quinta-feira, outubro 11, 2012

Vandalismo Neoliberal

AO MESMO tempo que diz querer mitigar o aumento de impostos, o Governo avançou com mais medidas penalizadoras dos trabalhadores, quer ao propor o despedimento de perto de 50.000 trabalhadores contratados a prazo na Administração Pública, como forma de diminuição da despesa pública, potenciando uma baixa generalizada do nível dos salários, tanto no sector público como privado, quer ao fazer subir a idade da reforma na função pública para os 65 anos, já no próximo ano, numa antecipação de dois anos face ao que estava acordado.

Se a primeira é o maior despedimento colectivo de que há memória, já a segunda, bem podem dizer que promove a equidade relativamente à idade de reforma do sector privado, que vai aumentar em dois anos as contribuições para a emagrecida segurança social, a qual se encontra descapitalizada devido aos desvios dos seus fundos para outros fins, pois a verdade é que a medida desrespeita um regime de transição anteriormente acordado, com isso sabotando os projectos de vida de milhares de trabalhadores, e adiando a renovação dos quadros na função pública, com a nefasta consequência de acabar por ser uma medida que vai aumentar o desemprego, restringindo a entrada no mercado de trabalho aos jovens.

quarta-feira, outubro 10, 2012

Alice (Vieira) no País dos Enganos


IMAGINEMOS que Alice ia a passear pelo campo, tropeçou num buraco e foi sugada para o País dos Enganos, onde as bandeiras são hasteadas de pernas para o ar, onde há um Coelho dos Passos, um Gato das Relvas e um Chapeleiro Gaspar que fazem a cabeça em água ao povo das Formigas, mais um Rei de Copas que devora bolo-rei confeccionado pela Cigarra Soprano, e uma Rainha de Copas chamada Conceição, que por tudo e por nada grita "foi engano!", fingindo dirigir uma orquestra de sapateiros anões que tocam rabecão, e que nas horas vagas se dedicam a escolher livros, mesmo sem os lerem, para as criancinhas se cultivarem, cantando um-dó-li-tá e escolhendo à sorte sobre uma lista de títulos...

PASSADO o devaneio da ficção, regressemos à realidade, para constatar que o livro de poesia para adultos "O que dói às aves", de Alice Vieira (mais conhecida pela sua obra dedicada a crianças e adolescentes) foi recomendado pelas sumidades intelectualóides do Plano Nacional de Leitura, para crianças de sete e oito anos. Só depois de a autora ter denunciado, escandalizada, que aquela obra não se destinava a crianças e adolescentes, dado ter um conteúdo dirigido a adultos já bem crescidinhos, a dita foi retirada da lista de obras que o organismo considerava aconselháveis para a iniciação na literatura portuguesa. Isto significa que até no aconselhamento e iniciação literária dos jovens, o país entrou em colapso. Foi um engano, disse a coordenadora, que afinal não coordena coisa nenhuma. É fácil de perceber que o serviço está entregue a uma equipa de trolhas pseudo-intelectuais, que manejam as suas escolhas ao deus-dará, sem sequer se darem ao trabalho de consultar as badanas e contracapas das obras eleitas, quanto mais de as abrir ou soletrar. Isto é o resultado que dá ter ministros da Educação a quedarem-se com sorrisos patetas nos lábios, a verem a banda passar, como se isto não tivesse nada a ver com eles.

domingo, outubro 07, 2012

Prioridades Seguras

«Não sei se consigo, mas ao menos luto.»

Afirmação de António José Seguro, durante uma digressão por França e Alemanha, referindo-se às dificuldades tremendas que tem encontrado para contrariar o programa de austeridade do governo de Passos Coelho, isto depois de se ter abstido de votar as moções de censura do BE e do PCP, e quando ainda não é garantido que vote contra o Orçamento de Estado para 2013.

Assim, não se sabe bem a que tipo de luta Seguro se está a referir, porém, não me admirava que tivesse a ver com a tal proposta para reduzir o número de deputados da Assembleia da República, inexcedível prioridade das prioridades nos tempos que correm, na medida de apenas visará emagrecer a representação parlamentar das oposições incómodas, contribuindo para deixar caminho livre às políticas de ruína e ladroagem desbragada do actual governo PSD/CDS-PP.

Descubram as Semelhanças


«Sei muito bem o que quero e para onde vou.»

Frase do discurso de tomada de posse de António de Oliveira Salazar como ministro das Finanças, em 29 de Abril de 1928.

«Nós sabemos para onde vamos.»

