A
O Balbino era uma pessoa que sempre teve grande dificuldade em conduzir com resultados satisfatórios a sua actividade profissional. Apesar de exibir uma postura que sugeria estar permanentemente assoberbado de serviço, e ocupadíssimo com a resolução dos mais complexos problemas, na verdade, a realidade era bem diferente. Não havia dia que o Balbino não chegasse substancialmente atrasado ao escritório, invocando as mais variadas razões, desde uma noite mal passada, o relógio que se recusou a despertar, o corte de água quando estava ensaboado no banho, o ter ficado fechado no elevador, o monstruoso engarrafamento na ponte ou a irregularidade dos horários dos autocarros. Tudo era pretexto para interromper o seu ritmo de trabalho, fosse ele a falta de papel na impressora, o esquecimento das chaves da secretária, as insuportáveis dores na coluna, um aparte de um colega sobre as flutuações do campeonato de futebol, a carga da esferográfica que acabou, o serviço que já vinha engatado da outra secção, a maçada de ter que fazer o arquivo, o computador que ficou bloqueado, uma vontade desmedida de ir beber um café lá fora ou um qualquer telefonema, associado a um qualquer problema, particular e inadiável, para resolver no exterior. O regresso do almoço era também sempre com substancial atraso, seja porque os snacks da zona estavam a abarrotar, porque esperou uma eternidade pelo prato de jardineira, ou então porque o Ramos nunca mais trazia a conta. Ao fim da tarde, a mais de uma hora do fecho dos serviços, o Balbino começava sub-repticiamente a arrumar a secretária, dez minutos depois tornava-se invisível, desaparecendo da vista e dos apelos para tarefas de última hora, e à hora dos outros começarem a sair, já não havia sinais nem cheiro dele.
O chefe já estava habituado a esta rotina do Balbino, recheada de obstáculos, dificuldades, indisposições, ausências súbitas, situações imprevistas, azares, mais uma bateria infindável de acidentes domésticos e pequenas catástrofes no seu posto de trabalho, que faziam com que nunca se pudesse contar com o Balbino, fosse para o que fosse. Assim, impunha-se que a chefia assumisse que tudo o que o Balbino não conseguia ou queria fazer, alguém acabaria por ter que o fazer por ele. Em resumo, nunca ninguém contava com o Balbino. Mas a chefia lá ia contando, todos os anos, com a compensação dos simpáticos presentinhos do Balbino, sempre que vinha de férias. Ora bem, ninguém fica indiferente perante umas trouxas-de-ovos, um ou dois chourições e mais umas quantas vitualhas…
Excepcionalmente, ao longo dos anos, uma vez por outra, esta rotina do Balbino era quebrada, e isso acontecia sempre em dias muito especiais. Como aconteceu há alguns dias atrás. O Balbino, fugindo à regra, chegou antes da hora, fresco e determinado, despachou diligentemente uma quantidade razoável de serviço, sorveu, distraída e apressadamente, uma chávena de café à secretária, frente ao computador, gastou apenas vinte minutos do período do almoço, passou o resto do dia a tentar resolver problemas “bicudos”, e até acabou por sair mais tarde que o horário exigido, facto que o chefe registou, e o senhor director-geral, devidamente informado do facto, reconheceu com agrado. Ao contrário do Balbino, os poucos colegas que naquele dia tinham ido trabalhar contrariados, fizeram ronha durante todo o dia, trocaram entre si uns quantos sorrisos e olhares cúmplices, mas não esboçaram espanto nem qualquer comentário, pois a postura e a atitude excepcional do Balbino não mereciam tal.
De facto, aquele dia era muito especial: estava-se em 30 de Maio de 2007, dia de Greve Geral.
O Balbino era uma pessoa que sempre teve grande dificuldade em conduzir com resultados satisfatórios a sua actividade profissional. Apesar de exibir uma postura que sugeria estar permanentemente assoberbado de serviço, e ocupadíssimo com a resolução dos mais complexos problemas, na verdade, a realidade era bem diferente. Não havia dia que o Balbino não chegasse substancialmente atrasado ao escritório, invocando as mais variadas razões, desde uma noite mal passada, o relógio que se recusou a despertar, o corte de água quando estava ensaboado no banho, o ter ficado fechado no elevador, o monstruoso engarrafamento na ponte ou a irregularidade dos horários dos autocarros. Tudo era pretexto para interromper o seu ritmo de trabalho, fosse ele a falta de papel na impressora, o esquecimento das chaves da secretária, as insuportáveis dores na coluna, um aparte de um colega sobre as flutuações do campeonato de futebol, a carga da esferográfica que acabou, o serviço que já vinha engatado da outra secção, a maçada de ter que fazer o arquivo, o computador que ficou bloqueado, uma vontade desmedida de ir beber um café lá fora ou um qualquer telefonema, associado a um qualquer problema, particular e inadiável, para resolver no exterior. O regresso do almoço era também sempre com substancial atraso, seja porque os snacks da zona estavam a abarrotar, porque esperou uma eternidade pelo prato de jardineira, ou então porque o Ramos nunca mais trazia a conta. Ao fim da tarde, a mais de uma hora do fecho dos serviços, o Balbino começava sub-repticiamente a arrumar a secretária, dez minutos depois tornava-se invisível, desaparecendo da vista e dos apelos para tarefas de última hora, e à hora dos outros começarem a sair, já não havia sinais nem cheiro dele.
O chefe já estava habituado a esta rotina do Balbino, recheada de obstáculos, dificuldades, indisposições, ausências súbitas, situações imprevistas, azares, mais uma bateria infindável de acidentes domésticos e pequenas catástrofes no seu posto de trabalho, que faziam com que nunca se pudesse contar com o Balbino, fosse para o que fosse. Assim, impunha-se que a chefia assumisse que tudo o que o Balbino não conseguia ou queria fazer, alguém acabaria por ter que o fazer por ele. Em resumo, nunca ninguém contava com o Balbino. Mas a chefia lá ia contando, todos os anos, com a compensação dos simpáticos presentinhos do Balbino, sempre que vinha de férias. Ora bem, ninguém fica indiferente perante umas trouxas-de-ovos, um ou dois chourições e mais umas quantas vitualhas…
Excepcionalmente, ao longo dos anos, uma vez por outra, esta rotina do Balbino era quebrada, e isso acontecia sempre em dias muito especiais. Como aconteceu há alguns dias atrás. O Balbino, fugindo à regra, chegou antes da hora, fresco e determinado, despachou diligentemente uma quantidade razoável de serviço, sorveu, distraída e apressadamente, uma chávena de café à secretária, frente ao computador, gastou apenas vinte minutos do período do almoço, passou o resto do dia a tentar resolver problemas “bicudos”, e até acabou por sair mais tarde que o horário exigido, facto que o chefe registou, e o senhor director-geral, devidamente informado do facto, reconheceu com agrado. Ao contrário do Balbino, os poucos colegas que naquele dia tinham ido trabalhar contrariados, fizeram ronha durante todo o dia, trocaram entre si uns quantos sorrisos e olhares cúmplices, mas não esboçaram espanto nem qualquer comentário, pois a postura e a atitude excepcional do Balbino não mereciam tal.
De facto, aquele dia era muito especial: estava-se em 30 de Maio de 2007, dia de Greve Geral.
Sem comentários:
Enviar um comentário