A
Pela primeira vez na vida, aconteceu-me uma coisa inacreditável. Eu conto como as coisas se passaram. No dia 2 de Março, necessitei de deslocar-me da Portela de Sacavém para a Avenida Infante Santo, a mais uma consulta no Hospital da Cuf, e como sou adepto das “boas práticas” e avesso a usar transporte particular dentro de Lisboa, em dia de semana e em horários de trabalho, decidi recorrer, tal como o tenho feito das outras vezes, ao transporte público, e utilizar a carreira 28 da Carris, que faz o percurso entre a Portela e o Restelo. Eram 12h e 45m quando o enorme veículo articulado chegou, o motorista abriu a porta, comprei o meu título de transporte, e quando me preparava para ir escolher um lugar sentado, naquele veículo gigantesco, que apenas transportava meia dúzia de idosos, ouvi a voz do condutor, um rapaz com pouco mais de 20 anos, que ainda não tinha arrancado da paragem, fazer a seguinte pergunta:
- O senhor desculpe, mas agora nesta rotunda, sigo para a direita ou vou em frente?
Parei, olhei para trás, incrédulo, e foi a minha vez de perguntar, muito embora não houvesse mais ninguém por perto:
- Está-me a perguntar isso a mim?
- É sim, queira desculpar a maçada, mas a questão é que me enfiaram nesta carreira e eu desconheço totalmente o percurso, pelo menos até ao Cais do Sodré, respondeu o motorista, a exibir um ar muito encavacado.
Perfeitamente abismado com a situação, voltei a insistir:
- Então e quando o escalaram para esta carreira não informou que desconhecia o percurso?
- Claro que informei, só que me disseram que tinha que ser, e se tivesse dificuldades com o caminho, que fosse perguntando às pessoas…
Claro está que não me sentei para fazer aquela viagem. Ou ficava a dar uma ajuda ao jovem funcionário da Carris, ou desembarcava na próxima paragem e arranjava um táxi. Acabei por decidir armar-me em “bom samaritano”, instalei-me em pé ao lado dele e disse:
- Pois bem, pelo menos até à Infante Santo vai ter navegador. Agora aí na rotunda vai seguir em frente.
E assim foi. Fui dando indicação da localização das paragens, das faixas rodoviárias que devia seguir, orientei-o nos meandros de Moscavide, do Parque das Nações, na avenida Infante D.Henrique, no percurso pelas ruelas apertadas da zona de Chelas, onde é preciso ser muito experiente para fazer curvas com um veículo articulado, senão é o cabo dos trabalhos, e assim sucessivamente. Pelo meio daquela inusitada viagem, e como é compreensível, a velocidade do autocarro era muito abaixo da média habitual, e isso começou-se a reflectir-se na chegada às paragens, empanturradas de gente, a despejarem sobre o motorista todas as ameaças e reclamações, tanto possíveis como imaginárias. Por isso, além de navegador, também tive que fazer a minha entrada de animal feroz:
- Alguém que está a reclamar, quer vir aqui para o meu lugar? É que o motorista foi metido neste autocarro e não sabe o percurso desta carreira. Alguém quer vir até aqui dar uma mãozinha? Então, ninguém se oferece?
Fez-se silêncio. Apenas um operário já entrado em idade, veio até à frente e disse que estava ali para o que desse e viesse, menos conduzir o “machibombo”.
- Fique descansado que ninguém se mete consigo. Eu só saio na última paragem…
Finalmente chegámos ao entroncamento da avenida 24 de Junho com a Infante Santo, onde desci do autocarro.
- Boa tarde e muito obrigado pela ajuda, agradeceu o jovem condutor.
- Não agradeça, mas olhe que na viagem de regresso, sobretudo dentro de Chelas, o percurso não é exactamente o mesmo que agora fizemos. Por isso, arranje uma nova ajuda.
- Mais uma vez obrigado, voltou ele a repetir, antes de arrancar em direcção ao Restelo. Não sei como acabou a saga daquele jovem condutor da Carris. A minha acabou mal. A consulta que estava marcada para as 14 horas, porque cheguei atrasado uma hora, foi transferida para as 17 horas. E no regresso a casa, pelo sim, pelo não, acabei por vir de táxi.
Assim anda esta Carris, já entrada no terceiro milénio, e com comportamentos muito piores, do que se andasse em auto-gestão. Assim anda (ou desanda) a Carris, que gasta muitos milhares de euros a fazer a respectiva auto-promoção da excelência dos seus serviços, e publicidade aos benefícios de deixar o carro em casa e usar o transporte público, e depois oferece serviços, que podem tornar-se uma aventura pelo desconhecido, e com fim imprevisível.