Frase pronunciada pelo primeiro-ministro Pedro Passos Coelho, em 6 de Outubro de 2012, referindo-se às medidas de austeridade do seu governo, como solução para conduzir o país à recuperação económica.

sexta-feira, outubro 05, 2012

Enganos que Falam Verdade

A BANDEIRA nacional é o símbolo da soberania da República, da independência, da unidade e integridade de Portugal é a adoptada pela República instaurada pela Revolução de 5 de Outubro de 1910. Exibida de forma invertida, equivale a um pedido de socorro, significando que o país está sob ocupação. Foi o que aconteceu ao ser hasteada hoje, 5 de Outubro de 2012, última vez em que é feriado nacional.

quinta-feira, outubro 04, 2012

Registo para Memória Futura (73)


O Governo PSD/CDS-PP ignorou deliberadamente estas quatro (4) propostas da CGTP Intersindical, destinadas a alargar às grandes empresas, às grandes fortunas e aos rendimentos do capital, a tão apegoada equidade nos sacrifícios, decorrentes do défice e da dívida soberana, e que permitiria arrecadar 5.965,6 milhões de euros.
Embora já saibamos o que valem as promessas na boca do Governo, este acabou por adiantar, timidamente, que iria (talvez) rever as taxas as transações financeiras, sendo logo apupado com um coro de protestos pelos senhores banqueiros. Nada mais foi preciso para que remetesse para as calendas a tal distribuição equitativa dos sacrifícios. Em compensação, e com os olhos postos em quem trabalha, seja pensionista ou reformado, o Governo - e não esqueçamos que todos eles são gente abjecta e vingativa - foi peremptório: ai não quisesteis o nosso remédio da TSU? Pois então tomai lá disto, para saberem como elas mordem! E assim fez. Aplicou um agravamento generalizado de 35% no IRS, e prometeu uma escalada alucinada no IMI, tudo isto anunciado pela voz pausadamente inexpressiva do ministro Victor “powerpoint” Gaspar, que veio substituir o ausente Coelho, que anda lá por fora em descontraída digressão, isto para não falar no manifesto desprezo pelos cidadãos portugueses, que foi colocá-los no fim da fila das suas preocupações comunicacionais. Entre ajustamentos, reajustamentos e consolidações orçamentais, a verdade é que este bando de malfeitores continua a exercer represálias sobre quem trabalha, levando o país ao desastre e à miséria.

Entretanto, faltou acrescentar a este pacote, um pormenor, que não é tão pequeno como isso. É que até ao final de Dezembro de 2012, os contribuintes portugueses ainda terão que desembolsar 3.4 mil milhões de euros, para saldar (?) a grande falcatrua que foi o caso BPN, o que significa, contas feitas, que os contribuintes irão ser espoliados de 6.5 mil milhões de euros, mais juros e contingências, tudo em benefício de uns quantos facínoras que se bamboleiam por aí, mais os novos proprietário que ficaram com o “bem-bom” do que restou, por uns simpáticos 40 milhões de euros. É obra! É bom relembrar, conforme o fez o jornal PÚBLICO, que a falência do BPN foi provocada por uma megafraude que teve repercussões políticas, pois o banco tinha políticos no activo, nomeadamente da esfera do PSD, entre os seus clientes, accionistas ou nos seus órgãos sociais. Os casos mais emblemáticos são os de Oliveira Costa e do ex-ministro de Cavaco Silva e ex-conselheiro de Estado Manuel Dias Loureiro. Quanto a Cavaco Silva, é bom lembrá-lo, também provou do pote, gostou e ficou a lamber os beiços.
O que acontece é que este episódio do BPN tem a ver (e muito) com todos os assaltos que são perpetrados ao bolso dos portugueses, apesar de haver a intencional preocupação de o descontextualizar da crise portuguesa. Por essas e outras, e bem vistas as coisas, eu acho que os portugueses, independentemente da Greve Geral de 14 de Novembro, têm razões de sobra para se indignarem, e deviam voltar à rua já hoje.

ADENDA - Depois de o Governo ter andado a repetir, dia sim, dia sim, que os portugueses andaram a fazer vida de lordes, a gastarem à tripa forra, mais do que permitiam as possibilidades do país, isto apesar de terem os mais baixos salários da Europa, foi a vez do patriarca Policarpo vir botar faladura e dizer que os portugueses são também parte responsável pelo descalabro em que se encontra o país. Na sua magnânima avaliação, disse ele, que tudo isto é resultado de exigirmos do Estado, mais do que ele pode dar, mas não referiu a obrigação que cabe a esse mesmo Estado de bem administrar e melhor redistribuir. Esqueceu-se de assinalar e enumerar a corja de bandoleiros que desviaram e gastaram em beneficio dos outros bandos que por aí andam, o que por direito pertencia aos supostos mal comportados e gastadores contribuintes. Sua Eminência devia persignar-se, confessar-se, recitar um milhão de pais-nossos como penitência, depois recolher-se em retiro espiritual, e deixar de dizer homilias recheadas de patacoadas, que só ofendem quem está desempregado, quem tem que sobreviver com salários miseráveis ou anda a respigar nos caixotes do lixo.

