quarta-feira, setembro 28, 2005

Que lugar é este?

Que lugar é este onde as Forças Armadas portuguesas são abjectamente parodiadas, em mais um abjecto “reality show” televisivo, sem que as hierarquias, noutras alturas, tão lestas e prontas a clamar por coesão e disciplina, esbocem agora uma simples palavra de repúdio?
Que lugar é este onde os Avelinos, as Fátimas, os Valentins, os Isaltinos e mais uns quantos ilustres desconhecidos, se passeiam, se gabam, se vangloriam, se exibem despudoradamente, toureando as polícias e a justiça, para se candidatarem depois a orgãos de poder, sem que quase nada lhes aconteça, na mais desbragada e imoral das impunidades?
Que lugar é este onde encontram aceitação e espaço de manobra as mais carismáticas associações do crime, tais como o vasto mundo dos cartéis da droga, as máfias russa, ucraniana, siciliana e calabresa, a camorra, a cosa nosta, a yacuza, e mais umas quantas réplicas autóctones, que chafurdam em certos nichos da administração pública, do meio político e da generalidade do mundo futebolístico, todos eles amancebados com os mais recatados e respeitados poderes económicos?
Que lugar é este onde os faltosos relapsos são contemplados com uma redução de 25% nos impostos em atrazo, se voluntáriamente decidirem visitar a repartição de finanças mais próxima, ao passo que se vai apertando o nó estrangulador aos que, invariávelmente, espremidos como limões, cumprem as suas obrigações fiscais?
Que lugar é este onde se mata por coisa nenhuma, como aconteceu na zona da Guarda, onde um cidadão que se achava com direitos de propriedade sobre uns quantos metros de estrada municipal, bloqueando o acesso a estacionamentos, matou a tiro o presidente da junta de freguesia, quando aquele coordenava os trabalhos de devolução do tal espaço ao domínio público?
Que lugar é este onde...

sábado, setembro 17, 2005

Abortos

Por razões que seria fastidioso enumerar aqui, em termos gerais sou a favor da interrupção voluntária da gravidez. Porém, no caso português, tenho um motivo especial: sermos poupados à proliferação de um outro tipo de abortos, com lugares garantidos nos governos e no aparelho de estado.

sexta-feira, setembro 16, 2005

Uma ONU à Medida Deles

Assim como há quem tenha sugerido que New Orleans, após a trágica passagem do furacão Katrina, fosse riscada do mapa, extirpando dos EUA aquela incómoda mancha de pobreza e negritude, há um outro especialista em demolições, que dá pelo nome de John Bolton, e é embaixador dos EUA junto da ONU. Ultraconservador conhecido pela sua intransigência negocial e por ser adepto de uma reforma radical da instituição, de forma que aquela se transforme num instrumento dócil dos interesses americanos, no seu papel de potência dominante, a dita criatura tem vindo a declarar aos quatro ventos que “a ONU não existe”. Falta saber a que tempo se refere, se antes de ter assumido funções, ou se depois do trabalho feito.
Tudo isto acontece num momento em que a ONU carece de profundas reformas, para enfrentar a realidade dos novos tempos, e onde se degladiam o modelo nacionalista da China, o modelo comunitário da Europa e o modelo unilateralista dos EUA que, avesso a compromissos que belisquem os seus interesses, também insiste em não querer falar de combates à pobreza, de protocolos de Quioto e de Tribunais Penais Internacionais.

segunda-feira, setembro 12, 2005

Grande Coração!

O meu amigo QUIM FAÍSCA (que também tem uma página na WEB), grande adepto de automóveis antigos, depois de superadas muitas dificuldades e burocracias, tomou a inciativa de promover uma concentração de MINIS, lá para fins de Novembro deste ano, estando agora na fase de angariação de apoios e patrocínios, junto de empresas e comerciantes. A receita do evento reverterá para apoio às crianças carenciadas da sua autarquia.
Ainda há grandes corações!

domingo, setembro 11, 2005

Imperdoável!

