as fontes
Dura e pura como os ventos.

Poema de Sophia de Mello Breyner Andresen in Dia do Mar, 1947
Ilustração: detalhe dos painéis de Nuno Gonçaves

sábado, agosto 18, 2012

Assim é Que Elas Começam!

CHEGOU ao domínio público a informação de que o Conselho de Ministros de 18 de Julho, aprovou um Decreto-Lei que transfere os palácios de Sintra e de Queluz, bem como a sua gestão, da Direcção-Geral do Património Cultural para a Parques de Sintra-Monte da Lua, S.A. (empresa de capitais públicos), colocando os seus trabalhadores a laborar em regime de cedência de interesse público, a frio e sem consulta prévia. Estando esta transferência prevista para o dia 1 de Setembro de 2012, da tal Direcção-Geral do Património Cultural ninguém dá pormenores nem explicações da operação, seja aos sindicatos, seja à comunicação social.

Não me admirava que esta manobra fosse uma espécie de ensaio para o Governo começar a privatizar os monumentos nacionais...

sexta-feira, agosto 17, 2012

Austeridade Ortográfica

Pelas regras do antigo acordo ortográfico, havia duas expressões distintas:

"pelo sim, pelo não" significava "por causa das dúvidas", e "pelo" era o resultado da contração da preposição por com o artigo definido o;

"pêlo sim, pêlo não" exprimia alternância relativamente ao órgão filiforme, de origem epidérmica, que reveste a superfície do corpo dos mamíferos.

Pelas regras do novo acordo ortográfico, a expressão "pelo sim, pelo não" é uma só. Que significado terá?

Felizmente que "bardamerda" não sofreu alteração!

terça-feira, agosto 14, 2012

Registo para Memória Futura (70)

Pedro Passos Coelho afirmou nesta terça-feira à noite (14 de Agosto de 2012), durante a tradicional festa do PSD, realizada no Pontal, que 2013 será o ano da recuperação económica e do fim da recessão.

Entretanto, neste mesmo dia, o Instituto Nacional de Estatística (INE) revelou que a taxa de desemprego portuguesa atingiu os 15 por cento da população activa no segundo trimestre de 2012, o nível mais alto de sempre. Contando com os que já não recebem subsídio, o número total de trabalhadores portugueses desempregados rondará um milhão e trezentos mil.

Sabendo-se que o definhamento económico, recessão e desemprego andam sempre de braço dado, não se percebe como irá o Governo conciliar aquela perspectiva optimista de Passos Coelho, com a sua previsão de que a taxa de desemprego atinjirá uma média de 15,5 por cento, para o total de 2012, subindo para 16 por cento em 2013.

domingo, agosto 12, 2012

Submarinando


«Grande parte da documentação dos submarinos desapareceu do Ministério da Defesa. Sumiram, em particular, os registos das posições que a antiga equipa ministerial de Paulo Portas assumiu na negociação.

"Apesar de todos os esforços e diligências levadas a cabo pela equipa de investigação, o certo é que grande parte dos elementos referentes ao concurso público de aquisição dos submarinos não se encontra arquivada nos respetivos serviços [da Defesa], desconhecendo-se qual o destino dado à maioria da documentação", escreveu o procurador João Ramos, do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), em despacho de 4 de junho que arquivou o inquérito em que era visado apenas o arguido e advogado Bernardo Ayala (o processo principal continua em investigação).

Nos últimos anos, já tinha sido noticiado o desaparecimento de vários documentos do negócio concretizado, em 2004, quando Durão Barroso era primeiro-ministro e Paulo Portas ministro de Estado e da Defesa Nacional. Mas, agora, é o próprio Ministério Público não só a reconhecer o problema como a atribuir-lhe uma dimensão que vai para além dos casos pontuais já noticiados.»

Notícia do JORNAL DE NOTÍCIAS on-line de 11 de Agosto de 2012

Meu comentário: Os novos submarinos que equipam a Marinha Portuguesa, por terem a capacidade de operarem submersos, tornando-se indectáveis, são uma arma de ataque de inestimável valor. Quanto aos documentos que serviram de suporte ao nebuloso negócio da sua aquisição, e que são necessários à investigação que continua em curso, primam por ter a mesma característica, isto é, submergiram, andam a submarinar, tornaram-se indetectáveis, e vai ser difícil que voltem à superfície, tanto para respirar como para responder a perguntas.

