A
terça-feira, novembro 27, 2007
Opinião a Reter
O
“Numa escola pública de Lisboa, cada aluno tem por missão verificar o que come cada colega, sobretudo se petisca guloseimas. Seguidamente, cada um destes vigilantes dá conta das suas averiguações ao professor de Educação Cívica. Presume-se que, da posse dessas informações, o dito professor tirará matéria para mostrar os benefícios da boa alimentação.
…
Os meninos de hoje não devem ser menos prosélitos do que os seus antepassados da Mocidade e dos Pioneiros. A alimentação deve preocupá-los, tal como os contaminantes comunistas e fascistas ocuparam o imaginário dos seus avós e pais.
…
Dentro de algum tempo será a vez de quererem regular as opiniões. Aí não falarão de segurança alimentar mas sim de pornografia, dos sites perigosos, dos blogues… E, nesse dia, que não vem longe, nas aulas de Formação Cívica, cada aluno será responsável por ver e relatar o que faz cada colega quando se liga à Internet.”
“Numa escola pública de Lisboa, cada aluno tem por missão verificar o que come cada colega, sobretudo se petisca guloseimas. Seguidamente, cada um destes vigilantes dá conta das suas averiguações ao professor de Educação Cívica. Presume-se que, da posse dessas informações, o dito professor tirará matéria para mostrar os benefícios da boa alimentação.
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Os meninos de hoje não devem ser menos prosélitos do que os seus antepassados da Mocidade e dos Pioneiros. A alimentação deve preocupá-los, tal como os contaminantes comunistas e fascistas ocuparam o imaginário dos seus avós e pais.
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Dentro de algum tempo será a vez de quererem regular as opiniões. Aí não falarão de segurança alimentar mas sim de pornografia, dos sites perigosos, dos blogues… E, nesse dia, que não vem longe, nas aulas de Formação Cívica, cada aluno será responsável por ver e relatar o que faz cada colega quando se liga à Internet.”
A
Helena Matos, in INFELIZMENTE ELES NÃO ESTÃO DOIDOS, jornal Público de 2007-Nov-26
Helena Matos, in INFELIZMENTE ELES NÃO ESTÃO DOIDOS, jornal Público de 2007-Nov-26
segunda-feira, novembro 26, 2007
Carta Aberta
C
Carta aberta ao Senhor Presidente da República Portuguesa
Ílhavo, 22 de Outubro de 2007
Senhor Presidente da República Portuguesa
Excelência:
Disse V. Excia, no discurso do passado dia 5 de Outubro, que os professores precisavam de ser dignificados e eu ouso acrescentar: “Talvez V. Excia não saiba bem quanto!”
1. Sou professor há mais de trinta e seis anos e no ano passado tive o primeiro contacto com a maior mentira e o maior engano (não lhe chamo fraude porque talvez lhe falte a “má-fé”) do ensino em Portugal que dá pelo nome de Cursos de Educação e Formação (CEF).
A mentira começa logo no facto de dois anos nestes cursos darem equivalência ao 9º ano, isto é, aldrabando a Matemática, dois é igual a três!
Um aluno pode faltar dez, vinte, trinta vezes a uma ou a várias disciplinas (mesmo estando na escola) mas, com aulas de remediação, de recuperação ou de compensação (chamem-lhe o que quiserem mas serão sempre sucedâneos de aulas e nunca aulas verdadeiras como as outras) fica sem faltas. Pode ter cinco, dez ou quinze faltas disciplinares, pode inclusive ter sido suspenso que no fim do ano fica sem faltas, fica puro e imaculado como se nascesse nesse momento.
Qual é a mensagem que o aluno retira deste procedimento? Que pode fazer tudo o que lhe apetecer que no final da ano desce sobre ele uma luz divina que o purifica ao contrário do que na vida acontece. Como se vê claramente não pode haver melhor incentivo à irresponsabilidade do que este.
2. Actualmente sinto vergonha de ser professor porque muitos alunos podem este ano encontrar-me na rua e dizerem: ”Lá vai o palerma que se fartou de me dizer para me portar bem, que me dizia que podia reprovar por faltas e, afinal, não me aconteceu nada disso. Grande estúpido!”
3. É muito fácil falar de alunos problemáticos a partir dos gabinetes mas a distância que vai deles até às salas de aula é abissal. E é-o porque quando os responsáveis aparecem numa escola levam atrás de si (ou à sua frente, tanto faz) um magote de televisões e de jornais que se atropelam uns aos outros. Deviam era aparecer nas escolas sem avisar, sem jornalistas, trazer o seu carro particular e não terem lugar para estacionar como acontece na minha escola.
Quando aparecem fazem-no com crianças escolhidas e pagas por uma empresa de “casting” para ficarem bonitos (as crianças e os governantes) na televisão.
Os nossos alunos não são recrutados dessa maneira, não são louros, não têm caracóis no cabelo nem vestem roupa de marca.
Os nossos alunos entram na sala de aula aos berros e aos encontrões, trazem vestidas camisolas interiores cavadas, cheiram a suor e a outras coisas e têm os dentes em mísero estado.
Os nossos alunos estão em estado bruto, estão tal e qual a Natureza os fez, cresceram como silvas que nunca viram uma tesoura de poda. Apesar de terem 15/16 anos parece que nunca conviveram com gente civilizada.
Não fazem distinção entre o recreio e o interior da sala de aula onde entram de boné na cabeça, “headphones” nos ouvidos continuando as conversas que traziam do recreio.
Os nossos alunos entram na sala, sentam-se na cadeira, abrem as pernas, deixam-se escorregar pela cadeira abaixo e não trazem nem esferográfica nem uma folha de papel onde possam escrever seja o que for.
Quando lhes digo para se sentarem direitos, para se desencostarem da parede, para não se virarem para trás olham-me de soslaio como que a dizer “Olha-me este!” e passados alguns segundos estão com as mesmas atitudes.