quarta-feira, outubro 03, 2012

A Coerência da Incoerência

EM 1 de Outubro de 2012, o vice-presidente da bancada do Partido Socialista José Junqueiro acusou Jerónimo de Sousa, secretário-geral do PCP, de andar de "mão dada com a direita", a propósito de aquele ter afirmado que o PS se demitiu de ser força de oposição à coligação PSD/CDS-PP. Disse isto sem se rir, e foi ainda mais longe, acusando Jerónimo de Sousa de ser um dos responsáveis por existir actualmente um governo de direita, na medida em que ao votar ao lado da direita, contra o PEC IV (Plano de Estabilidade e Crescimento) - produto de um suposto governo de esquerda, apenas no espírito mas não de facto - levou a que José Sócrates se demitisse.

Dois dias depois, em 3 de Outubro de 2012, o PS (partido submisso) do mesmo José Junqueiro, ancorado num pretenso sentido de responsabilidade por ter subscrito o memorando da troika, por se considerar oposição responsável e alternativa ao Governo, e rejeitar “populismos fáceis”, declarou que se irá abster (expressão máxima de coerente incoerência) na votação das Moções de Censura do PCP e do BE, dirigidas contra o Governo da coligação PSD/CDS-PP, as quais irão ser discutidas e votadas na sessão da Assembleia da República de 4 de Outubro de 2012.

A ver vamos o que resultará desta estrábica “lucidez” política.

terça-feira, outubro 02, 2012

Gente Sinistra e Perigosa (3)

OS PACOTES de austeridade, bem como o futuro de Portugal, decidem-se e são aprovados em Bruxelas, e os bandoleiros do Governo de Passos Coelho escondem-se e calam-se, já nem se dignando informar os portugueses, de quais as novas desgraças que planearam e contrataram.

BE e PCP respondem com moções de censura, ao passo que o PS (partido submisso) continua a sentir-se confortável com a sua teoria da "austeridade inteligente", no "sentido de responsabilidade", e a refugiar-se nas "abstenções violentas", provávelmente à espera de entrar para o tal governo de salvação nacional, de iniciativa presidencial, para continuar a ajudar à missa.

segunda-feira, outubro 01, 2012

Regressem ao Sítio de Onde Vieram!

«Estado deu benefícios fiscais a empresas de 2,6 mil milhões em dois anos. Valor dos benefícios fiscais a empresas em 2010 e 2011 equivale a mais de metade da austeridade exigida em 2013.

Os benefícios fiscais concedidos pelo Estado português ascenderam a 2,6 mil milhões de euros, entre 2010 e 2011. Os incentivos fiscais concedidos em dois anos representam assim mais de metade do esforço de consolidação previsto para o próximo ano que, segundo o ministro das Finanças é da ordem dos 4,9 mil milhões de euros para atingir a meta do défice orçamental de 4,5%.

No ano em que Portugal pediu a assistência financeira internacional foram até concedidos benefícios em sede de IRC a mais 3.353 empresas, ainda que a despesa fiscal total, no final desse ano, tenha registado uma diminuição de 133 milhões de euros face a 2010.

A publicitação da lista com as empresas que tiveram benefícios fiscais e respectivos montantes referentes a 2011, no Portal das Finanças, surge um dia depois de ter sido publicada informação relativa a 2010. No ano passado, os benefícios fiscais somaram 1.237 milhões de euros, menos 9,7% face à despesa fiscal do ano anterior que foi de 1.370 milhões de euros. Entre as duas listas mantêm-se uma constante: a maior fatia de benefícios concedidos pelo Estado continuou a ir para a Zona Franca da Madeira.

Zona Franca absorve maiores benefícios.

Em 2011, o universo de empresas abrangidas somou as 14.189 as entidades, mais 3.353 face a 2010.

Na lista disponibilizada, as principais beneficiárias continuam na Zona Franca da Madeira. No topo da lista, surge a CSN Europe Lda que recebeu 187 milhões de euros, seguindo-se Namisa Europe, Unipessoal Lda com 120 milhões de euros e em terceiro lugar vem o Millennium BCP Participações SGPS, Sociedade Unipessoal Lda, também da Zona Franca, com incentivos fiscais de 98,3 milhões de euros. Em quarto lugar da lista de entidades que tiveram mais benefícios fiscais surge a Caixa Económica Montepio Geral com 53,4 milhões de euros.

