quarta-feira, fevereiro 27, 2008

À Moda Antiga

A
A
Parece uma casa de bonecas, mas não é! Cumpre a sua função como uma original caixa-de-correio, que respeita, tanto no traçado como nas proporções, a moradia que lhe dá abrigo. Neste tempo de Internetes, Emails, Messangers, SMS e outras formas de comunicação, cedidas pelas novas tecnologias, este curioso receptáculo, vai aguardando, impávido e sereno, que lhe tragam notícias, à moda antiga. Fica junto à EN, ali para os lados do Vimeiro.

domingo, fevereiro 24, 2008

15 Boas Razões para Exigir um Referendo Sobre o Tratado de Lisboa

1
Considerações sobre o conteúdo do Tratado Reformador ou Tratado de Lisboa

Autor: Octávio Teixeira, economista

O Tratado Reformador (Tratado de Lisboa) altera os Tratados existentes: o Tratado da União Europeia [Tratado de Maastricht alterado pelos Tratados de Amesterdão e de Nice] (TUE) e o Tratado instituindo a Comunidade Europeia [Tratado de Roma alterado por sucessivos tratados após 1957] (TFUE).

O sofisma do Tratado não constitucional
Uma das razões que José Sócrates invocou para a não realização de um referendo ao novo Tratado (Assembleia da República, 09.01.08) foi: “o Tratado de Lisboa que temos hoje é diferente do antigo projecto de Tratado Constitucional (…) O Tratado, realmente, mudou. Mudou na sua natureza e no seu conteúdo.”
Na mesma linha, o seu “compagnon de route” Vital Moreira afirmou (Público, 10.01.08): “há uma diferença conceptual: o Tratado Constitucional pretendia imprimir uma noção de Estado, de unidade à UE. O Tratado de Lisboa não inclui os símbolos como a bandeira e o hino, nem estabelece a primazia do direito europeu sobre o direito constitucional nacional.”
Estas afirmações relevam, principalmente, da hipocrisia.
De facto, o Tratado de Lisboa não é mais que o Tratado Constitucional com outro nome, e o nome foi alterado exclusivamente para tentar evitar novas rejeições populares. No seu conteúdo, nos seus efeitos e nas suas consequências, é exactamente o mesmo.
É certo que os símbolos da União não integram qualquer artigo no novo Tratado. Mas eles existem e são regularmente utilizados em todo o território da União. Mas mais do que isso. Surge agora uma Declaração anexa ao Tratado, subscrita por 16 Estados – Membros, entre os quais Portugal, assumindo que o hino, a bandeira e o euro são “os símbolos do vínculo comum dos cidadãos à União Europeia e dos laços que os ligam a esta.”
Igualmente é verdade que, formalmente, não foi reposto o artigo 10º do defunto Tratado Constitucional segundo o qual “ A Constituição e o direito adoptado pelas instituições da União no exercício das competências que lhe são atribuídas primam sobre o direito dos Estados Membros”. Mas é impossível ignorar, a não ser por tartufice, que foi aprovada uma Declaração (que vincula juridicamente todos os Estados-Membros) sobre o primado do direito comunitário, rezando: “A Conferência lembra que, em conformidade com a jurisprudência constante do Tribunal de Justiça da União Europeia, os Tratados e o direito adoptado pela União com base nos Tratados primam sobre o direito dos Estados-Membros, nas condições estabelecidas pela referida jurisprudência.” E para que não restem dúvidas mínimas, a mesma Declaração recorda essas condições: “Decorre da jurisprudência do Tribunal de Justiça que o primado do direito comunitário é um princípio fundamental desse mesmo direito. Segundo o Tribunal, este princípio é inerente à natureza específica da Comunidade Europeia”.
Na verdade, todos os elementos constitucionais de um Estado federal (por acréscimo com o handicap da não existência de uma Câmara Alta parlamentar em que os Estados-Membros tenham a mesma representação) constam do novo Tratado da União Europeia (TUE):
- os símbolos, de facto para todos e através da Declaração juridicamente vinculativa para 16 Estados-Membros;
- o primado do direito da União sobre o direito dos Estados-Membros (Declaração respectiva;
- a personalidade jurídica da União (artigo 47 TUE);
- a existência de uma moeda comum (artigo 3-4 TUE);
- a repartição de competências entre a União e os Estados-Membros (artigos 4 e 5 TUE);
- a adopção de um conjunto de direitos fundamentais, como a Carta dos Direitos Fundamentais e a adesão da União à Convenção Europeia dos Direitos do Homem (artigo 6º TUE);
- a criação de uma cidadania da União (artigo 9 TUE);
- o estabelecimento de uma política externa da União (artigos 21 e 22 TUE) à qual, na prática, se devem submeter as políticas nacionais (artigo 24-3 TUE) ;
- a institucionalização do cargo de presidente do Conselho Europeu, com funções de representação externa da União e sem possibilidade de desempenhar qualquer mandato nacional [o chefe de Estado europeu] (artigo 15 TUE;
- a criação de um Ministro dos Negócios Estrangeiros Europeu, alcunhado de Alto Representante da União para os Negócios Estrangeiros (artigo 18 TUE).
Em suma, como cruamente o disse Giscard d’Estaing, o pai do projecto Constitucional derrotado nas urnas em França e na Holanda em 2005, “os Governos Europeus puseram-se de acordo sobre alterações cosméticas à Constituição para que ela seja mais fácil de engolir.”
Realce-se, por último, que o Preâmbulo do TUE foi alterado com o acréscimo de um considerando que afirma que a União se inspira na herança religiosa da Europa, o que significa um recuo ideológico importante, porque em contradição com o princípio da laicidade.