Afinal, a América poderia ser o paraíso terrestre, mas não é. Pode mesmo tornar-se um inferno, tudo porque tem um governo ultraconservador que ao mesmo tempo que se compraz a promover o “estilo de vida americano”, ameaçando meio mundo e liquidando a outra metade, esquece que há catástrofes naturais que é preciso prevenir e enfrentar, sob pena de também ficar responsável pela liquidação física de alguns milhares de membros da sociedade civil, do seu próprio país. Como agora aconteceu em New Orleans, sob o impacto do furacão Katrina, onde quase nada funcionou, seja porque a protecção civil era uma insignificância, face à extensão do desastre, ou porque a guarda nacional estava reduzida a quase nada, por força das mobilizações para o Iraque. Tudo isto acontece num país onde quem é branco lá vai tendo oportunidades e singra na vida, ao passo que quem é negro vive da assistência social e de múltiplos expedientes, e com isso vai vegetando, num país onde o Estado se tem vindo a demitir das suas funções sociais básicas, deixando tudo entregue à voracidade dos interesses e ambições privadas.Tudo isto acontece num país onde quem manda é o dinheiro e ainda persistem os preconceitos raciais, excrecências do esclavagismo e da luta pelo direitos cívicos, onde quem tem dólares foge e sobrevive, quem os não tem fica para trás e sofre as consequências. Continua a ser uma sociedade que se rege por conceitos e preconceitos a preto e branco, onde se alguém for apanhado a apropriar-se do recheio de uma loja, no caso de ser branco é luta pela sobrevivência, mas se for negro é um puro acto de pilhagem.Onde estavam os socorristas, os médicos, a água potável, os alimentos, os agasalhos, os transportes para as evacuações, as autoridades para garantirem a segurança e evitarem o caos social? O que prevaleceu foram os corpos de fuzileiros, mobilizados à pressa, a exibirem-se de armas aperradas e olhos em alvo, para combaterem as pilhagens, indiferentes aos acenos de gente refugiada nos telhados e aos cadáveres que boiavam na água fétida. O presidente apareceu seis dias depois para debitar, como é seu hábito, entre sorrisos, acenos, palmadinhas nas costas e duas preces, algumas tiradas alarves e despropositadas, para que dez dias depois ainda continuasse a sobrar muito improviso e a escassear método e organização, deixando no ar a ideia de que o Estado, negligente e insensível, adoptou uma postura tão próxima quanto possível do “amanhem-se como puderem, temos mais em que pensar, a luta contra o terrorismo é prioritária”. Mas o mais preocupante é haver gente que pensa que se a cidade atingida tivesse sido outra qualquer, que não Nova Orleans, talvez os meios e recursos de socorro, tivessem aparecido em tempo oportuno, em quantidade e qualidade. E tudo isso ficou bem visível no que as reportagens transmitiram para todo o planeta, dando uma visão que se confundia com um misto de campo de batalha e de catástrofe terceiro-mundista, onde se morre às carradas, num abrir e fechar de olhos. Pura ilusão. Aquilo estava a acontecer na casa da hiperpotência que dá ordens ao mundo e transfere exércitos num abrir e fechar de olhos, impondo pela força as suas regras, que tem o estrelato de Beverly Hills, o carisma do MIT, a massa cinzenta de Silicon Valey, ao mesmo tempo que não consegue precaver e minimizar os efeitos de uma catástrofe natural (amplamente prevista e monitorizada) no seu próprio território, denunciando a mais grotesca das negligências e incompetências. O furacão Katrina deixou atrás de si um imenso rasto de destruição e uma mensagem que não é difícil de descodificar. Bem vistas as coisas, a América de Bush e seus compadres, além de não ser essa a sua vocação, está impreparada e convive mal com guerras deste tipo, talvez porque não estão em causa interesses geoestratégicos, chorudos recursos naturais, a consolidação de um qualquer regime “amigo”, personalizado pelo mais hediondo dos empaladores, a destruição de uma qualquer fatia do “eixo do mal”, mesmo que não passe de tiranete mal enjorcado, ou algum teste de novas armas inteligentes, com vista à exportação do seu estilo de vida e modelo de democracia. Talvez por isso já tenham aparecido os idiotas do costume, emproados, engravatados e bem instalados no sistema, sugerindo que seja arrazado o que resta daquela que é (ou foi) uma das cidades mais carismáticas dos EUA, como se estivéssemos numa qualquer missão nos confins do Afeganistão, a levar a cabo uma preparatória demolição com tapetes de bombas.

