quarta-feira, novembro 18, 2009

A “Reserva Moral” da República

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No DIÁRIO DE NOTÍCIAS de 17 de Novembro o Dr.Mário Soares, num artigo intitulado A 'FACE OCULTA'... DA JUSTIÇA, teceu algumas considerações sobre o processo do mesmo nome. Transcrevo alguns parágrafos do texto, para que se avaliem quais os alvos e situações marginais que Mário Soares escolheu para desviar as atenções e desacreditar a investigação, por sinal, as mesmíssimas situações marginais que em referi no meu post intitulado OS VIOLADORES. Mas leiam, que vale a pena, pois este cavalheiro tenta usar o seu "prestígio" e "lucidez" para, ao argumentar com as violações do segredo de justiça, contribuir para desviar as atenções e lançar uma pesada cortina de suspeitas sobre a investigação, senão mesmo decapitá-la. O interessante é que ele sabe do que fala…

"1.Não acabou ainda o caso Freeport, embora já esteja encerrado pela justiça inglesa, e já rebentou, de forma a quase não se falar de mais nada, em todos os meios de comunicação social, a "Operação Face Oculta". Reconheçamos que são curiosos o espírito inventivo e o esmero com que a Polícia Judiciária ou o Ministério Público (não sei a quem atribuir a paternidade) dão nome aos escândalos que investigam... Outras operações do género, como por exemplo a "Operação Furacão", depois dos escândalos das devassas a importantes bancos e outras empresas a que deu lugar - largamente divulgadas -, ficou tudo, como se diz, em águas de bacalhau... Com o mesmo mistério com que surgiram, desapareceram, até agora, sem deixarem rasto. Porquê? Ninguém sabe.

No caso vertente, a "Operação Face Oculta" parece ser... a da justiça. Porque ninguém sabe donde vêm as "fugas" e quem - e com que fim - as divulgam nos jornais, rádios e televisões. Mas toda a gente as discute. Pior: sem saber se correspondem à verdade ou são uma pura falsidade, para entreter a opinião pública, desprestigiar ainda mais a justiça, e descredibilizar a democracia, à semelhança do que se passou em Itália - com os resultados politicamente devastadores que se conhecem - e noutros países europeus, nossos parceiros, como a vizinha Espanha. Note-se que alguns comentadores portugueses - et pour cause... - começam a falar em "apodrecimento do regime"...

Leia-se a comunicação social do fim-de-semana, e oiçam-se os comentadores das rádios e televisões, algumas vezes escolhidos a dedo, e compreender-se-á que não se trata de uma "operação" casual - ou muito menos ainda de "fugas" fortuitas ou ocasionais - mas sim de "fugas" organizadas estrategicamente, em momentos específicos, com objectivos claros de desprestigiar a justiça, certos políticos e enfraquecer e desacreditar o sistema democrático, em que alguns outros políticos, inconscientemente, se intrometem, com fins imediatistas e oportunistas, tentando visar os seus adversários de momento.

Trata-se de um fenómeno que está a repetir-se, com excessiva e perigosa frequência. Daí que comece a falar-se abertamente, em todos os meios sociais, do descrédito e da corrupção da justiça, que constitui, sem dúvida, um dos pilares do nosso Estado de direito democrático e, obviamente, dos políticos e dos partidos julgados sempre como os responsáveis de tudo, nos regimes livres.

A opinião portuguesa - com tantos julgamentos feitos na praça pública, que constituem verdadeiros "assassinatos morais e políticos" de homens públicos, sem provas nem julgamento, hão-de considerar--se inocentes, mesmo que o não sejam. Daí conclui-se, necessariamente, que se vive num ambiente deletério em que paira a corrupção, de que a justiça é culpada, porque nunca consegue apurar nada de concreto, quanto às acusações e rumores que deixa propalar, prolongando os casos e, às vezes, os processos, sendo certo que não é capaz de punir ninguém...

A situação tornou-se tão opaca e confusa que, no fim da semana passada, um diário de grande circulação publicou em toda a largura da sua primeira página uma manchete: "O Ministério Público já abriu três inquéritos à violação do segredo de justiça no caso "Face Oculta"... Já não era sem tempo! Mas, claro, não se indica quem foram os inquiridos nem quais os segredos de justiça que violaram...

Realmente, os cidadãos têm razão para perguntar: a quem aproveita e para que serve o segredo de justiça? Para defesa dos arguidos - como devia ser - não é, seguramente. Mas para quem os viola - e os propaga impunemente - isso, sim: porque está a tornar-se uma forma muito corrente de denegrir a honra de figuras públicas, que ainda por cima não têm como se defender...

Sócrates - e muito bem - pediu respostas urgentes ao procurador-geral da República, dado os rumores que circulam sobre as conversas que terá tido, com Armando Vara. O procurador veio esclarecer, nos jornais de domingo, que "não vê indícios de crime nas escutas a José Sócrates". Antes, Vieira da Silva, que é um político impoluto, falou "em espionagem política" e disse, com razão, que "a situação, em termos de fugas de informação, é extremamente preocupante". Também acho que é.

Temos agora um novo ministro da Justiça, Alberto Martins, resistente à ditadura e homem de bem, como tal reconhecido. Espera-se que possa acabar com os escândalos da divulgação sistemática do "segredo de justiça". Uma das formas de se poder pôr fim ao polvo da corrupção, separando o trigo do joio. É importante que o faça, doa a quem doer. Por razões éticas e cívicas, em defesa do bom-nome da justiça e da nossa democracia, e até por razões económicas. É uma tarefa urgente que interessa vitalmente a todos os partidos e às pessoas de bem."

Como se pode ver, Mário Soares é atrevido: associa as fugas de informação do processo com manobras de enfraquecimento e descredibilização do regime democrático, vê nos processos uma cabala promotora de assassinatos morais e políticos, e acaba a concordar com as teorias da “espionagem política” de Vieira da Silva e Santos Silva, duas encomendas de se tirar o chapéu. A conclusão que se deduz é que Mário Soares, na sua ilustre “lucidez”, suspeita que o Ministério Público e os seus investigadores, não passam de uma dissimulada quadrilha de malfeitores, ao serviço sabe-se lá de quem.
Não sei se consigo resistir a tanta “lucidez” desta figura de “prestígio”! E já que falamos de "prestígio" e "lucidez", não resisto a transcrever o post de Ricardo Santos Pinto, que apesar de publicado em 17 de Junho de 2009, antes das últimas eleições legislativas, mantém toda a sua actualidade, e que reza o seguinte:

«A probabilidade de, nas próximas eleições legislativas, Portugal se poder tornar ingovernável é alta e perigosa para a democracia.»
A sentença só podia vir de alguém que tem pautado uma duradoura carreira política por extraordinários momentos de «lucidez».
Falo de Mário Soares, que ontem publicou aquela inacreditável frase no «Diário de Notícias».
No fundo, é a mesma «lucidez» que o fez meter, quando lhe deu jeito, o socialismo na gaveta durante a sua experiência governativa.
A mesma «lucidez» que lhe permitiu governar sem ler os «dossiers».
A mesma «lucidez» que lhe permitiu não voltar a ser primeiro-ministro depois de tão fantástico desempenho no cargo.
A mesma «lucidez» que lhe permitiu pôr-se a jeito para ser agredido na Marinha Grande e, dessa forma, vitimizar-se aos olhos da opinião pública e vencer as eleições presidenciais.
A mesma «lucidez» que lhe permitiu, após a vitória nessas eleições, fundar um grupo empresarial, a Emaudio, com «testas de ferro» no comando e um conjunto de negócios obscuros que envolveram grandes magnatas internacionais.
A mesma «lucidez» que lhe permitiu utilizar a Emaudio para financiar a sua segunda campanha presidencial.
A mesma «lucidez» que lhe permitiu nomear para Governador de Macau Carlos Melancia, um dos homens da Emaudio.
A mesma «lucidez» que lhe permitiu passar incólume ao caso Emaudio e ao caso Aeroporto de Macau e, ao mesmo tempo, dar os primeiros passos para uma Fundação na sua fase pós-presidencial.
A mesma «lucidez» que lhe permitiu ler o livro de Rui Mateus, «Contos Proibidos», e ter a sorte de esse mesmo livro, depois de esgotado, jamais voltar a ser publicado.
A mesma «lucidez» que lhe permitiu passar incólume às «ligações perigosas» com Angola, ligações essas que quase lhe roubaram o filho no célebre acidente de avião na Jamba.
A mesma «lucidez» que o fez não processar o Ministro da Comunicação Social de Angola, que disse que esse avião ia carregado de diamantes.
A mesma «lucidez» que lhe permitiu, durante a sua passagem por Belém, visitar 57 países («record» absoluto para a Espanha - 24 vezes - e França - 21), num total equivalente a 22 voltas ao mundo (mais de 992 mil quilómetros).
A mesma «lucidez» que lhe permitiu visitar as Seychelles, esse território de grande importância estratégica para Portugal.
A mesma «lucidez» que lhe permitiu, no final destas viagens, levar para a Casa-Museu João Soares uma grande parte dos valiosos presentes oferecidos oficialmente ao Presidente da República Portuguesa.
A mesma «lucidez» que lhe permitiu guardar esses presentes numa caixa-forte blindada daquela Casa, em vez de os guardar no Museu da Presidência da República.
A mesma «lucidez» que lhe permite, ainda hoje, ter 24 horas por dia de vigilância paga pelo Estado nas suas casas de Nafarros, Vau e Campo Grande.
A mesma «lucidez» que lhe permitiu, abandonada a Presidência da República, constituir a Fundação Mário Soares. Uma fundação de Direito privado, que, vivendo à custa de subsídios do Estado, tem apenas como única função visível ser depósito de documentos valiosos de Mário Soares. Os mesmos que, se são valiosos, deviam estar na Torre do Tombo.
A mesma «lucidez» que lhe permitiu construir o edifício-sede da Fundação violando o PDM de Lisboa, segundo um relatório do IGAT, que decretou a nulidade da licença de obras.
A mesma «lucidez» que lhe permitiu conseguir que o processo das velhas construções que ali existiam e que se encontrava no Arquivo Municipal fosse requisitado pelo filho e que acabasse por desaparecer convenientemente num incêndio dos Paços do Concelho, como ainda há poucos meses o PSD acusou.
A mesma «lucidez» que lhe permitiu receber do Estado, ao longo dos últimos anos, donativos e subsídios superiores a um milhão de contos.
A mesma «lucidez» que lhe permitiu receber, entre os vários subsídios, um de quinhentos mil contos, do Governo Guterres, para a criação de um auditório, uma biblioteca e um arquivo num edifício cedido pela Câmara de Lisboa.
A mesma «lucidez» que lhe permitiu receber, entre 1995 e 2005, uma subvenção anual da Câmara Municipal de Lisboa, na qual o seu filho era Vereador e Presidente.
A mesma «lucidez» que lhe permitiu que o Estado lhe arrendasse e lhe pagasse um gabinete, a que tinha direito como ex-Presidente da República, na... Fundação Mário Soares.
A mesma «lucidez» que lhe permite, ainda hoje, receber quase 4 mil euros mensais da Câmara Municipal de Leiria.
A mesma «lucidez» que lhe permitiu fazer obras no Colégio Moderno, propriedade da família, sem licença municipal, numa altura em que o Presidente era... João Soares.
A mesma «lucidez» que lhe permitiu silenciar, através de pressões sobre o director do «Público», José Manuel Fernandes, a investigação jornalística que José António Cerejo começara a publicar sobre o tema.
A mesma «lucidez» que lhe permitiu candidatar-se a Presidente do Parlamento Europeu e chamar dona de casa, durante a campanha, à vencedora Nicole Fontaine.
A mesma «lucidez» que lhe permitiu considerar José Sócrates «o pior do guterrismo» e ignorar hoje em dia tal frase como se nada fosse.
A mesma «lucidez» que lhe permitiu passar por cima de um amigo, Manuel Alegre, para concorrer às eleições presidenciais uma última vez.
A mesma «lucidez» que lhe permitiu, então, fazer mais um frete ao Partido Socialista.
A mesma «lucidez» que lhe permitiu ler os artigos «O Polvo» de Joaquim Vieira na «Grande Reportagem», baseados no livro de Rui Mateus, e assistir, logo a seguir, ao despedimento do jornalista e ao fim da revista.
A mesma «lucidez» que lhe permitiu passar incólume depois de apelar ao voto no filho, em pleno dia de eleições, nas últimas Autárquicas.
No final de uma vida de «lucidez», o que resta a Mário Soares? Erguer a voz e, em mais um momento de despeito, dizer que sem o PS, será o caos? Pensar que alguém ainda o ouve na sociedade portuguesa?"