Institucionalização do directório dos grandes
O novo Tratado reduz substancialmente as decisões do Conselho que devem ser tomadas por unanimidade: “O Conselho delibera por maioria qualificada, salvo disposição em contrário dos Tratados” (artigo 16-3 TUE) passa a ser a regra.
Tendo em atenção a institucionalização da regra da dupla maioria na tomada de decisões, tal significa, em termos práticos, que nenhuma decisão por maioria qualificada pode ser tomada contra a vontade dos quatro maiores Estados da União (Alemanha, França, Itália e Reino-Unido), já que:
- A minoria de bloqueio deve ser composta por, pelo menos, quatro membros do Conselho (artigo 16-4 TUE), e
- A minoria de bloqueio deve ser composta por, pelo menos, o número mínimo de membros do Conselho que represente mais de 35 % da população dos Estados-Membros participantes, mais um membro (238º-3-a) TFUE)

Política Externa e de Defesa Comum (PESC)
A PESC passa a ser concebida como um instrumento integrado na NATO, comandada pelos EUA:
No actual artigo 17 – 4 TUE diz-se a cooperação no quadro da NATO só pode ter lugar “na medida em que essa cooperação não contrarie nem dificulte a cooperação prevista no presente título”.
O novo artigo 42-7 afirma: “Os compromissos e a cooperação neste domínio respeitam os compromissos assumidos no quadro da Organização do Tratado do Atlântico Norte, que, para os Estados que são membros desta organização, continua a ser o fundamento da sua defesa colectiva e a instância apropriada para a concretizar.”
O que é reforçado pelo Protocolo respectivo, explicitando que a PESC reforça a ligação à NATO, “que a PESC da União respeita as obrigações decorrentes da NATO” e “que um papel mais assertivo da União em matéria de segurança e de defesa contribuirá para a vitalidade de uma Aliança Atlântica”.
É alargado o campo de acção da União circunscrito, desde 1992, às “missões de Petersburg” (“manutenção da paz”, “gestão de crises”, “missões humanitárias”, …).
No novo Tratado (artigo 42) define-se um quadro mais amplo, incluindo “a prevenção de conflitos” e “o reforço da segurança internacional”, o que abre portas a todas as acções de apoio à NATO a coberto das missões de “desarmamento”, de “conselho e assistência militar”, de “estabilização” ou de “luta contra o terrorismo”.
O militarismo passa a ser oficialmente encorajado (artigo 42-3): “Os Estados-Membros comprometem-se a melhorar progressivamente as suas capacidades militares. A agência no domínio do desenvolvimento das capacidades de defesa, da investigação, da aquisição e dos armamentos (a seguir denominada “Agência Europeia de Defesa”) identifica as necessidades operacionais, promove as medidas necessárias para as satisfazer, contribui para identificar e, se necessário, executar todas as medidas úteis para reforçar a base industrial e tecnológica do sector da defesa”.
È o único âmbito em que os Estados Membros são encorajados a aumentar a despesa pública!