Segundo os dados das Finanças, no top 50 dos incentivos fiscais constam empresas como a VW AutoEuropa, a Efacec Capital SGPS, a Corticeira Amorim SGPS, a Universidade Aberta, a SIBS SGPS, GalpEnergia e Pingo Doce Distribuição Alimentar. Todas acima dos três milhões de euros de benefícios em sede de IRC.»

Notícia de Lígia Simões e Paula Cravina de Sousa, publicada no DIÁRIO ECONÓMICO on-line de 28/09/12 - 17:30

Meu comentário: Ver os apoios de recapitalização que a banca tem recebido com as tranches da troika, não estarem a ser aplicados no financiamento das empresas e da economia em geral, saber que o Governo não extinguiu a Fundação Social Democrata da Madeira, que está a ser investigada pelo Ministério Público, no âmbito de uma generalizada infecção de corrupção e desvios de dinheiros públicos, saber que a Segurança Social apresenta um défice de 694 milhões, depois das transferências de fundos de pensões da banca, destinadas a salvar as contas de 2011, suspeitar que o Governo tem em estudo um corte generalizado no subsídio de desemprego, bem como estar a preparar uma proposta de aumento de impostos para o próximo ano, incluindo o IRS, para compensar a devolução parcial dos subsídios de Natal e de férias retirados ao sector público e pensionistas, ao mesmo tempo que mantem simbólicamente colectadas, quando não fiscalmente ignoradas, as grandes fortunas e os lautos rendimentos de capital, ouvir o economista, eminente cavaquista e também conselheiro de Estado Victor Bento, que já em 2009 defendia a descida dos salários, reclamar agora que a idade de reforma deve ser alargada, para que os portugueses trabalhem até tombarem para o lado, para depois ouvir Passos Coelho, e mais uns quantos facínoras da política, dizerem com aquela conhecida expressão de falso martírio e comiseração, que os sacrifícios estão a ser partilhados por todos e que não há alternativas, dá vontade de dizer: - Façam meia volta e regressem ao sítio de onde vieram!

domingo, setembro 30, 2012

O Borges é Três Vezes FDP

A CRIATURA não merece muitas palavras, mas convém estarmos atentos à sua loquacidade fecal, porque o meliante tem lugar cativo à mesa do orçamento e emparceira com o Governo, influenciando (ou arquitectando) as suas perversas decisões. Assim, sem receio de errar, podemos dizer que o Borges é três vezes um refinado FDP; a primeira porque é um Figurão Dos Poderosos (desde que não sejam ignorantes, claro está!), a segunda porque é um Fanático Das Privatizações, e a terceira porque é um Fabricante De Precariedade. E mais não digo.

quinta-feira, setembro 27, 2012

Austeridade ao Retardador


É GARANTIDO que as novas medidas de austeridade que o Governo já tem delineadas, apenas chegarão ao domínio público depois de ocorrer a manifestação da CGTP, a ter lugar no sábado, dia 29 de Setembro. Percebe-se que o Governo queira retardar a sua divulgação para não potenciar os protestos e a indignação dos portugueses, mas talvez venham a ter mais uma surpreza.

domingo, setembro 23, 2012

Cantar e Acordar


ALGÉM disse um dia destes que os portugueses se sentiam desiludidos e atraiçoados pelos políticos da oposição, e que o resultado era as manifestações de protesto serem cada vez menos concorridas, dando a sensação que o povo, apesar de estar a ser selváticamente espoliado pelo governo, mantinha-se ancorado nos tradicionais brandos costumes, estava possuído de grande desânimo, tinha baixado os braços e desistido de lutar. Na verdade, também eu já começava a duvidar que alguma vez, por mais faíscas que saltassem, não chegavam para incendiar a indignação, trazendo os protestos para a rua, com a adequada força, expontaneidade e determinação. Nesse aspecto, e em situações semelhantes, a resposta rápida, a audácia e arrojo dos espanhóis, sempre me impressionou.

Finalmente, por cá, a fervura começou a levantar, primeiro a 15 de Setembro, e depois a 21, pela madrugada dentro, com uma participação verdadeiramente inovadora e desafiante, frente ao Palácio de Belém (com várias réplicas espalhadas pelo resto do país), enquanto decorria o Conselho de Estado, e não tanto por causa da tal suposta traição dos políticos da oposição. E quando digo inovadora, isso significa que a população decidiu tomar a iniciativa da contestação, e com isso restituiu aos partidos da oposição a força que lhes estava a faltar, embora possa parecer que se inverteram os papeis, passando os partidos de condutores a conduzidos. Ora, por vezes, em política, acontecem destes fenómenos; é de baixo que irrompe impetuosamente a força da razão, ao passo que as cúpulas não têm outro remédio senão subscrevê-la e dar-lhe expressão política.