4. Eu não quero alunos perfeitos. Eu quero apenas alunos normais!!!
Alunos que ao serem repreendidos não contradigam o que eu disse e que ao serem novamente chamados à razão não voltem a responder querendo ter a última palavra desafiando a minha autoridade, não me respeitando nem como pessoa mais velha nem como professor. Se nunca tive de aturar faltas de educação aos meus filhos por que é que hei-de aturar faltas de educação aos filhos dos outros? O Estado paga-me para ensinar os alunos, para os educar e ajudar a crescer; não me paga para os aturar! Quem vai conseguir dar aulas a alunos destes até aos 65 anos de idade?
Actualmente só vai para professor quem não está no seu juízo perfeito mas se o estiver, em cinco anos (ou cinco meses bastarão?...) os alunos se encarregarão de lhe arruinar completamente a sanidade mental.
Eu quero alunos que não falem todos ao mesmo tempo sobre coisas que não têm nada a ver com as aulas e quando peço a um que se cale ele não me responda: “Por que é que me mandou calar a mim? Não vê os outros também a falar?”
Eu quero alunos que não façam comentários despropositados de modo a que os outros se riam e respondam ao que eles disseram ateando o rastilho da balbúrdia em que ninguém se entende.
Eu quero alunos que não me obriguem a repetir em todas as aulas “Entram, sentam-se e calam-se!”
Eu quero alunos que não usem artes de ventríloquo para assobiar, cantar, grunhir, mugir, roncar e emitir outros sons. É claro que se eu não quisesse dar mais aula bastaria perguntar quem tinha sido e não sairia mais dali pois ninguém assumiria a responsabilidade.
Eu quero alunos que não desconheçam a existência de expressões como “obrigado”, “por favor” e “desculpe” e que as usem sempre que o seu emprego se justifique.
Eu quero alunos que ao serem chamados a participar na aula não me olhem com enfado dizendo interiormente “Mas o que é que este quer agora?” e demorem uma eternidade a disponibilizar-se para a tarefa como se me estivessem a fazer um grande favor. Que fique bem claro que os alunos não me fazem favor nenhum em estarem na aula e a portarem-se bem.
Eu quero alunos que não estejam constantemente a receber e a enviar mensagens por telemóvel e a recusarem-se a entregar-mo quando lho peço para terminar esse contacto com o exterior pois esse aluno “não está na sala”, está com a cabeça em outros mundos.
Eu sou um trabalhador como outro qualquer e como tal exijo condições de trabalho! Ora, como é que eu posso construir uma frase coerente, como é que eu posso escolher as palavras certas para ser claro e convincente se vejo um aluno a balouçar-se na cadeira, outro virado para trás a rir-se, outro a mexer no telemóvel e outro com a cabeça pousada na mesa a querer dormir?
Quando as aulas são apoiadas por fichas de trabalho gostaria que os alunos, ao sair da sala, não as amarrotassem e deitassem no cesto do lixo mesmo à minha frente ou não as deixassem “esquecidas” em cima da mesa.
Nos últimos cinco minutos de uma aula disse aos alunos que se aproximassem da secretária pois iria fazer uma experiência ilustrando o que tinha sido explicado e eles puseram os bonés na cabeça, as mochilas às costas e encaminharam-se todos em grande conversa para a porta da sala à espera que tocasse. Disse-lhes: “Meus meninos, a aula ainda não acabou! Cheguem-se aqui para verem a experiência!” mas nenhum deles se moveu um milímetro!!!
Como é possível, com alunos destes, criar a empatia necessária para uma aula bem sucedida?
É por estas e por outras que eu NÃO ADMITO A NINGUÉM, RIGOROSAMENTE A NINGUÉM, que ouse pensar, insinuar ou dizer que se os meus alunos não aprendem a culpa é minha!!!
5. No ano passado tive uma turma do 10º ano dum curso profissional em que um aluno, para resolver um problema no quadro, tinha de multiplicar 0,5 por 2 e este virou-se para os colegas a perguntar quem tinha uma máquina de calcular!!! No mesmo dia e na mesma turma outro aluno também pediu uma máquina de calcular para dividir 25,6 por 1. Estes alunos podem não saber efectuar estas operações sem máquina e talvez tenham esse direito. O que não se pode é dizer que são alunos de uma turma do 10º ano!!!
Com este tipo de qualificação dada aos alunos não me admira que, daqui a dois ou três anos, estejamos à frente de todos os países europeus e do resto do mundo. Talvez estejamos só que os alunos continuarão a ser brutos, burros, ignorantes e desqualificados mas com um diploma!!!
6. São estes os alunos que, ao regressarem à escola, tanto orgulho dão ao Governo. Só que ninguém diz que os Cursos de Educação e Formação são enormes ecopontos (não sejamos hipócritas nem tenhamos medo das palavras) onde desaguam os alunos das mais diversas proveniências e com histórias de vida escolar e familiar de arrepiar desde várias repetências e inúmeras faltas disciplinares até famílias irresponsáveis.
Para os que têm traumas, doenças, carências, limitações e dificuldades várias há médicos, psicólogos, assistentes sociais e outros técnicos, em quantidade suficiente, para os ajudar e complementar o trabalho dos professores?
Há alunos que têm o sublime descaramento de dizer que não andam na escola para estudar mas para “tirar o 9º ano”.
Outros há que, simplesmente, não sabem o que andam a fazer na escola…
E, por último, existem os que se passeiam na escola só para boicotar as aulas e para infernizar a vida aos professores. Quem é que consegue ensinar seja o que for a alunos destes? E por que é que eu tenho de os aturar numa sala de aula durante períodos de noventa e de quarenta e cinco minutos por semana durante um ano lectivo? A troco de quê? Da gratidão da sociedade e do reconhecimento e do apreço do Ministério não é, de certeza absoluta!
7. Eu desafio seja quem for do Ministério da Educação (ou de outra área da sociedade) a enfrentar (o verbo é mesmo esse, “enfrentar”, já que de uma luta se trata…), durante uma semana apenas, uma turma destas sozinho, sem jornalistas nem guarda-costas, e cumprir um horário de professor tentando ensinar um assunto qualquer de uma unidade didáctica do programa escolar.