Delimitação de competências entre a União e os Estados-Membros
Teoricamente resultam três tipos de competências: as que relevam da competência exclusiva da União, as que são da competência partilhada entre a União e os Estados Membros e aquelas para as quais “a União dispõe de competência para desenvolver acções destinadas a apoiar, a coordenar ou a completar a acção dos Estados-Membros, sem substituir a competência destes nesses domínios” (artigo 2 TFUE).
E em relação às que são da competência partilhada reza o artigo 2-2 TFUE que “os Estados-Membros exercem a sua competência na medida em que a União não tenha exercido a sua”. Isto é, não se trata verdadeiramente de competências partilhadas mas de uma predominância das acções da União sobre os Estados-Membros.
A listagem dos artigos 2 a 6 TFUE mostra o número impressionante dos âmbitos da competência exclusiva da União (união aduaneira, estabelecimento das regras de concorrência necessárias ao funcionamento do mercado interno, política monetária para os Estados-Membros cuja moeda seja o euro, conservação dos recursos biológicos do mar, no âmbito da política comum das pescas, política comercial comum e celebração de acordos internacionais quando tal celebração esteja prevista num acto legislativo da União) e da competência dita partilhada (mercado interno, política social, no que se refere aos aspectos definidos no Tratado, coesão económica, social e territorial, agricultura e pescas, com excepção da conservação dos recursos biológicos do mar, ambiente, defesa dos consumidores, transportes, redes transeuropeias, energia, espaço de liberdade, segurança e justiça, problemas comuns de segurança em matéria de saúde pública), sendo certo que em âmbitos alegadamente da competência exclusiva dos Estados-Membros a União também pode meter a sua colherada (protecção e melhoria da saúde humana, indústria, cultura, turismo, educação, formação profissional, juventude e desporto, protecção civil, Cooperação administrativa).
É certo que uma parte das políticas sociais e fiscais escapa às competências da União, mas não é menos verdade que, na prática, elas são sobre determinadas pelas políticas económicas e monetárias, as quais relevam da União.

A Comissão soberana
O esquema institucional continua a concentrar os poderes em instâncias não eleitas: a Comissão e o Tribunal de Justiça da União, e o BCE quanto à política monetária.
A Comissão é o verdadeiro Governo da União:
- “controla a aplicação do direito da União, sob a fiscalização do Tribunal de Justiça da União Europeia” (artigo 17-1 TUE), e este tem os poderes de “interpretação” e “de aplicação” dos Tratados (artigo 19 TUE);
- detém o monopólio da iniciativa legislativa, pois “os actos legislativos da União só podem ser adoptados sob proposta da Comissão” (artigo 17-2 TUE);
- “exerce as suas responsabilidades com total independência” (artigo 17-3 TUE);
- como qualquer Primeiro-Ministro, o seu Presidente tem o poder discricionário de nomeação (partilhado com o Conselho) e de demissão dos comissários;
- nos termos do artigo 48 TUE, pode apresentar projectos de revisão dos Tratados e de todas ou de parte das disposições da terceira parte do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, relativas às políticas e acções internas da União;
- é ela que decide apresentar ou não ao Conselho uma proposta de cooperação reforçada que seja apresentada por Estados-Membros, isto é, tem o poder de veto sobre as cooperações reforçadas (artigo 329 TFUE).
A composição da Comissão é alterada: com o novo Tratado deixa de integrar um nacional de cada Estado-Membro e passa a ser composta por um número de membros, incluindo o seu Presidente e o Alto Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, correspondente a dois terços do número dos Estados-Membros (artigo 17-5 TUE).
O Alto Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança ocupa um lugar de Vice-Presidente da Comissão.

