Foi na semana passado que chegaram até nós as notícias de que o Ministério Público e a Polícia Judiciária haviam desencadeado uma grande operação, baptizada de “Furacão”, destinada a investigar alguns bancos, empresas a eles associadas e escritórios de advogados, todos eles envolvidos em métodos e práticas que tinham por objectivo o branqueamento de capitais, fraudes fiscais e camuflagem das grandes fortunas dos seus clientes, eximindo-os assim ao pagamento de impostos, e falando-se de valores astronómicos, que ascenderão a muitos milhares de milhões de Euros. Embora ainda haja muita investigação pela frente, e também já se vá falando em violações do segredo de justiça, que podem inquinar as investigações, vamos ficar atentos aos acontecimentos e desenvolvimentos, esperando que não apareça nenhum pauzinho a emperrar a engrenagem, e que se comece finalmente a procurar o dinheiro fugitivo, onde ele realmente está. Sem deixar de ser rico, diz a lei que o rico vai ter que justificar a origem daquele dinheiro que possui, bastando que o Estado passe a andar mais atento e faça cumprir a lei, para que não sejam sempre os mesmos a pagar as crises, e terem que suportar os devaneiros dos orçamentos de estado.
Entretanto, definitivamente apostado na moralização da vida e das finanças dos portugueses, o governo, inchado de arrojo e determinação, e porque não queria ficar atrás do Ministério Público, nesta cruzada anti-corrupção, correu a disparar sobre outro sector da sociedade, mais exactamente os ricos que se fazem passar por pobres. No caso presente falamos dos idosos com mais de 80 anos, que se dizem sem recursos e sem família, mas que se calhar não é bem assim, podendo cada um deles esconder um perigoso malfeitor, cujo objectivo é viver à grande e à francesa, à custa do erário público, lesando assim as frágeis finanças do país. Animado da melhor das intenções, acontece que o Estado decidiu atribuir uma pensão a cerca de 65 mil idosos, que se pensa serem manifestamente pobres, porém, o Estado não vai em cantigas. Os ditos idosos carenciados terão que provar a sua condição de indigência, sendo que tanto o candidato a pensionista, como a sua família próxima, se a tiver, terão que exibir os extratos das suas esqueléticas contas bancárias, provando deste modo a penúria. Assim, a pensão só será atribuída a quem não tiver família a quem recorrer, ou se a dita for tão ou mais pobre que o candidato. Entretanto, ainda não se sabe o que acontecerá a quem não tiver conta no banco, podendo muito bem acontecer que os octagenários e seus familiares sejam convidados a exibir as entranhas dos colchões, ou a levantar as tábuas do soalho. Como fácilmente se pode adivinhar, com tão bizarros condicionamentos, os tais 65 mil candidatos irão ficar reduzidos à lotação de meia dúzia de autocarros.
Segundo fontes do Ministério da Segurança Social, esta iniciativa já trás a marca e os contornos das mudanças que futuramente irão reger a obtenção de pensões, moralizando assim as prestações sociais. Face a isto, e considerando a fértil imaginação dos políticos portugueses, para engendrarem novas formas de espoliarem os cidadãos, e não esquecendo que há por aí muita gente que tem tendência para confundir maiorias absolutas com poder absoluto, prevêem-se, no futuro, pouquíssimas alterações nos direitos, mas grandes alterações nos deveres e obrigações de quem vive de pensões ou reformas. Sem querer fazer futurologia, vou dar três exemplos do que pode vir a acontecer.
Primeiro: Para acabar com o dinheiro escondido nos sítios mais incríveis, quem não tiver conta bancária não tem direito a nada.
Segundo: Habilitar-se a uma herança vai passar a ter mais um passo burocrático e um senão: o candidato à herança terá que apresentar um documento que prove que não é pensionista ou reformado, e caso o seja, a sua reforma ou pensão será reduzida numa percentagem proporcional à herança recebida. A condição de pensionista passa a ser incompatível com a condição de herdeiro.
Terceiro: O mesmo se passará com quem for premiado com a lotaria, totobola, totoloto ou o euromilhões. Para levantar o prémio terá que provar que não é reformado ou pensionista, e se o for, a Santa Casa está obrigada a comunicar o acontecimento aos serviços respectivos, que se encarregarão de reduzir a pensão de reforma do feliz contemplado, numa percentagem proporcional ao valor do prémio recebido. Neste caso, a condição de pensionista passa a ser incompatível com a condição de sortudo.
Dizem alguns teóricos socialistas de meia tijela que isto é solidariedade social, em estado de pureza absoluta, pois o Estado encarrega-se de redistribuir pelos outros carenciados do país, o quinhão que acabou de amputar às reformas e pensões, de uns quantos pobres priveligiados, por força de passarem a ser detentores de uma herançazita ou de um prémio da lotaria.
Depois das pensões e reformas, virá a vez dessa praga dos subsídios de desemprego, dar o corpo ao manifesto. A propósito, alguém consegue ver o Belmiro de Azevedo, o Sousa Cintra, o Espírito Santo Salgado, o Manuel Damásio ou o Jardim Gonçalves a receberem subsídio de desemprego, quando estão desocupados ou algum dos seus negócios dá para o torto? Claro que não! Se queremos uma sociedade mais justa e igualitária, nada impede que coloquemos os pobres em pé de igualdade com os ricos.
Portanto, sejam eles aposentados, reformados, pensionistas e todos os cidadãos em geral, que se cuidem, pois finalmente vem aí a tão apregoada como esperada justiça social. E já agora, quanto aos ricos, e para que não venham dizer que ficaram esquecidos, já sabemos o que a casa gasta...