É certo que o caldo se entornou com aquela tentativa de voltar a expoliar os trabalhadores com o criminoso aumento da TSU, mas o governo não vai desistir dos seus intentos. Se não é por via da TSU, outros expedientes eles encontrarão, para subtrair a quem trabalha ou está reformado, aquele apetecivel mês de salário ou de reforma de que eles se querem apropriar à viva força (sempre quero ver que posição irão assumr o PS e a UGT), um passo importante para impor a austeridade como modelo dominante e definitivo, baseado no empobrecimento generalizado, na erosão dos direitos sociais e na supressão de expectativas, mantendo incólumes as grandes fortunas e os rendimentos do capital. Portanto, convém manter à mão aquela letra de José Gomes Ferreira, e a música de Fernando Lopes Graça, para nos mantermos despertos, e voltarmos a sair à rua, sempre que os salteadores sejam tentados a repetir a proeza. Nesta altura, voltar a adormecer, é um risco que o povo não pode correr.

Acordai
acordai
homens que dormis
a embalar a dor
dos silêncios vis
vinde no clamor
das almas viris
arrancar a flor
que dorme na raíz

Acordai
acordai
raios e tufões
que dormis no ar
e nas multidões
vinde incendiar
de astros e canções
as pedras do mar
o mundo e os corações

Acordai
acendei
de almas e de sóis
este mar sem cais
nem luz de faróis
e acordai depois
das lutas finais
os nossos heróis
que dormem nos covais
Acordai!

sábado, setembro 22, 2012

Aberrações e Originalidades

VAI HAVER um grupo de acompanhamento, denominado "conselho de coordenação da coligação", olarilolé, destinado a gerir o relacionamento dos parceiros da coligação PSD/CDS-PP, para já, com a obrigação de diáriamente se beijarem e abraçarem. A partir de agora os portugueses já podem voltar a dormir descansadíssimos, pois as relações e a oscilação dos humores entre os membros do Governo passarão a ser filtrados, amortecidos e normalizados pelo tal conselho, o que significa que quando um ministro propõe que se mate o contribuinte, e outro diga que o melhor é esfolá-lo vivo, para evitar discórdias, lá virá o "grupo de acompanhamento" aconselhar que se fiquem por umas escoriações ou pequenas mutilações, mas nunca soluções radicais.

Acho que era mesmo um orgão deste tipo que o governo estava a precisar, evitando que suas excelências andem por aí desacompanhadas, ausentes, instáveis, irritadiças, indecisas, deprimidas e intratáveis, esquecendo tanto as suas obrigações recíprocas, bem como as que devem ser asseguradas com o país. Parece que a Presidência da República vê com muito bons olhos esta inciativa, e se o Presidente for do mesmo partido dos da coligação, melhor ainda, pois é como se fosse Deus com os anjos. Por isso, seja uma aberração ou uma originalidade, que venha o diabo e escolha.

sexta-feira, setembro 21, 2012

Mistificações

A COMUNICAÇÂO social, escrita e audio-visual, continua a ter uma escolha muito restrita nos seus paineis de comentadores. Parece que o pais está reduzido a meia dúzia de "sábios", escolhidos a dedo. Tudo gente que dá opiniões redondas, pitorescas e inofensivas, como se estivessem a encher chouriços. São sempre os mesmos que palestram e botam faladura, "madrinhas" e "padrinhos" do tipo Helena Matos e Ângelo Correia, este último a terçar armas pelo "afilhado" Coelho, garantindo que tudo isto à volta da TSU, são mal-entendidos e garotadas dos inexperientes CDSs, parceiros de coligação do PSD, a confirmar uma teoria de desculpabilização que continua a ganhar corpo, e que eu já tinha vindo a referir.