Eu quero saber se ao fim dessa semana esse ilustre voluntário ainda estará com vontade de continuar. E não me digam que isto é demagogia porque demagogia é falar das coisas sem as conhecer e a realidade escolar está numa sala de aula com alunos de carne, osso e odores e não num gabinete onde esses alunos são números num mapa de estatística e eu sei perfeitamente que o que o Governo quer são números para esse mapa, quer os alunos saibam estar sentados numa cadeira ou não (saber ler e explicar o que leram seria pedir demasiado pois esse conhecimento justificaria equivalência, não ao 9º ano, mas a um bacharelato…).
É preciso que o Ministério diga aos alunos que a aprendizagem exige esforço, que aprender custa, que aprender “dói”! É preciso dizer aos alunos que não basta andar na escola de telemóvel na mão para memorizar conhecimentos, aprender técnicas e adoptar posturas e comportamentos socialmente correctos.
Se V.Excia achar que eu sou pessimista e que estou a perder a sensibilidade por estar em contacto diário com este tipo de jovens pergunte a opinião de outros professores, indague junto das escolas, mande alguém saber. Mas tenha cuidado porque estes cursos são uma mentira…
Permita-me discordar de V. Excia mas dizer que os professores têm de ser dignificados é pouco, muito pouco mesmo…
Atenciosamente
Domingos Freire Cardoso
Professor de Ciências Físico-Químicas
Rua José António Vidal, nº 25 C
3830 - 203 ÍLHAVO
E-mail: dfcardos@gmail.com
Carta aberta ao Senhor Presidente da República Portuguesa
Ílhavo, 22 de Outubro de 2007
Senhor Presidente da República Portuguesa
Excelência:
Disse V. Excia, no discurso do passado dia 5 de Outubro, que os professores precisavam de ser dignificados e eu ouso acrescentar: “Talvez V. Excia não saiba bem quanto!”
1. Sou professor há mais de trinta e seis anos e no ano passado tive o primeiro contacto com a maior mentira e o maior engano (não lhe chamo fraude porque talvez lhe falte a “má-fé”) do ensino em Portugal que dá pelo nome de Cursos de Educação e Formação (CEF).
A mentira começa logo no facto de dois anos nestes cursos darem equivalência ao 9º ano, isto é, aldrabando a Matemática, dois é igual a três!
Um aluno pode faltar dez, vinte, trinta vezes a uma ou a várias disciplinas (mesmo estando na escola) mas, com aulas de remediação, de recuperação ou de compensação (chamem-lhe o que quiserem mas serão sempre sucedâneos de aulas e nunca aulas verdadeiras como as outras) fica sem faltas. Pode ter cinco, dez ou quinze faltas disciplinares, pode inclusive ter sido suspenso que no fim do ano fica sem faltas, fica puro e imaculado como se nascesse nesse momento.
Qual é a mensagem que o aluno retira deste procedimento? Que pode fazer tudo o que lhe apetecer que no final da ano desce sobre ele uma luz divina que o purifica ao contrário do que na vida acontece. Como se vê claramente não pode haver melhor incentivo à irresponsabilidade do que este.
2. Actualmente sinto vergonha de ser professor porque muitos alunos podem este ano encontrar-me na rua e dizerem: ”Lá vai o palerma que se fartou de me dizer para me portar bem, que me dizia que podia reprovar por faltas e, afinal, não me aconteceu nada disso. Grande estúpido!”
3. É muito fácil falar de alunos problemáticos a partir dos gabinetes mas a distância que vai deles até às salas de aula é abissal. E é-o porque quando os responsáveis aparecem numa escola levam atrás de si (ou à sua frente, tanto faz) um magote de televisões e de jornais que se atropelam uns aos outros. Deviam era aparecer nas escolas sem avisar, sem jornalistas, trazer o seu carro particular e não terem lugar para estacionar como acontece na minha escola.
Quando aparecem fazem-no com crianças escolhidas e pagas por uma empresa de “casting” para ficarem bonitos (as crianças e os governantes) na televisão.
Os nossos alunos não são recrutados dessa maneira, não são louros, não têm caracóis no cabelo nem vestem roupa de marca.
Os nossos alunos entram na sala de aula aos berros e aos encontrões, trazem vestidas camisolas interiores cavadas, cheiram a suor e a outras coisas e têm os dentes em mísero estado.
Os nossos alunos estão em estado bruto, estão tal e qual a Natureza os fez, cresceram como silvas que nunca viram uma tesoura de poda. Apesar de terem 15/16 anos parece que nunca conviveram com gente civilizada.
Não fazem distinção entre o recreio e o interior da sala de aula onde entram de boné na cabeça, “headphones” nos ouvidos continuando as conversas que traziam do recreio.
Os nossos alunos entram na sala, sentam-se na cadeira, abrem as pernas, deixam-se escorregar pela cadeira abaixo e não trazem nem esferográfica nem uma folha de papel onde possam escrever seja o que for.
Quando lhes digo para se sentarem direitos, para se desencostarem da parede, para não se virarem para trás olham-me de soslaio como que a dizer “Olha-me este!” e passados alguns segundos estão com as mesmas atitudes.
4. Eu não quero alunos perfeitos. Eu quero apenas alunos normais!!!
Alunos que ao serem repreendidos não contradigam o que eu disse e que ao serem novamente chamados à razão não voltem a responder querendo ter a última palavra desafiando a minha autoridade, não me respeitando nem como pessoa mais velha nem como professor. Se nunca tive de aturar faltas de educação aos meus filhos por que é que hei-de aturar faltas de educação aos filhos dos outros? O Estado paga-me para ensinar os alunos, para os educar e ajudar a crescer; não me paga para os aturar! Quem vai conseguir dar aulas a alunos destes até aos 65 anos de idade?
Actualmente só vai para professor quem não está no seu juízo perfeito mas se o estiver, em cinco anos (ou cinco meses bastarão?...) os alunos se encarregarão de lhe arruinar completamente a sanidade mental.