Mais palavras para quê? Até hoje, tirando um apontamento aqui e ali, mais ou menos preguiçoso, nunca escrevi nada sobre Mário Soares, (contando com esta ajuda de Ricardo Pinto) que fosse tão frontal e agressivo. Como dizia um grande amigo meu, um dia virá que pomos tudo em pratos limpos e riscamos da agenda mais um assunto pendente, e calhou ser hoje, não porque o trouxesse engatilhado, mas porque Mário Soares o despoletou.
Mário Soares é um artista português que pensa que já nos esquecemos como se rebobina a história recente, aquela que conta como fundou com alguns amigos políticos um grupo empresarial destinado a usar fundos financeiros excedentes da sua campanha presidencial, que fez questão de ser visitado por alguns magnatas internacionais, tais como Rupert Murdoch, Sílvio Berlusconi, Robert Maxwell e Stanley Ho, com o objectivo de financiarem a sua reeleição, e outras coisas mais, muito pouco abonatórias, o que prova que a sordidez de que se reveste alguma classe política, não é só de agora, e tem antecedentes que vêm dos tempos em que Mário Soares andava pelos tablados do poder, o que acaba por esbater a distância que separa o “animal político” do “animal feroz”. Afinal, tudo coisas que não têm nada a ver com a política, mas apenas com a ética e a idoneidade. Na altura escapou por entre os estilhaços e os pingos da chuva, outras vezes ainda, recolhido sob o chapéu-de-chuva da ingenuidade dos cidadãos crédulos, que viam nele um herói, um combatente das liberdades, um adesivo a causas nobres, difusor do “socialismo em liberdade”, uma fantasia corrupta, mascarada com uma rosa de plástico, que acabou por dar naquilo que está à vista.
Em resumo, Mário Soares não aprendeu nada com a idade, pois quando hoje escreve o que escreve, logo vêm à memória as águas passadas, que embora não movam moinhos, nos advertem que, afinal, as “reservas morais” da República deixam muito a desejar.

terça-feira, novembro 17, 2009

A CONFIANÇA

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A CONFIANÇA nos órgãos e instituições da República, bem como em quem as dirige, é a matriz que deve reger o exercício da cidadania.
Neste momento, o meu grau de CONFIANÇA mede-se da seguinte forma:

- Não confio no Presidente da República;
- Não confio no Presidente do Supremo Tribunal de Justiça;
- Não confio no Procurador-geral da República;
- Não confio no Primeiro-Ministro;
- Não confio em nenhum membro do Governo da República;
- Não confio em nenhum elemento, SEJA DO QUE FOR, que tenha sido objecto de nomeação política, por qualquer das entidades anteriormente citadas.

Deixo aqui um desafio a quem quiser impugnar esta minha escolha.

segunda-feira, novembro 16, 2009

Os Violadores

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AS VIOLAÇÕES do segredo de justiça, têm muito que se lhe diga, ponto final, parágrafo.

Digo isto porque depois de uma investigação serena, discreta e cautelosa, como foi o caso do processo “Face Oculta”, levada a cabo pelo DIAP de Aveiro, como é que se explica que, a dada altura, quando se aproxima o momento de o processo entrar numa nova fase e serem tomadas decisões fulcrais, o processo comece a ser perturbado com a divulgação de aspectos e detalhes, que deveriam manter-se em segredo de justiça, coisa que acaba por beneficiar quem está a ser objecto de investigação, pois de imediato se assiste a indignadas atitudes que, insurgindo-se contra as tais violações do segredo de justiça, e usando esse argumento, começam a falar em cabalas, conspirações e missas negras, tentando colocar em causa a legitimidade, senão mesmo a idoneidade dessa investigação.
A minha opinião é que essas violações do segredo de justiça são encomendadas (neste país de “empresários”, toda a encomenda tem o seu “valor”), e destinam-se a funcionar como sabotagem controlada do processo em investigação, tentando desacreditá-lo perante a opinião pública. Pelos intervalos da chuva, vão continuando a escapulir-se os supostos violadores e, naturalmente, os “inofensivos” prevaricadores …
Em abono do que digo, isto é, que subsiste a intenção de desvalorizar e ver soçobrar as investigações, tal suspeita encontra eco no ponto de vista que os meios de comunicação que giram na órbita do poder socretino, fazem questão de defender, e que é rigorosamente o seguinte: mais importante que o progresso do caso “Face Oculta”, bem como de todos os episódios acessórios, envolvendo escutas em que aparece o Zé Sócrates, o que é vital e prioritário, é aprofundar a investigação sobre as profanações do segredo de justiça.
Entretanto, o presidente Cavaco, embora altamente preocupado, mantém-se hirto e paralisado, não dá um passo, não mexe uma palha, não chama ninguém, nem se digna fazer um ponto de ordem à mesa para estancar a bandalheira, ao contrário do PCP, que disse, na pessoa do corajoso deputado António Filipe, que isto não pode ficar assim, pois alguém vai ter que clarificar (não branquear) o que está a ficar negro como breu.

domingo, novembro 15, 2009

O Social Capitalismo

“…
Sempre escrevi aqui que, em minha opinião, o problema do PS não é o que ele deixa de fazer em benefício dos pobres, mas o que faz e consente em benefício dos potentados. O fascínio com o grande capital e os grandes negócios (inspirados, promovidos ou pagos pelo Estado) é a perdição do PS. Aos poucos, este PS tem vindo a copiar o modelo de gestão introduzido por Alberto João Jardim na Madeira: negócios privados com oportunidades e dinheiros públicos, em troca da solidariedade política para com o Governo. Um capitalismo batoteiro, com chancela “social” e disfarce de “interesse público”.
…”
Extracto do artigo de opinião de Miguel Sousa Tavares, publicado no semanário EXPRESSO de 14 de Novembro de 2009 com o título “As más companhias”. O título do post é da minha autoria.

sábado, novembro 14, 2009

República de Safardanas

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Depois da sexta-feira 13 de Novembro de 2009, e na sequência do desenvolvimento do processo FACE OCULTA, é esta a posição dos vários intervenientes, sintetizada através de súmulas de notícias da comunicação social:

O SOL disse:
Segundo o SOL apurou, as conversas entre Armando Vara e o primeiro-ministro sobre a questão PT/TVI, que constam no ‘processo Face Oculta’, ocorreram em Março – constituindo a primeira das nove certidões extraídas pelo DIAP de Aveiro.
Ora as declarações de Sócrates no Parlamento sobre este tema ocorreram a 24 de Julho. Esta semana, o procurador-geral da República (PGR) afirmou que soube do assunto «numa reunião, entre Maio e Junho», com o procurador do DIAP de Aveiro, titular do inquérito, e com o procurador-distrital de Coimbra.
Consultando a agenda oficial de Pinto Monteiro, o SOL constatou que essa reunião ocorreu no dia 24 de Junho, às 11h. Segundo o PGR, a primeira certidão (negócio PT/TVI) foi-lhe remetida no dia 26 de Junho, estando as conversas de Vara e Sócrates gravadas há algumas semanas.
Ora, Sócrates negou saber o que quer que fosse sobre o envolvimento da PT precisamente na tarde de 24 de Junho – dia do debate quinzenal com os partidos da oposição na Assembleia da República (e, curiosamente, o mesmo dia da reunião do PGR com os seus adjuntos).
No hemiciclo, e tendo em conta o historial recente de ‘guerra’ de Sócrates com a TVI, o CDS perguntou se o Governo estava a par do envolvimento da PT na compra da estação, que os jornais tinham revelado no dia anterior e que a própria PT já tinha assumido. José Sócrates foi peremptório a negar e até ironizou:
«O Governo não dá orientações nem recebe informações da PT. Mas qual é o interesse que o senhor deputado tem na linha editorial da TVI? Está preocupado com alguma coisa? Como eu o percebo: como a linha editorial é contra o Governo, não tirem de lá ninguém, pois assim é que está bem».
À saída do debate, Sócrates foi interpelado pelos jornalistas e voltou a responder: «Nada sei disso, são negócios privados e o Estado não se mete nesses negócios. Não estou sequer informado disso, nem o Estado tem conhecimento disso».

Primeiro-ministro SÓCRATES
Visivelmente irritado e incomodado com toda esta história, Sócrates considerou que o artigo do semanário SOL "não é uma notícia, é um insulto", que "isto está a passar todas as marcas" e disse esperar que Pinto Monteiro esclareça, "como prometeu", se o primeiro-ministro foi pessoalmente escutado "durante meses a fio (...) com conversas a serem transcritas e gravadas, e se isso é legal e possível de ser feito num Estado de Direito".
Sócrates recusou explicar o alegado conteúdo das conversas com Vara, dizendo que "fazem parte da reserva da minha vida privada, tive essas conversas com um amigo. Estou à espera que alguém diga se essas gravações são verdadeiras."

Ministro da Economia VIEIRA DA SILVA
Entrevistado na Antena 1, o ministro Vieira da Silva falou mesmo em "espionagem política": "O que motiva essas forças e as pessoas que estão por trás do que me parece ser uma ilegalidade não é qualquer averiguação relativamente a qualquer processo de corrupção, é pura espionagem política, porque estar a ouvir um dirigente de um partido que também é primeiro-ministro sobre temas políticos e depois colocá-los nos jornais através de escutas cuja legalidade é mais do que duvidosa, é algo de extremamente preocupante".

O Presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, JOÃO PALMA diz:
“Recuso-me a aceitar que um ministro de um Governo português, democrático, eleito, recentemente empossado, possa dizer uma coisa dessas com essa gravidade”. Classifica também as acusações de Vieira da Silva de “muito graves” e afirma que os magistrados “não têm medo do Governo, nem de ninguém”.
João Palma garante que os magistrados do Ministério Público não se deixam intimidar e que devem continuar a fazer o seu trabalho de “forma digna, correcta, isenta, seja quem for que esteja envolvido e tratando todas as pessoas de uma forma igual”.

Ministro AUGUSTO SANTOS SILVA
Entrevistado pela SIC admitiu também que este caso das escutas ao primeiro-ministro configura um episódio de espionagem política. Disse também que existiam "50 cassetes com escutas ao primeiro-ministro e realizadas durante meses". Quando o jornalista lhe perguntou como é que ele sabia que eram 50 cassetes, estando o processo em segredo de justiça, o ministro disse que essa informação já tinha sido dada pela comunicação social.

O EXPRESSO diz:
Pinto Monteiro, procurador-geral da República, admite ser impossível evitar as fugas de informação, “uma violência contra o Estado de Direito”. Por isso defende que “os políticos devem regular o segredo de Justiça, acabando com ele ou mudando a lei”. Dispõe-se a revelar tudo quanto lhe for possível do caso ‘Face Oculta’, porque “neste processo está a misturar-se política com Justiça” e é urgente “acalmar tudo” afirmando que “se depender de mim, e se for possível, divulgo as escutas para isto acalmar”. O PSD prepara iniciativas para forçar a divulgação do que levou à anulação das escutas que envolvem o primeiro-ministro.

O DIÁRIO ECONÓMICO diz:
O país assiste, neste momento, a várias "guerras" distintas, na sombra do processo Face Oculta. A par da investigação criminal, aparece, de um lado, o primeiro-ministro a querer saber porque razão andou a ser escutado "meses a fio" e se essas escutas foram ou não legais. Do outro, a oposição a exigir esclarecimentos políticos sobre o que José Sócrates refere em relação ao negócio da TVI nessas alegadas conversas com Armando Vara. Pelo meio, assiste-se ainda a uma luta de poderes entre o Procurador-Geral da República e o Supremo Tribunal de Justiça pela liderança da investigação criminal.

O CORREIO DA MANHÃ diz:
Suspeitas da prática de atentado contra o Estado de Direito, punido pela lei 34/87, que legisla sobre os crimes de responsabilidade dos titulares dos cargos públicos, foi a fundamentação usada pelo Ministério Público de Aveiro para extrair duas certidões visando o primeiro-ministro, José Sócrates. Aquele diploma legal foi ainda articulado com o artigo 38º, número 4, da Constituição, para fundamentar as suspeitas de manipulação dos órgãos de Comunicação Social.

