Uma cadeira de seis pernas é um objecto difícil de descrever, se não for acompanhado de um esboço clarificador, como o que juntamos a este artigo. Tiradas as dúvidas, falta saber para que serve esta curiosa peça de mobiliário. É simples: é sempre utilizada pela mesma pessoa, umas vezes com responsabilidades governativas, nesse caso sentando-se do lado A, outras vezes como sócio de um escritório de advogados, e nessa função sentando-se do lado B. Exemplifiquemos: quando o protagonista estava sentado do lado A, isto é, com funções governativas, tinha que assegurar os interesses do Estado e do país, contra as pretensões de uma empresa de nome Eurominas, ao passo que quando se sentava do lado B, tinha por objectivo lutar pela garantia de satisfação das exigências dessa mesma Eurominas, mesmo que do outro lado estivesse o tal Estado, em cujo governo servira, sentado do lado A.
Explicadas as curiosas e múltiplas funções da cadeira de seis pernas, passemos aos factos.
Em 1974, ainda antes do 25 de Abril, o governo de Marcello Caetano atribuiu uma concessão de exploração de ligas de manganês, ao grupo francês Pechiney, com a cedência de terrenos e energia eléctrica a preços simbólicos, para a instalação da empresa Eurominas.
Em 1986 a EDP altera o custo das tarifas de electricidade, o que não é aceite pela Eurominas. Como não se chega a qualquer acordo, a empresa suspende o fornecimento de energia, levando a que a Eurominas decida interromper a laboração.
Em 1995, perante a cessação da actividade, o governo de Cavaco Silva assina um decreto que faz reverter para o domínio público os terrenos e instalações da Eurominas, sem direito a qualquer indemnização.
A Eurominas desencadeia acções judiciais contra o Estado, com vista a ser ressarcida de tal decisão, exigindo uma indemnização de 16 milhões de contos, ao mesmo tempo que efectua contactos com o recém-empossado governo de António Guterres.
O ministro António Vitorino recebe a incumbência de negociar com a Eurominas. Em 2001, contrariando a decisão do governo de Cavaco Silva, e sem nunca ser revogado o decreto que lhe deu origem, o executivo do PS, num acordo extra-judicial, decide conceder à Eurominas uma compensação de 2,3 milhões de contos, em troca do abandono das acções judiciais movidas contra o Estado e da reivindicação de direitos sobre os terrenos e instalações abandonados.
O ministro João Cravinho e o Tesouro, baseados em vários pareceres, recusam-se a pagar a dita indemnização, argumentando não existir enquadramento legal para tal encargo. Só em Outubro o Ministério das Finanças autoriza o pagamento, tendo que recorrer, para o efeito, a uma interpretação muito livre e flexível do primitivo decreto-lei de 1974, da lavra do governo de Marcello Caetano.
Até 2003 o pagamento é efectuado em três tranches. Sabe-se agora que nas negociações esteve envolvido um escritório de advogados, detido por António Vitorino, José Lamego e António Costa, sendo que os dois primeiros, repartiam a sua actividade entre o governação e a actividade no dito escritório, isto é, ocupando alternadamente a tal cadeira de seis pernas, umas vezes como negociadores por parte do Estado, outras vezes como defensores dos interesses da Eurominas.
Assim se explica para onde vai o dinheiro dos contribuintes. Assim se delapida o património português, desde o material até ao moral. Assim se vai percebendo porque vamos de mal a pior, e isso nada tem a ver com produtividade, competitividade e as outras balelas do costume. Há suspeitas de favorecimento, e sabe-se lá de mais o quê. O assunto vai baixar a uma comissão de inquérito da Assembleia da República, que esperemos faça a sua obrigação e chegue a conclusões dignas de nota. Até lá vai continuar a passear-se por aí muita gente séria, excepto quando não se estão a rir de nós...
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