A estes soma-se o sempre omnipresente caga-sermões Mário Soares, a debitar uma solução "à grega", para solucionar a crise política portuguesa, isto é, muda-se de protagonistas sem se mudar de políticas, sem consulta eleitoral, logo sem gastos, sem propostas nem soluções, para darmos um salto em frente e chegarmos à mesma situação da Grécia, mais depressa do que imaginávamos. Acrescente-se a isto o caga-sentenças Marcelo Rebelo de Sousa, o impagável Camilo Lourenço, o sempre-em-pé António Barreto e o honorável Medina Carreira. Todos a mistificarem, receitando emplastros para desinfectarem uma estabilidade e realidade que o Governo todos os dias se encarrega de dinamitar, a quererem impingir-nos gato por lebre, e a dizerem que o grande problema do Governo é uma insuficiência de comunicação (só falta culpar o acordo ortográfico!). Se bem percebo, está na hora de passar a modelar e calibrar as medidas de austeridade, bem como a forma de as transmitir (ou não transmitir) a quem vai sofrer na pele os seus efeitos, de forma suave e adoçicada, para abafar os protestos, não fazer ondas nem provocar estragos.

No meio de tudo isto, fica-me a dúvida se o Presidente da República convocou o Conselho de Estado (mais o Gaspar e a sua folha de Excel) para se aconselhar e tentar controlar os danos provocados pelas alterações na TSU, dando um puxão de orelhas ao Coelho, se para dar um ralhete à troika, se apreensivo com a fraca popularidade e credibilidade do Governo (e já agora, também da sua) ou se motivado pelo facto da coligação PSD/CDS-PP estar presa por arames, não se ouvir falar de conselhos de ministros, substituídos por cimeiras dos generais Pedro e Paulo, acusados de andarem a convocar os seus estados-maiores e conselhos de guerra, e apenas comunicarem entre si por meio de mensagens cifradas e estafetas.

No meio dos improvisos da classe política e das badalhoquices dos comentadores de meia-tijela, nota positiva para a escritora Maria Tereza Horta, por rejeitar ser agraciada por Pedro Passos Coelho, "uma pessoa empenhada em destruir o país", muito embora se considere honrada com o Prémio D. Dinis, pelo seu romance "As Luzes de Leonor". Isto prova que ainda há pessoas decentes, que não se disponibilizam para salamaleques nem se dobram por dez réis de mel coado.

quarta-feira, setembro 19, 2012

Aprender com os Filmes





«Os juízes servem para fazer justiça, aplicando a lei, só que a lei nem sempre é justa»

Opinião do juiz Philippe, desempenhado pelo actor Philippe Noiret (1930-2006) no filme A Grande Farra (La Grande Bouffe) de 1973, realizado por Marco Ferreri.

terça-feira, setembro 18, 2012

Pedro e Paulo, mais o António


PEDRO decide garrotar os trabalhadores portugueses com o agravamento da TSU e do IRS, dizendo que não há alternativa. Vem depois o Paulo (após um grande silêncio, para finalmente fazer coro com o resto do mundo), dizer que não concorda e a brandir o seu desvelado patriotismo para justificar a continuação no governo, digamos que sob protesto. Ao ver que a solução deu para o torto, Paulo sacaneia o parceiro Pedro da coligação, fazendo-se passar por virgem púdica e ofendida, a fim de se desvincular das malfeitorias perpetradas por Pedro, e com isso vir a colher dividendos junto dos portugueses. Pelo meio, alguém que me explique o que é isso de um imposto extraordinário sobre as PPPs, solução alternativa defendida pelo António da abstenção violenta, que logo serviu para aparecerem os defensores de um governo de salvação nacional a três, uma coisa que até dava muito jeito ao Pedro e ao Paulo, para diluir responsabilidades. Então e a renegociação das rendas das tais PPPs? E os rendimentos do capital? E os lucros das grandes empresas? E os dividendos dos accionistas? E as grandes fortunas que se andam a passear, cá dentro e lá fora?

Quanto ao povo, no passado 15 de Setembro, à margem de convocatórias partidárias e sindicais, e com um enérgico protesto a nível nacional, levantou-se e deu sinal de que não quer continuar a ser albardado.

Entretanto, fica por explicar como é que esta coligação funciona, e se o seu objectivo é governar ou apenas tiranizar o povo. Não acredito muito na teoria da ingenuidade, da inexperiência ou da incompetência dos seus membros. Penso que embrulhados e desculpabilizados por essa teoria, passo a passo, com muita paciência e alguma turbulência artificial pelo meio, vão levando a água ao seu moinho. Para dramatizar, Bruxelas já vai ameaçando que se a TSU não for para a frente, suspendem a próxima tranche, em nome da Merkel, do Euro e do raio que os parta a todos. A crise política que se avizinha serve para pôr o país de quarentena, na calha para abandonar o Euro, e se repararmos bem, na Grécia o percurso foi mais ou menos o mesmo.

quinta-feira, setembro 13, 2012

Gente Sinistra e Perigosa (2)