Papel dos Parlamentos Nacionais
O artigo 7 do Protocolo relativo à aplicação dos princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade, explicita o procedimento que aos Parlamentos Nacionais sobre o processo legislativo europeu.
Cada Parlamento nacional dispõe de dois votos.
No caso de um procedimento legislativo ordinário, se uma maioria dos votos atribuídos aos Paramentos Nacionais der uma opinião negativa, o projecto deve ser reanalisado [nos outros casos, um terço dos votos é suficiente, e baixa para um quarto nas questões da liberdade, da segurança e da justiça].
Porém este “poder” é extremamente limitado, se não meramente simbólico.
Por um lado, os Parlamentos Nacionais não se pronunciam sobre o fundo do projecto mas exclusivamente sobre a sua conformidade jurídica com o princípio da subsidiariedade.
Por outro lado, “depois dessa reanálise, a Comissão, ou, eventualmente, o grupo de Estados-Membros, o Parlamento Europeu, o Tribunal de Justiça, o Banco Central Europeu ou o Banco Europeu de Investimento, se deles emanar o projecto de acto legislativo, pode decidir manter o projecto, alterá-lo ou retirá-lo”!
Para além disto, “são informados” dos projectos de actos legislativos, participam nos mecanismos de avaliação da execução das políticas no âmbito do espaço de liberdade, segurança e justiça, participam nos processos de revisão dos Tratados, “são informados” dos pedidos de adesão à União e participam na cooperação interparlamentar entre os Parlamentos Nacionais e o Parlamento Europeu.
Tudo espremido, dá nada.

Carta dos Direitos Fundamentais
A Carta dos Direitos Fundamentais não integra o articulado dos novos Tratados, mas o artigo 6 do TUE “reconhece-a” e atribui-lhe “o mesmo valor jurídico que os tratados”.
Mas o seu conteúdo é de fraco alcance.
Assim, o direito ao trabalho e ao emprego não consta da Carta, apenas o “direito de trabalhar”. O direito à protecção social igualmente não existe, mas apenas o “direito de acesso às prestações de segurança social e aos serviços sociais”. O que significa que a Carta está aquém da Declaração Universal dos Direitos do Homem e da Constituição da República Portuguesa.
Outros aspectos podem gerar problemas. Por exemplo, os direitos ao aborto e à contracepção não são reconhecidos pela Carta. O que não garante que o reafirmado “direito à vida” (artigo 2 da Carta) não possa vir a utilizado para os contestar junto do Tribunal de Justiça da União Europeia.
No essencial, a aplicação dos direitos contidos na Carta remete para “as práticas e legislações nacionais”. Não é pois criado qualquer direito social europeu susceptível de equilibrar o direito de concorrência que continuará dominante à escala da União. Maxime, os direitos contidos na Carta podem ser restringidos se isso for julgado “necessário”.
Além do mais, e pelo sim pelo não, o seu alcance é explicitamente restringido: ela “não cria quaisquer novas competências ou atribuições para a União, nem modifica as competências e atribuições definidas nos Tratados”. Acrescendo que as disposições da Carta “só serão invocadas perante o juiz tendo em vista a interpretação desses actos e a fiscalização da sua legalidade”, o que reduz o seu alcance jurídico.
Por último, no artigo 6 foi eliminado o nº 4 anterior que referia que “a União deve dotar-se dos meios necessários para atingir os seus objectivos e realizar com êxito as suas políticas”, o que parece confirmar que esta Carta corre um sério risco de não ter qualquer impacto nas políticas da União.
Onde está o “modelo social europeu”?

Incentivo às deslocalizações e ao dumping social
A supressão de todos os entraves ao livre comércio e ao livre estabelecimento de empresas em todo o território da União, em simultâneo com a preservação das disparidades fiscais e sociais entre os Estados-Membros, são um factor de agravamento do dumping social e das deslocalizações. O objectivo é o de conduzir, sob a pressão da “concorrência livre e não falseada” à escala da União, um alinhamento por baixo dos salários e das condições de trabalho, não uma harmonização por cima.
É o que diz o Tratado ao prever que a “harmonização” das “condições de vida e de trabalho” e a “promoção do emprego” resultarão “do funcionamento do mercado interno, que “favorecerá a harmonização dos sistemas sociais”, tendo em conta “a necessidade de manter a capacidade concorrencial da economia da União” (artigo 151 TFUE).
Neste quadro, a vontade de criar “mercados de trabalho aptos a reagir rapidamente às mudanças económicas” (artigo 145 TFUE) significa a oferta da liberdade aos empresários para ajustar a mão-de-obra despedindo e deslocalizando à vontade. Um objectivo facilitado pela sujeição à concorrência das protecções e dos direitos dos trabalhadores, com a limitação do direito à greve através do reconhecimento do “lock-out” (artigo 153-5 TFUE), e substituindo a noção do direito ao trabalho pelo “direito de trabalhar” (artigo 15 da Carta), e a remissão das distorções das legislações nacionais em matéria de protecção dos assalariados em caso de despedimento sem justa causa (artigo 30 da Carta).

