O ambicionado plano tecnológico, inicialmente referido por José Sócrates como o “choque” tecnológico, e desde a primeira hora apontado como uma referência incontornável, que iria colocar Portugal no pelotão da frente, nasceu mal e continua a andar de mão em mão. Já vai no terceiro coordenador, e agora, o primeiro, que se tinha demitido, por discordâncias com a forma como o plano era conduzido, resolveu chamar as coisas pelos nomes, questionando em público o primeiro-ministro, sobre um tal protocolo com o MIT (Massachusetts Institute of Technology), que tinha por objectivo a investigação aplicada e desenvolvimento de tecnologias, envolvendo um vasto leque de universidades e empresas, e vocacionado para aplicação dos resultados nestas últimas, e que andaria a marinar há largos meses pelas secretárias dos ministros, sendo que um deles lhe era particularmente hostil. José Sócrates, visivelmente incomodado com a interpelação, e conhecidas que são as suas reacções epidérmicas, algo violentas e ruidosas, disparou a matar: disse que o tal projecto irá para a frente e será anunciado quando o governo muito bem entender, e não por iniciativa e pressão de um qualquer funcionário público, esquecendo-se que também ele é funcionário público. Com esta saída, sinal de manifesta prosápia e má educação, não só tentou humilhar o interpelante e ex-coordenador Prof. Dr. José Tavares, mas também todos os funcionários públicos do país, tentando relegá-los para o lugar das coisas banais, dispensáveis e sem importância.
Enfiando a carapuça de ser o tal ministro adverso ao projecto MIT, Mariano Gago saltou para a ribalta dos telejornais e veio dizer, com manifesta inabilidade, que as afirmações do ex-coordenador não passavam de falsidades, mais graves ainda pelo facto de serem veiculadas por um bolseiro pago pelo estado português (cala-te ou cortamos-te a mesada), ao que o Prof. Dr. José Tavares contrapôs com a exibição de provas documentais, que se necessário for, trará a público. Habituados como estamos a que o governo apenas funcione por estímulos, vamos aguardar os próximos capítulos deste episódio. Quanto ao Prof. Dr. José Tavares, é motivo de inspiração para todos os portugueses. Desde o memorável “obviamente demito-o!” que o general Humberto Delgado soletrou, referindo-se a Salazar, que não via quem fosse tão corajoso, afrontando o poder, cara a cara e com todas as letras, provando que a força da razão será sempre mais forte que a razão da força.
No pólo oposto, temos o Instituto de Meteorologia (com a tutela do mesmo ministro Mariano Gago), cuja administração decidiu instalar, em tempo recorde, um sofisticado e complexo sistema de acessos e controle de presenças, que chega ao ponto de utilizar as tecnologias de ponta de controlo biométrico de impressões digitais, como se estivéssemos a falar das instalações do SIS, de um ministério da defesa ou dos negócios estrangeiros. Foi gasta, sem pestanejar, uma verba de aproximadamente 55.000 euros (11.000 contos), numa instituição que, por força das limitações orçamentais, tem vindo a cortar no papel higiénico, nos tinteiros e papel para as impressoras, e sobrevive com estações meteorológicas inoperacionais e outras coisas mais. Neste caso, uma versão popularucha do choque tecnológico, a roçar a paranóia securitária, não encontrou entraves, talvez porque o anticiclone dos Açores corra o risco de sequestro.
Da administração do Instituto de Meteorologia não se podia esperar mais. A sua iniciativa não foi além da constatação da necessidade premente de instalar uns quantos torniquetes e câmaras de vigilância, produzir alguns cartões, passes e autorizações para perto de 250 funcionários, e quem não sabe mais do que isto, a mais não é obrigado. Em última instância, quem de facto é responsável, foi quem nomeou tais eminências para gerir os destinos da meteorologia nacional, subscrevendo sem pestanejar, esta ridícula parcela do tal “choque tecnológico”, como um contributo para transformar Portugal numa moderna sociedade do conhecimento.
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