“A INQUISIÇÃO - O Reino do Medo”, de Toby Green
Editorial Presença
«(…) A Inquisição, como todas as instituições, uma vez obtido o poder não lhe agradaria perdê-lo. Por isso, poderia fingir horror perante casos de corrupção e suborno, mas os casos eram, em si mesmos, provas do poder da instituição, algo que era apreciado. O poder era demasiado agradável para ser sacrificado no altar da moralidade. Em vez de castigar severamente os malfeitores da casa, era frequente a Inquisição nomeá-los para outra terra, como aconteceu com (M…). Não havia lugar para sentimentos de vergonha; havia uma pequena inconveniência, pois, de facto, a moralidade estava na base de tudo o que a instituição fazia.»
«(…) como é que o inquisidores podiam saber se as informações que sabiam eram exactas? A resposta devia ser que confiavam na capacidade de os aldeões se vigiarem mutuamente, no conhecimento que tinham dos pormenores íntimos sobre os antepassados distantes dos vizinhos ou que, pelo menos, quisessem dar a ideia de que os conheciam. A Península Ibérica tornou-se um ninho de espiões. (…) são vigiados no trabalho e na maneira como vivem com tanta atenção que, se prevaricarem, mesmo que seja no mais insignificante rito cristão, são acusados de heresia e punidos (…) »
Estes são dois excertos do livro “A INQUISIÇÃO - O Reino do Medo”, de Toby Green, publicado pela Editorial Presença, onde é feita uma pormenorizada abordagem da Inquisição Espanhola e Portuguesa, entre a sua instituição, no século XV, e a sua extinção no início do século XIX, e onde se conclui que através do seu prolongado exercício, podemos encontrar a génese de muitos dos instrumentos de dominação que o poder secular tem adoptado. Os medos e recalcamentos de ambas as sociedades, esculpidos por mais de três séculos de tutela da Igreja e dos seus braços purificadores e castradores, a Inquisição e o Santo Ofício, também acabaram por facilitar o caminho às ditaduras de Salazar e Francisco Franco, e replicar muitos dos métodos inquisitoriais a que as polícias políticas PVDE/PIDE/DGS portuguesas e a Brigada Político-Social espanhola recorriam para alimentar de combustível humano os abomináveis Tribunais Plenários portugueses e o Tribunal de Ordem Pública espanhol, entidades repressivas que viviam à custa de um imenso exército secreto de informadores, gente vulgar que era recrutada entre as hostes de simpatizantes dos regimes, e que quantas vezes não eram mais do que o nosso simpático vizinho do lado, familiar, confidente ou colega de trabalho. A Santa Inquisição perseguia, prendia, torturava, garrotava, queimava tudo o que passava pelas mãos, desde judeus, mouros, cristãos-novos, mouriscos, cristãos-velhos menos ortodoxos, intelectuais, as ideias do Reanascimento e do Iluminismo, e os livros, ai os livros, sobretudo os livros, essa praga que se insinuava nos espíritos, a conversar em voz baixinha, espalhando obras do diabo, heresias e outras ideias que inquietavam as gentes. Os regimes, com a lição aprendida, perseguiam e perseguem oposicionistas, sindicalistas, comunistas, e quanto à censura, passavam e passam tudo a pente fino, livros, jornais e até programas de rádio, televisão e cinema. Neste capítulo, a herdeira da Real Mesa Censória do Santo Ofício, foi a Comissão de Censura e Exame Prévio do Estado Novo. Perseguir, aprisionar, ocultar as ideias e instilar o medo e o terror, são as principais funções de todas as instituições repressivas, pertençam elas aos guardiães da fés ou aos regimes políticos.
Quanto ao mal endémico da corrupção, ao nível do aparelho de estado, se quisermos ficar a pensar no assunto, basta que no texto do primeiro excerto, se substitua a palavra Inquisição pela palavra Governo, e teremos transpostas para a actualidade, copiadas a papel químico, as práticas daquela odiosa instituição, que acabaram por ganhar raízes, entre muitos dos (maus) usos e costumes dos povos ibéricos. E ficamos por aqui.
“A INQUISIÇÃO - O Reino do Medo”, de Toby Green, é um livro para se ler, reler e não só.