Os serviços públicos mais ameaçados
O actual artigo 16 do Tratado que institui a Comunidade Europeia reconhece os serviços de interesse económico geral como um “valor comum da União”. No artigo 14 do novo TFUE mantém-se esse reconhecimento, mas acrescenta-se que os princípios em que devem assentar são estabelecidos pelo Parlamento Europeu e pelo Conselho. E esses princípios devem respeitar a sacrossanta lei da concorrência, como explicitamente o recorda o artigo 106 do TFUE. Para além do mais estabelece toda uma série de proibições dirigidas aos Estados Membros e pressiona a liberalização que os Estados Membros são convidados a alargar.
O novo artigo 106 do TFUE é demolidor para os serviços públicos: “As empresas encarregadas da gestão de serviços de interesse económico geral ou que tenham a natureza de monopólio fiscal ficam submetidas ao disposto nos Tratados, designadamente às regras de concorrência, na medida em que a aplicação destas regras não constitua obstáculo ao cumprimento, de direito ou de facto, da missão particular que lhes foi confiada”
Ficam sujeitos à concorrência e é a Comissão que decide de qualquer derrogação possível. Este artigo fornece a base jurídica para a liberalização dos serviços públicos.
E o artigo 107 torna, de facto, quase impossível qualquer ajuda do Estado por razões de interesse geral.
No capítulo dos transportes, as necessárias interconexões das redes são condicionadas à sua abertura à concorrência. As ajudas dos Estados-Membros às empresas de serviços públicos são consideradas como incompatíveis com o mercado interno. Em caso de conflito, a última palavra pertence ao Tribunal de Justiça da União Europeia, um demonstrado guardião empedernido do liberalismo.
Acresce que o artigo 71-2 do actual TiCE, em derrogação do princípio geral aplicável, exigia uma deliberação do Conselho por unanimidade para “as disposições que incidam sobre os princípios do regime dos transportes e cuja aplicação seja susceptível de afectar gravemente o nível de vida e o emprego em certas regiões, bem como a exploração dos equipamentos de transporte”. Este artigo foi alterado, e o novo artigo 91 diz apenas que “são tidos em conta os casos em que a aplicação seja susceptível de afectar gravemente o nível de vida e o emprego em certas regiões, bem como a exploração de equipamentos de transporte.” É uma protecção do serviço público de transportes que desaparece.
É um facto que as instituições europeias distinguem os serviços de interesse económico geral não mercantis e os serviços de interesse económico geral mercantis (que fornecem o acesso a um serviço em contrapartida de um pagamento) que devem ser submetidos às leis da concorrência, portanto à liberalização.
A verdade porém, é que toda a tendência recente tem sido a de considerar o máximo possível os serviços de interesse económico geral como mercantis Veja-se o acórdão do Tribunal de Justiça da União (C-180-184/98) em que se decide que “constitui uma actividade económica toda a actividade que consista em oferecer bens e serviços num mercado.” Com este tipo de definição, quase tudo pode ser considerado como uma actividade económica e, portanto, ser submetido à concorrência e às regras do mercado interno. E em termos práticos aí temos os exemplos da liberalização dos serviços postais, da distribuição de energia e do sector ferroviário.
O Protocolo relativo aos serviços de interesse económico geral pode funcionar como um travão. Designadamente o seu artigo 2, ao afirmar: ”as disposições dos Tratados em nada afectam a competência dos Estados-Membros para prestar, mandar executar e organizar serviços de interesse geral não económicos”.
O problema está em definir quais são esses serviços, já que a definição não consta dos textos. Ora, o que se constata é que, até hoje, a Comissão tem-se recusado a fazê-lo. Num relatório dos serviços de interesse geral, feito por ocasião do Conselho europeu de Laeken no final de 2001, a Comissão dizia que “não é possível estabelecer a priori uma lista definitiva de todos os serviços de interesse geral que devam ser considerados como não económicos”, e acrescentava que “a gama de serviços públicos passíveis de serem propostos num mercado depende de mutações tecnológicas, económicas e sociais”.
O que significa, na prática, que para a Comissão perde pertinência a distinção entre serviços de interesse geral económicos e não económicos, pelo que esse Protocolo corre sério risco de não ter qualquer efeito prático.

