Em Portugal os socialistas são grandes especialistas em acabamentos. A direita vai para o governo e começa por abrir os caboucos, levantar paredes e estender a cobertura do edifício neo-liberal, em mais uma etapa do desmantelamento do que ainda vai restando do estado social. Desalojados do poder pelas eleições, a alternância leva depois ao poder os socialistas, os quais, depois de congelarem os seus programas e promessas eleitorais, esmeram-se desenfreadamente nos acabamentos das políticas iniciadas pela direita, sendo nestas alturas que não se consegue distinguir os primeiros dos segundos. Compete ao PR fazer uma análise e avaliação do desempenho deste governo (pese embora a sua maioria absoluta), em função das promessas feitas (e não cumpridas) e dos resultados da sua actuação, a bem da credibilidade do regime democrático, tão citado e simultâneamente subvertido e maltratado.
Em Portugal o choque tecnológico afinal não passa do choque do betão e do alcatrão, em prejuízo do investimento nas áreas produtivas, as únicas que podem ser criadoras de riqueza, desenvolvimento e emprego. Se a isso acrescentarmos a tendência que os políticos têm para o espavento, com o anúncio de obras grandiosas e sumptuárias, candidatas a futuros elefantes brancos, como o TGV e o aeroporto da OTA, o edifício fica completo. No caso particular da OTA, os seus patronos, gente pouco qualificada para estudos prospectivos, logo com larga experiência em comprometer o futuro do país, mas declarados adeptos das apostas - como se tornou comum classificar as opções governativas - mantêm-se firmes, continuando a ignorar os avisos que apontam para a progressiva penúria das reservas petrolíferas planetárias, o que significa o crescente encarecimento dos transportes aéreos, e a sua inevitável decadência a médio prazo.
Levando a que o futuro aeroporto da OTA, indiferente aos milhões que lá terão sido enterrados, acabe os seus dias como pista de karts movidos a álcool de beterraba.
Em Portugal há dois problemas distintos: uma coisa é a imoralidade que tem grassado entre os gestores públicos, no que toca às vantagens recolhidas por desempenharem cargos nas instituições, que é suportada pelos contribuintes, e outra coisa é ir buscar os dinheiros que faltam às receitas, junto de quem, escandalosamente, se tem eximido a declarar o que de facto anda a facturar.
Nesta ordem de ideias, que credibilidade se pode esperar de um governo que não dispunha de mais ninguém para nomear para administrador da Caixa Geral de Depósitos, senão o Armando Vara, o tal senhor que andou envolvido nos manobrismos e malabarismos do Instituto para a Prevenção e Segurança, no tempo dos governos de António Guterres? Assim, se o governo está cada vez mais parecido com uma Colónia Balnear, onde ministros e secretários de estado se juntam para dar uns mergulhos, testando as suas habilidades e disfarçando as suas incompetências, por outro lado, a Caixa Geral de Depósitos, assemelha-se cada vez mais a um Centro de Dia, distribuidor de lautos vencimentos e reformas douradas, para premiar favores, alojar temporáriamente todos aqueles que não arranjaram lugar no aparelho da (des)governação, ou então dar guarida a quem precise de um bem remunerado estágio de branqueamento, para ocultar inabilidades ou actividades menos recomendáveis.
Tal como a seca, os incêndios e os mortos na estrada, o desemprego grassa em todo o país. Fechar uma empresa, mandar uma mão cheia de trabalhadores para o “olho da da rua”, com ordenados em atrazo, sem garantias e com as contribuições sequestradas, para ir abrir nova fabriqueta, no distrito vizinho, para uma nova surtida, tornou-se uma banalidade fora de controle. Por outro lado, alguns patrões mais “civilizados” (e já vamos tendo alguns), já não receiam as reivindicações por melhores condições salariais, e recorrem a outros métodos. Basta ameaçarem com a deslocalização das empresas para que trabalhadores e sindicatos recuem nas suas pretensões. Ao contra-ataque do capital os trabalhadores e as suas organizações, respondem com o silêncio, a divisão e a dispersão, estando precisados de recapitularem as lições do passado.
Em Portugal, porque somos muito educados e respeitadores das personagens detentoras de poder, ninguém levanta a voz e chama à ordem o javardo madeirense, quando aquele apelida de bastardos e filhos da puta, alguns profissionais da comunicação social, ou entre dois copos de três, grunhe invectivas xenófobas contra chineses e indianos.
Neste Portugal pequenino, que não pára de minguar, porque também somos pequeninos, irracionalmente optimistas e persiste a tendência para esquecer rápidamente, convém lembrar a quem de direito, que três dos quatro países protagonistas da Cimeira de Guerra dos Açores (EUA, Reino Unido, Espanha e o anfitrião Portugal), que subscreveram o início da guerra contra o Iraque, já sofreram ataques terroristas, dois deles de retaliação. Apenas resta incólume o quarto, isto é, Portugal.
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