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quinta-feira, dezembro 13, 2012

Inesgotável Sophia


Poema inserto num texto em prosa inédito de Sophia de Mello Breyner Andresen, publicado na revista LER de Dezembro de 2012, com o título (atribuído por aquela publicação)"A casa desmedida".

«(...)
Mergulhávamos nos fetos como em ondas, fingíamos nadar, o que nos divertia infinitamente e me punha em grande estado de euforia - saltávamos, ríamos, mergulhávamos entre as folhas ásperas dos fetos, rente ao perfume da terra. Lá em cima baloiçavam as grandes copas dos pinheiros mansos. De repente passavam bandos de pássaros. Estalavam ramos, tudo estava cheio de murmúrios. Ao longe avistava-se o mar brilhante e o friso branco das espumas. Tomar banho nos fetos do pinhal como tomar banho de mar na praia, era a nossa união com a felicidade do terrestre.

Passavam pelos ares aves repentinas
O cheiro da terra era fundo e amargo
E ao longe as cavalgadas do mar largo
Sacudiam na areia as suas crinas

(...)»

segunda-feira, agosto 20, 2012

Reler Sophia - Painéis do Infante


Píncipes do silêncio ó taciturnos
Por quem chamava nos longínquos céus nocturnos
A verdade das estrelas nunca vista.

A vossa face é a face dos elementos,
Solitária como o mar e como os montes
Vinda do fundo de tudo como as fontes
Dura e pura como os ventos.

Poema de Sophia de Mello Breyner Andresen in Dia do Mar, 1947
Ilustração: detalhe dos painéis de Nuno Gonçaves

domingo, julho 15, 2012

Reler Sophia – Manhã de Julho


Na praça barão de Quintela
Nesta enevoada manhã de Julho
Onde cai às vezes chuva leve e fina
Ente montras sardinheiras e as esquinas
Tudo parece um desenho animado:
Pessoas passam – jovens ágeis matutinas
Movidas como por gratuito jogo
Em idílicas harmonias citadinas

Poema de Sophia de Mello Breyner Andresen in Musa, Julho de 1994

segunda-feira, julho 02, 2012

Reler Sophia - As Rosas


Quando à noite desfolho e trinco as rosas
É como se prendesse entre os meus dentes
Todo o luar das noites transparentes,
Todo o fulgor das tardes luminosas,
O vento bailador das Primaveras,
A doçura amarga dos poentes,
E a exaltação de todas as esperas.

Poema de Sophia de Mello Breyner Andresen in Dia do Mar, 1947

sexta-feira, abril 08, 2011

As Grades – Exílio

Quando a pátria que temos não a temos
Perdida por silêncio e por renúncia
Até a voz do mar se torna exílio
E a luz que nos rodeia é como grades

Sophia de Mello Breyner Andresen – Livro Sexto

quarta-feira, março 23, 2011

II – Jardim

Alguém diz:
«Aqui antigamente ouve roseiras» -
Então as horas
Afastam-se estrangeiras,
Como se o tempo fosse feito de demoras.

Sophia de Mello Breyner Andresen – Poesia

sábado, março 05, 2011

Deriva - VIII

Vi as águas os cabos vi as ilhas
E o longo baloiçar dos coqueirais
Vi lagunas azuis como safiras
Rápidas aves furtivos animais
Vi prodígios espantos maravilhas
Vi homens nus bailando nos areais
E ouvi o fundo som de suas falas
Que já nenhum de nós entendeu mais
Vi ferros e vi setas e vi lanças
Oiro também à flor das ondas finas
E o diverso fulgor de outros metais
Vi pérolas e conchas e corais
Desertos fontes trémulas campinas
Vi o rosto de Eurydice das neblinas
Vi o frescor das coisas naturais
Só do Preste João não vi sinais

As ordens que levava não cumpri
E assim contando tudo quanto vi
Não sei se tudo errei ou descobri

Sophia de Mello Breyner Andresen – Navegações – 1982

sábado, janeiro 15, 2011

Eu contarei a beleza das estátuas

Eu contarei a beleza das estátuas –
Seus gestos imóveis ordenados e frios –
E falarei do rosto dos navios

Sem que ninguém desvende outros segredos
Que nos meus braços correm como rios
E enchem de sangue a ponta dos meus dedos.

Poema de Sophia de Mello Breyner Andresen – No Tempo Dividido

sexta-feira, dezembro 17, 2010

Eterno Mar de Sophia

Um homem de olhos fechados procurando
Dentro de si memória do seu nome
Um homem na memória caminhando
O silêncio em silêncio derivando
E a onda
Ora o abandonava ora o cobria

Com vagos olhos contemplava o dia
Em seus ouvidos
Como um longínquo búzio o mar gemia
Líquida e fria
Uma mão sobre os seus ombros escorria
Era a onda
Que ora o abandonava ora o cobria

Um homem só n’areia lisa inerte
Na orla dansada do mar
Nos seus cinco sentidos devagar
A presença das coisas principia

No branco nevoeiro a deusa o via
Solitário erguendo-se do mar
Os cabelos com algas misturados
Os ombros luminosos e molhados

O seu corpo era como uma coluna
Sustentando o equilíbrio dos espaços
Água e luz corriam dos seus braços
E uma onda quebrada percorria
O rasto que deixavam os seus passos.

Fragmento de um poema inédito de Sophia de Mello Breyner Andresen, escrito provavelmente nos anos 50 do século passado, encontrado entre outros papéis do seu espólio, e cedido por sua filha Maria Sousa Tavares. Foi publicado na revista ÚNICA do semanário EXPRESSO, em 4 de Dezembro de 2010. A ilustração e o título do post são de minha autoria.