O DIÁRIO DE NOTÍCIAS diz:
Circulam cada vez mais pormenores sobre as conversas de Sócrates com Armando Vara. O primeiro-ministro reagiu pedindo respostas urgentes ao procurador-geral da República: "Isto está a passar todas as marcas." Vieira da Silva fala em "espionagem política" e diz que a situação, em termos de fugas de informação, é "extremamente preocupante".
As fugas de informação no processo Face Oculta estão a deixar o PS desesperado. "Isto está a passar todas as marcas", disse José Sócrates, em resposta a uma manchete do semanário Sol dando mais pormenores sobre as escutas telefónicas de conversas suas com Armando Vara.

O JORNAL DE NOTÍCIAS diz:
O presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Noronha Nascimento, decidiu, ontem, sexta-feira, anular e destruir as escutas telefónicas do processo Face Oculta em que intervém o primeiro-ministro, José Sócrates, à conversa com Armando Vara.
A decisão de Noronha Nascimento foi tomada poucas horas depois de lhe serem entregues, em mão, informações complementares sobres as escutas que haviam sido pedidas ao Ministério Público de Aveiro, apurou o JN. O presidente do STJ terá considerado as
escutas nulas e irrelevantes do ponto de vista criminal.
A urgência da decisão terá sido agravada pela manchete de ontem do semanário "Sol" e pela reacção pronta e dura de José Sócrates, ainda da parte da manhã. "Isto está a passar todas as marcas", protestou o primeiro-ministro, afirmando-se insultado pelo trabalho publicado pelo "Sol", com escutas do processo Face Oculta e um título assertivo na primeira página: "Sócrates mentiu ao Parlamento sobre a TVI".

O PÚBLICO diz:
O primeiro-ministro quer saber se esteve sob escuta e se essa vigilância foi legal, exigindo um esclarecimento ao procurador-geral da República, Pinto Monteiro. "Desconheço as escutas, não estou a par de nada e sei apenas o que vem nos jornais. Espero que o senhor procurador, com o esclarecimento que prometeu, possa esclarecer-nos a todos", afirmou, ontem, ao final da manhã, quando confrontado com a notícia do semanário Sol, que revelou o alegado teor das conversas telefónicas de Sócrates com Armando Vara, realizadas no âmbito do processo Face Oculta.
Considerando que "isto está a passar todas as marcas", o chefe do Executivo acrescentou: "[É necessário] saber se durante meses a fio eu fui escutado, se essas escutas foram legais e se é possível fazê-las num Estado de Direito."
Quanto à notícia, também avançada pelo Sol, de que terá mentido no Parlamento ao afirmar desconhecer a intenção de compra da TVI pela Portugal Telecom (PT), Sócrates brandiu a distinção entre conhecimento oficial e oficioso.
Questionado directamente sobre a possibilidade de ter mentido, respondeu: "Uma coisa é naturalmente discutirmos com amigos, como fiz, relativamente a notícias que são publicadas nos jornais e a conhecimentos informais. Outra coisa é, como disse no Parlamento, como primeiro-ministro, o conhecimento oficial e o conhecimento prévio desse negócio."
Ao mesmo tempo que o primeiro-ministro fazia estas declarações, o ministro da Economia, Vieira da Silva, em entrevista (em directo) à Antena 1, desferia um forte ataque contra as "forças" e as "pessoas" que "estão por trás do que parece ser, mas na realidade não é, qualquer averiguação relativamente a qualquer processo de corrupção".
Instado a comentar as escutas feitas ao primeiro-ministro, o governante não teve dúvidas em classificá-las como "espionagem política".
As afirmações de Vieira da Silva foram lidas pelo PCP como uma forma de "pressão" sobre o Ministério Público. "Estas acusações são absolutamente deploráveis e constituem uma pressão sobre o Ministério Público", sublinhou o deputado António Filipe. Que comentou ainda a manchete do Sol dizendo que Sócrates deve "explicações ao Parlamento e ao país". "Importa que esclareça de uma vez por todas o que sabia sobre os negócios que envolviam a TVI", afirmou.
O Bloco de Esquerda (BE), pela voz da deputada Ana Drago, destacou que as afirmações feitas ontem por Sócrates confirmam que ele tinha conhecimento do negócio quando foi questionado sobre o assunto no Parlamento. "O primeiro-ministro tentou utilizar a
diferenciação entre oficial e oficioso. Para nenhum português sobrou qualquer dúvida que o primeiro-ministro tinha conhecimento do interesse por parte da PT", disse.
Diogo Feio, vice-presidente do CDS/PP, preferiu não comentar "escutas que são publicadas de forma ilegal". Mas não deixou de lembrar a "resposta atrapalhada" de Sócrates quando o agora eurodeputado lhe perguntou se sabia do interesse da PT pela TVI.
O PS e o PSD optaram por não fazer quaisquer comentários.

Minha conclusão: A justiça a política e a governação estão a degradar-se de tal modo, levando a que o Estado de Direito se esteja a transformar-se numa república de safardanas.

quarta-feira, novembro 11, 2009

O Mosquedo



PORTUGAL não tomou medidas profiláticas a tempo, e o resultado é que está a ficar nas mãos das moscas e varejeiras. Apesar de ter apenas 30 dias de vida, o mosquedo é muito prolífico na sua reprodução, procura o seu alimento na matéria orgânica das lixeiras, na podridão, nas fezes, onde também deixa os seus ovos com a geração seguinte, e no seu voo aleatório, por aqui e por ali, infecta tudo em que toca, sobretudo os alimentos, mas pode chegar ao ponto de contaminar a governação, as leis, os negócios, os concursos e a opinião pública, as sucatas e as próprias conversas telefónicas, com impunidade total. Quando damos por nós, o mosquedo é dono e senhor de tudo o que nos rodeia.

terça-feira, novembro 10, 2009

Escutar é Feio!

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O SUPREMO Tribunal de Justiça, braço implacável que continua a zelar pelas boas maneiras, a privacidade e o bom-nome das pessoas de bem, considerou nulas as escutas telefónicas das conversas havidas entre o Armandito e o Zezito, independentemente de quem tivesse tomado a iniciativa dos contactos, das razões e dos assuntos tratados. Acho bem! Já a minha mãezinha dizia que era feio escutar às portas, ora se for ao telefone, isso nem se fala...e já agora convém lembrar que não é com vinagre que se apanham moscas, mais a mais havendo leis, e bem recentes, feitas à medida para protegê-las.

segunda-feira, novembro 09, 2009

Muros

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FAZ VINTE anos que o povo deitou a baixo o muro de Berlim, coisa que devia ser objecto de uma autópsia séria, exaustiva, e implacável, mas que está a ser festejada até à exaustão, com muito espectáculo, luzes, alegorias com dominós e pouco debate, quando o que está em causa é assunto cinzento e muito sério. Quanto aos outros muros que se levantam por esse mundo fora, uns invisíveis, como aqueles que trazemos na nossa cabeça, e outros bem mais visíveis, em especial aquele o que o nazistóide Israel levantou para dividir e guetizar o povo palestiniano da Cisjordânia, ninguém levanta a voz com determinação e autoridade, ninguém toma medidas efectivas, as referências são de raspão, como se "aquilo" não passasse de um "fait divers", uma mera curiosidade deste mundo, se calhar, um dia destes, um destino turístico, onde os políticos, confrontados com aquela paradoxal fronteira de betão, apenas conseguem contrapor um olhar distraído e o silêncio ditado pela opacidade dos seus interesses.
Não sei porquê, em muitas das suas cambiantes, mas sem o fatal muro de betão, a Palestina faz-me lembrar Timor sob ocupação indonésia!

O Icebergue da Corrupção

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Extracto do artigo do jornalista Mário Crespo, com o título "Os intocáveis", publicado no JORNAL DE NOTÍCIAS de 2/11/2009. O título do post é da minha autoria.
"...
Face ao que (felizmente) já se sabe sobre as redes de corrupção em Portugal, um chefe de Governo não se pode refugiar no "no comment" a que a Justiça supostamente o obriga, porque a Justiça não o obriga a nada disso. Pelo contrário. Exige-lhe que fale. Que diga que estas práticas não podem ser toleradas e que dê conta do que está a fazer para lhes pôr um fim. Declarações idênticas de não-comentário têm sido produzidas pelo presidente Cavaco Silva sobre o Freeport, sobre Lopes da Mota, sobre o BPN, sobre a SLN, sobre Dias Loureiro, sobre Oliveira Costa e tudo o mais que tem lançado dúvidas sobre a lisura da nossa vida pública.
Estes silêncios que variam entre o ameaçador, o irónico e o cínico, estão a dar ao país uma mensagem clara: os agentes do Estado protegem-se uns aos outros com silêncios cúmplices sempre que um deles é apanhado com as calças na mão (ou sem elas) violando crianças da Casa Pia, roubando carris para vender na sucata, viabilizando centros comerciais em cima de reservas naturais, comprando habilitações para preencher os vazios humanísticos que a aculturação deixou em aberto ou aceitando acções não cotadas de uma qualquer obscuridade empresarial que rendem 147,5% ao ano. Lida cá fora a mensagem traduz-se na simplicidade brutal do mais interiorizado conceito em Portugal: nos grandes ninguém toca."

MEU COMENTÁRIO: Democracia é transparência, é conhecimento, é informação, é livre opinião, é consenso, é partilha, é acção, e não convive, sem alarido e contestação, sob pena de se autodestruir, com ancilosados segredos de justiça, e obtusos segredos de estado que tentam entaipar os vícios, trapaças e maus comportamentos humanos, que são desculpáveis, senão mesmo negligenciáveis, em relação ao plebeu pobretana, mas não a césar é à sua mulher. A gripe H1N1 é uma pandemia que continua a gerar sérias preocupações em toda a população, mas relativamente a outras doenças que afectam Portugal, e atendendo ao que é visível da ponta do icebergue (a parte submersa pode ser 100 vezes maior), também estamos a precisar de uma urgente vacina contra a corrupção, e esta sim, em dose reforçada.

sábado, novembro 07, 2009

Neblina Matinal

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Depois das "faces ocultas", a neblina meteorológica iria estender-se à discussão do programa de governo. Foto de F.Torres em 28 Outubro 2009.

sexta-feira, novembro 06, 2009

“Quanto mais desemprego criar mais rico serei”

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Transcrevo um trecho do post publicado por Luís Maia no blog COM BLOGS DE VER em Quarta-feira, Novembro 04, 2009

“- Notícia em 03 de Fevereiro de 2009

A Corticeira Amorim vai despedir 193 trabalhadores de duas unidades fabris, naquele que é o primeiro despedimento colectivo na história de empresa. A líder mundial em exportação de cortiça justifica, em comunicado enviado à Comissão do Mercados dos Valores Mobiliários, o despedimento com a necessidade de adequar a produção à quebra da procura. O Sindicato dos Operários Corticeiros do Norte já veio manifestar dúvidas em relação aos contornos deste despedimento.

- Notícia em 4 de Novembro de 2009

A Corticeira Amorim obteve um resultado líquido de 5,7 milhões de euros (MEuro), no terceiro trimestre, mais 60,5 por cento comparando com os 3,6 MEuro do período homólogo de 2008, anunciou hoje a empresa.

