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O lugre bacalhoeiro ARGUS vai regressar novamente a Portugal depois de uma existência atribulada. Construído na Holanda em 1939, esteve integrado na frota portuguesa da pesca do bacalhau que operava nos bancos pesqueiros da Terra Nova até 1970, tendo sido vendido em 1974, recebido posteriores alterações e melhoramentos, foi rebaptizado com o nome POLYNESIA II, continuando a navegar até agora, ao serviço de cruzeiros turísticos em Aruba. É um lugre de quatro mastros, irmão gémeo do CREOULA, actualmente utilizado em treino de mar pela Marinha Portuguesa.
O ARGUS volta a Portugal graças à sua aquisição pela empresa de Ílhavo, Pascoal & Filhos SA, a mesma que salvou do desmantelamento e do esquecimento outro lugre lendário, também gémeo do ARGUS, de nome SANTA MARIA MANUELA, o qual sofreu as primeiras obras de restauro nos estaleiros de Aveiro, e que está agora a receber os últimos trabalhos de recuperação e aparelhamento nos estaleiros de Vigo, esperando-se que fique operacional ainda neste ano de 2009.
O ARGUS, era um dos mais belos e imponentes lugres da Frota Branca (Portuguese White Fleet ), nome por que era conhecida a frota portuguesa de bacalhoeiros durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Para assinalar os objectivos pacíficos da frota e a neutralidade portuguesa no conflito, os cascos de todos os lugres foram pintados de branco, com a inscrição do nome PORTUGAL em grandes caracteres, a fim de advertir as armadas beligerantes (sobretudo submarinos) da nossa presença e estatuto neutral. No entanto, o ARGUS acabou por tornar-se uma lenda viva quando em 1950 foi o protagonista da memorável reportagem escrita e filmada por Alan Villiers, comandante da Marinha Australiana, a quem o governo português da época encomendou aquela obra, considerada por muitos como uma promoção do regime de Salazar. A obra escrita, de nome A CAMPANHA DO ARGUS, primitivamente editada em inglês sob o nome THE QUEST OF THE SCHOONER ARGUS, rapidamente se tornou um “best seller” internacional, divulgando a autêntica epopeia marítima que eram as campanhas anuais de pesca de bacalhau, que se estendiam entre seis a oito meses de trabalho intensivo e arrojado nos bancos pesqueiros da Terra Nova, levadas a cabo por aqueles marinheiros / pescadores / operários portugueses, numa altura em que os grandes veleiros já pertenciam ao passado, persistindo apenas como objectos do imaginário romântico.
Agora, o ARGUS já não vai ser só memória. O sonho vai a caminho de se tornar realidade. Agora, voltar a ver o ARGUS restaurado, a navegar imponente, com todo o pano desfraldado e sob pavilhão português, é uma imagem que, julgando-se perdida para sempre, fará brotar muita lágrima furtiva no rosto de quem nutre pela navegação à vela uma paixão do tamanho de todos os oceanos, e até a mim que nunca fui marinheiro.
.O ARGUS nos mares da Terra Nova durante a campanha bacalhoeira de 1940
O ARGUS (rebaptizado POLYNESIA II) nos mares das Caraíbas
NOTA: Aproveito para referir outros artigos que escrevi sobre o mesmo tema da pesca do bacalhau:
Outros blogs de consulta obrigatória:
2 comentários:
Boas Fernando.
É um prazer escrever-lhe de novo e fico contente, por ver no seu artigo sobre o Nosso Argus, que é mais um dos muitos que sem dúvida estão muito emocionados com o que a Pascoal fez "a dobrar", adquirindo estes dois míticos navios. São este tipo de pessoas que merecem estátuas e monumentos à sua memória, pelo que fazem não só pela comunidade piscatória, mas pela grande memória de Portugal.
Já há cerca de ano e meio que procurava tudo o que podia de notícias sobre o "Polynesia II", desde o momento em que vi que a companhia havia falido. O resultado... em breve estará a entrar no porto da Gafanha da Nazaré e como o Fernando disse, lágrimas de muitos correrão de certeza.
Não estarei lá para esse momento, mas cá o sigo desde a Polónia.
Parece um sonho... daqueles que realmente se tornou realidade.
Aguardemos o projecto da Pascoal para o navio.
Com um abraço,
www.caxinas-a-freguesia.blogs.sapo.pt
Caro Fernando, excelente blog, trouxe-me muitas recordações. Também fiquei bem impressionado com o blog das Caxinas. Para o seu autor um grande abraço deste meio-caxineiro e meio-poveiro, José Milhazes
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