segunda-feira, novembro 21, 2005

Reflectir e Perguntar


Estou quase tentado a concluir que se está a tornar desnecessário insistirmos em caracterizar e criticar a sociedade portuguesa actual. Em termos genéricos, já tudo foi dito. Para isso basta recapitular o que escreveu Eça de Queirós, há respectivamente 138 e 134 anos, e que a seguir se transcreve. Não acreditamos em fados, destinos e fatalidades, porém, curiosamente, quase tudo se ajusta às mentalidades, às competências e à situação actual do país. Basta ler, reflectir e perguntar: - Com tanto tempo decorrido, será que não aprendemos nada?

Em 1867 Eça de Queirós escreveu:
"Ordinariamente todos os ministros são inteligentes, escrevem bem, discursam com cortesia e pura dicção, vão a faustosas inaugurações e são excelentes convivas. Porém, são nulos a resolver crises. Não têm a austeridade, nem a con­cepção, nem o instinto político, nem a experiência que faz o ESTADISTA. É assim que há muito tempo em Portugal são regidos os destinos políticos. Política de acaso, política de compadrio, política de expediente. País governado ao acaso, governado por vaidades e por interesses, por especulação e corrupção, por privilégio e influência de camarilha, será possível conservar a sua independência?"

Mais tarde, em 1871, voltou a escrever:
”Estamos perdidos há muito tempo...
O país perdeu a inteligência e a consciência moral.
Os costumes estão dissolvidos, as consciências em debandada.
Os caracteres corrompidos.
A prática da vida tem por única direcção a conveniência.
Não há princípio que não seja desmentido.Não há instituição que não seja escarnecida.
Ninguém se respeita.Não há nenhuma solidariedade entre os cidadãos.
Ninguém crê na honestidade dos homens públicos.
Alguns agiotas felizes exploram.A classe média abate-se progressivamente na imbecilidade e na inércia.
O povo está na miséria.
Os serviços públicos são abandonados a uma rotina dormente.
O Estado é considerado na sua acção fiscal como um ladrão e tratado como um inimigo.A certeza deste rebaixamento invadiu todas as consciências.Diz-se por toda a parte, o país está perdido!"

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