Vale a pena despedir trabalhadores, vale a pena criar desemprego e espalhar a fome a troco duns milhões de lucro a mais a favor do homem mais rico de Portugal.
Isto passa-se num país onde, dizem as entidades patronais, os despedimentos não são permitidos.
…”

quinta-feira, novembro 05, 2009

Era Bom Que…

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AS FARPAS de Eça de Queirós e Ramalho Ortigão têm recebido, nos últimos tempos, muitas visitas da minha parte. Sempre que algo corre mal por estas bandas, vou até elas, folheio algumas páginas e acabo sempre por encontrar uma crónica que, velhinha de cento e trinta e tal anos, podia muito bem ter sido escrita hoje, provando que foi quase nula a evolução que as elites dirigentes sofreram com o correr das décadas. Em contrapartida, no que ao cidadão comum diz respeito, o espírito crítico progrediu substancialmente, democratizou-se, mas tal reflecte-se quase e apenas, no rico anedotário que floresce como planta de geração espontânea, pelos quatro cantos do país. Quando chega o momento de eleger os líderes que irão ocupar o poder, o povo continua a desbaratar o conhecimento e a experiência adquirida, desculpando os Isaltinos, as Fátimas, os Sócrates, os Costas, os Loureiros, os Varas, os Valentins e os Torres, argumentando que “eles roubam, mas fazem”, esquecendo que a fatia do que “fazem” é uma insignificância, melhor dizendo, uma magra compensação, destinada a ocultar a grande fatia daquilo que “roubam”. Isto já não contando com as vezes que se diz, brandindo a vulgar esperteza saloia, que “se eu estivesse no lugar dele e tivesse a mesma oportunidade, talvez fizesse o mesmo”.
É verdade que gente bem instalada, corrupta e a roubar desalmadamente, é coisa que sempre existiu, tanto cá dentro, como lá fora. No entanto, nos dias de hoje, o problema é mais grave e complexo, quando tais actividades ilícitas se conglomeram em complexas redes, tecidas e concertadas por múltiplos e mafiosos interesses convergentes, como se fossem réplicas de grandes e idóneas empresas. Embora pareça, não são propriamente gente que ande por aí a esgravatar, à cata de uns cêntimos para o tabaco, mas cavalheiros que ocupam posições dominantes, desfrutam de ricos tachos, umas vezes aqui, outras vezes ali, remunerados a 500.000 euros anuais, fora os prémios, os cartões, os automóveis e as despesas de representação, ao mesmo tempo que no patamar de baixo, vão transaccionando o que lhes sobra do andar de cima, tais como negociatas, facilidades, recompensas, licenciaturas de aviário, contrapartidas, informações privilegiadas, sinecuras, favores, diligências e outras coisas mais. Depois, e como se fosse a cereja no topo do bolo, fica-se a saber que estão envolvidos nestes conluios e traficâncias, os quadros de empresas tão grandes como uma EDP, Galp, CP, Refer, EP entre outras, e ainda uma larga franja de funcionários e entidades fiscais, ao passo que os governantes, dizendo-se preocupados com rentabilidades e vantagens competitivas, se esmeram a perseguir os salários e o direito ao trabalho, assegurando que só assim está garantida a viabilidade das empresas e a recuperação económica. “Esquecem-se” deliberadamente das entorses geradas pela promiscuidade entre o poder político e o poder económico, acrescida da proliferação dos ajustes directos, e o seu derivado que é a corrupção em sentido lato, a associação criminosa, as burlas e os tráficos de influências, esses sim os factores determinantes que contaminam a transparência e a igualdade de oportunidades que devem nortear os concursos públicos, base da leal concorrência entre as empresas. O resultado fica à vista: para que uns prosperem de forma ilícita, muitos outros, trabalhando honestamente e cumprindo as regras, são perdedores à partida, não resistem e irão fatalmente sucumbir.
Assim, era bom que os investigadores das polícias e do Ministério Público continuassem a “esmiuçar” as actividades marginais dos “meninos” que o governo andou a espalhar por “postos avançados” e “posições estratégicas” da economia nacional, pois é quase certo que se fizerem um esforço e forem corajosos, irão ser recompensados e ter mais algumas (des)agradáveis surpresas.
Ah, já me esquecia! Também é desejável que as suas diligências não sofram entraves e cheguem a bom porto.

quarta-feira, novembro 04, 2009

PETIÇÃO

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Os Signatários reclamam:

O ALARGAMENTO DA PROTECÇÃO NO DESEMPREGO

Em consequência do encerramento de grande número de empresas, deslocalizações e salários em atraso, resultante da governação do PS e do comportamento do patronato, milhares de trabalhadores são hoje desempregados de longa duração e muitos outros, essencialmente jovens, devido ao emprego precário, estão desempregados e sem direito a protecção no desemprego, conduzindo muitos famílias à situação de pobreza.
Impõe-se alargar a protecção no desemprego, reduzindo os períodos de garantia para 365 e 90 dias dos subsídios de desemprego e social, e o prolongamento deste durante todo o período de recessão; majoração das prestações familiares e das prestações de desemprego quando há em simultâneo mais que um desempregado no mesmo agregado.

A REVOGAÇÃO DO FACTOR DE SUSTENTABILIDADE

O Governo de Sócrates impôs desde 1 de Janeiro de 2008 a todos os trabalhadores que se reformaram por velhice, uma redução na sua pensão. Ao valor da pensão resultante do cálculo, aplica-se este factor de sustentabilidade. Em 2008 a redução foi de 0,56%, e em 2009 o valor acumulado de 1,32%. Em cada ano, se a esperança de vida aos 65 anos aumentar, como está previsto, maior será a redução das pensões.

ALTERAÇÃO DAS REGRAS DE ACTUALIZAÇÃO DAS PENSÕES E PRESTAÇÕES

Milhares de reformados e aposentados têm perdido poder de compra, dado que os aumentos das pensões não acompanharam a inflação.
Com as novas regras de actualização (IAS), nem as pensões mínimas “escaparam”, deixando estas de crescer, mantendo só o poder de compras, rompendo com o ciclo da sua dignificação, que vinha há muito a ser prosseguido.

Assine aqui esta PETIÇÃO da iniciativa da CGTP-IN

terça-feira, novembro 03, 2009

Novas Oportunidades

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O GOVERNO diz que não vai suspender a avaliação dos professores, invocando o facto de existirem professores que já foram avaliados. Entretanto, avança com uma curiosa intenção: que vai realizar programas de formação dos directores das escolas e dos professores avaliadores, deixando no ar a suspeita de que nem os directores das escolas estão habilitados para o serem, nem os avaliadores possuem condições para o cabal desempenho da polémica avaliação, o que pressupõe que as Novas Oportunidades irão ter mais uma aplicação prática (tantas quantas nós quisermos), desta vez na área da requalificação dos agentes do ensino. Entretanto, diz o governo que se as oposições se unirem numa “coligação negativa” contra a avaliação de professores, isso terá como consequência uma querela jurídico-constitucional, coisa que não se sabe muito bem o que é, nem o governo consegue explicar cabalmente.

sábado, outubro 31, 2009

"Melhor crer do que ler?"

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TRANSCREVO o excelente artigo de Vasco Graça Moura, publicado no jornal DIÁRIO DE NOTÍCIAS de 28 de Outubro de 2009, onde se fala da Bíblia e dos perigos, reconhecidos pela Igreja, decorrentes da sua divulgação junto dos crentes, situação que veio a ser agravada por Gutenberg, com a invenção da imprensa, e consequentemente, com a proliferação da Bíblia luterana, aliás, primeira obra a ser dada à estampa pelo novo processo, nos idos de 1455.

"Há um bom par de anos, escrevi num artigo intitulado "Contra Deus" (Egoísta, Outubro de 2001) que "o Jeová da Bíblia é um ser caprichoso e muitas vezes iniquamente absurdo. O Deus dos Católicos (já agora, e por razões óbvias, é-me mais difícil falar do austero Deus dos protestantes…) é um ser em que o princípio da crueldade é transferido para a paixão de Cristo e que, no que respeita ao sem sentido do sofrimento do mundo, transpõe para uma dimensão escatológica a correcção de todas as injustiças e a abolição desse sofrimento. Em minha opinião, é preciso realmente ter muita fé para se acreditar e para se esperar que seja assim. Sem contar que se trata, no ensinamento eclesial ao longo de séculos e séculos, de um ser castrador e profundamente misógino, obstinado contra o que em nome dele se estigmatizava como 'pecado da carne', e redutor da filosofia (e portanto do próprio pensamento) à condição de serva da teologia (philosophia ancilla theologiae). A cultura, que para os Gregos era antropocêntrica, tende a tornar-se teocêntrica e cristocêntrica a partir dos primórdios do Cristianismo. A lógica passou a ser substituída pela aceitação passiva dos chamados mistérios da fé. Deus, e não o homem, passa a ser a medida dogmática de todas as coisas. O Cristianismo instaurou uma cultura do arrependimento, na expectativa da misericórdia de um Deus cujos desígnios são imprescrutáveis."O Deus do Velho Testamento é um ser intolerante, insatisfeito e vingativo. A terribilità da voz dos profetas tem qualquer coisa de deriva totalitária, existindo para o anúncio reiterado da catástrofe, se à rigidez da norma divina não for sacrificado, sem dó nem piedade, tudo e mais alguma coisa. A Bíblia é um texto compósito, de múltipla autoria, com passagens que podem ser extremamente interessantes e outras que são uma maçada insuportável, e também só um crente muito crente é que pode pretender ver no texto uma unidade que a Bíblia não tem e dar tantas voltas ao torno da interpretação que acabe por ler nela o que ela não diz. A esta minha opinião pode, evidentemente, ser contraposta qualquer outra. Por isso mesmo é que há liberdade de pensamento e de expressão. O que me espanta é que nenhum dos que saltaram a protestar indignados contra Saramago se sinta chocado com a adesão irreflectida e infundamentada da maioria dos crentes à sua própria crença, muito embora o credo quia absurdum não seja propriamente um paradigma idóneo de lógica formal ou comportamental. De resto, a Igreja Católica, receosa das iniciativas heterodoxas de interpretação dos textos sagrados e cedo feroz repressora da tolerância erasmiana, procurou evitar que a generalidade dos crentes lesse a Bíblia. Para quem duvide, aqui fica este extracto do Catalogo dos livros que se prohibem nestes Regnos & Senhorios de Portugal, de 1581: "Quanto às trasladações do testamento velho, somente se poderão conceder aos varões doctos & pios, por parecer do Bispo, com condição de que se use delas como de declarações da trasladação Vulgata, & não como texto sagrado. Mas as trasladações do testamento novo, feitas por Autores de primeira classe deste catálogo [i. e., constantes do Index], a ninguém se concedam: porque sói da tal ligação resultar aos Lectores pouco proveito, & muito perigo."É por isso que num Portugal de matriz católica há pouca tradição de leitura directa dos textos bíblicos, que não foram interiorizados pelas consciências como na Europa luterana. Os clérigos reservaram-se o exclusivo das quatro modalidades da interpretação dos textos sagrados, histórica, alegórica, tropológica e anagógica, de modo a que o sentido literal pudesse ser ultrapassado, ou mesmo escamoteado em sede figurada ou mística, sem dificuldades de maior. O comum dos mortais não precisava de se preocupar muito com os textos, apesar de, muito antes, Gregório Magno e depois Isidoro de Sevilha terem insistido na importância da lectio divina (sobre a qual, e no tocante à Alta Idade Média, José Mattoso escreveu páginas interessantíssimas). No entanto, para o autor das Etimologias: melius est orare quam legere… Será?"

sexta-feira, outubro 30, 2009

Brincar aos Comboios

Do JORNAL DE NEGÓCIOS de 26 de Outubro de 2009, retirei os seguintes extractos:

“As linhas de alta velocidade Aveiro-Salamanca e Évora-Faro-Huelva estão a ser objecto de estudo mas não existe um calendário definido para ambas as ligações, disse hoje à Lusa fonte oficial da RAVE, empresa responsável pelo projecto.
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"Conforme compromissos assumidos nas Cimeiras luso-espanholas, tendo em vista servir de base a tomadas de decisão para as ligações Aveiro-Salamanca e Évora-Faro-Huelva, foram desenvolvidos e encontram-se em preparação" vários estudos, disse à Lusa fonte oficial da RAVE.
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O Diário Económico relança hoje o tema, avançando que "o novo Governo deverá reforçar a aposta no projecto nacional de alta velocidade ferroviária, alargando-o das actuais três linhas prioritárias - Lisboa-Madrid, Lisboa-Porto e Porto-Vigo - para um total de cinco, passando a considerar como essenciais as ligações Aveiro-Salamanca e Évora-Faro-Huelva".
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O investimento previsto para a linha Aveiro-Salamanca, que terá 180 quilómetros em território português, totaliza 2.300 milhões de euros (a preços de 2008) e terá uma procura estimada de 1,8 milhões de passageiros por ano, segundo o relatório do Ministério das Obras Públicas que apresenta o balanço do último mandato.
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Já a linha Évora-Faro-Huelva, que terá 200 quilómetros de extensão em Portugal, custará 2.600 milhões de euros (a preços de 2008) e terá uma procura estimada de 1,6 milhões de passageiros por ano, de acordo com a mesma fonte.”
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Meu comentário: Estou impressionado com tanta grandeza e modernidade. Depois das multimilionárias linhas de alta velocidade Porto-Vigo, Lisboa-Porto e Lisboa-Madrid, só nos faltavam mais estas duas, pois é mesmo disto que estamos a precisar. Já agora fazíamos um sacrifício (não custa nada) e construíamos mais dois ramais, um para ir até Vilar de Maçada e outro para servir Boliqueime.
Enquanto o insuportável Sócrates e os seus querubins de meia-tigela, continuam alegremente a brincar aos comboios, o país vai definhando, à espera que a crise se resolva por si.

quinta-feira, outubro 29, 2009

Trapaceiros

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"Se tivermos que fazer batota para salvar a economia, que façamos batota nos concursos públicos"

(Palavras de Francisco Van Zeller, presidente da CIP, em declarações à RTP, na manhã de 29 de Outubro 2009)

MEU COMENTÁRIO – O patriotismo em relação à economia nacional, é uma coisa bonita de se ver. Volta Melancia que estás perdoado...