Eu quero alunos que não falem todos ao mesmo tempo sobre coisas que não têm nada a ver com as aulas e quando peço a um que se cale ele não me responda: “Por que é que me mandou calar a mim? Não vê os outros também a falar?”
Eu quero alunos que não façam comentários despropositados de modo a que os outros se riam e respondam ao que eles disseram ateando o rastilho da balbúrdia em que ninguém se entende.
Eu quero alunos que não me obriguem a repetir em todas as aulas “Entram, sentam-se e calam-se!”
Eu quero alunos que não usem artes de ventríloquo para assobiar, cantar, grunhir, mugir, roncar e emitir outros sons. É claro que se eu não quisesse dar mais aula bastaria perguntar quem tinha sido e não sairia mais dali pois ninguém assumiria a responsabilidade.
Eu quero alunos que não desconheçam a existência de expressões como “obrigado”, “por favor” e “desculpe” e que as usem sempre que o seu emprego se justifique.
Eu quero alunos que ao serem chamados a participar na aula não me olhem com enfado dizendo interiormente “Mas o que é que este quer agora?” e demorem uma eternidade a disponibilizar-se para a tarefa como se me estivessem a fazer um grande favor. Que fique bem claro que os alunos não me fazem favor nenhum em estarem na aula e a portarem-se bem.
Eu quero alunos que não estejam constantemente a receber e a enviar mensagens por telemóvel e a recusarem-se a entregar-mo quando lho peço para terminar esse contacto com o exterior pois esse aluno “não está na sala”, está com a cabeça em outros mundos.
Eu sou um trabalhador como outro qualquer e como tal exijo condições de trabalho! Ora, como é que eu posso construir uma frase coerente, como é que eu posso escolher as palavras certas para ser claro e convincente se vejo um aluno a balouçar-se na cadeira, outro virado para trás a rir-se, outro a mexer no telemóvel e outro com a cabeça pousada na mesa a querer dormir?
Quando as aulas são apoiadas por fichas de trabalho gostaria que os alunos, ao sair da sala, não as amarrotassem e deitassem no cesto do lixo mesmo à minha frente ou não as deixassem “esquecidas” em cima da mesa.
Nos últimos cinco minutos de uma aula disse aos alunos que se aproximassem da secretária pois iria fazer uma experiência ilustrando o que tinha sido explicado e eles puseram os bonés na cabeça, as mochilas às costas e encaminharam-se todos em grande conversa para a porta da sala à espera que tocasse. Disse-lhes: “Meus meninos, a aula ainda não acabou! Cheguem-se aqui para verem a experiência!” mas nenhum deles se moveu um milímetro!!!
Como é possível, com alunos destes, criar a empatia necessária para uma aula bem sucedida?
É por estas e por outras que eu NÃO ADMITO A NINGUÉM, RIGOROSAMENTE A NINGUÉM, que ouse pensar, insinuar ou dizer que se os meus alunos não aprendem a culpa é minha!!!
5. No ano passado tive uma turma do 10º ano dum curso profissional em que um aluno, para resolver um problema no quadro, tinha de multiplicar 0,5 por 2 e este virou-se para os colegas a perguntar quem tinha uma máquina de calcular!!! No mesmo dia e na mesma turma outro aluno também pediu uma máquina de calcular para dividir 25,6 por 1. Estes alunos podem não saber efectuar estas operações sem máquina e talvez tenham esse direito. O que não se pode é dizer que são alunos de uma turma do 10º ano!!!
Com este tipo de qualificação dada aos alunos não me admira que, daqui a dois ou três anos, estejamos à frente de todos os países europeus e do resto do mundo. Talvez estejamos só que os alunos continuarão a ser brutos, burros, ignorantes e desqualificados mas com um diploma!!!
6. São estes os alunos que, ao regressarem à escola, tanto orgulho dão ao Governo. Só que ninguém diz que os Cursos de Educação e Formação são enormes ecopontos (não sejamos hipócritas nem tenhamos medo das palavras) onde desaguam os alunos das mais diversas proveniências e com histórias de vida escolar e familiar de arrepiar desde várias repetências e inúmeras faltas disciplinares até famílias irresponsáveis.
Para os que têm traumas, doenças, carências, limitações e dificuldades várias há médicos, psicólogos, assistentes sociais e outros técnicos, em quantidade suficiente, para os ajudar e complementar o trabalho dos professores?
Há alunos que têm o sublime descaramento de dizer que não andam na escola para estudar mas para “tirar o 9º ano”.
Outros há que, simplesmente, não sabem o que andam a fazer na escola…
E, por último, existem os que se passeiam na escola só para boicotar as aulas e para infernizar a vida aos professores. Quem é que consegue ensinar seja o que for a alunos destes? E por que é que eu tenho de os aturar numa sala de aula durante períodos de noventa e de quarenta e cinco minutos por semana durante um ano lectivo? A troco de quê? Da gratidão da sociedade e do reconhecimento e do apreço do Ministério não é, de certeza absoluta!
7. Eu desafio seja quem for do Ministério da Educação (ou de outra área da sociedade) a enfrentar (o verbo é mesmo esse, “enfrentar”, já que de uma luta se trata…), durante uma semana apenas, uma turma destas sozinho, sem jornalistas nem guarda-costas, e cumprir um horário de professor tentando ensinar um assunto qualquer de uma unidade didáctica do programa escolar.
Eu quero saber se ao fim dessa semana esse ilustre voluntário ainda estará com vontade de continuar. E não me digam que isto é demagogia porque demagogia é falar das coisas sem as conhecer e a realidade escolar está numa sala de aula com alunos de carne, osso e odores e não num gabinete onde esses alunos são números num mapa de estatística e eu sei perfeitamente que o que o Governo quer são números para esse mapa, quer os alunos saibam estar sentados numa cadeira ou não (saber ler e explicar o que leram seria pedir demasiado pois esse conhecimento justificaria equivalência, não ao 9º ano, mas a um bacharelato…).