Pela primeira vez na vida, aconteceu-me uma coisa inacreditável. Eu conto como as coisas se passaram. No dia 2 de Março, necessitei de deslocar-me da Portela de Sacavém para a Avenida Infante Santo, a mais uma consulta no Hospital da Cuf, e como sou adepto das “boas práticas” e avesso a usar transporte particular dentro de Lisboa, em dia de semana e em horários de trabalho, decidi recorrer, tal como o tenho feito das outras vezes, ao transporte público, e utilizar a carreira 28 da Carris, que faz o percurso entre a Portela e o Restelo. Eram 12h e 45m quando o enorme veículo articulado chegou, o motorista abriu a porta, comprei o meu título de transporte, e quando me preparava para ir escolher um lugar sentado, naquele veículo gigantesco, que apenas transportava meia dúzia de idosos, ouvi a voz do condutor, um rapaz com pouco mais de 20 anos, que ainda não tinha arrancado da paragem, fazer a seguinte pergunta:
- O senhor desculpe, mas agora nesta rotunda, sigo para a direita ou vou em frente?
Parei, olhei para trás, incrédulo, e foi a minha vez de perguntar, muito embora não houvesse mais ninguém por perto:
- Está-me a perguntar isso a mim?
- É sim, queira desculpar a maçada, mas a questão é que me enfiaram nesta carreira e eu desconheço totalmente o percurso, pelo menos até ao Cais do Sodré, respondeu o motorista, a exibir um ar muito encavacado.
Perfeitamente abismado com a situação, voltei a insistir:
- Então e quando o escalaram para esta carreira não informou que desconhecia o percurso?
- Claro que informei, só que me disseram que tinha que ser, e se tivesse dificuldades com o caminho, que fosse perguntando às pessoas…
Claro está que não me sentei para fazer aquela viagem. Ou ficava a dar uma ajuda ao jovem funcionário da Carris, ou desembarcava na próxima paragem e arranjava um táxi. Acabei por decidir armar-me em “bom samaritano”, instalei-me em pé ao lado dele e disse:
- Pois bem, pelo menos até à Infante Santo vai ter navegador. Agora aí na rotunda vai seguir em frente.
E assim foi. Fui dando indicação da localização das paragens, das faixas rodoviárias que devia seguir, orientei-o nos meandros de Moscavide, do Parque das Nações, na avenida Infante D.Henrique, no percurso pelas ruelas apertadas da zona de Chelas, onde é preciso ser muito experiente para fazer curvas com um veículo articulado, senão é o cabo dos trabalhos, e assim sucessivamente. Pelo meio daquela inusitada viagem, e como é compreensível, a velocidade do autocarro era muito abaixo da média habitual, e isso começou-se a reflectir-se na chegada às paragens, empanturradas de gente, a despejarem sobre o motorista todas as ameaças e reclamações, tanto possíveis como imaginárias. Por isso, além de navegador, também tive que fazer a minha entrada de animal feroz:
- Alguém que está a reclamar, quer vir aqui para o meu lugar? É que o motorista foi metido neste autocarro e não sabe o percurso desta carreira. Alguém quer vir até aqui dar uma mãozinha? Então, ninguém se oferece?
Fez-se silêncio. Apenas um operário já entrado em idade, veio até à frente e disse que estava ali para o que desse e viesse, menos conduzir o “machibombo”.
- Fique descansado que ninguém se mete consigo. Eu só saio na última paragem…
Finalmente chegámos ao entroncamento da avenida 24 de Junho com a Infante Santo, onde desci do autocarro.
- Boa tarde e muito obrigado pela ajuda, agradeceu o jovem condutor.
- Não agradeça, mas olhe que na viagem de regresso, sobretudo dentro de Chelas, o percurso não é exactamente o mesmo que agora fizemos. Por isso, arranje uma nova ajuda.
- Mais uma vez obrigado, voltou ele a repetir, antes de arrancar em direcção ao Restelo. Não sei como acabou a saga daquele jovem condutor da Carris. A minha acabou mal. A consulta que estava marcada para as 14 horas, porque cheguei atrasado uma hora, foi transferida para as 17 horas. E no regresso a casa, pelo sim, pelo não, acabei por vir de táxi.
Assim anda esta Carris, já entrada no terceiro milénio, e com comportamentos muito piores, do que se andasse em auto-gestão. Assim anda (ou desanda) a Carris, que gasta muitos milhares de euros a fazer a respectiva auto-promoção da excelência dos seus serviços, e publicidade aos benefícios de deixar o carro em casa e usar o transporte público, e depois oferece serviços, que podem tornar-se uma aventura pelo desconhecido, e com fim imprevisível.
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