A concorrência prevalece sobre tudo o resto
O artigo terceiro do Tratado Constitucional afirmava como um dos objectivos da União “proporcionar aos seus cidadãos um espaço de liberdade, segurança e justiça sem fronteiras internas e um mercado interno em que a concorrência é livre e não falseada”.
O presidente Sarkozy apontou como uma das suas grandes conquistas no Tratado de Lisboa a eliminação deste objectivo. A verdade é que, mais uma vez, a alteração é meramente aparente e sofística.
De facto desaparece do artigo 3 do TUE, mas surge num Protocolo interpretando esse mesmo artigo 3: “tendo em conta que o mercado interno, tal como estabelecido no artigo 3º (2.º) do Tratado da União Europeia, inclui um sistema que assegura que a concorrência não seja falseada.” E, através desta remissão para o artigo 3, que respeita aos objectivos da União, temos a reintrodução da concorrência não falseada como objectivo da União. E para que não haja dúvidas, para mostrar que não se trata de um objectivo teórico mas muito concreto e incontornável, o Protocolo refere ainda que,” para esse efeito, a União, se necessário, toma medidas ao abrigo do disposto nos Tratados, incluindo do artigo 352º (308.º) do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia.”
O estabelecimento das regras da concorrência é um privilégio exclusivo da Comissão. Nada foi alterado nas sanções em que incorrem os Estados-Membros que queiram auxiliar um sector económico ameaçado.
A livre concorrência mantém-se pois como objectivo principal, cujo respeito condiciona todas as políticas sociais.

A circulação de capitais sem entraves
A par da concorrência “não falseada”, a livre circulação de capitais constitui o outro pilar do liberalismo expresso dos Tratados da União. Proclamada no artigo 63 TFUE, o princípio de base é perfeitamente claro: “são proibidas todas as restrições aos movimentos de capitais entre Estados-Membros e entre Estados-Membros e países terceiros.” Todas as medidas de salvaguarda utilizadas por um Estado-Membro é definida como uma derrogação sob elevada vigilância, sendo requerida a unanimidade no Conselho para qualquer limitação (qualificada de “recuo”) dos movimentos de capitais, não apenas no interior da União, mas igualmente entre os Estados-Membros e países terceiros. Assim se abrindo a porta para as deslocalizações para países mais generosos para os investidores (baixos salários, fiscalidade reduzida ou nula, …). A interdição de tocar nos movimentos de capitais impede qualquer taxa, qualquer medida capaz de combater o dumping social. (É em nome deste princípio que a Comissão preconiza um regulamento permitindo às empresas que deslocalizem as suas produções para regiões de baixos salários exteriores à União a reimportação sem entraves daquelas produções).
A livre circulação de capitais complementada com a liberdade de estabelecimento e a interdição de qualquer restrição à livre prestação de serviços no território da União, e na ausência de uma harmonização social, deixa em aberto todas as possibilidades de colocar os trabalhadores assalariados da União em concorrência, como gritantemente foi demonstrado com a directiva dos serviços dita “Bolkestein”.

Política comercial: a União Europeia expoente do livre comércio e motor da globalização liberal
O princípio inultrapassável do livre comércio e a eliminação, à escala mundial, de todas as barreiras ao livre comércio é uma pedra angular da actual construção europeia e determina a linha de conduta da União na Organização Mundial de Comércio e nas negociações bilaterais. Este objectivo é claramente explicitado e precisado no artigo 206 do TFUE: “a União contribui … para a supressão progressiva das restrições às trocas internacionais e aos investimentos estrangeiros directos e para a redução das barreiras alfandegárias e de outro tipo.”
Este artigo altera a redacção actual no sentido de uma maior liberalização: o “investimento directo externo” e as “barreiras de outro tipo” são novidade nos Tratados.
Acresce que a expressão “de outro tipo” sugere que as barreiras tarifárias não serão as únicas em causa. Com esta formulação pode visar-se as restrições às trocas assentes em normas ambientais, sanitárias, sociais ou de protecção dos consumidores.
A política comercial comum é um domínio da competência exclusiva da União no quadro do qual poderão expandir-se os poderes exorbitantes da Comissão.
Só a conclusão de acordos comerciais “ no domínio do comércio de serviços culturais e audiovisuais, sempre que esses acordos sejam susceptíveis de prejudicar a diversidade cultural e linguística da União” e “no domínio do comércio de serviços sociais, educativos e de saúde, sempre que esses acordos sejam susceptíveis de causar graves perturbações na organização desses serviços ao nível nacional e de prejudicar a responsabilidade dos Estados-Membros de prestarem esses serviços”, exigem a unanimidade dos Estados Membros. Sendo certo que, de facto, esta formulação remete para os acórdãos do ultraliberal Tribunal de Justiça da União Europeia, pois, em última instância, é ele que decidirá se existe ou não o risco de perturbações.