De qualquer modo, e como isto anda tudo ligado, sempre podemos perguntar ao Paulo Portas pelo seu paradeiro, pois foi ele quem andou por lá a gerir a negociata, como ministro de Estado e da Defesa, e que ao sair, levou para casa (presume-se) à volta de 60.000 cópias de documentos oficiais, e se calhar, lá no meio (por engano, ou por lapso, como agora se diz), talvez alguns originais.

Com um Ministério da Defesa tão permeável e frouxo em termos de segurança, de onde até desaparecem documentos importantes (senão mesmo classificados), começo a não me sentir seguro nem a dormir descansado. Fica uma pergunta no ar: o que será assim tão problemático de ultrapassar, e o que será preciso fazer para chamar à responsabilidade quem tem que ser chamado (a alguém caberia a responsabilidade da guarda de tais documentos), fazer as respectivas diligências e apurar o que tem que ser apurado, para que tudo seja posto em pratos limpos?

sábado, agosto 11, 2012

Acabem Com Ele, Já!


O Tribunal de Contas detectou um milhão e 132 mil euros de facturação duplicada, bem como 883 mil euros de facturas que não constam nas listas de suporte da contabilidade do Ministério de Defesa, relativas à manutenção dos novos helicópteros EH 101 da Força Aérea, adquiridos em 2001, e destinados a substituirem os Puma em fim de vida. O Tribunal de Contas alargou os seus reparos ao modo como foram efectuadas as compras daqueles dez helicópteros, afirmando que o Estado, não acautelou os seus interesses, devido ao facto de ter optado por um tipo de contrato pouco adequado, acabando prejudicado em 120 milhões de euros.

No imediato, o Governo diz que vai investigar como surgiu a tal duplicação e omissão de facturas, porém, não abrirá qualquer inquérito à compra das aeronaves, pois isso foi obra de anteriores governos. A coisa dita assim, até parece que já decorreu uma eternidade, no entanto, não nos devemos esqueçer que quem deve estar bem ao corrente e bem documentado sobre tudo isto, é o actual ministro Paulo Portas, pois quando ele deixou o ministério da Defesa, em 2005, diz-se que trouxe consigo algumas dezenas de milhares de cópias de documentos oficiais, e não consta que fossem trabalhos de casa ou despachos de última hora...

A verdade é que as compras de material para as forças armadas tem sido uma escandaleira quase permanente, envolvendo fardamentos, substituição das G3, aquisição de submarinos, helicópteros, aviões para transporte e vigilância marítima, blindados "pandur", todos eles objecto de pantagruélicas negociatas, destinadas a manter bem alimentada a tropa fandanga que continua a orbitar e a engordar à custa do aparelho de Estado, aparelho esse que tem por hábito cortar nas gorduras em que não devia cortar. Apuradas as manigâncias, há já umas vózinhas mais radicais, que vão arengando contra o incómodo e metediço Tribunal de Contas, sugerindo mesmo que se acabe com ele, e já.

sexta-feira, agosto 10, 2012

Aeroporto de Beja

O AEROPORTO de Beja fez em Abril de 2012 um ano que foi inaugurado, custou 33 milhões de euros e só recebe um avião por mês, tendo até aquela data passado por ele pouco mais de 2.500 passageiros.

Embora tenha resultado do aproveitamento de uma base aérea desactivada, supunha eu que quando se avança para uma obra daquela envergadura (e não é precisa muita perspicácia), já existiam objectivos e acordos pré-estabelecidos, precisos e concretos, e não apenas as habituais apostas vazias, promessas e vagas intenções.

Um Grupo de Trabalho para o Aeroporto de Beja, criado a 5 de Junho, está em vias de concluir o seu relatório que será entregue à tutela, sabendo-se apenas que já existe uma linha condutora muito sólida sobre aquilo que deve ser o aeroporto de Beja. Eu cá por mim, acho que deve continuar a ser aeroporto, embora com tráfego, já que a sua reconversão noutro tipo de equipamento é coisa assaz complicada.

