segunda-feira, janeiro 08, 2007

Incomodidades

I
João Cravinho já anda a sair dos eixos há tempo demais, desde que adoptou aquela mania da perseguição à corrupção, ao sigilo bancário e aos enriquecimentos ilícitos, razão porque o engenheiro Sócrates, cada vez mais incomodado com aqueles excessos e propósitos (já lá vai o tempo em que o ministro Cravinho desmantelou a JAE, por ser um ninho de corrupção e favorecimentos), e do desassossego que tem provocado na bancada parlamentar do PS (diz a experiência que onde há resistências é porque há interesses instalados), em vez de bani-lo ou ostracizá-lo, decidiu exilá-lo. Se fosse o PC, mandava-o colar cartazes ou servir “cachorros” na Festa do Avante!; como é o PS, partido do governo, e com poder absoluto sobre todos as almas, tachos, púcaros e quejandos, manda-o ir coachar para o Reino Unido.
Porém, para que não começassem a chover as reclamações e as vozes indignadas, o tal degredo vai ser dourado, nada mais, nada menos, que a administração do Banco Europeu de Reconstrução e Desenvolvimento (BERD). Tal como aconteceu com o rei Midas, todos esperam que Cravinho se deixe hipnotizar com o brilho do ouro. Vamos lá a ver se é assim. Como é compreensível, Cravinho que não vira as costa a desafios nem a trabalhar no duro, rejubilou e aceitou aquela fartura de olhos arregalados, recusando-se a ver a oferta como um afastamento suave da ribalta política, mas sim como o reconhecimento das suas reais capacidades. Pelo meio promete que não desarma, que vai fazer os “trabalhos de casa”, continuando a manter-se atrevido e inflexível no seu combate anti-corrupção, ao mesmo tempo que vai fazendo a mala apressadamente. Para as primeiras impressões chega meia dúzia de peúgas e cuecas, uma gravata, o dicionário Liliput, a carneira para limpar os óculos, mais a escova e a pasta de dentes, já que o tempo urge e daqui a dias vai ter que tomar posse em Londres, e os ingleses são muito rigorosos com as questões de pontualidade (para saber como é, vejam o filme “A Volta ao Mundo em 80 Dias”).
Por outro lado, e já que falamos de incomodidades, é oportuno lembrar que os tempos de antena exibidos no canal de televisão RTP1, vão ser transferidos, na grelha de programação, das 20 para as 19 horas. A intenção é óbvia: os tempos de antena, habitualmente muito incómodos quando são da autoria das oposições, vão ser “despachados” para um horário mais pobre, a fim de não “atropelarem” o telejornal da noite, prejudicando assim a “imagem” do governo, cujo “ministério da propaganda” costuma fazer uso deste poderoso meio que é a televisão, para exibir, divulgar, dourar e adornar as actividades governativas, as quais continuam a sair amplamente beneficiadas daqueles alinhamentos. O governo já veio dizer que desconhecia a existência desta iniciativa da RTP (ninguém acredita!), ao passo que aquela estação, por sua vez, veio confirmar que a medida não foi sugestão do governo (jogo combinado!), e que a sua implementação apenas se deve à necessidade de “uniformizar horários” (ora, não havia necessidade! Isto quando já nem os auxiliares da função pública andam uniformizados…), e não de criar uma barreira de invisibilidade aos tais tempos de antena, como andam a difundir as más línguas do costume. Quanto à Entidade Reguladora de Comunicação Social (ERC), aquela “coisa” que uns dizem ser um ante-projecto de censura, e que outros dizem não saber o que é, diz ela, dizia eu, que a medida é legal, e que não é da sua competência dar qualquer parecer sobre a oportunidade ou bondade da medida tomada pela RTP, e mesmo que o fizesse, a sua opinião não era vinculativa. Pergunta-se: então, afinal, para que serve esta ERC?

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