A NOITE passada, assediado pela espertina, tive sonhos acordados. Começei a desbobinar memórias e leituras antigas, a recombinar factos, a tecer hipóteses, a congeminar conspirações, e como não consigo estar deitado de olhos abertos a esquadrinhar no escuro, confrontado com tanta inspiração, levantei-me e sentei-me ao teclado a escrevinhar. E concluí que 73 anos depois de Adolf Hitler ter decidido fazer avançar as suas divisões, para conquistar a Europa, disposto a colocá-la sob o jugo do III Reich, coisa que não conseguiu concretizar, por ser um campónio alucinado, convencido que ao jogar em todos os tabuleiros, a sorte e os deuses se vergariam à sua vontade, a história se estava a repetir, embora sob outras formas.
A Alemanha de Angela Merkel, voz tonitruante de uma Europa que ( diz ela) quer ser potência no concerto mundial, faz nova investida, e não precisa de recorrer aos métodos antigos, grande derramador de sangue, consumidor de recursos e de êxito não comprovado. Desta vez, 73 anos depois da investida do tio Adolfo, sem precisar da orientação doutrinária do "Mein Kampf", sem o blitzkrieg das divisões Panzer, sem esquadrões de SS, sem Gestapo, sem campos de concentração, sem câmaras de gás, tudo muito mais democrático, semeado de beijinhos e de cimeiras, para manter os espíritos calmos e serenos, uma mulher de perfil ariano, dá ordens, põe e dispõe, faz ultimatos, apostada em tomar conta, de vez, desta ingénua e fugidia Europa.
Passo a passo, sob a batuta de Angela e Sarkozy, o seu “compagnon de route” de circunstância, todos os países da Europa cairão no logro, esmifrando os défices, austeritando-se, empobrecendo-se, até se tornarem simples protectorados, governados por tantas troikas quantas as necessárias, telecomandadas pela inflexível Angela, expandindo-se como hera asfixiante, tudo abafando, tudo mirrando à sua volta, até que volte a despontar aquela insepulta ideia do Reich dos Mil Anos.
As noites de insónia produzem disto: recordações, alucinações e sei lá mais o quê. Mais umas quantas ideias loucas, sem eira nem beira, que me deixam a pensar que sou, entre atrevido e insone, um fazedor de histórias improváveis.
Entretanto, com o despontar da manhã, e já depois de ter garatujado este delírio, leio nas notícias que Christine Lagarde, a presidente em exercício do FMI, discursando perante o Conselho Alemão de Relações Externas, em Berlim, declarou que era necessário os políticos fazerem o que tem que ser feito, para evitarem na zona euro, uma situação semelhante àquela que se verificou nos anos 30 do século passado, isto é, decidirem se querem apenas salvar um país ou uma região, ou se querem salvar o mundo. O que é que ela quererá dizer com isto?