Editorial Presença
«(…) A Inquisição, como todas as instituições, uma vez obtido o poder não lhe agradaria perdê-lo. Por isso, poderia fingir horror perante casos de corrupção e suborno, mas os casos eram, em si mesmos, provas do poder da instituição, algo que era apreciado. O poder era demasiado agradável para ser sacrificado no altar da moralidade. Em vez de castigar severamente os malfeitores da casa, era frequente a Inquisição nomeá-los para outra terra, como aconteceu com (M…). Não havia lugar para sentimentos de vergonha; havia uma pequena inconveniência, pois, de facto, a moralidade estava na base de tudo o que a instituição fazia.»
«(…) como é que o inquisidores podiam saber se as informações que sabiam eram exactas? A resposta devia ser que confiavam na capacidade de os aldeões se vigiarem mutuamente, no conhecimento que tinham dos pormenores íntimos sobre os antepassados distantes dos vizinhos ou que, pelo menos, quisessem dar a ideia de que os conheciam. A Península Ibérica tornou-se um ninho de espiões. (…) são vigiados no trabalho e na maneira como vivem com tanta atenção que, se prevaricarem, mesmo que seja no mais insignificante rito cristão, são acusados de heresia e punidos (…) »
Estes são dois excertos do livro “A INQUISIÇÃO - O Reino do Medo”, de Toby Green, publicado pela Editorial Presença, onde é feita uma pormenorizada abordagem da Inquisição Espanhola e Portuguesa, entre a sua instituição, no século XV, e a sua extinção no início do século XIX, e onde se conclui que através do seu prolongado exercício, podemos encontrar a génese de muitos dos instrumentos de dominação que o poder secular tem adoptado. Os medos e recalcamentos de ambas as sociedades, esculpidos por mais de três séculos de tutela da Igreja e dos seus braços purificadores e castradores, a Inquisição e o Santo Ofício, também acabaram por facilitar o caminho às ditaduras de Salazar e Francisco Franco, e replicar muitos dos métodos inquisitoriais a que as polícias políticas PVDE/PIDE/DGS portuguesas e a Brigada Político-Social espanhola recorriam para alimentar de combustível humano os abomináveis Tribunais Plenários portugueses e o Tribunal de Ordem Pública espanhol, entidades repressivas que viviam à custa de um imenso exército secreto de informadores, gente vulgar que era recrutada entre as hostes de simpatizantes dos regimes, e que quantas vezes não eram mais do que o nosso simpático vizinho do lado, familiar, confidente ou colega de trabalho. A Santa Inquisição perseguia, prendia, torturava, garrotava, queimava tudo o que passava pelas mãos, desde judeus, mouros, cristãos-novos, mouriscos, cristãos-velhos menos ortodoxos, intelectuais, as ideias do Reanascimento e do Iluminismo, e os livros, ai os livros, sobretudo os livros, essa praga que se insinuava nos espíritos, a conversar em voz baixinha, espalhando obras do diabo, heresias e outras ideias que inquietavam as gentes. Os regimes, com a lição aprendida, perseguiam e perseguem oposicionistas, sindicalistas, comunistas, e quanto à censura, passavam e passam tudo a pente fino, livros, jornais e até programas de rádio, televisão e cinema. Neste capítulo, a herdeira da Real Mesa Censória do Santo Ofício, foi a Comissão de Censura e Exame Prévio do Estado Novo. Perseguir, aprisionar, ocultar as ideias e instilar o medo e o terror, são as principais funções de todas as instituições repressivas, pertençam elas aos guardiães da fés ou aos regimes políticos.
Quanto ao mal endémico da corrupção, ao nível do aparelho de estado, se quisermos ficar a pensar no assunto, basta que no texto do primeiro excerto, se substitua a palavra Inquisição pela palavra Governo, e teremos transpostas para a actualidade, copiadas a papel químico, as práticas daquela odiosa instituição, que acabaram por ganhar raízes, entre muitos dos (maus) usos e costumes dos povos ibéricos. E ficamos por aqui.
“A INQUISIÇÃO - O Reino do Medo”, de Toby Green, é um livro para se ler, reler e não só.
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