Entretanto, quando não está às moscas, não deve estar muito longe disto…

quarta-feira, agosto 08, 2012

Estória Breve: Aurice Que Lavas no Rio


ERA o ano de 1543, um ano aziago, com o povo a voltar a ser maltratado pela peste, e com os campos definhados pela moléstia a prometerem mais um Inverno de fome, naquela região inóspita, senhorio do conde do Couto Calvo, que pouca semente lançava à terra, mas que compensava com as abundantes sementes que espargia pelas alcovas alheias, gerando um exército de bastardos. Eram tempos adversos, até mesmo para o mosteiro de Romalde, que pela sua traça mais parecia uma fortaleza que casa de retiro e oração, cuja fundação remontava aos recuados tempos da monarquia visigótica. Implantado no alto da colina, era amparado pelo pequeno burgo que crescera aconchegado à sua volta, sendo ponto de passagem de um dos caminhos de Santiago.

Estivera quase em ruínas, mas, dois séculos atrás fora reconstruído para albergar os freires da Ordem da Adoração, gente que ingressava na vida religiosa, como forma de se furtar ao cortejo de fome e miséria que os esperava no mundo dos outros mortais. Por isso e outras razões, era uma época em que a santidade andava pelas ruas da amargura. As exigências das regras conventuais eram bem mais brandas do que a dureza e precariedade do mundo exterior, razão porque pobres e bastardos, senão mesmo foragidos, era vê-los a fazerem fila para envergarem o hábito, tivessem ou não vocação para abraçarem a vida monástica e espalharem a mensagem divina, à mistura com o terror dos suplícios e fogos eternos. Entre uma vida dedicada à santidade, preferiam a santa vida que a fingida devoção proporcionava. Era o próprio papado que dava maus exemplos, que vivia amancebado e fazia vista grossa à vida dissoluta da classe sacerdotal, a qual, quantas vezes de barriga cheia e testículos vazios, tinha o costume de passar umas temporadas no recato dos mosteiros, entre jejuns e orações, a desintoxicarem-se de banquetes e orgias de sacristia.

Aurice Mendes, filha de Paio e Joana Mendes, tratava dos porcos, abichando algumas poucas moedas como lavadeira dos paramentos e toalhas de altar do mosteiro, tarefa que cumpria na ribeira de Sule, pois a cisterna conventual há muito que estava à míngua de água. Era neta de judeus que tinham sido enxotados de Castela em 1492, refugiando-se em Portugal, sendo forçados a receber o baptismo, e por cá foram ficando, cuidando de passarem despercebidos, furtando-se assim às perseguições e "limpezas de sangue" que periódicamente recaíam sobre os “cristãos-novos”. Uma vez por mês, Aurice voltava afogueada ao convento para entregar os panos lavados, recebia de volta as prometidas moedas, mas depois, esgueirando-se, espraiava-se pelo claustro e pela celas dos freires, a ouvir histórias, a ser seduzida com sermões e palmadinhas, e outras coisas mais. Até um dia! Atacada de vómitos e com a barriga a crescer cada dia que passava, ameaçada pelos pais de que a punham a comer e a dormir com os porcos, contou que aquele estado só podia ter acontecido no mosteiro, na brincadeira com os frades. Qual deles? Perguntaram os Mendes. Não sei! Respondeu ela.

Paio Mendes não perdeu tempo. Deu uma tareia na filha e logo a seguir subiu até ao mosteiro para falar com o Superior. Esqueceu-se de dizer à mulher, Joana Mendes, para se manter calada, e por isso, não era corrido meio-dia e já todo o povoado sabia da encomenda. O povo, não fez nada por menos, e à falta de haver quem mais frágil houvesse, onde descarregar as desgraças e misérias que se vinham acumulando, passou a palavra e ejaculou a acusação fatal. A porca da judia acamou-se com a fradalhada, e lá vem a caminho mais um filho do Demo!