É preciso que o Ministério diga aos alunos que a aprendizagem exige esforço, que aprender custa, que aprender “dói”! É preciso dizer aos alunos que não basta andar na escola de telemóvel na mão para memorizar conhecimentos, aprender técnicas e adoptar posturas e comportamentos socialmente correctos.
Se V.Excia achar que eu sou pessimista e que estou a perder a sensibilidade por estar em contacto diário com este tipo de jovens pergunte a opinião de outros professores, indague junto das escolas, mande alguém saber. Mas tenha cuidado porque estes cursos são uma mentira…
Permita-me discordar de V. Excia mas dizer que os professores têm de ser dignificados é pouco, muito pouco mesmo…
Atenciosamente
Domingos Freire Cardoso
Professor de Ciências Físico-Químicas
Rua José António Vidal, nº 25 C
3830 - 203 ÍLHAVO
E-mail: dfcardos@gmail.com
domingo, novembro 25, 2007
Invasões
I
Aconselho vivamente a leitura do ensaio histórico do investigador Vasco Pulido Valente, recentemente publicado com o sugestivo título de “Ir Prò Maneta” (Alêtheia Editores, 2007). Relata e traça um pormenorizado retrato dos vários estratos sociais portugueses, das suas motivações e forma como enfrentaram as invasões dos exércitos napoleónicos - com especial relevo para a primeira, comandada pelo general Junot em 1808 - em inusitadas insurreições e levantamentos patrióticos, sem esquecer que quando os ingleses desembarcaram em Lavos, perto da Figueira da Foz, para nos virem ajudar, já o povo amotinado, de norte a sul, apenas armado de paus, chuços e piques, tinha libertado nove décimos do país.
Duzentos anos depois, os portugueses bem podem reflectir e tirar algumas conclusões sobre o comportamento dos nossos antepassados. O conhecimento da História também tem essa prodigiosa função que é a de, em momentos muito precisos, perante outros tipos de pilhagens e sevícias, ajudar a reanimar a identidade, a combatividade e a auto-estima dos povos.
Aconselho vivamente a leitura do ensaio histórico do investigador Vasco Pulido Valente, recentemente publicado com o sugestivo título de “Ir Prò Maneta” (Alêtheia Editores, 2007). Relata e traça um pormenorizado retrato dos vários estratos sociais portugueses, das suas motivações e forma como enfrentaram as invasões dos exércitos napoleónicos - com especial relevo para a primeira, comandada pelo general Junot em 1808 - em inusitadas insurreições e levantamentos patrióticos, sem esquecer que quando os ingleses desembarcaram em Lavos, perto da Figueira da Foz, para nos virem ajudar, já o povo amotinado, de norte a sul, apenas armado de paus, chuços e piques, tinha libertado nove décimos do país.
Duzentos anos depois, os portugueses bem podem reflectir e tirar algumas conclusões sobre o comportamento dos nossos antepassados. O conhecimento da História também tem essa prodigiosa função que é a de, em momentos muito precisos, perante outros tipos de pilhagens e sevícias, ajudar a reanimar a identidade, a combatividade e a auto-estima dos povos.
quinta-feira, novembro 22, 2007
Habituem-se!
H
Em Fevereiro de 2005, António Vitorino, respondendo aos jornalistas sobre a pouca informação que girava à volta da constituição do futuro governo, afirmou, por mais de uma vez, com a sua habitual impertinência, que o Governo de Sócrates não seria formado "na comunicação social e pela comunicação social", e que em termos de governação, "em Portugal é preciso ter teimosia, e ter determinação". Para que não restassem dúvidas, sublinhou as suas declarações com um peremptório, quase ameaçador, "Vamos continuar. Habituem-se!".
Ao princípio ainda se pensava que esta advertência era dirigida exclusivamente aos jornalistas, mas com o correr do tempo concluiu-se que a mensagem era dirigida a toda a sociedade portuguesa, dando a entender que aquele "vamos continuar” e “habituem-se!" prenunciava a confrontação eminente, contra tudo e contra todos, não para melhorar mas para piorar o estado geral da nação. Quase 3 anos depois daquelas palavras de António Vitorino, os resultados estão à vista:
1 - A passiva maioria absoluta do PS, tornou-se o sustentáculo de uma das mais preocupantes derivas autoritárias, desde a restauração das liberdades democráticas, em 25 de Abril;
2 – José Sócrates Pinto de Sousa estava determinado a fazer regredir socialmente o país para níveis próximos do século XIX, e se o povo não souber responder em conformidade, ele vai consegui-lo.
Em Fevereiro de 2005, António Vitorino, respondendo aos jornalistas sobre a pouca informação que girava à volta da constituição do futuro governo, afirmou, por mais de uma vez, com a sua habitual impertinência, que o Governo de Sócrates não seria formado "na comunicação social e pela comunicação social", e que em termos de governação, "em Portugal é preciso ter teimosia, e ter determinação". Para que não restassem dúvidas, sublinhou as suas declarações com um peremptório, quase ameaçador, "Vamos continuar. Habituem-se!".
Ao princípio ainda se pensava que esta advertência era dirigida exclusivamente aos jornalistas, mas com o correr do tempo concluiu-se que a mensagem era dirigida a toda a sociedade portuguesa, dando a entender que aquele "vamos continuar” e “habituem-se!" prenunciava a confrontação eminente, contra tudo e contra todos, não para melhorar mas para piorar o estado geral da nação. Quase 3 anos depois daquelas palavras de António Vitorino, os resultados estão à vista:
1 - A passiva maioria absoluta do PS, tornou-se o sustentáculo de uma das mais preocupantes derivas autoritárias, desde a restauração das liberdades democráticas, em 25 de Abril;
2 – José Sócrates Pinto de Sousa estava determinado a fazer regredir socialmente o país para níveis próximos do século XIX, e se o povo não souber responder em conformidade, ele vai consegui-lo.
