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Declaração política em defesa da liberdade de manifestação
Intervenção de António Filipe (deputado do PCP) na AR em 2009 Janeiro 22
“Senhor Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados,
Subimos hoje a esta tribuna em defesa da liberdade de manifestação. É insólito ter de o fazer quase 35 anos depois do 25 de Abril, mas a vida a isso nos obriga.
Teve lugar anteontem em Guimarães uma audiência de julgamento de um processo em que são arguidos quatro dirigentes da União dos Sindicatos de Braga, acusados de desobediência qualificada pelo Governador Civil, por alegadamente terem promovido uma manifestação ilegal.
O caso é que o Governador Civil de Braga, na véspera da realização de uma greve geral, e oito meses depois de uma acção popular de protesto contra a política do Governo em Guimarães, mandou a PSP processar criminalmente quatro dirigentes sindicais sob a acusação de terem promovido uma manifestação não autorizada. Perante o arquivamento do processo, o mesmo Governador Civil assumiu ter pressionado o Ministério Público para forçar a sua reabertura.
Também, anteontem mesmo, três cidadãos pertencentes ao Movimento de Utentes de Transportes Públicos da Área Metropolitana do Porto foram ouvidos pelo Ministério Público, por terem sido acusados pela governadora civil de terem promovido uma manifestação ilegal porque, alegadamente, o número de subscritores da comunicação ao Governo Civil seria inferior ao exigido por lei.
Também no Porto, três dirigentes da União dos Sindicatos, incluindo o respectivo coordenador, foram notificados de um processo que existe contra si por, alegadamente, terem participado numa manifestação ilegal, e esta semana, ainda no Porto, uma jovem estudante de 18 anos foi ouvida pela PSP e pelo Ministério Público sob a acusação de uma alegada desobediência, por terem promovido uma manifestação em que cumpriram todas as exigências legais. Simplesmente, a Governadora Civil do Porto arrogou-se o direito de ser ela a decidir o trajecto da manifestação e comunicou-o à PSP, sem sequer se ter dado ao trabalho de o comunicar aos manifestantes, que foram acusados de desobediência por se terem manifestado, seguindo o percurso que tinham comunicado ao Governo Civil.
Estes casos somam-se infelizmente a outros. Foi o caso da Governadora Civil de Lisboa, que pretendeu proibir a montagem simbólica de tendas por agricultores, junto da Assembleia da República, com o argumento caricato de que a montagem de tendas só pode ser feita em parques de campismo. Foi o caso da decisão tomada pelo comando da PSP de avançar com um processo-crime contra dois dirigentes do PCP, sob a acusação de terem promovido uma manifestação ilegal, por terem entregado um abaixo-assinado na residência oficial do Primeiro-Ministro. Foi o caso da Governadora Civil de Castelo Branco, que achou normal que a PSP se tenha deslocado ao Sindicato dos Professores na Covilhã para obter informações sobre a manifestação que reuniu em Lisboa mais de 100.000 professores contra o regime de avaliação. Foi o caso grotesco, passado em Montemor-o-Velho, onde o Secretário-Geral da FENFROF, Mário Nogueira, ao passar por uma manifestação de agricultores, foi identificado pela GNR, por ser conhecido, e foi constituído arguido.
Senhor Presidente,
Senhores Deputados,
A atitude persecutória dos governadores civis e de algumas autoridades policiais, por cuja actuação o Governo é inteiramente responsável, perante o exercício legítimo do direito de manifestação é absolutamente intolerável. A democracia não suporta estas atitudes prepotentes. O exercício do direito de manifestação tem uma protecção constitucional directa que não pode ser limitada por governantes agastados com o protesto popular contra as suas políticas ou por governadores civis que convivem mal com as liberdades democráticas e que pensam que o exercício do direito de manifestação depende da sua autorização.
Era bom que o Ministro da Administração Interna, enquanto responsável político pela actuação dos governadores civis, mandasse afixar na parede dos seus gabinetes, em local bem visível, o artigo 45.º da Constituição, onde se pode ler que os cidadãos têm o direito de se reunir, pacificamente e sem armas, mesmo em lugares abertos ao público, sem necessidade de qualquer autorização e que a todos os cidadãos é reconhecido o direito de manifestação.