Da conversa travada entre Paio Mendes e Monsenhor Damião, pouco ou nada se sabe, excepto que Aurice ia levar mais umas chibatadas e os frades iam ser interrogados por Monsenhor. Mas uma coisa era certa: daquele episódio, nem a neta de judeus, nem os frades da Adoração, se iam safar da forma habitual. Se havia uma pecadora, era preciso encontrar um pecador, e pelas contas de Monsenhor Damião, havia um candidato que se acomodava à pretensão: frei Bernardo, um sonso e solitário de modos doces, que não falhava uma novena, que não partia um prato, mas que ficava congestionado de luxúria quando se cruzava com a Aurice, e isso não passava despercebido a ninguém. Monsenhor iria fazer o que era preciso, isto é, interrogar todos, e sobretudo o depravado.


- Monsenhor, estive com essa rapariga na minha cela, recitei-lhe uns salmos mas não pecámos! E Bernardo jurou ser verdade o que dizia, apertando contra o peito as sagradas escrituras.

- Frei Bernardo, vós dizeis que não pecaste, mas frei Antão, frei Tadeu, frei Jorge e os outros irmãos desta ala do mosteiro garantem que ouviram, mesmo abafados pelas grossas paredes das celas, fortes risadas e repetidos gemidos de prazer.

- Mas monsenhor, se ela própria diz que era visita de todas as celas…

- Mas meu filho, é a tua palavra contra a palavra de muitos. Se o caso não tivesse escapado ao recato desta casa de Deus, indo cair no meio do povoado, sempre se podia compor, mas sendo assim, mandam as regras que se chame o Santo Ofício, com os seus interrogatórios e tormentos, para apurar a verdade…

- Monsenhor, a ser assim, é meu desejo que me escutais em confissão.

- Se é isso que desejais, espero por vós na capela, depois das orações, pela hora nona…


Naquele tempo, uma ameaça com a intervenção do Santo Ofício era o diabo. Casos de heresias, práticas judaizantes, bruxarias e feitiçarias, a envolverem paramentos e toalhas de altar, à mistura com fornicação entre judeus e cristãos, implicavam, habitualmente, a vinda do Santo Ofício, com os seus torniquetes e inquirições, para apreciar e julgar o desvio, e se necessário proceder à respectiva purificação, que podia acabar na fogueira. Ora, se a tolerância recorresse a outros meios mais consensuais - mais tarde conhecidos por acordos de cavalheiros - onde nenhuma honra ficasse ferida e a vida continuasse em suposta normalidade, tudo isso eram soluções que até a Deus agradavam, pois farto estava ele de julgar e castigar, tanta era a maldade à solta, e tantos os dissabores que a Humanidade lhe provocava.

Assim, embora fosse pouco habitual um freire abandonar a vida monástica, foi o que aconteceu com frei Bernardo, depois daquela prolongada confissão ao superior da Ordem. O que confessou, no segredo da confissão ficou. Dois dias depois, ao entardecer, abriram-se as portas do mosteiro de Romalde para ver partir Bernardo, já sem o hábito nem as sandálias da Ordem. Voltava para enfrentar o mundo de onde viera, como se fosse um penitente, abraçado a um saco com nacos de broa, descalço e com uns andrajos, recuperados do bafiento depósito do mosteiro, em jeito de misericórdia.

Muitos meses depois, o povo começou a sussurrar, e o que se ouvia, vindo de terras mais ao sul, era uma história inacreditável, pois tortuosos são os caminhos, que a mão da providência escolhe para exibir a verdade. Contava-se que o réprobo frei Bernardo teria sido emboscado por salteadores, e que à falta de valores, não tiveram contemplações, despojando-o dos míseros andrajos que trazia vestidos e deixando-o desnudo como viera ao mundo. E o que viram – surpresa das surpresas – deixou os malandrins boquiabertos: pela frente tinham não um Bernardo, mas sim uma Bernarda, havendo quem se lembrasse de associar o facto com a tão mal explicada, quanto ocultada história da Papisa Joana, ocorrida por volta do ano 1099. Já naquela época difícil, as mulheres recorriam ao embuste, mudando de género, tal era a vontade de sobreviver e superar a sua condição.