terça-feira, setembro 06, 2005

Os Estados Interessantes

Ser estúpido é uma limitação da natureza humana, com que temos de conviver, ao passo que ser ignorante é um estado que pode ser superável com alguma aprendizagem. Porém, é preciso ter cuidados redobrados, quando a esperteza se disfarça de inteligência, com a intenção de nos iludir ou fazer passar por parvos. Foi talvez o que se passou quando o ultraconservador pastor tele-evangelista Pat Robertson, ex-candidato presidencial e actual grande apoiante de G.W.Bush, sugeriu que o governo dos EUA, deveria promover a liquidação física do presidente venezuelano Hugo Chavez, para eliminar aquilo que ele pensa ser um foco de terrorismo e comunismo. As gravidezes de fundamentalismo religioso e de política neofascista, dão sempre abortos deste tipo.

sábado, setembro 03, 2005

A Sequela

Esta história verídica, teve o seu primeiro episódio em Outubro de 2002, tendo-a eu então revertido para um artigo que intitulei “A Inesgotável Imaginação”. Dizia eu, nessa altura, que os gatunos, malfeitores e vigaristas, entre os quais eu incluo algumas instituições bancárias, recorrem a processos e artes, uns mais subtis do que outros, com o objectivo de ludibriar os cidadãos. Não basta repetir que anda meio mundo a enganar o outro meio. Há que fugir deles, ou então estar de permanente sobreaviso. Foi o que se passou comigo e um banco onde guardava algumas economias.
A dita instituição bancária tinha por mau costume não reportar nos extractos de conta que periodicamente enviava aos depositantes, os depósitos a prazo que eventualmente se encontravam agregados à conta à ordem. Pior ainda. Quando os depósitos a prazo se venciam ou eram resgatados, a instituição bancária abria, por sua iniciativa, e sem disso dar conhecimento ao cliente, uma nova conta à ordem que também não aparecia nos extractos, e onde a consabida instituição despejava o valor do tal depósito a prazo, e cuja operação de transferência não aparecia reflectida nos movimentos. Se na dúvida fossemos até à caixa Multibanco mais próxima e pedissemos um saldo de conta, nada transpirava. O dinheiro estava bem escondido e a recato, não se manifestando sequer na habitual diferença entre saldo efectivo e saldo contabilístico. Não houve roubo, não senhor, apenas um ligeiro desvio. O pé-de-meia continuava lá na tal instituição bancária, mas tão invisível e dissimulado, que só os conhecedores do ardil sabiam onde parava. Se o cliente não exercesse um apertado controle sobre os valores que deixava à guarda da dita instituição, corria o risco de ser detentor de um sem-número de contas, com uma existência muito próxima da clandestinidade, e com passaporte garantido para o esquecimento. Para cúmulo, a instituição apenas disponibilizava os valores deste tipo de contas (apelidadas de conta-investimento) se o cliente se dirigisse pessoalmente ao balcão (seja de cadeira de rodas ou amparado a muletas), e pedisse “encarecidamente” que os valores residentes nas tais contas-fantasma passassem para a conta à ordem tradicional. Falta acrescentar que as vítimas desta artimanha podiam ser pessoas idosas, acamadas ou com problemas de visão, umas menos vocacionadas para controles apertados do seu pecúlio, outras mais distraídas ou demasiado confiantes que, sem darem conta ou saberem como, corriam o risco de serem esbulhadas (ou os seus herdeiros), de forma silenciosa e indolor, fazendo lembrar o silêncio tumular que se abateu sobre os pecúlios dos judeus vítimas do holocausto nazi, depositados em contas de bancos suiços. Dizia eu, nessa altura, que a imaginação e criatividade dos salteadores é inesgotável, fossem eles vigaristas de meia-tijela ou insuspeitas e respeitáveis instituições bancárias, de porta aberta e nome firmado, restando-nos ficar atentos e de sobreaviso. Escusado será dizer que reclamei de tal procedimento, e o dinheiro foi transferido para a conta à ordem tradicional.