XVIII Fornada de Secretários de Estado

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Enumerar a constituição do governo e deixar de fora os(as) senhores(as) secretários(as) de estado era imperdoável. Assim, e para que conste, segue a relação com a fornada dos 38 Secretários de Estado do XVIII Governo Constitucional:
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- Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro, Dr. José Manuel Gouveia Almeida Ribeiro
- Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação, Prof. João Titterington Gomes Cravinho
- Secretário de Estado dos Assuntos Europeus, Mestre Pedro Manuel Carqueijeiro Lourtie
- Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, Dr. António Fernandes da Silva Braga
- Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento, Mestre Emanuel Augusto dos Santos
- Secretário de Estado do Tesouro e Finanças, Mestre Carlos Manuel Costa Pina
- Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Prof. Dr. Sérgio Trigo Tavares Vasques
- Secretário de Estado da Administração Pública, Mestre Gonçalo André Castilho dos Santos
- Secretário de Estado da Juventude e do Desporto, Dr. Laurentino José Monteiro Castro Dias
- Secretária de Estado da Modernização Administrativa, Profª. Drª. Maria Manuel Leitão Marques
- Secretário Estado da Administração Local, Dr. José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
- Secretária de Estado da Igualdade, Drª. Elza Maria Henriques Deus Pais
- Secretário de Estado da Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar, Dr. Marcos da Cunha e Lorena Perestrello de Vasconcellos
- Secretário de Estado Adjunto e da Administração Interna, Dr. José Manuel Vieira Conde Rodrigues
- Secretário de Estado da Administração Interna, Drª. Maria Dalila Correia Araújo Teixeira
- Secretário de Estado da Protecção Civil, Dr. Vasco Seixas Duarte Franco
- Secretário de Estado da Justiça, Dr. João José Garcia Correia
- Secretário de Estado da Justiça e da Modernização Judiciária, Dr. José Manuel Santos de Magalhães
- Secretário de Estado Adjunto, da Indústria e do Desenvolvimento, Mestre Fernando Medina Maciel Almeida Correia
- Secretário de Estado do Comércio, Serviços e Defesa do Consumidor, Dr. Fernando Pereira Serrasqueiro
- Secretário de Estado do Turismo, Dr. Bernardo Luís Amador Trindade
- Secretário de Estado da Energia e da Inovação, Prof. Doutor José Carlos das Dores Zorrinho
- Secretário de Estado das Florestas e Desenvolvimento Rural, Eng. Rui Pedro de Sousa Barreiro
- Secretário de Estado das Pescas e Agricultura, Dr. Luís Medeiros Vieira
- Secretário de Estado Adjunto, das Obras Públicas e das Comunicações, Dr. Paulo Jorge Oliveira Ribeiro de Campos
- Secretário de Estado dos Transportes, Dr. Carlos Henrique Graça Correia da Fonseca
- Secretário de Estado do Ambiente, Prof. Doutor Humberto Delgado Ubach Chaves Rosa
- Secretária de Estado do Ordenamento do Território e das Cidades, Dra. Fernanda Maria Rosa do Carmo Julião
- Secretário de Estado da Segurança Social, Mestre Pedro Manuel Dias de Jesus Marques
- Secretário de Estado do Emprego e da Formação Profissional, Mestre Valter Victorino Lemos
- Secretária de Estado Adjunta e da Reabilitação, Idália Maria Marques Salvador Serrão de Menezes Moniz
- Secretário de Estado Adjunto e da Saúde, Dr. Manuel Francisco Pizarro Sampaio e Castro
- Secretário de Estado da Saúde, Dr. Óscar Manuel de Oliveira Gaspar
- Secretário de Estado Adjunto e da Educação, Prof. Doutor José Alexandre da Rocha Ventura Silva
- Secretário de Estado da Educação, Dr. João José Trocado da Mata
- Secretário de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Prof. Doutor Manuel Frederico Tojal de Valsassina Heitor
- Secretário de Estado da Cultura, Dr. Elísio Costa Santos Summavielle
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No total, são 38 os secretários de Estado do XVIII Governo Constitucional, porque, no passado dia 19 de Outubro, tomou já posse como secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros, João Tiago Silveira.

A Matilha

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A PROPÓSITO das conclusões prévias a que está a chegar a investigação da operação “Face Oculta”, apenas consigo murmurar um pensamento: a matilha de lobos esfaimados que nos anda a devorar é grande demais para o pequeno país que somos.

Estilos de Vida

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FRANCISCO Van Zeller, presidente da CIP, à saída do encontro que o primeiro-ministro promoveu em 28 de Outubro, com os parceiros sociais, comentou o pedido que Manuel Carvalho da Silva, secretário-geral da CGTP(IN) havia formulado, de ser aumentado o salário mínimo nacional em mais 25 euros, afirmando que tal valor não resolve o problema de ninguém, que se fosse ele teria pedido muito mais. Pudera! O senhor Van Zeller, patrão dos patrões (como é habitualmente conhecido), é insensível às carências de quem vive de infra-salários, além de que está habituado a outro estilo de vida, onde os tais 25 euros são ridículos e não contam para nada…

quarta-feira, outubro 28, 2009

"O risco da bomba-relógio"

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"Para quando em Portugal queimarem-se carros?" A pergunta, que recordo de memória, foi feita na noite de sexta-feira da semana passada pelo jornalista João Pacheco, um dos fundadores do movimento Precários Inflexíveis, numa sessão de lançamento do livro organizado e lançado por um outro movimento de precários, o Ferve-Fartos/as d"Estes Recibos Verdes.

A pergunta - feita por um jornalista que recebeu o Prémio Gazeta de Revelação em 2006 e que hoje continua a trabalhar sem vínculo para o "i", depois de ter já trabalhado para a "Visão" e para o "PÚBLICO" - espelha o desespero de uma geração sem perspectivas de atingir as garantias e a segurança laboral e material que aos seus pais e avós estiveram asseguradas.

Hoje em Portugal os números atingidos pela precarização do trabalho são avassaladores e atingem um crescimento exponencial não acompanhado por outros países europeus. Estima-se que cerca de dois milhões de trabalhadores, ou seja, 40 por cento da população activa, estejam numa situação de vínculo laboral não permanente ou mesmo sem vínculo e trabalhe sob fórmulas jurídicas diversas como os contratos a prazo, as bolsas, o trabalho temporário, o trabalho não declarado e a prestação de serviços mediante recibo verdes. Sabe-se ainda que cerca de 900 mil pessoas trabalham a recibo verde.

Acresce a este mundus horribilis o facto de em Portugal o desemprego ter atingindo, segundo os dados do Instituto Nacional de Estatística e no trimestre de Abril, Maio e Junho, os 9,1 por cento da população activa, isto é, mais de meio milhão de pessoas. Já a OCDE prevê que até ao final de 2010 em Portugal se chegue aos 11,7 por cento, com um total de cerca de 650 mil pessoas sem emprego.

Quando um novo governo se prepara para entrar em funções, é importante questionar e reflectir sobre qual a realidade social que está a ser criada em Portugal. E nesta reflexão importa ter em conta o facto de o poder executivo continuar a ser liderado por José Sócrates, o primeiro-ministro responsável pela revisão do Código do Trabalho que consagrou de forma simbólica o reconhecimento legal do trabalho precário.

Nada indica que de facto a situação social em Portugal esteja para melhorar. Mais, o problema do dumping social não é um fenómeno que possa ser associado a uma crise conjuntural, a um mau momento na economia. Tudo indica que as mudanças são estruturais e que resultam de uma real alteração do modelo de organização sócio-económico.

Por isso é problemático pensar qual o futuro dos jovens. Não só dos que participaram na sessão organizada pelos Ferve e cujo olhar expectante feria a sensibilidade e a consciência de qualquer um. Mas de todos os jovens que foram criados num mundo e num modelo sócio-económico em que apreenderam - com o que viram em casa através da experiência de pais e de avós - que o emprego é também uma profissão e uma carreira. Que um emprego é também um lugar de inserção social e de identificação no colectivo. Que o emprego é também uma função e um papel social.

E que ter emprego é o meio pelo qual se cumprem deveres para com a sociedade e se auferem direitos no plano da redistribuição da riqueza produzida pela sociedade. Riqueza essa que é garantida aos trabalhadores através do salário, mas também dos subsídios de Natal e de férias, do direito a subsídio de doença ou de desemprego.

Só que agora, quando chegou a sua vez, passaram a ser conhecidos como a geração que não tem direito a esses direitos e que apenas tem à sua espera trabalho precário e mal pago. E até já tem direito a alcunha: a geração dos 500 euros.

O modelo mudou e com ele o que parece ser o paradigma de quem trabalha. E se ainda persistem os privilegiados que vivem dentro do agora considerado como antigo modelo - e provavelmente sempre haverá, já que o modelo de economia capitalista pode não comportar a precariedade absoluta -, há uma massa crescente de trabalhadores que se vêem privados dos seus direitos laborais e sociais associados ao trabalho e que entram numa situação de isolamento absoluto, sem redes de inserção e de identificação na sociedade.

É que a regressão que em termos históricos se vive é-o no que se refere à garantia de direitos. Mas é nova a situação de isolamento e de não inserção dos indivíduos na sociedade. A individualização, a autonomização das relações sociais hoje agrava o isolamento do indivíduo, que se sente diferente ou excluído, e aumenta a estigmatização.

Ora a questão central que a pergunta de João Pacheco encerra é essa: até que ponto é que essa estigmatização, a de se ser um trabalhador diferente, um trabalhador sem direitos, um trabalhador de segunda, pode levar a actos de desespero e de raiva, que desencadeiem manifestações de agressão contra a sociedade que os maltrata. Até que ponto a violência que é sempre o ser-se estigmatizado é de tal forma atroz que motiva uma reacção e uma resposta de fúria contra a sociedade ou de pura agressividade sem objecto definido.

É dado como adquirido que os portugueses não são violentos, assim como é dado como adquirido que a atomização das relações sociais hoje seja razão suficiente para contrariar acções de revolta. Mas agora que um novo governo se prepara para entrar em funções, e mesmo sabendo que ele não irá inverter a situação criada e impor o fim do trabalho precário, é bom que se tenha consciência de que há uma bomba-relógio que pode estar accionada e com o tempo a contar."

Texto da jornalista São José Almeida, publicado na edição de 24 de Outubro de 2009 do jornal PÚBLICO

segunda-feira, outubro 26, 2009

Dos Deuses do Evangelho aos Demónios de Caim

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FEITA A LEITURA de “Caim”, e conforme prometido há um post atrás, e também porque não gosto de adiar seja o que for, aqui seguem as minhas primeiras, e talvez definitivas, impressões.