Finalmente, lá por Romalde, também a criança de Aurice acabou por nascer, um varão, porém, de pai incógnito não ficou. Mais do que desconfiança, logo se instalou no burgo a certeza de que o pai do petiz era o próprio superior da Ordem, Monsenhor Damião, tal era a semelhança entre ambos, que ia da expressão e contornos faciais, até àquele sinal, do tamanho de uma moeda, que ambos ostentavam na maçã direita do rosto. A confirmar isso, ficara garantido, por contrato firmado entre o avô Mendes e Monsenhor Damião, que ao atingir a maioridade, o pequeno Tiago Mendes, isento de exame vocacional, seria admitido e receberia o hábito de membro da Ordem da Adoração, e depois, seria o que Deus quisesse. Quanto a Monsenhor Damião, nunca mais pôs os pés fora do mosteiro, excepto quando foi a enterrar. Sobre Aurice, sabe-se que não voltou a lavar na ribeira de Sule, e quanto à suposta Bernarda não nos chegaram mais memórias, fossem elas escritas ou orais.

Texto de F.Torres. Agosto de 2012
Ilustração: Montagem fotográfica de F.Torres

domingo, agosto 05, 2012

Há 14 Anos Foi Pavilhão da Utopia


«O Pavilhão Atlântico foi vendido por 21,2 milhões de euros ao Consórcio Arena Atlântico, no qual se inclui Luís Montez, dono da Música no Coração e genro do Presidente da República. O equipamento custou ao Estado 50 milhões de euros e “era rentável”, tendo os seus lucros triplicados entre 2009 e 2010.
Assunção Cristas justificou esta venda argumentando que “o grupo Parque Expo tem uma dívida de 200 milhões de euros, daí a decisão de realizar ativos, vendendo um conjunto de património relevante sobre o qual o Estado não tem função pública crucial a prosseguir”»

Artigo do blog ESQUERDA.NET em 1-8-2012

«As coisas mais simples são muitas vezes incompreensíveis para as mentes mais sofisticadas. O Estado construiu o PA (Pavilhão Atlântico) por 50 milhões de euros. Fê-lo porque considerou que este equipamento era importante no plano de recuperação urbanística da zona oriental de Lisboa. Trata-se de um equipamento cuja utilização comprova a justeza da opção do Estado já que os objectivos que presidiram à sua construção têm sido alcançados. Em função desse sucesso as receitas que gera são superiores aos custos incluindo os custos financeiros a ele associados. Não entra aqui nestas contas o valor de uso embora seja esse valor que justifica a construção de qualquer equipamento desta natureza. Não interessa sequer discutir se para esta construção existiram ou não financiamentos comunitários a fundo perdido.
O que interessa é o facto de não existir nenhuma racionalidade económica em alienar um equipamento, ainda novo, por menos de metade do seu custo apenas e só porque, afinal, o Estado não se revê na função de gestor de equipamentos culturais. Não existe racionalidade mas também não existe surpresa já que esta tem sido a nossa triste história. Infelizmente alguns teimam em não perceber mesmo as coisas mais simples.»

Comentário de José Guinote, em 4-8-2012 sobre a privatização do Pavilhão Atlântico

«(...) A venda do Pavilhão Atlântico é pois apenas mais um episódio (evidentemente simbólico em termos financeiros comparativos), da longa história das privatizações em Portugal, que por sua vez se insere num processo mais vasto, o do empobrecimento deliberado do Estado. Uma história que tem vindo a ser escrita com as linhas da mais pura «irracionalidade económica» (para usar os termos do pensamento económico dominante), na óptica da defesa do interesse público e do dinheiro dos contribuintes.
Quando ouvirem falar do Estado gordo, que gasta mais do que tem, que é ineficiente e que não produz recursos suficientes para permitir a existência de políticas sociais decentes, lembrem-se do Pavilhão Atlântico. Quando vos disserem que não é possível manter um Serviço Nacional de Saúde universal e gratuito, ou um sistema público de educação com qualidade para todos, lembrem-se do Pavilhão Atlântico. Quando insistirem que não se podem assegurar os recursos mínimos de subsistência aos cidadãos mais carenciados, lembrem-se do que significa - simbolicamente - a privatização do Pavilhão Atlântico.»