Mudanças na Ortografia da Língua Portuguesa
M
A partir de Janeiro de 2008, Brasil, Portugal e os países da CPLP – Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor Leste - terão a ortografia unificada.
O português é a terceira língua ocidental mais falada, após o inglês e o espanhol. A ocorrência de ter duas ortografias atrapalha a divulgação do idioma e a sua prática em eventos internacionais. Sua unificação, no entanto, facilitará a definição de critérios para exames e certificados para estrangeiros. Com as modificações propostas no acordo, calcula-se que 1,6% do vocabulário de Portugal seja modificado. No Brasil, a mudança será bem menor: 0,45% das palavras terão a escrita alterada. Mas apesar das mudanças ortográficas, serão conservadas as pronúncias típicas de cada país.
O português é a terceira língua ocidental mais falada, após o inglês e o espanhol. A ocorrência de ter duas ortografias atrapalha a divulgação do idioma e a sua prática em eventos internacionais. Sua unificação, no entanto, facilitará a definição de critérios para exames e certificados para estrangeiros. Com as modificações propostas no acordo, calcula-se que 1,6% do vocabulário de Portugal seja modificado. No Brasil, a mudança será bem menor: 0,45% das palavras terão a escrita alterada. Mas apesar das mudanças ortográficas, serão conservadas as pronúncias típicas de cada país.
O que vai mudar na ortografia em 2008:
- As paroxítonas terminadas em "o" duplo, por exemplo, não terão mais acento circunflexo. Ao invés de "abençôo", "enjôo" ou "vôo", os brasileiros (e os outros) terão que escrever "abençoo", "enjoo" e "voo";
- mudam-se as normas para o uso do hífen no meio das palavras; O hífen vai desaparecer do meio de palavras, com excepção daquelas em que o prefixo termina em `r´, casos de "hiper-", inter-" e "super-". Assim passaremos a ter "extraescolar", "aeroespascial" e "autoestrada".
- Não se usará mais o acento circunflexo nas terceiras pessoas do plural do presente do indicativo ou do substantivo dos verbo "crer", "dar", "ler","ver" e seus decorrentes, ficando correta a grafia "creem", "deem", "leem" e "veem";
- Criação de alguns casos de dupla grafia para fazer diferenciação, como o uso do acento agudo na primeira pessoa do plural do pretérito perfeito dos verbos da primeira conjugação, tais como "louvámos" em oposição a "louvamos" e "amámos" em oposição a "amamos";
- O trema (brasileiro) desaparece completamente. Estará correto escrever "linguiça", "sequência", "frequência" e "quinquênio" ao invés de lingüiça, seqüência, freqüência e qüinqüênio;
- O alfabeto deixa de ter 23 letras para ter 26, com a incorporação de "k", "w" e "y"; - O acento deixará de ser usado para diferenciar "pára" (verbo) de "para" (preposição);
- No Brasil, haverá eliminação do acento agudo nos ditongos abertos "ei" e "oi" de palavras paroxítonas, como "assembléia", "idéia", "heróica" e "jibóia". O certo será assembleia, ideia, heroica e jiboia;
- Em Portugal, desaparecem da língua escrita o "c" e o "p" nas palavras onde ele não é pronunciado, como em "acção", "acto", "adopção" e "baptismo". O certo será ação, ato, adoção e batismo;
- Também em Portugal elimina-se o "h" inicial de algumas palavras, como em "húmido", que passará a ser grafado como no Brasil: "úmido";
- Portugal mantém o acento agudo no e e no o tônicos que antecedem m ou n, enquanto o Brasil continua a usar circunflexo nessas palavras: académico/acadêmico, génio/gênio, fenómeno/fenômeno, bónus/bônus.
F
Fontes: Banco de Dados da Língua Portuguesa – FFCLH USP (2007), Revista Isto É, Folha de São Paulo, Agência Lusa e Semanário "SOL"
sábado, novembro 17, 2007
Colecções Particulares
C
Uma semana antes das eleições, o Paulo Portas mandou digitalizar mais de 60 mil páginas de documentos que transitaram pelo seu gabinete no Ministério da Defesa. Se em vez de digitalização, estivéssemos a falar de fotocópias tradicionais, e se cada documento fosse apenas uma página de A4, ele fez sair do ministério, surripiando material para o seus arquivos particulares, nada mais, nada menos, que 120 resmas de papel, de documentação altamente sigilosa, para não dizer de segredos de estado. Então, na altura, ninguém deu por nada, ninguém dá um passo, ninguém mexe uma palha, ninguém faz uma “vistoria” à casa daquele Portas, e responsabiliza o tunante?
Uma semana antes das eleições, o Paulo Portas mandou digitalizar mais de 60 mil páginas de documentos que transitaram pelo seu gabinete no Ministério da Defesa. Se em vez de digitalização, estivéssemos a falar de fotocópias tradicionais, e se cada documento fosse apenas uma página de A4, ele fez sair do ministério, surripiando material para o seus arquivos particulares, nada mais, nada menos, que 120 resmas de papel, de documentação altamente sigilosa, para não dizer de segredos de estado. Então, na altura, ninguém deu por nada, ninguém dá um passo, ninguém mexe uma palha, ninguém faz uma “vistoria” à casa daquele Portas, e responsabiliza o tunante?
sábado, novembro 10, 2007
Pobreza e Riqueza em Portugal
P
“Nos últimos cinco anos (a acreditar-se na visão optimista da estatística oficial) os dez maiores grupos portugueses de empresas da indústria e da banca registaram lucros consolidados de cerca de 5.500 milhões de Euros, isto é, 10 empresas geraram um crescimento de +122% nos seus resultados financeiros, enquanto que, no mesmo período, o PIB nacional apenas conseguia um modesto registo de +14,7% (a distribuir pelos referidos 5 anos), portanto, oito vezes inferior ao que foi produzido pelas citadas 10 empresas privadas. Se tivermos somente em atenção os resultados dos 4 bancos que integram esse “pelotão da frente” (CGD, BCP, BES e BPI), veremos que só à sua parte o crescimento somou 72,5%.