Todas as religiões têm sido, desde o principio dos tempos, grandes fontes de inspiração privilegiada para todas as artes, desde a literatura até à arquitectura, e para um escritor tão fecundo como o é Saramago, as Sagradas Escrituras não fogem à regra, constituindo um alfobre de eleição, onde o escritor vai colher temas que depois desenvolve à sua maneira, quase sempre de forma polémica e não apologética.
Caim é uma figura trágica. Foi um Saramago muito conversador, em muitos momentos divertido, e noutros irreverente e ironicamente ácido, que a repescou para dar corpo à sua obra, onde narra episódios bíblicos, como se fossem acontecimentos passados à nossa beira, no tempo presente, olhados e avaliados segundo os preceitos contemporâneos.
A história de Caim e Abel é conhecida. Os dois irmãos, como era hábito no princípio dos tempos, faziam as suas oferendas a Deus, Abel com vitelos, pois era pastor, ao passo que Caim recorria aos produtos da terra, pois era agricultor. Deus, do seu pedestal celestial, avaliou as prendas que lhe ofertavam, apreciou mais a carne que os vegetais, e decidiu louvar Abel em prejuízo de Caim. Este sentindo-se rejeitado, resolveu o problema de uma penada: acabou com a concorrência matando o irmão. O seu crime foi sancionado pelo pai do céu com uma marca na sua face, e uma condenação a preceito: errar pelo mundo a espiar o seu pecado, exibindo a marca com que a divindade o marcara, e assistir ao desenrolar de todas as ignomínias que pautaram a proto-história da humanidade, sob a batuta e o olhar despeitado do criador e juiz supremo.
Saramago toma nas mãos aquela condenação, e a errância de Caim acaba por tomar a forma de uma espécie de viagem no tempo, em que aquele visita aleatoriamente alguns acontecimentos do Antigo Testamento, qual deles o mais violento e controverso, como sejam o episódio da Torre de Babel, quando a primordial língua universal foi pulverizada em tantos idiomas, tantos quantos os necessários para confundir os espíritos e o humano entendimento, o sacrifício de Isaac pelo patriarca Abraão, Sodoma e Gomorra, as muralhas de Jericó, a adoração do bezerro de ouro junto ao monte Sinai, a queda em desgraça de Job e os trabalhos de Noé. É certo que Saramago, nestas andanças de cá para lá, ao longo do Livro, não poupa Deus, e nem sequer dá dele uma imagem minimamente abonatória, pois não há vestígios da proverbial misericórdia divina, mas apenas livre arbítrio, poder absoluto, vingança e gratuita violência divina.
É certo que Caim gozou de uma espécie de liberdade condicional, com a obrigatoriedade de apresentação regular a quem o marcou com o ferrete da ignomínia, mas isso, à luz das Escrituras, parece ter sido uma forma do Criador se indulgenciar, antes de concluir que cometeu erros crassos nas manipulações que operou no laboratório da criação, e que a raça humana, afinal, não foi criada à sua imagem e semelhança, antes pelo contrário. Como alguém em tempos alvitrou, não devemos contar demasiado com Deus, mas talvez Deus conte connosco. Ou então, como o afirma Saramago, “a história dos homens é a história dos seus desentendimentos com deus, nem ele nos entende a nós, nem nós o entendemos a ele”.
No meio de tudo isto, tanto os teólogos como alguns críticos, acabam a dizer que a Bíblia NÃO é para ser lida de forma literal, mas mudando de critério, acham que as obras de Saramago SIM, isto é, não as consideram obras literárias, na verdadeira acepção da palavra, e como tal, passíveis de vários sentidos e múltiplas interpretações. Por isso, cada vez que Saramago dá mais um livro à luz, é certo que aí virá mais uma enxurrada de críticas e polémicas sem fim, adornadas, de tempos a tempos, com o tradicional catolicismo patrioteiro de alguns basbaques e querubins, mais rústicos e atrevidos.
Neste tempo em que as relações entre deuses, anjos, demónios, confrarias e sociedades secretas, andam a monopolizar uma larga fatia da produção literária que enche as estantes e vitrinas, para o leitor mais desprevenido, a abordagem de Caim não é fácil, como aliás a maioria das obras de Saramago, mas depois de encontrado o passo certo e a cadência da narrativa, a obra abre-se de par em par, e espanta-nos pela sua originalidade e fluidez.
Digam o que disserem, facto incontroverso é que o autodidacta Saramago, mesmo com a sua falta de diplomas académicos, continua a ser um mestre, e cada obra que sai das suas mãos, é cada vez mais uma obra que prima pela singularidade e inovação.

domingo, outubro 25, 2009

ADENDA ao Livro do Génesis 22, 1-19

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QUANDO escrevi este post em 20 de Outubro ( Livro do Génesis 22, 1-19 )
ainda não tinha comprado nem lido o “CAIM” de Saramago. Como queria fundamentar a minha opinião sobre a polémica iniciada em Penafiel, na sessão de apresentação da obra, escolhi um episódio da Bíblia (o sacrifício de Isaac pelo seu pai Abraão) que sempre me impressionou pela negativa, e que costumo invocar como a prova maior de que Deus, e em sentido lato, todos os deuses, maiores e menores, do imenso panteão politeísta, não são pessoas de bem, antes são, além de inexperientes e incompetentes criadores, curiosos e sádicos experimentadores, neste imenso laboratório do tamanho do universo, onde se divertem a avaliarem como se comportam os “objectos” da sua criação. Tal como garotos curiosos e cruéis torturadores, a espetarem alfinetes e a cortarem asas a moscas e a lançarem fogo a formigueiros. Entretanto, e na primeira oportunidade, comprei o livro, mais exactamente, em 22 de Outubro, e só o comecei a ler ontem, dois dias depois, e como todos os romances de Saramago, costumo lê-los de um fôlego. Assim, foi hoje que constatei que o escritor também recorreu àquela assassina e fanática cegueira do pai Abraão, grossa coincidência com que só hoje me confrontei, a páginas 81. Para que não seja acusado de hediondo plágio, coisa com que não consigo conviver, deixo aqui este apontamento, como se de uma providência cautelar se tratasse. Fica também a promessa de que rabiscarei um novo post para comentar "CAIM", depois de terminar a sua leitura.

A Primeira Pedra

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«José Saramago diz que não corre atrás de polémicas, mas é raro sair um livro seu que não dê origem a polémicas. Mérito dos livros, certamente, mas também do autor, que sabe promovê-los como ninguém. … Só não fica bem ao nosso Nobel atirar a primeira pedra e logo recuar para o lugar de vítima, queixando-se de “incompreensões, resistências e lóbis velhos”, só porque alguém ousa responder-lhe no mesmo tom.»

Extracto do comentário de Fernando Madrinha, no semanário EXPRESSO de 24 de Outubro 2009, com o título “Com a ajuda de Deus”. O título do post é de minha autoria.

sábado, outubro 24, 2009

Fotomaton do Governo

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É UM GOVERNO recauchutado, não para governar, mas sim para assegurar e manter o Poder. É constituído por um “núcleo duro” de 6 figuras tutelares (Sócrates, Silva Pereira, Augusto Santos Silva, Vieira da Silva, Teixeira dos Santos e Luís Amado), as quais continuam a concentrar em si toda a estratégia, tácticas e decisões, indispensáveis à manutenção do poder, ao passo que a identidade do PS continua a esbater-se nesta irreprimível fulanização, onde a política continua a perder terreno para as soluções a metro e as auto-estradas ao quilómetro. Tudo indica que os restantes ministros irão funcionar como amortecedores e válvulas de escape do descontentamento, pois, tal como o disse Vasco Pulido Valente, “Em geral, nunca se deram ao trabalho de contar o que pensam do mundo ou do país. Também não é preciso. Sócrates pensará por eles e eles pensarão o que Sócrates pensar.” Para memória futura, e em vésperas de mais uma voltinha, mais uma viagem, segue-se a listagem do elenco governativo do XVIII Governo Constitucional:

O “núcleo duro”:

Primeiro-ministro
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa

Ministro da Presidência
Dr. Manuel Pedro Cunha da Silva Pereira

Ministro da Defesa Nacional
Prof. Doutor Augusto Santos Silva

Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento
Dr. José António Fonseca Vieira da Silva

Ministro de Estado e das Finanças
Prof. Doutor Fernando Teixeira dos Santos

Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros
Dr. Luís Filipe Marques Amado

Os “outros”:

Ministro da Administração Interna
Dr. Rui Carlos Pereira

Ministro da Justiça
Dr. Alberto de Sousa Martins

Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas
Prof. Doutor António Manuel Soares Serrano

Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações
Prof. Doutor António Augusto da Ascenção Mendonça

Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território
Engª. Dulce dos Prazeres Fidalgo Álvaro Pássaro

Ministra do Trabalho e da Solidariedade Social
Drª. Maria Helena dos Santos André

Ministra da Saúde
Drª. Ana Maria Teodoro Jorge

Ministra da Educação
Drª. Isabel Alçada (Maria Isabel Girão de Melo Veiga Vilar)

Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior
Prof. Doutor José Mariano Rebelo Pires Gago

Ministra da Cultura
Drª. Maria Gabriela da Silveira Ferreira Canavilhas

Ministro dos Assuntos Parlamentares
Dr. Jorge Lacão Costa

Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros
Dr. João Tiago Valente Almeida da Silveira

quinta-feira, outubro 22, 2009

terça-feira, outubro 20, 2009

Vá lá, Puxem pela Imaginação!

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QUASE um mês depois das eleições legislativas de 27 de Setembro, ainda não está constituído novo governo. Parece que o processo continua a decorrer, a deixar correr os prazos, cumprindo os passos burocráticos, com todo o ripanço, como se nada tivesse acontecido, como se não existisse crise e problemas graves para resolver. Houve eleições, o Partido Socialista perdeu a maioria, e até parece que não aconteceu nada. Até o ministro da agricultura, o insuperável, pedante e sorridente Jaime Silva, voltou de Bruxelas com uma promessa de 6 milhões de euros de ajudas para os produtores de leite portugueses, dinheiro esse que o ministro acha que deve ser distribuído directamente, para que os produtores o gastem, da forma que melhor entenderem, sei lá, terá dito a ministerial figura, puxem pela imaginação.
É assim desta forma que as coisas se passam e acontecem por cá, neste país residual, à beira-mar plantado, com os patrícios do ainda-governo a exibirem a mais baixa produtividade da última década, e o senhor Francisco Van Zeller da confederação da indústria, atento e persistente, a substituir-se ao governo e a dizer que o ordenado mínimo nacional não deve ter actualização em 2010, porque senão...

Livro do Génesis 22, 1-19

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Naqueles dias,
Deus quis pôr à prova Abraão e chamou-o:
«Abraão!»
Ele respondeu: «Aqui estou».
Deus disse: «Toma o teu filho,
o teu único filho, a quem tanto amas, Isaac,
e vai à terra de Moriá,
onde o oferecerás em holocausto,
num dos montes que Eu te indicar».
Abraão levantou-se de manhã cedo,
aparelhou o jumento, tomou consigo dois dos seus servos
e o seu filho Isaac.
Cortou a lenha para o holocausto
e pôs-se a caminho do local que Deus lhe indicara.
Ao terceiro dia, Abraão ergueu os olhos e viu de longe o local.
Disse então aos servos: «Ficai aqui com o jumento.
Eu e o menino iremos além fazer adoração
e voltaremos para junto de vós».
Abraão apanhou a lenha do holocausto
e pô-la aos ombros do seu filho Isaac.
Depois, tomou nas mãos o fogo e o cutelo
e seguiram juntos o caminho.
Isaac disse a Abraão: «Meu pai».
Ele respondeu: «Que queres, meu filho?»
Isaac prosseguiu: «Temos aqui fogo e lenha;
mas onde está o cordeiro para o holocausto?»
Abraão respondeu:
«Deus providenciará o cordeiro para o holocausto, meu filho».
E continuaram juntos o caminho.
Quando chegaram ao local designado por Deus,
Abraão levantou um altar e colocou a lenha sobre ele,
atou seu filho Isaac e pô-lo sobre o altar, em cima da lenha.
Depois, estendendo a mão, puxou do cutelo para degolar o filho.
Mas o Anjo do Senhor gritou-lhe do alto do Céu:
«Abraão, Abraão!»
«Aqui estou, Senhor», respondeu ele.
O Anjo prosseguiu:
«Não levantes a mão contra o menino,
não lhe faças mal algum.
Agora sei que na verdade temes a Deus,
uma vez que não Me recusaste o teu filho, o teu filho único».
Abraão ergueu os olhos
e viu atrás de si um carneiro, preso pelos chifres num silvado.
Foi buscá-lo e ofereceu-o em holocausto, em vez do filho.
Abraão deu ao local este nome: «O Senhor providenciará».
E ainda hoje se diz: «Sobre a colina o Senhor providenciará».
O Anjo do Senhor chamou Abraão, do Céu, pela segunda vez,
e disse-lhe:
«Por Mim próprio te juro __ oráculo do Senhor __
já que assim procedeste,
e não Me recusaste o teu filho, o teu filho único,
abençoar-te-ei e multiplicarei a tua descendência
como as estrelas do céu e como a areia que está nas praias do mar,
e a tua descendência conquistará as portas das cidades inimigas.
Porque obedeceste à minha voz,
na tua descendência serão abençoadas todas as nações da terra».
Abraão foi ter de novo com os seus servos
e juntos puseram-se a caminho de Bersabé,
onde Abraão ficou a morar.