Post de Nuno Serra em 31-7-2012 no blog LADRÕES DE BICICLETAS, com o título "Lembrem-se do Pavilhão Atlântico"

Meu comentário: Mais palavras para quê, se mantenho de pé a minha convicção de que tudo o que é privatizável, quando os ventos soprarem de feição, poderá voltar a ser nacionalizável?

sábado, agosto 04, 2012

Mais Imóvel e Isolado


DIZEM os jornais que a 15 de Agosto deste ano a Refer vai fechar mais 65 quilómetros de linhas, incluindo o ramal de Cácares, argumentando que não se justifica manter activos aqueles 65 quilómetros de linha unicamente para a passagem de dois comboios, tanto mais que existe a vontade da CP e da sua congénere Renfe de o fazer passar pela linha da Beira Alta, servindo assim cidades com mais mercado (sempre os mercados!) como Pombal, Coimbra, Nelas, Mangualde, Guarda e Salamanca.

Os sucateiros que compram por tuta e meia os carris inoperacionais, bem como os rapinantes que operam a coberto da noite, é que são os grandes beneficiários destas medidas, que tornam Portugal cada vez mais mais imóvel e isolado, cada vez mais região e menos país. Passo a passo, é garantido que voltaremos, não ao século XIX, onde até fomos pioneiros na implementação da cobertura ferroviária do país, mas bastante mais para trás.

quarta-feira, agosto 01, 2012

Detectada Mais Uma Causa do Desemprego

O DIÁRIO ECONÓMICO on-line de 1 de Agosto de 2012 noticia que a CMVM (Comissão do Mercado de Valores Mobiliários), no seu Relatório Anual do Governo das Sociedades cotadas, apurou que em 2010, 17 administradores acumulavam, cada um, lugares de gestão em 30 ou mais empresas, sendo que um deles tinha lugar na administração de 73.

Tomando como base esta informação da CMVM, e feitas as contas por alto, conclui-se que esses 17 cavalheiros monopolizaram (ou ainda monopolizam) a função de administradores, em perto de 700 empresas, com a simpática média de apenas 4 horas mensais de assistência a cada uma delas, factor que certamente acaba por se reflectir na rendibilidade e competitividade das mesmas. Por outro lado (e esse é o aspecto mais grave), tal exclusividade, acaba por contribuir para o desemprego que grassa entre os jovens licenciados, e explica porque razão em Portugal os cursos de Gestão de Empresas passaram a ter reduzidas saídas profissionais.

terça-feira, julho 31, 2012

Sobre o Impacto dos Discursos


NOTA prévia: Estive vários dias a meditar sobre o assunto, e só avanço agora com o meu juízo, quando as dúvidas já estão reduzidas ao mínimo. O tempo dirá, se sim ou não, tenho razão. Fica escrito e assinado.

No passado dia 23 de Julho, Pedro Passos Coelho, numa reunião com quadros do PSD (que propositadamente, não foi à porta fechada), ao relacionar de forma subtil a sua dieta de emagrecimento com aquela traumática expressão de "que se lixem as eleições", tinha um objectivo preciso. Aquele discurso não foi improvisado, mas sim estudado milimétricamente para causar um efeito preciso. E para isso foi posta a funcionar a máquina de produzir ideias-chave do marketing político, o qual além de servir para ganhar eleições, também serve para manter governos no poder, umas vezes de forma "pimba" (caso de José Sócrates), outras vezes de forma mais sofisticada. O marketing político sabia que aquela ideia de associar dietas de emagrecimento com o desprezo por eleições, iria ter repercussões, e no momento actual, o que é preciso é fazer repercutir ideias, e quanto mais popularuchas, melhor…

Acho que foi este o caso, e o objectivo era simples! A intenção de Passos Coelho foi a de explorar o sentimento generalizado de descrédito dos políticos e da democracia, que grassa entre os portugueses, colocando-se ao lado da opinião corrente de que as eleições constituem uma despesa extraordinária que só serve para agravar o défice, e que no fundo até não solucionam "técnicamente" nenhum dos problemas com que os portugueses se debatem. Foi como se tivesse dito: Vêem, vêem? Quanto a eleições, eu penso exactamente como vós, e quanto a salvar Portugal estou aqui cheio de vigor e determinação, e podem contar comigo. A finalidade era desclassificar as eleições, como instrumento de mudança, colocando-se, ele, Passos Coelho, num patamar superior, e "oferecendo-se" em sacrifício ao supremo e patriótico objectivo de salvar Portugal. Onde é que eu já ouvi isto?