FALHOU a troika, o Governo reincide, vai mais longe que a troika e falha também, porém, o tratamento escolhido continua a ser uma desalmada fuga em frente, feita de receitas extraordinárias (as privatizações) e outras permanentes (as reduções salariais), até ao descalabro total. Nessa altura já estaremos todos (menos os do costume) vestidos de andrajos e calçados de alparcatas, a dormirmos debaixo da ponte e a irmos buscar o saquinho de géneros à Caritas ou ao Banco Alimentar Contra a Fome. Por este andar teremos consultas nos hospitais só às segundas, quartas e sextas, e aulas do ensino público obrigatório só às terças, quintas e sábados. Às quartas-feiras, à noite - conhecida como noite do optimista - teremos que ouvir a homilia do Coelho, acolitado pelo Gaspar com o seu discurso "robótico", em que eles prometem uma terra de mel e fartura, à custa de novas medidas de austeridade, até que apareça a luz ao fundo túnel. Ao domingo vai-se à missa, para não cairmos em tentação, e agradecermos o pão que o diabo amassou por conta do Passos Coelho.

O problema é que os portugueses têm estado a avaliar incorrectamente este Governo PSD/CDS-PP, pensando que eles não passam de um grupelho de miúdos do jardim infantil, que decidiram brincar aos governos, fazendo do país um laboratório, e da vida das pessoas uma bancada exprimental das suas teorias económicas. Nada mais errado! Não são amadores, nem trambolhos, nem incompetentes; esta gente sabe perfeitamente o que está a fazer e ao que vão. São fanáticos austeritários, insensíveis ao facto de estarem a vandalizar pessoas. Na verdade, estamos a ficar sequestrados por malfeitores de grosso calibre, muito mais que candidatos a delinquentes, que sabem perfeitamente o que querem, o que estão a fazer, e para benefício de quem. Isto é o que dá quando começa a tardar dar-lhes a resposta adequada, remetendo-os para o sítio de onde vieram.

terça-feira, setembro 11, 2012

Uma História para a História


EM 20 de Julho de 2012 e com o título "Vulnerabilidades" teci algumas considerações sobre o historiador Rui Ramos, enquanto autor de comentários na imprensa, e que por arrastamento me levaram à História de Portugal, de que ele foi coordenador e co-autor, que estava a ser oferecida pelo semanário EXPRESSO, e cuja leitura só naquela altura eu estava a iniciar. Estava longe de imaginar que se iria instalar, tanto na imprensa como na blogosfera, uma acesa polémica sobre a tal História de Portugal, a propósito das críticas que o historiador Manuel Loff fez da obra. Algumas semanas decorridas, o artigo que o professor Fernando Rosas dedicou à polémica, parece-se que a encerra, pouco mais havendo a dizer, mas mesmo mau foi quando no seu início, uma polémica que se adivinhava boa, se tentou matá-la com acusações de calúnia pessoal, ou ainda quando Maria Filomena Mónica sugeriu que Manuel Loff fosse ostracizado e os seus escritos censurados. Para tirar dúvidas, no CARTÓRIO DO ESCREVINHADOR estão coligidos alguns dos escritos que alimentaram a controvérsia.

Quanto à obra (a tal História de Portugal) propriamente dita, cuja leitura só agora estou a terminar, sobretudo nos capítulos pós-implantação da República, e no que respeita ao período da ditadura do Estado Novo, não gostei do que li, pois Rui Ramos ao enveredar pelo artifício da sistemática comparação do modelo português, com outros regimes seus contemporâneos, socorrendo-se da citação de muitos autores que encaravam a ditadura salazarista, com alguma benevolência, e não querendo expor-se demasiado, eu diria, quase desresponsabilizando-se, deixando a pairar no ar um "estão a ver, não fui eu que disse!", acaba por fazer uma História asséptica, branqueada, amena, descaracterizada, desbastada, desvinculada de ideias, que nada tem a ver com uma visão desapaixonada e questionadora da verdade histórica. Não é propriamente uma falsificação da História, mas sim uma criativa e aligeirada interpretação da História, além de que os factos históricos baseados em opiniões e testemunhos, viciados ou contaminados por preconceitos, tal como as pequenas e grandes omissões, não são propriamente falsificações, mas podem levar a que sejam manipulados resultados e conclusões. A minuciosa escolha das fontes e das citações, pelo facto de terem sido pronunciadas por outros, não liberta o historiador de responsabilidades. O historiador é mais médico legista que cirurgião estético ou anestesista. Tal como não basta dizer meias verdades; uma coisa é dizer apenas que um automóvel anda porque tem rodas, outra coisa é dizer que um automóvel anda porque tem rodas, um motor que as faz faz rodar e alguém que o conduz. Bem, e quanto ao período posterior à revolução do 25 de Abril de 1974, esta História deixa um bocado a desejar, e o facto de ser uma síntese não é desculpa. É mais panfleto que História propriamente dita, pois o senhor historiador Rui Ramos não esteve com meias medidas, e decidiu mesmo acertar contas com os ventos da História e com as pessoas de quem não gosta. Em resumo: nove fascículos depois, prevalece a minha opinião inicial. Gosto menos de Rui Ramos como comentador do que como historiador, muito embora como historiador também não o considere grande espingarda.