Palavra do Senhor.

NOTA
Faço esta transcrição, porque na sequência do lançamento mundial em Penafiel, da mais recente obra de José Saramago, intitulada “CAIM”, ouvem-se vozes.
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- A Bíblia é um manual de maus costumes, diz Saramago...
Uns escandalizam-se e bradam - Blasfémia!
Outros exclamam: - Não passa de uma operação publicitária.
Outros afirmam: - Vale o que vale, é apenas uma opinião!
Outros dizem ainda: - O escritor acabou por dizer em voz alta o que muito boa gente pensa.

segunda-feira, outubro 19, 2009

Pobreza em Portugal

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18 por cento dos portugueses são pobres e a situação tende a piorar

SEGUNDO a Assistência Médica Internacional (AMI), os seus centros Porta Amiga apoiaram no primeiro semestre deste ano mais 10 por cento de pessoas do que no mesmo período do ano anterior.
"Estes valores demonstram uma nítida tendência para um crescente número de casos de pobreza persistente. A grande maioria destas pessoas encontra-se em plena idade activa, entre os 21 e os 59 anos de idade", pode ler-se num comunicado daquela organização.
Além disso, a AMI destaca que há cada vez mais novos casos de pobreza. No primeiro semestre deste ano "foram 1836 as pessoas que recorreram pela primeira vez ao apoio social da AMI, mais 24 por cento do que no mesmo período no ano anterior".
Também a Rede Europeia Anti-Pobreza se manifesta preocupada com a situação em Portugal, onde afirma que 18 em cada 100 pessoas vivem na pobreza.
“O número europeu que serve de referência para definir a pobreza equivale a um vencimento mínimo mensal de 406 euros mensais. Quem tiver um rendimento inferior a 406 euros é pobre”, disse à Lusa Agostinho Jardim Moreira, presidente da Rede Europeia Anti-Pobreza (REAP).
Num comunicado, a REAP sublinha que “os idosos e as crianças e jovens são os grupos etários com maior taxa de risco de pobreza em Portugal. A “vulnerabilidade à situação de pobreza” é de 26 por cento para os idosos e de 21 por cento para pessoas com menos de 17 anos, indica.
A mesma instituição destaca a desigualdade em matéria da distribuição de rendimento como um dos principais problemas: "Em 2008, 20 por cento da população com maior rendimento recebia aproximadamente 6,1 vezes o rendimento dos 20 por cento da população com o rendimento mais baixo”.
Por outro lado, a REAP recorda, citando dados do Instituto Nacional de Estatística, que no segundo trimestre de 2009, a taxa de desemprego foi de 9,1 por cento, um valor que, comparativamente ao mesmo período do ano passado, aumentou 1,8 pontos percentuais.
“Só a existência de empregos e de salários pode quebrar os ciclos de pobreza que estão criados e reestruturar as famílias, permitindo-lhes mandar os filhos à escola, cuidar dos idosos e viver com dignidade”, referiu Jardim Moreira.
Também a AMI regista que a maioria da população que recorreu aos centros Porta Amiga no primeiro semestre se encontra em situação de desemprego (80 por cento), "tendo como principais recursos os subsídios e apoios institucionais e o apoio de familiares ou amigos".
O serviço que registou mais procura entre as mais de cinco mil pessoas que, nos primeiros seis meses de 2009, pediram ajuda à AMI, foi o da distribuição de géneros alimentares, roupa e medicamentos.
Num contexto de pobreza mundial, 2010 será o Ano Europeu do Combate à Pobreza e à Exclusão Social.

União das Misericórdias defende apoio discreto a famílias "envergonhadas"

O PRESIDENTE da União das Misericórdias (UdM), Manuel Lemos, defendeu hoje "a prática de um apoio discreto" às famílias com necessidades, já que muitas têm vergonha de expor a situação de pobreza em que se encontram.
"Os provedores dão-me conta de muitas situações, em particular de famílias residentes em meios urbanos e suburbanos. Todos têm histórias para contar", disse Manuel Lemos à Lusa, a propósito do Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza, que se assinala sábado.
Em declarações à Lusa, o presidente da UdM considerou que "a pobreza envergonhada é um problema crescente em Portugal e a crise veio dar amplitude a este fenómeno".
"Infelizmente, a recuperação económica não terá repercussões imediatas nestas situações, daí a necessidade de se encontrarem formas discretas de apoiar estas famílias", sublinhou.
Manuel Lemos apontou o exemplo de Itália, também confrontada com idêntico fenómeno, onde o apoio alimentar, por exemplo, é distribuído por instituições sociais "em carros não identificados e em sacos plásticos de supermercado".
Em seu entender, também "os funcionários que fazem este serviço devem ser muito bem escolhidos para garantir a discrição necessária".
"São situações que devem ser abordadas com delicadeza e cautela. Temos casos em que os pedidos chegam por e-mail, tentando evitar dar a cara. A maioria está relacionada com o desemprego de um ou dos dois membros do casal e muitos nem sequer têm subsídio de desemprego", explicou.
O adiamento ou redução do pagamento de prestações, nomeadamente de creches e infantários, e também o apoio alimentar são os pedidos mais frequentes.
"O perfil dos utilizadores das nossas cantinas tem vindo a mudar. Ao contrário do que era habitual - as pessoas chegarem, conversarem e deixarem-se ficar - agora temos muitas pessoas que chegam, comem rapidamente, se possível viradas para a parede, e saem", sustentou Manuel Lemos.
O dirigente da União das Misericórdias contou ainda casos de pessoas que, quando questionadas directamente sobre as suas necessidades, não as admitem e mais tarde, por "uma outra porta, acabam por pedir ajuda".
"São normalmente pessoas que pertenciam à classe média, que por circunstâncias da vida foram apanhadas pela crise. Sem trabalho e meios de subsistência vêem-se obrigadas a recorrer a instituições e a subsídios sociais", frisou.

Informação da LUSA de 16 de Outubro de 2009, publicada pelo jornal PÚBLICO.

sábado, outubro 17, 2009

Sol na Eira e Chuva no Nabal

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AS CANDIDATURAS dos arguidos António Preto e Eduarda Napoleão do PSD, as candidaturas múltiplas de Ana Gomes e Elisa Ferreira do PS, e a apressada renuncia ao mandato do deputado João de Deus Pinheiro do PSD, no próprio dia da sua tomada de posse (andou tão entusiasmado na campanha eleitoral, que chegou a pedir a maioria absoluta para o PSD, coisa que Manuela Ferreira Leite nunca fez), são exemplos a registar e censurar, pois demonstram que há quem use e abuse da actividade política, paga por todos os cidadãos, para fazer prevalecer, sem hesitação nem remorso, os seus interesses pessoais, relativamente aos objectivos de servir a república, demonstrando com tal procedimento uma grande falta de ética e pudor.
Contudo, não nos devemos esquecer que os principais responsáveis, não são exclusivamente os transgressores, mas sim quem os deixa proceder dessa forma e lhes dá cobertura, isto é, as organizações políticas a que pertencem.

sexta-feira, outubro 16, 2009

Grande Cinema

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Mais anúncios de sessões de cinema na imprensa escrita dos anos 80 do século passado.

Título: Lili Marleen
Ano: 1981
Realizador: Rainer Werner Fassbinder
Argumento:Lale Andersen e Rainer Werner Fassbinder
Género: Ficção / Drama / Musical / Romance / Guerra

Elenco:
Hanna Schygulla ... Willie
Giancarlo Giannini ... Robert
Mel Ferrer ... David Mendelsson
Karl-Heinz von Hassel ... Henkel
Erik Schumann ... von Strehlow
Hark Bohm ... Taschner
Gottfried John ... Aaron
Karin Baal ... Anna Lederer
Christine Kaufmann ... Miriam
Udo Kier ... Drewitz
Roger Fritz ... Kauffmann
Rainer Will ... Bernt
Raúl Gimenez ... Blonsky
Adrian Hoven ... Ginsberg
Willy Harlander ... Prosel

Duração:120 min
País: ex-República Federal Alemã
Idioma: Inglês / Alemão
Cor: Cor
Formato:1.66 : 1
Audio: Mono
Locais de Filmagens:
Bavaria Filmstudios, Geiselgasteig, Grünwald, Bavaria, Germany
Companhia Distribuídora: Bayerischer Rundfunk (BR)

Fonte: http://www.imdb.com/

quinta-feira, outubro 15, 2009

Pausa para a Ficção

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Uma Ilha Chamada “Grace”

Somos uma espécie de arquipélago, feito de ilhas solitárias, separadas por oceanos que tanto podem estar serenos, como revoltos e tempestuosos.

A primeira vez que a vi, o que mais me perturbou foi a sua compleição frágil como um vime, pescoço esguio a sustentar uma cabeça de feições delicadas, emolduradas por uma cabeleira de um castanho claro luminoso. Abeirava-se de nós, com um andar silencioso, como uma brisa, pose que denunciava timidez, mascarada de uma aparente e subtil insolência. Económica em palavras e fria a exprimir-se, o timbre da sua voz era ligeiramente cavo e rouco, o que lhe acentuava o ar misterioso, embora cheio de sensualidade. A atracção que causava contrastava com o distanciamento que a sua altivez impunha, e isso era um timbre que marcava todas as suas relações, tanto as de amizade como as outras.

Os pormenores vieram depois, quase todos contrastantes com a sua aparência física, como aquela profissão de auxiliar de enfermagem, com que garantia o seu sustento, com uns turnos de serviço desgastantes e absolutamente impróprios para quem pretendesse ter uma vida regular, passados entre termómetros, arrastadeiras, algálias, chagas, corpos ulcerados, cateteres e frascos de soro, mas que não a impediam de continuar a estudar línguas e relações internacionais. Fiquei ainda mais confuso – porém, cada vez mais interessado em conhecê-la - quando soube que tinha apenas dois nomes, Alda Grace, sem o adorno ou a referência de qualquer apelido familiar, e que andava a ler os quatro volumes do Quarteto (*) de forma aleatória, que embora não sendo uma missão impossível, acabava por não respeitar a genuína sequência da obra. Semanas mais tarde, vim a saber pela Paula Freitas, a colega que habitualmente a acompanhava, no trabalho e nos estudos, e que era a sua antítese, não só por ser extrovertida como incapaz de guardar um segredo, que a Grace seria dez anos mais velha que eu, que era filha de uma camponesa da Soalheira e de um desertor do exército britânico, que se viera refugiar no interior algarvio, nos penhascos da Serra do Caldeirão, por alturas de 1939, quando os ventos da guerra começavam a soprar na Europa. Três anos mais tarde, num daqueles momentos em que a Grace sentia necessidade de entreabrir um pouco a janela sobre a sua pessoa e o seu passado, entre uma pausa de revisão da matéria e dois goles de café, confessou-me que era estéril e que isso lhe provocava insuportáveis menstruações dolorosas. Ficara órfã da mãe, que se suicidara, atirando-se a um poço, na sequência dos maus-tratos que o tal inglês lhe dava, um homem irascível, amigo de bebidas fortes e incapaz de alinhavar, depois de quinze anos de exílio, uma frase com sentido, no seu português intraduzível. Aos dezanove anos, cansada de fazer de criada de servir e de aturar as colossais bebedeiras do pai, sem se despedir, fez a mala, comprou um bilhete de autocarro e rumou à capital, acolhendo-se, temporariamente, em casa de uma tia materna que trabalhava nas limpezas, nos escritórios da companhia do gás e electricidade.

