terça-feira, julho 31, 2012

Sobre o Impacto dos Discursos


NOTA prévia: Estive vários dias a meditar sobre o assunto, e só avanço agora com o meu juízo, quando as dúvidas já estão reduzidas ao mínimo. O tempo dirá, se sim ou não, tenho razão. Fica escrito e assinado.

No passado dia 23 de Julho, Pedro Passos Coelho, numa reunião com quadros do PSD (que propositadamente, não foi à porta fechada), ao relacionar de forma subtil a sua dieta de emagrecimento com aquela traumática expressão de "que se lixem as eleições", tinha um objectivo preciso. Aquele discurso não foi improvisado, mas sim estudado milimétricamente para causar um efeito preciso. E para isso foi posta a funcionar a máquina de produzir ideias-chave do marketing político, o qual além de servir para ganhar eleições, também serve para manter governos no poder, umas vezes de forma "pimba" (caso de José Sócrates), outras vezes de forma mais sofisticada. O marketing político sabia que aquela ideia de associar dietas de emagrecimento com o desprezo por eleições, iria ter repercussões, e no momento actual, o que é preciso é fazer repercutir ideias, e quanto mais popularuchas, melhor…

Acho que foi este o caso, e o objectivo era simples! A intenção de Passos Coelho foi a de explorar o sentimento generalizado de descrédito dos políticos e da democracia, que grassa entre os portugueses, colocando-se ao lado da opinião corrente de que as eleições constituem uma despesa extraordinária que só serve para agravar o défice, e que no fundo até não solucionam "técnicamente" nenhum dos problemas com que os portugueses se debatem. Foi como se tivesse dito: Vêem, vêem? Quanto a eleições, eu penso exactamente como vós, e quanto a salvar Portugal estou aqui cheio de vigor e determinação, e podem contar comigo. A finalidade era desclassificar as eleições, como instrumento de mudança, colocando-se, ele, Passos Coelho, num patamar superior, e "oferecendo-se" em sacrifício ao supremo e patriótico objectivo de salvar Portugal. Onde é que eu já ouvi isto?

Por outro lado, misturar problemas políticos bicudos com dietas de emagrecimento, serve também para reforçar este discurso pseudo-improvisado. Tendo as dietas a ver com menos gordura, não só significam mais sobriedade e austeridade, mas também mais agilidade, com o consequente aumento da energia e da capacidade de trabalho, para levar de vencida aquela missão, que ele, Passos Coelho, configurou como histórica, urgente e consensual. Além disso, a par do seu martírio da governação, apela ao nosso resignado consentimento, para que continuemos a ser desbastados até ao osso. Passos Coelho não precisou de ser histriónico, nem de vitimizar-se. Fez exactamente o contrário. Foi com calma e serenidade, embora com algum dramatismo à mistura, que esvaziou de sentido as eleições, chegando mesmo a perguntar ao parceiro do lado (como se não soubesse) como se aplicava o termo "lixar".

Embora congeninado para ser dito num encontro partidário, os destinatários daquele discurso não eram própriamente as hostes do PSD, mas sim o povo português em geral. Não foi por acaso que foi retransmitido até à exaustão por todos os canais de comunicação social, ocupando durante os dias seguintes, a legião de comentadores do costume, com muitas e variegadas interpretações sobre o seu significado. Comigo, o seu destino estava traçado: era ao povo que interessava fazer chegar a mensagem, e isso, o tempo dirá se foi conseguido. Que o primeiro-ministro comungava das mesmas apreensões que o mais desiludido e comum dos portugueses, quanto à eficácia da democracia para solucionar a crise, e que ele se entregava, de alma e coração, para acabar com ela, se disso dependesse a "continuidade" de Portugal. Onde é que eu já ouvi isto?

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