Por outro lado, misturar problemas políticos bicudos com dietas de emagrecimento, serve também para reforçar este discurso pseudo-improvisado. Tendo as dietas a ver com menos gordura, não só significam mais sobriedade e austeridade, mas também mais agilidade, com o consequente aumento da energia e da capacidade de trabalho, para levar de vencida aquela missão, que ele, Passos Coelho, configurou como histórica, urgente e consensual. Além disso, a par do seu martírio da governação, apela ao nosso resignado consentimento, para que continuemos a ser desbastados até ao osso. Passos Coelho não precisou de ser histriónico, nem de vitimizar-se. Fez exactamente o contrário. Foi com calma e serenidade, embora com algum dramatismo à mistura, que esvaziou de sentido as eleições, chegando mesmo a perguntar ao parceiro do lado (como se não soubesse) como se aplicava o termo "lixar".

Embora congeninado para ser dito num encontro partidário, os destinatários daquele discurso não eram própriamente as hostes do PSD, mas sim o povo português em geral. Não foi por acaso que foi retransmitido até à exaustão por todos os canais de comunicação social, ocupando durante os dias seguintes, a legião de comentadores do costume, com muitas e variegadas interpretações sobre o seu significado. Comigo, o seu destino estava traçado: era ao povo que interessava fazer chegar a mensagem, e isso, o tempo dirá se foi conseguido. Que o primeiro-ministro comungava das mesmas apreensões que o mais desiludido e comum dos portugueses, quanto à eficácia da democracia para solucionar a crise, e que ele se entregava, de alma e coração, para acabar com ela, se disso dependesse a "continuidade" de Portugal. Onde é que eu já ouvi isto?

sábado, julho 28, 2012

Estória Breve - As Duas Padeiras


CORRIA o ano de 1385, mais exactamente a tarde do dia 14 de Agosto, e para os lados de Aljubarrota, aprestavam-se para se enfrentarem, as hostes do Condestável e de dom João I, o mestre de Avis, e o exército de Juan I, rei de Castela, cujas hostes, em número e fidalguia apoiante, suplantavam largamente o exército português e as ajudas inglesas. Por aquelas bandas, entre povoados e charnecas inabitadas, viviam, não uma mas duas padeiras, a saber, uma de nome Brites de Almeida, mulher rija e trabalhadeira, e outra mais discreta, surda, mas toda ela farta de carnes e músculo, porém minguada de formosura, de sua graça Lianor Domingues, casada com um insignificante jornaleiro, de nome Álvaro Domingues.

Ao saber da notícia de que estava eminente o embate, Álvaro não pensou duas vezes, e foi rápido a decidir. Sem espada nem lança, silencioso e sem dizer onde ia, apanhou uma forquilha e meteu pés ao caminho para se ir juntar às tropas invasoras, cujos estandartes e pendões, desde manhã cedo, lá ao longe, já tinham assomado nos outeiros. Fê-lo como o haviam feito um punhado de fidalgos das redondezas, imaginando que a sorte das armas penderia, infalivelmente, para Castela, e que com isso colheria algum benefício ou honraria. Na sua ignorância, seguiu o exemplo de quem ele pensava ser mais entendido em matéria de interesses e oportunidades.