Foi neste período que os governos de direita do PS e do PSD/CDS desenvolveram as suas teses do “apertar o cinto por causa do défice público” e avançaram políticas de desmembramento do Serviço Nacional de Saúde, de redução de âmbito da Segurança Social, da venda a privados das dívidas do Estado e de um sector crescento do património nacional, da progressiva liberalização dos despedimentos e do estabelecimento das bases de um Estado centralizado e autoritário.
O país serve, na perspectiva dos governantes, para financiar os projectos de uma elite do sector privado.”
Jorge Messias, em ODIARIO.INFO em 2007 Setembro 30
“Nos últimos cinco anos (a acreditar-se na visão optimista da estatística oficial) os dez maiores grupos portugueses de empresas da indústria e da banca registaram lucros consolidados de cerca de 5.500 milhões de Euros, isto é, 10 empresas geraram um crescimento de +122% nos seus resultados financeiros, enquanto que, no mesmo período, o PIB nacional apenas conseguia um modesto registo de +14,7% (a distribuir pelos referidos 5 anos), portanto, oito vezes inferior ao que foi produzido pelas citadas 10 empresas privadas. Se tivermos somente em atenção os resultados dos 4 bancos que integram esse “pelotão da frente” (CGD, BCP, BES e BPI), veremos que só à sua parte o crescimento somou 72,5%.
Foi neste período que os governos de direita do PS e do PSD/CDS desenvolveram as suas teses do “apertar o cinto por causa do défice público” e avançaram políticas de desmembramento do Serviço Nacional de Saúde, de redução de âmbito da Segurança Social, da venda a privados das dívidas do Estado e de um sector crescento do património nacional, da progressiva liberalização dos despedimentos e do estabelecimento das bases de um Estado centralizado e autoritário.
O país serve, na perspectiva dos governantes, para financiar os projectos de uma elite do sector privado.”
Jorge Messias, em ODIARIO.INFO em 2007 Setembro 30
O Analfabeto Político
O
“O pior analfabeto é o analfabeto político. Ele não ouve, não fala, nem participa nos acontecimentos políticos. Ele não sabe que o custo de vida, o preço do feijão, do peixe, da farinha, do aluguer, do sapato e do remédio depende das decisões políticas.
O analfabeto político é tão burro que se orgulha e estufa o peito dizendo que odeia a política. Não sabe o imbecil que, da sua ignorância política, nasce a prostituta, o menor abandonado, e o pior de todos os bandidos, que é o político vigarista, pilantra, corrupto e lacaio das empresas nacionais e multinacionais.”
Bertold Brecht (1898-1956), poeta, dramaturgo e encenador
“O pior analfabeto é o analfabeto político. Ele não ouve, não fala, nem participa nos acontecimentos políticos. Ele não sabe que o custo de vida, o preço do feijão, do peixe, da farinha, do aluguer, do sapato e do remédio depende das decisões políticas.
O analfabeto político é tão burro que se orgulha e estufa o peito dizendo que odeia a política. Não sabe o imbecil que, da sua ignorância política, nasce a prostituta, o menor abandonado, e o pior de todos os bandidos, que é o político vigarista, pilantra, corrupto e lacaio das empresas nacionais e multinacionais.”
Bertold Brecht (1898-1956), poeta, dramaturgo e encenador
segunda-feira, novembro 05, 2007
A Ilha
A
Título: A Ilha
Título Original: The Island
Ano da estreia: 2005
Realização: Michael Bay
Guião: Caspian Tredwell-Owen e Alex Kurtzman
Género: Ficção Científica – Acção
Actores principais: Ewan McGregor e Scarlett Johansson
Embora classificado como tal, este filme, em rigor, já não se enquadra no género de ficção científica, porque o que nos transmite é uma realidade que já está ali ao virar da esquina, fruto do “aperfeiçoamento” das técnicas de clonagem, da sua inevitável industrialização e comercialização, e que só ainda não abandonou o segredo dos laboratórios, por força das questões éticas que têm acompanhado os progressos da engenharia genética. No entanto, isso não impediu que à volta do tema tivesse sido construído um argumento robusto e credível, que só pecou por os criadores do filme terem querido extrair muitos “subprodutos” fílmicos de efeito fácil, recorrendo a uma montagem vertiginosa, perseguições e muita pirotecnia, que têm tanto de supérfluas como de desnecessárias, tentando levar a história mais longe, quando a “energia” da ideia nuclear já estava esgotada, ou melhor dizendo, subvertida.
A acção localiza-se algures neste século XXI e decorre num complexo tecnológico que, baseando-se em avançadas técnicas de clonagem, explora a criação de réplicas humanas, para clientes com suficiente capacidade financeira para poderem dispor de uma cópia de si próprios, funcionando aqueles como banco de órgãos, para que eles, os originais, pudessem beneficiar de um prolongamento da vida, sem que os transplantes corram o habitual risco de rejeições por incompatibilidade. Ainda não é a eternidade, mas apenas uma promessa, um primeiro grande passo.
Como se trata de seres humanos e não da ovelha “Dolly”, e para manter a estabilidade da sua população, o tal centro tecnológico recorria a duas piedosas mentiras: a vida sobre a superfície da terra tinha-se tornado impossível, irremediavelmente condenada pela contaminação ambiental, e a obtenção de passaporte para abandonar aquele mundo subterrâneo e aceder a uma certa ilha paradisíaca, apenas era possível através de um regular sorteio, que mantinha mobilizada e na expectativa toda a população de imitações. Acontece que não era uma ilha o que esperava os felizes contemplados, mas apenas e tão só a sala de transplantes. Em dado momento pensei que iria novamente ser introduzido naquela velha questão que “Brade Runner” ou “Inteligência Artificial” (é fatal a comparação) tão genialmente abordaram. Mas não. Centrado numa ideia-chave que a acção do filme se propunha desenvolver, isto é, qualquer coisa como “eles não querem que tu saibas quem tu és”, há um momento em que o filme podia ter enveredado pela exploração do filão inesgotável da problemática e da confrontação entre a condição humana e as suas réplicas. Contudo, Michael Bay não entendeu assim, preferindo mudar de rumo, encaminhando a narrativa para a acção pura e dura, e transformando as vítimas em improváveis e pouco credíveis “denunciadores” e “heróis libertadores” de uma “indústria” que, em termos reais, nunca se deixaria infiltrar por sabotadores, de forma tão ingénua e pouco convincente. A linha de força inicial esbate-se para dar lugar à banalidade. Se “a ilha” e a “contaminação”, no contexto do filme, são duas mentiras que servem para manter uma população de clones sob controlo e na expectativa de alcançar uma espécie de paraíso, também o filme em si mesmo, relativamente à sua responsabilidade perante o espectador, se vai transformando numa espécie de auspiciosa promessa não cumprida.