O problema é que há governadores civis que se arrogam o direito de autorizar manifestações, de definir os respectivos trajectos, de questionar os manifestantes sobre as palavras de ordem e de ordenar actuações policiais contra cidadãos que se manifestam, e que não ignoram, porque não podem ignorar, que estão a actuar à da Constituição e da lei.
Não ignoram, porque não podem ignorar, que a lei que regula o direito de manifestação, e que fixa os respectivos trâmites legais, não foi feita para limitar ou condicionar o direito de manifestação, mas bem pelo contrário, foi feita para garantir o seu exercício. Em democracia, não há manifestações pacíficas que sejam ilegais ou que precisem de ser autorizadas seja por quem for.
O problema é que para o Governo e para os governadores civis a seu mando há dois tipos de manifestantes. Os que aplaudem os membros do Governo são manifestantes bons: podem manifestar-se sem autorização e têm direito a passadeira vermelha e protecção policial. Os que protestam contra as políticas do Governo, à mesma hora e no mesmo local, são manifestantes maus: cometem crimes de desobediência, são incomodados pela polícia, são alvo de intimidações policiais, são acusados e levados a tribunal porque se manifestaram sem autorização.
Não é tolerável que no Portugal democrático o legítimo protesto social seja levado ao banco dos réus por acção de responsáveis políticos.
A Assembleia da República, enquanto órgão de soberania representativo de todos os portugueses, não pode deixar de assumir as suas responsabilidades quando há cidadãos que são levados a tribunal sob a única acusação de terem cometido o crime de exercer os direitos cívicos e políticos que a Constituição lhes confere.
Anuncio por isso que o Grupo Parlamentar do PCP vai requerer a comparência dos governadores civis de Lisboa, Porto e Braga na Comissão Parlamentar de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, para os questionar sobre as atitudes persecutórias que têm vindo a desenvolver contra o legítimo exercício do direito de manifestação, e esperamos que esta iniciativa conte com o apoio de todos os Deputados que se prezam de respeitar as liberdades públicas e os direitos dos cidadãos.
Disse.”
Declaração política em defesa da liberdade de manifestação
Intervenção de António Filipe (deputado do PCP) na AR em 2009 Janeiro 22
“Senhor Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados,
Subimos hoje a esta tribuna em defesa da liberdade de manifestação. É insólito ter de o fazer quase 35 anos depois do 25 de Abril, mas a vida a isso nos obriga.
Teve lugar anteontem em Guimarães uma audiência de julgamento de um processo em que são arguidos quatro dirigentes da União dos Sindicatos de Braga, acusados de desobediência qualificada pelo Governador Civil, por alegadamente terem promovido uma manifestação ilegal.
O caso é que o Governador Civil de Braga, na véspera da realização de uma greve geral, e oito meses depois de uma acção popular de protesto contra a política do Governo em Guimarães, mandou a PSP processar criminalmente quatro dirigentes sindicais sob a acusação de terem promovido uma manifestação não autorizada. Perante o arquivamento do processo, o mesmo Governador Civil assumiu ter pressionado o Ministério Público para forçar a sua reabertura.
Também, anteontem mesmo, três cidadãos pertencentes ao Movimento de Utentes de Transportes Públicos da Área Metropolitana do Porto foram ouvidos pelo Ministério Público, por terem sido acusados pela governadora civil de terem promovido uma manifestação ilegal porque, alegadamente, o número de subscritores da comunicação ao Governo Civil seria inferior ao exigido por lei.
Também no Porto, três dirigentes da União dos Sindicatos, incluindo o respectivo coordenador, foram notificados de um processo que existe contra si por, alegadamente, terem participado numa manifestação ilegal, e esta semana, ainda no Porto, uma jovem estudante de 18 anos foi ouvida pela PSP e pelo Ministério Público sob a acusação de uma alegada desobediência, por terem promovido uma manifestação em que cumpriram todas as exigências legais. Simplesmente, a Governadora Civil do Porto arrogou-se o direito de ser ela a decidir o trajecto da manifestação e comunicou-o à PSP, sem sequer se ter dado ao trabalho de o comunicar aos manifestantes, que foram acusados de desobediência por se terem manifestado, seguindo o percurso que tinham comunicado ao Governo Civil.