A caminho do fim da tarde, depois de algumas manobras preparatórias, e ainda sob um sol escaldante, chocaram-se os dois exércitos, com uma violência desmesurada. O fragor da batalha, feito de ordens, gritos, entrechocar das armas e das couraças, troar das bombardas, assobios de flechas e virotões, e o relinchar de cavalos feridos, calou a passarada e fez estremecer a bucólica e lânguida paz das hortas e pomares, ao redor do campo de São Jorge. Com o chegar da noite eram vencedores os invadidos e estavam derrotados os invasores. O povo em brasa saiu aos campos, armado de foices, forquilhas, varapaus e em tremenda gritaria, vasculhava os caminhos, atalhos e celeiros, em busca de castelhanos transviados, chacinando-os sem piedade. Outros, aventuravam-se no campo de batalha, ainda morno, volteando corpos e saqueando tudo o que de valor encontravam, indiferentes aos corpos enganchados e trespassados nas paliçadas aguçadas, outros tombados e massacrados nos fossos e covas de lobo. Amontoados de corpos entupiam os ribeiros, cujas águas corriam vermelhas de sangue, e pelos campos em redor, galopavam à toa cavalos sem cavaleiro, aterrorizados peões castelhanos e aragoneses, lanceiros italianos e besteiros franceses, feridos e esfarrapados, acossados e em fuga desordenada.

Sete dos fugitivos foram esconder-se no forno da Brites de Almeida, que com a sua pá de ferro, logo ali os aliviou de outros tormentos. Mais para norte, a meia légua, num lugarejo cujo nome se perdeu, coube a tarefa a Lianor Domingues, que com a sua machada de rachar lenha para o forno, já mesmo ao cair da noite, tratou da saúde de outros quatro castelhanos extraviados, que se coziam com as sombras, e mais um outro, que berrava a plenos pulmões, suplicando misericórdia, mas em vão. Na penumbra, embalada pela sua surdez e no calor do ajuste de contas, o gume da machada, movida com destreza e com um ruído seco, abriu a cabeça do tratante ao meio, até aos ombros, como se fosse um melão maduro.

Esse quinto, o tal mais um, veio-se a saber mais tarde, era nem mais nem menos que o foragido, humilhado e arrependido, Álvaro Domingues, de regresso ao doce lar e aos braços portentosos da sua Lianor, que nunca lhe conhecera a voz. Depois de ter provado o pão que diabo amassou, regressava sem ter sido reconhecido, pior do que tinha saído, de calções rotos, ensopado de feridas, sem honra nem forquilha. Dias depois foi rezada uma missa por ele e outros traidores, mas ficaram dúvidas que tivessem sido aceites no paraíso.

Semanas mais tarde, depois de assentar a poeira daquela refrega e voltarem a chilrear os pássaros e a arrebitarem os arbustos espezinhados dos campos de Aljubarrota, inconsolável e roída de remorsos, Lianor juntou os poucos haveres e acabou - dizem as alcoviteiras - por partir para algures, deixando à parceira de ofício, a tal Brites de Almeida, o prestígio, o protagonismo e a responsabilidade da lenda.

Texto de F.Torres - Julho de 2012
Ilustração de Hal Foster

quarta-feira, julho 25, 2012

Registo para Memória Futura (69)

«(...) é ao PSD que tem cabido a missão de tornar irreconhecível o Estado herdado da normalização democrática e constitucional de Novembro de 1975. Um serviço há muito desejado pela direita da direita, a direita dos negócios obscuros, aquela que só conhece quatro formas de "competitividade": o favor político, a desregulação laboral e empresarial, a evasão fiscal e os baixos salários. (...) Sem ter esperança de poder cumprir os objectivos do défice, tendo agravado o desemprego e a recessão, nada tendo feito para reformar a despesa inútil do Estado, torna-se claro o objectivo: mudar as relações entre capital e trabalho e instalar um modelo de capitalismo chinês em Portugal.»

Excertos do artigo de Miguel Sousa Tavares, intitulado "O PREC de direita", publicado no semanário EXPRESSO de 21 de Julho de 2012

segunda-feira, julho 23, 2012

No Local e no Momento Errado

ANTÓNIO José Seguro, secretário-geral do partido Seguro, de visita aos locais atingidos pelos incêndios, nos concelhos de Tavira e S.Brás de Alportel, confrontado com o desesperante cenário de miséria das populações atingidas, e não sei a que propósito (talvez pensando que estava em campanha eleitoral a angariar votos), abandonou temporáriamente a sua providencial "abstenção violenta" e voltou a repetir para os repórteres de televisão que queria ser primeiro-ministro.