E já que falamos de História e de historiadores, e da tentação que é fazer cirurgia estética sobre os períodos históricos mais negros e controversos, queria terminar com dois apontamentos.

O primeiro tem a ver com uma notícia que chegou até nós,  em Janeiro de 2012, e que dava conta que o Presidente do Chile, Sebastian Piñera, fez aprovar pelo Conselho Nacional de Educação, uma disposição destinada a permitir a alteração da palavra “ditadura” nos manuais escolares, substituindo-a por "regime militar", sempre que era referido o período em que o general Augusto Pinochet governou o país entre 1973 e 1990, depois de ter deposto com um golpe militar o legítimo governo de Salvador Allende, deixando atrás de si mais de 3.000 mortos e desaparecidos, a par de uma repressão feroz, com perseguições e graves violações dos direitos humanos. De uma assentada, uma simples mudança de expressão, pretende varrer para debaixo do tapete todas as ignomínias praticadas durante aquele período negro. O objectivo é provocar a banalização e diluição, junto das camadas jovens, daquele período da História Chilena. E já agora, não me venham contrapor, como desculpa, os crimes e os "apagões" levados a cabo sobre a história soviética, durante o período estalinista, pois isso é matéria que já foi devidamente posta no seu lugar, e não serve para equilibrar os pratos da balança, antes pelo contrário.

O segundo apontamento, é mais um convite. Que leiam o excelente texto que o escritor Mário de Carvalho publicou no Facebook, e que tomei a liberdade de transcrever no CARTÓRIO DO ESCREVINHADOR. Intencional ou não, como forma de remate da polémica Manuel Loff vs Rui Ramos, deixo que cada um faça o seu julgamento, e que no fim prevaleça, indiferente a ventos e marés, a sempre omnipresente verdade, pois a História dita "normalizada", maquilhada, adoçada ou sujeita a reconstruções plásticas, é coisa que não se deve tolerar.

Ilustração: “História” do pintor grego Nikolaos Gysis (1892)

domingo, setembro 09, 2012

Gente Sinistra e Perigosa


AS NOVAS medidas de austeridade são clarividentes e quase não precisam de ser descodificadas. Ao passarem a ter a Taxa Social Única agravada em 7%, são os trabalhadores que passam a financiar  com um mês de ordenado os desv(ar)ios orçamentais, ao passo que os patrões são contemplados com uma redução de 5,75% dessa mesma Taxa Social Única. Quanto aos rendimentos da riqueza, lucros das grandes empresas e do sacrossanto capital, mantêm-se intocáveis, e os bancos que deveriam aprestar-se a financiar a economia, continuam a passar incólumes e fazerem ouvidos de mercador às necessidades daquela. Cortes nas Fundações e renegociação das rendas das Parcerias Público-Privadas, é coisa para se ver mais tarde, com calma, depois de amigavelmente sopesada. Diz Pedro Passos Coelho, o sinistro primeiro-ministro deste flibusteiro governo PSD/CDS-PP, que o agravamento para os trabalhadores se destina a promover a equidade dos sacrifícios (equidade é a tua tia, pá!) e a compensar o chumbo que afectou os anteriores cortes de subsídios, decretado pelo Tribunal Constitucional, ao passo que o desconto para as empresas se destina a reduzir os custos do trabalho, fomentando o emprego e estancando o desemprego. Depois do anúncio destas medidas, o atrevido Coelho ainda teve o descaramento de ir para o Facebook fazer mais uma promessa: "Amigos, os sacrifícios ainda não terminaram...". Amigo era a tua tia, pá!

Entretanto, configura-se no horizonte mais um assalto ao bolso dos contribuintes, com a prometida redução do número de escalões do IRS, medida que foi "vendida" como sendo destinada a simplificar o sistema fiscal e a promover a sempre omnipresente competitividade (não se sabe bem de quê), mas que na realidade se vai traduzir num agravamento generalizado daquele imposto, como consequência do alargamento dos parâmetros de incidência dos escalões.

A fazerem política de corso, esta gente é sinistra, e Pedro Passos Coelho passa de político potencialmente perigoso, a perigoso de facto.