Não olhou a meios para conseguir o que pretendia. Trabalhou nas limpezas, lado a lado com a tia, em escritórios e casas particulares, serviu à mesa de cafés e casas de pasto, foi ajudante de cozinha, embaladora numa fabriqueta de camisas, acompanhante de pessoas idosas, e nunca desistiu de estudar, até que tirou o tal curso de auxiliar de enfermagem. Quando nos conhecemos já ia no segundo ano de relações internacionais, e continuava, como autodidacta e com um método muito próprio, para além do inglês, do francês e do alemão, a coleccionar línguas estrangeiras, tais como o espanhol, o servo-croata, o russo e o árabe, além de conseguir manter uma conversação em esperanto. Vivia num quarto com mobiliário mínimo, com direito a utilização da cozinha, cuja austeridade apenas era cortada por três enormes pilhas de livros, que iam crescendo arrumadas contra a parede. Numa das raras visitas que fiz aos seus aposentos, constatei que lia ficção científica com a mesma voracidade com que comentava a Florbela Espanca ou dissertava sobre “A Arte da Guerra” de Sun Tzu. Lembro-me de lhe ter emprestado “O Estrangeiro” de Albert Camus e o “Homens e Bichos” de Axel Munthe, obras que se esqueceu de me devolver.
Quando em meados dos anos 60, conseguiu finalmente colocação no ministério dos negócios estrangeiros, o que a obrigou a mudar de quarto, para ficar mais perto do trabalho e não despender dinheiro com transportes, a mudança dos haveres, a fiança que lhe exigiram e o novo vencimento que só chegava daí a um mês, deixaram-na quase insolvente e sem dinheiro para se alimentar. Foi nessa altura que nos passámos a conhecer melhor, pois eu insistia em levá-la a jantar ao meu restaurante habitual, onde as contas eram feitas apenas no final do mês, adiamento esse que lhe permitia ganhar fôlego para reequilibrar o seu debilitado orçamento. Foi mais ou menos por essa altura que a ouvi pela primeira vez cortar o silêncio, com qualquer coisa de diferente dos seus habituais monossílabos. Com uma grande tristeza estampada no rosto, disse que as pessoas eram como ilhas, solidárias por fazerem parte do mesmo arquipélago, mas solitárias por terem um grande oceano a separá-las. Foi também por essa altura que ela conheceu o Professor, com quem iniciou uma relação, o que levou a que nos deixássemos de ver com tanta frequência, até que, dois anos e meio depois, após regressar de África e em cima da Revolução de Abril, voltei a revê-la, já casada e em vésperas de partir para a Holanda, em missão diplomática.

Fui encontrá-la acompanhada pelo marido Professor, no intervalo de um concerto na Fundação Gulbenkian, onde naquela noite se escutava Brahms, em todo o seu esplendor. Continuava a ser a mesma Grace misteriosa, com aquele leve sorriso, quase de Gioconda, resguardada atrás do porte silencioso da sua beleza esfíngica, porém, atributos esses agora realçados pelo vestuário dispendioso e meticulosamente escolhido, enfim, exigência ditada e a condizer com a sua nova condição. Na verdade, no seu longo vestido negro que lhe descia até aos pés, e com as costas desnudas, era mais a imagem de uma pitonisa de tragédia grega, perdida num auditório de Lisboa, que a modesta auxiliar de enfermagem que eu conhecera há vários anos atrás.
Almoçámos os três no dia seguinte, num restaurante da Baixa, tentando condensar naquele breve encontro tudo o que tínhamos feito durante aqueles anos de separação, e por onde tínhamos andado. Contei-lhe a minha passagem pelas guerras coloniais, umas a sério, outras de alecrim e manjerona. Revisitámos o passado, tentámos decifrar o futuro e acabámos a falar de coisas banais. Separámo-nos a cruzar endereços e números de telefone. Nos dois anos seguintes ainda trocámos cartões de boas festas, mas depois instalou-se o silêncio entre nós. Bem, talvez fosse porque o Professor não apreciava aquelas trocas de mimos…
No entanto, uma vez por outra, a minha curiosidade levou-me a indagar por onde andaria a Alda Grace. Em 1978, por altura do sequestro de Aldo Moro, soube que estava em Roma, depois, no princípio dos anos 80 andou por Rangum, a seguir em Washington, depois em Nova Iorque, integrada na delegação portuguesa à Assembleia Geral da ONU, mais tarde em Atenas, e depois perdi-lhe novamente o rasto.

Subitamente, em Fevereiro de 1992, entre a leitura apressada do jornal e outra insípida reunião de executivos, tocou o telefone no meu gabinete, e ouvi a sua voz levemente rouca, no outro extremo da linha. Era a Grace a perguntar se podíamos marcar encontro.
- Se estás em Lisboa, claro que sim! Respondi eu.
Encontrámo-nos num restaurante da Avenida Infante Santo, bem perto do Palácio das Necessidades, o seu ministério, onde aguardava nova colocação, talvez no Rio de Janeiro. Aqueles dez anos de idade que ela tinha de avanço sobre mim, notavam-se agora com mais evidência. O cabelo já não era o seu castanho natural, as linhas do pescoço estavam mais cavadas, e nem um grande e elegante par de óculos escuros, conseguia dissimular as rugas que começavam a insinuar-se pela superfície da sua pele quase sexagenária. Contou-me que o “seu” Professor, entusiasticamente rejuvenescido, se tinha separado dela, trocando-a por uma mulher muito mais jovem, uma francesa, dactilógrafa no consulado de Bayonne.
- Era bom homem, interessante, mas muito ocioso e inseguro, classificou-o ela, com um leve ar de desdém a bailar-lhe nos lábios.
– Apesar disso casaste com ele, retorqui eu.
– É certo, mas a verdade é que, mesmo que indiferentes, temos que aprender a viver com os defeitos dos outros, senão estamos condenados à solidão, atalhou ela, com um leve sopro de tristeza a ensombrar-lhe o olhar. E acrescentou ainda: - E tu, há muito tempo que sabes, que eu nunca deixarei de ser uma ilha inóspita e desabitada!
Era a mais pura das verdades. Lembrava-me agora daquela frase que ela pronunciara há largos atrás, quando dissera que as pessoas eram como ilhas, dependentes por fazerem parte do mesmo arquipélago, mas solitárias por terem um grande oceano a separá-las.
E continuou:
– Como sabes, não pude ter filhos. Então, há uns anos atrás, quando estive numa curta passagem pelo Quénia, ainda pensei em adoptar uma criança, mas o Professor não concordou. Amarras e compromissos eram coisas que abominava e que entravam em conflito com a sua pessoa. Nem com um gato persa ele conseguia partilhar a sua vida. Tudo o que fosse para além das recepções, dos cocktails e outros cerimoniais, eram interferências no seu bem-estar, que cultivada com um egoísmo quase doentio, para não dizer cruel. Agora, liberta que estou, adoptar uma criança, já é tarde!
Depois desta queixosa introdução, e de voltarmos a cumprir aquele ritual que consistia em, de tempos a tempos, termos uma recaída, e lembrarmo-nos de que somos confessionários uns dos outros, lá fomos recapitular o que nos tinha acontecido durante aqueles anos de separação, enumerando os sucessos e as derrotas, os sonhos e os projectos, as alegrias e as tristezas, as guerras civis e todas as outras, até que a tarde começou a declinar, entre dois aguaceiros que deixaram Lisboa de cara lavada. Separámo-nos de novo, com a promessa de nos escrevermos com mais regularidade, mas a promessa não saiu do tinteiro.

Entretanto, passaram mais quinze anos, enquanto nos confins do universo expiravam e nasciam novas estrelas, este mundo volteava sob os nossos pés, e continuávamos a ser uma espécie de arquipélago, feito de ilhas solitárias, umas exuberantes, outras desertas, separadas por oceanos que tanto podem estar serenos, como cavados e tempestuosos.
Foi então, quando estava fechado em casa a recuperar de uma constipação obstinada, que recebi uma encomenda postal da Grace, vinda de Wellington, na Nova Zelândia, no outro extremo do mundo. Trazia uma carta, rabiscada com letra insegura, onde dizia, sem mais pormenores, que estava internada, e que a coisa era grave.
Junto vinham os dois livros que lhe emprestara há quarenta e dois anos atrás, o Camus e o Axel Munthe. Olhando com cuidado, reparei que ainda estavam lá na estante, os espaços em aberto que lhes pertenciam. A acompanhá-los vinha outra nota muito breve:
“Suspeito que não vou chegar a tempo para tos devolver pessoalmente.
Bem hajas e até sempre!
Um beijo desta tua ilha Grace”

Passaram alguns dias, até que a gripe se dissipou, o Camus e o Axel Munthe voltaram para o seu lugar na estante, ao mesmo tempo que o mapa do meu arquipélago estava em vias de perder uma ilha, uma ilha de nome Grace, varrida por uma grande e devastadora tempestade tropical.

(*) O Quarteto de Alexandria, tetralogia do escritor inglês Lawrance Durrell, composta pelos romances Justine, Balthazar, Mountolive e Clea.

terça-feira, outubro 13, 2009

Diversões...

«...
A satisfação que ninguém me poderá tirar: é que eu gostei muito, mesmo muito, de fazer esta campanha!
O que quero e posso fazer para mudar para melhor Sintra e a vida dos sintrenses - está ainda no horizonte, nas mãos dos cidadãos que vão votar no domingo.
O divertimento que tirei desta campanha, esse, já cá canta!»

Extracto do post de Ana Gomes, publicado em 9 de Outubro de 2009, no blog CAUSA NOSSA

MEU COMENTÁRIO: Como facilmente se compreende, quem se diverte com a política, mesmo que a nível autárquico, não pode ser levado a sério, e o veredicto dos eleitores, expresso dois dias depois, não oferece dúvidas.

segunda-feira, outubro 12, 2009

30 Minutos (à Portuguesa)

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Data: 2009 Outubro 12
Momento: Telejornal da SIC Notícias das 21 Horas
Jornalista apresentador: Mário Crespo
Convidado: Professor Adriano Moreira, um Ancião, um Sábio, um Professor

Foi uma memorável, lúcida e exemplar lição de 30 minutos, que deveria ter sido escutada atentamente e apreciada por TODOS os portugueses, especialmente os que compõem a nossa classe política, quando se equaciona a trágica hipótese de Portugal se transformar num “Estado exíguo, mergulhado numa crise financeira de que não há memória”.

sábado, outubro 10, 2009

A Bolsa Nobel

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BARACK OBAMA, ao fim de nove meses de presidência dos Estados Unidos da América, foi agraciado com o Prémio Nobel da Paz, pelos esforços (ainda com escassos resultados) que tem desenvolvido em prol da paz. O Prémio Nobel foi atribuído não como prémio por obra feita, mas sim como estímulo para obra futura. Além de subverter o propósito que encerra a atribuição de um prémio, seja ele qual for, estou convicto que Obama se terá sentido embaraçado, senão mesmo pressionado, pois os êxitos que se possam vir a ter em matéria de negociações de paz, resultam da vontade de quem está envolvido no processo, da convergência de esforços colectivos, raramente resultando do esforço isolado de uma única pessoa.
Por esse motivo, sugiro que seja criada pela Fundação Nobel, paralelamente ao Prémio, uma recompensa destinada a financiar as expectativas associadas a casos semelhantes, e que poderia chamar-se Bolsa Nobel.
Esta minha opinião não tem nada a ver com o significado que a eleição do Presidente Obama teve para os E.U.A. e para mundo, nem com a confiança e esperanças que nele continuo a depositar.

sexta-feira, outubro 09, 2009

Solução SIMPLEX

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DESTA vez não veio falar do fim da crise, mas Fernando Teixeira dos Santos, não sei se na qualidade de ex-ministro das finanças, se na qualidade de oráculo da Maia, na impossibilidade de continuar a ficar calado, abriu a boca para dar uma notícia surpreendente, seja na forma, seja no conteúdo, isto é, informar os portugueses que os impostos em Portugal, não vão subir nem descer, isto é, a respeito de esbulhos, vai ficar tudo na mesma. Ora o que acontece é que uma notícia deste calibre era perfeitamente dispensável, a não ser que fosse complementada com uma outra, a de que na ausência de mexidas nos impostos, passaríamos também a prescindir de ministro e ministério das finanças. Era SIMPLEX, ganhávamos nós e ganhava o país.