Os plenos poderes do Banco Central Europeu
O BCE é uma peça central da União liberal. As suas regras de funcionamento foram concebidas como instrumento de uma política monetária estritamente devotada aos mercados financeiros. O principal critério é o de combater a inflação, de forma a garantir que as margens rentistas bolsistas não sejam prejudicadas pela inflação. Daí a sua postura permanente de luta pela austeridade salarial.
As alterações resultantes do novo Tratado vão no sentido de reforçar todo o arsenal de normas liberais. Maxime, a “estabilidade dos preços” passa a fazer parte dos objectivos da União quando, até agora, era apenas um objectivo do BCE expresso no artigo 105 do TiCE. Esse artigo é mantido no novo TFUE, com o número 127 e é reforçado com o novo artigo 282, em cujo nº 2 se reexplicita que “o objectivo primordial do SEBC é a manutenção da estabilidade dos preços”.
Poder-se-á dizer que estas alterações não mudarão a prática. Mas politicamente são significativas.
É institucionalizado o Eurogrupo (artigo 137 e Protocolo relativo ao Eurogrupo) em que “Os ministros dos Estados-Membros cuja moeda seja o euro reúnem-se entre si de maneira informal. Estas reuniões têm lugar, na medida do necessário, para debater questões relacionadas com as responsabilidades específicas que partilham em matéria de moeda única. Nelas participa a Comissão. O Banco Central Europeu será convidado a participar nessas reuniões, que serão preparadas pelos representantes dos ministros das Finanças dos Estados-Membros cuja moeda seja o euro e da Comissão.”
A verdade é que nada pesa em termos de política monetária: são reuniões informais, o BCE participa como mero convidado, e não pode dar quaisquer orientações ao BCE pois a independência deste mantém-se (artigo 130 do TFUE) e continuará a ter como único objectivo a estabilidade de preços, contrariamente ao que se passa com os outros bancos centrais por esse mundo fora.

A regra do pacto de estabilidade orçamental
O novo TFUE retoma integralmente o constrangimento orçamental do pacto de estabilidade, retirando aos Estados-Membros toda a margem de manobra para conduzir políticas de crescimento e de investimentos públicos. Consequências desse constrangimento: a supressão contínua das despesas públicas e sociais e, pela degradação dos serviços públicos, dos sistemas de saúde e de educação, a redução dos postos de trabalho na função pública e a oferta de oportunidades de negócio ao sector privado (privatizações camufladas).
Para que não restem dúvidas, a Declaração relativa aos défices excessivos incita os Estados Membros a uma “reestruturação das receitas e das despesas públicas, sem deixar de respeitar a disciplina orçamental, nos termos dos Tratados e do Pacto de Estabilidade e Crescimento.”

Em suma e em conclusão:
As razões de fundo da rejeição do Tratado Constitucional mantêm-se para este Tratado dito reformador.
A própria disposição que permite ao Reino-Unido ser dispensado de aplicar a Carta dos Direitos Fundamentais é demonstrativa de que os direitos sociais ao nível da União, mesmo reduzidos ao mínimo, não são vinculativos, enquanto as regras do mercado interno o são. O social é uma opção, a concorrência uma obrigação!
O Tratado é marcado, de ponta a ponta, pelo neoliberalismo, tanto nos princípios como nas políticas. Com ele, a União Europeia continuará um espaço privilegiado de promoção das políticas neoliberais.
Marcado, ainda, por um profundo défice democrático que exclui os povos e os cidadãos do processo de construção da União.
O Tratado Constitucional foi rejeitado em referendo. O Tratado “reformador”, que retoma o essencial e substancial daquele, deve ser submetido ao voto dos cidadãos por referendo.

sábado, fevereiro 23, 2008

5 Motivos para Reflectir

5
Tomada de Posição da SEDES

1) UM DIFUSO MAL-ESTAR
Sente-se hoje na sociedade portuguesa um mal-estar difuso, que alastra e mina a confiança essencial à coesão nacional.
Nem todas as causas desse sentimento são exclusivamente portuguesas, na medida em que reflectem tendências culturais do espaço civilizacional em que nos inserimos. Mas uma boa parte são questões internas à nossa sociedade e às nossas circunstâncias. Não podemos, por isso, ceder à resignação sem recusarmos a liberdade com que assumimos a responsabilidade pelo nosso destino.
Assumindo o dever cívico decorrente de uma ética da responsabilidade, a SEDES entende ser oportuno chamar a atenção para os sinais de degradação da qualidade da vida cívica que, não constituindo um fenómeno inteiramente novo, estão por detrás do referido mal-estar.