Há filmes que são obras de arte, enquanto que outros, embora pretensiosos ou bem intencionados, não passam de produtos mais ou menos comerciais. Com um terço inicial a prometer um filme recheado de substância e densidade, Michael Bay, com alguns créditos já firmados, não resiste à tentação do espectáculo visual, acabando por resvalar para o puro entretenimento. A banda sonora é sofrível, a fotografia é excelente, e quanto a Scarlett Johansson e Ewan McGregor, têm representações competentes e dignas, embora, por mais que se esforcem, não consigam salvar a honra do convento.
Esta “A Ilha”, com todas as condições e atributos para se classificar como um grande filme, ansiando um lugar entre os eleitos, acaba por escolher o caminho fácil e efémero, mas nem sempre garantido, de ser um produto apetecível, porém perecível, que depois de digerido, logo se esquece.
Título: A Ilha
Título Original: The Island
Ano da estreia: 2005
Realização: Michael Bay
Guião: Caspian Tredwell-Owen e Alex Kurtzman
Género: Ficção Científica – Acção
Actores principais: Ewan McGregor e Scarlett Johansson
Embora classificado como tal, este filme, em rigor, já não se enquadra no género de ficção científica, porque o que nos transmite é uma realidade que já está ali ao virar da esquina, fruto do “aperfeiçoamento” das técnicas de clonagem, da sua inevitável industrialização e comercialização, e que só ainda não abandonou o segredo dos laboratórios, por força das questões éticas que têm acompanhado os progressos da engenharia genética. No entanto, isso não impediu que à volta do tema tivesse sido construído um argumento robusto e credível, que só pecou por os criadores do filme terem querido extrair muitos “subprodutos” fílmicos de efeito fácil, recorrendo a uma montagem vertiginosa, perseguições e muita pirotecnia, que têm tanto de supérfluas como de desnecessárias, tentando levar a história mais longe, quando a “energia” da ideia nuclear já estava esgotada, ou melhor dizendo, subvertida.
A acção localiza-se algures neste século XXI e decorre num complexo tecnológico que, baseando-se em avançadas técnicas de clonagem, explora a criação de réplicas humanas, para clientes com suficiente capacidade financeira para poderem dispor de uma cópia de si próprios, funcionando aqueles como banco de órgãos, para que eles, os originais, pudessem beneficiar de um prolongamento da vida, sem que os transplantes corram o habitual risco de rejeições por incompatibilidade. Ainda não é a eternidade, mas apenas uma promessa, um primeiro grande passo.
Como se trata de seres humanos e não da ovelha “Dolly”, e para manter a estabilidade da sua população, o tal centro tecnológico recorria a duas piedosas mentiras: a vida sobre a superfície da terra tinha-se tornado impossível, irremediavelmente condenada pela contaminação ambiental, e a obtenção de passaporte para abandonar aquele mundo subterrâneo e aceder a uma certa ilha paradisíaca, apenas era possível através de um regular sorteio, que mantinha mobilizada e na expectativa toda a população de imitações. Acontece que não era uma ilha o que esperava os felizes contemplados, mas apenas e tão só a sala de transplantes. Em dado momento pensei que iria novamente ser introduzido naquela velha questão que “Brade Runner” ou “Inteligência Artificial” (é fatal a comparação) tão genialmente abordaram. Mas não. Centrado numa ideia-chave que a acção do filme se propunha desenvolver, isto é, qualquer coisa como “eles não querem que tu saibas quem tu és”, há um momento em que o filme podia ter enveredado pela exploração do filão inesgotável da problemática e da confrontação entre a condição humana e as suas réplicas. Contudo, Michael Bay não entendeu assim, preferindo mudar de rumo, encaminhando a narrativa para a acção pura e dura, e transformando as vítimas em improváveis e pouco credíveis “denunciadores” e “heróis libertadores” de uma “indústria” que, em termos reais, nunca se deixaria infiltrar por sabotadores, de forma tão ingénua e pouco convincente. A linha de força inicial esbate-se para dar lugar à banalidade. Se “a ilha” e a “contaminação”, no contexto do filme, são duas mentiras que servem para manter uma população de clones sob controlo e na expectativa de alcançar uma espécie de paraíso, também o filme em si mesmo, relativamente à sua responsabilidade perante o espectador, se vai transformando numa espécie de auspiciosa promessa não cumprida.
Há filmes que são obras de arte, enquanto que outros, embora pretensiosos ou bem intencionados, não passam de produtos mais ou menos comerciais. Com um terço inicial a prometer um filme recheado de substância e densidade, Michael Bay, com alguns créditos já firmados, não resiste à tentação do espectáculo visual, acabando por resvalar para o puro entretenimento. A banda sonora é sofrível, a fotografia é excelente, e quanto a Scarlett Johansson e Ewan McGregor, têm representações competentes e dignas, embora, por mais que se esforcem, não consigam salvar a honra do convento.
Esta “A Ilha”, com todas as condições e atributos para se classificar como um grande filme, ansiando um lugar entre os eleitos, acaba por escolher o caminho fácil e efémero, mas nem sempre garantido, de ser um produto apetecível, porém perecível, que depois de digerido, logo se esquece.
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