Estes casos somam-se infelizmente a outros. Foi o caso da Governadora Civil de Lisboa, que pretendeu proibir a montagem simbólica de tendas por agricultores, junto da Assembleia da República, com o argumento caricato de que a montagem de tendas só pode ser feita em parques de campismo. Foi o caso da decisão tomada pelo comando da PSP de avançar com um processo-crime contra dois dirigentes do PCP, sob a acusação de terem promovido uma manifestação ilegal, por terem entregado um abaixo-assinado na residência oficial do Primeiro-Ministro. Foi o caso da Governadora Civil de Castelo Branco, que achou normal que a PSP se tenha deslocado ao Sindicato dos Professores na Covilhã para obter informações sobre a manifestação que reuniu em Lisboa mais de 100.000 professores contra o regime de avaliação. Foi o caso grotesco, passado em Montemor-o-Velho, onde o Secretário-Geral da FENFROF, Mário Nogueira, ao passar por uma manifestação de agricultores, foi identificado pela GNR, por ser conhecido, e foi constituído arguido.
Senhor Presidente,
Senhores Deputados,
A atitude persecutória dos governadores civis e de algumas autoridades policiais, por cuja actuação o Governo é inteiramente responsável, perante o exercício legítimo do direito de manifestação é absolutamente intolerável. A democracia não suporta estas atitudes prepotentes. O exercício do direito de manifestação tem uma protecção constitucional directa que não pode ser limitada por governantes agastados com o protesto popular contra as suas políticas ou por governadores civis que convivem mal com as liberdades democráticas e que pensam que o exercício do direito de manifestação depende da sua autorização.
Era bom que o Ministro da Administração Interna, enquanto responsável político pela actuação dos governadores civis, mandasse afixar na parede dos seus gabinetes, em local bem visível, o artigo 45.º da Constituição, onde se pode ler que os cidadãos têm o direito de se reunir, pacificamente e sem armas, mesmo em lugares abertos ao público, sem necessidade de qualquer autorização e que a todos os cidadãos é reconhecido o direito de manifestação.
O problema é que há governadores civis que se arrogam o direito de autorizar manifestações, de definir os respectivos trajectos, de questionar os manifestantes sobre as palavras de ordem e de ordenar actuações policiais contra cidadãos que se manifestam, e que não ignoram, porque não podem ignorar, que estão a actuar à da Constituição e da lei.
Não ignoram, porque não podem ignorar, que a lei que regula o direito de manifestação, e que fixa os respectivos trâmites legais, não foi feita para limitar ou condicionar o direito de manifestação, mas bem pelo contrário, foi feita para garantir o seu exercício. Em democracia, não há manifestações pacíficas que sejam ilegais ou que precisem de ser autorizadas seja por quem for.
O problema é que para o Governo e para os governadores civis a seu mando há dois tipos de manifestantes. Os que aplaudem os membros do Governo são manifestantes bons: podem manifestar-se sem autorização e têm direito a passadeira vermelha e protecção policial. Os que protestam contra as políticas do Governo, à mesma hora e no mesmo local, são manifestantes maus: cometem crimes de desobediência, são incomodados pela polícia, são alvo de intimidações policiais, são acusados e levados a tribunal porque se manifestaram sem autorização.
Não é tolerável que no Portugal democrático o legítimo protesto social seja levado ao banco dos réus por acção de responsáveis políticos.
A Assembleia da República, enquanto órgão de soberania representativo de todos os portugueses, não pode deixar de assumir as suas responsabilidades quando há cidadãos que são levados a tribunal sob a única acusação de terem cometido o crime de exercer os direitos cívicos e políticos que a Constituição lhes confere.
Anuncio por isso que o Grupo Parlamentar do PCP vai requerer a comparência dos governadores civis de Lisboa, Porto e Braga na Comissão Parlamentar de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, para os questionar sobre as atitudes persecutórias que têm vindo a desenvolver contra o legítimo exercício do direito de manifestação, e esperamos que esta iniciativa conte com o apoio de todos os Deputados que se prezam de respeitar as liberdades públicas e os direitos dos cidadãos.
Disse.”