Ora esta história não terminou aqui. Tem uma sequela.
Naturalmente desconfiado de quem recorria a processos tão dúbios e pouco ortodoxos, para com os bens alheios, ao longo destes três últimos anos fui retirando dinheiro da tal conta, sempre com a intenção de a deixar extinguir-se, o que veio a acontecer há perto de quinze dias, quando passei um último cheque de 30 Euros, baseado no saldo exibido pelo último extrato de conta. Dias depois, qual não é o meu espanto quando recebo em casa uma carta do tal banco, informando-me que este “estimado cliente” se encontrava em maus lençóis, em virtude de ter emitido um cheque sem provisão, que aquilo era um crime grave, muito embora o banco tivesse aceite o cheque, e que se não regularizasse a situação, o meu nome entraria na lista nacional dos portugueses passadores de cheques sem cobertura, logo, daí para a frente, sem direito aos ditos, fosse de que banco fosse. Caí das nuvens! Em boa verdade, as minhas relações com aquele banco nunca tinham sido as melhores, pontuadas aqui e ali, por episódios rocambolescos. Em vez de viver descansado e em paz, o pouco dinheiro que por lá tinha guardado, periódicamente, tornara-se uma fonte de sobressaltos e preocupações. Assim, mais uma vez, meti-me ao caminho, para tirar a limpo o que se passava.
Lá chegado, fui atendido, contei a história do cheque, exibi os meus papéis e pedi explicações. O solícito funcionário consultou computadores, torceu o nariz, leu e tornou a reler os meus papéis, que afinal eram documentos do próprio banco, e acabou por sentenciar:
- Mas afinal o senhor não passou cheque nenhum! Aqui a sua conta ainda tem um saldo de 30 Euros e não há sinal do seu cheque, exclamou o funcionário mostrando-me um “print” ainda fresquinho, acabado de sair da impressora.
- Ai passei, passei! Então como explica a carta que o banco me enviou? Atalhei eu, a principiar a sentir-me embrulhado numa qualquer cabala de mau gosto.
- Lá isso é verdade! Só mais um momento, isto tem que ter uma explicação, atalhou o confundido funcionário.
- Também acho que sim... ripostei eu.
Foram feitas mais consultas ao computador, inquirido o chefe que encolheu os ombros, e efectuados dois telefonemas para um qualquer departamento “especializado” em embróglios, que dez minutos depois, acabou por fornecer a chave do mistério.
- Está explicado! Veio esclarecer finalmente o funcionário. O seu cheque foi indevidamente lançado numa antiga conta-investimento que estava a zeros, e por força disso ficou com o saldo negativo. Daí a razão desta antipática cartinha...
Ah bem, afinal sempre era aquela famigerada conta fantasma, criada há três anos atrás, que ainda andava a fazer maldades, disse eu para os meus botões.
- Bem, quero que regularizem esta situação, e depois vamos cancelar a conta, respondi eu. Para uma insignificante conta bancária, alojada num banco tão pouco fiável e confiável, já vai sendo altura de acabar com esta tendência para a proliferação de sequelas.