2) DEGRADAÇÃO DA CONFIANÇA NO SISTEMA POLÍTICO
Ao nível político, tem-se acentuado a degradação da confiança dos cidadãos nos representantes partidários, praticamente generalizada a todo o espectro político.
É uma situação preocupante para quem acredita que a democracia representativa é o regime que melhor assegura o bem comum de sociedades desenvolvidas. O seu eventual fracasso, com o estreitamento do papel da mediação partidária, criará um vácuo propício ao acirrar das emoções mais primárias em detrimento da razão e à consequente emergência de derivas populistas, caciquistas, personalistas, etc. Importa, por isso, perseverar na defesa da democracia representativa e das suas instituições. E desde logo, dos partidos políticos, pilares do eficaz funcionamento de uma democracia representativa. Mas há três condições para que estes possam cumprir adequadamente o seu papel.
Têm, por um lado, de ser capazes de mobilizar os talentos da sociedade para uma elite de serviço; por outro lado, a sua presença não pode ser dominadora a ponto de asfixiar a sociedade e o Estado, coarctando a necessária e vivificante diversidade e o dinamismo criativo; finalmente, não devem ser um objectivo em si mesmos...
É por isso preocupante ver o afunilamento da qualidade dos partidos, seja pela dificuldade em atrair e reter os cidadãos mais qualificados, seja por critérios de selecção, cada vez mais favoráveis à gestão de interesses do que à promoção da qualidade cívica. E é também preocupante assistir à tentacular expansão da influência partidária – quer na ocupação do Estado, quer na articulação com interesses da economia privada – muito para além do que deve ser o seu espaço natural.
Estas tendências são factores de empobrecimento do regime político e da qualidade da vida cívica. O que, em última instância, não deixará de se reflectir na qualidade de vida dos portugueses.

3) VALORES, JUSTIÇA E COMUNICAÇÃO SOCIAL
Outro factor de degradação da qualidade da vida política é o resultado da combinação de alguma comunicação social sensacionalista com uma justiça ineficaz. E a sensação de que a justiça também funciona por vezes subordinada a agendas políticas.
Com ou sem intencionalidade, essa combinação alimenta um estado de suspeição generalizada sobre a classe política, sem contudo conduzir a quaisquer condenações relevantes. É o pior dos mundos: sendo fácil e impune lançar suspeitas infundadas, muitas pessoas sérias e competentes afastam-se da política, empobrecendo-a; a banalização da suspeita e a incapacidade de condenar os culpados (e ilibar inocentes) favorece os mal-intencionados, diluídos na confusão. Resulta a desacreditação do sistema político e a adversa e perversa selecção dos seus agentes.
Nalguma comunicação social prolifera um jornalismo de insinuação, onde prima o
sensacionalismo. Misturando-se verdades e suspeitas, coisas importantes e minudências,
destroem-se impunemente reputações laboriosamente construídas, ao mesmo tempo que, banalizando o mal, se favorecem as pessoas sem escrúpulos.
Por seu lado, o Estado tem uma presença asfixiante sobre toda a sociedade, a ponto de não ser exagero considerar que é cada vez mais estreito o espaço deixado verdadeiramente livre para a iniciativa privada. Além disso, demite-se muitas vezes do seu dever de isenta regulação, para desenvolver duvidosas articulações com interesses privados, que deixam em muitos um perigoso rasto de desconfiança.
Num ambiente de relativismo moral, é frequentemente promovida a confusão entre o que a lei não proíbe explicitamente e o que é eticamente aceitável, tentando tornar a lei no único regulador aceitável dos comportamentos sociais. Esquece-se, deliberadamente, que uma tal acepção enredaria a sociedade numa burocratizante teia legislativa e num palco de permanente litigância judicial, que acabaria por coarctar seriamente a sua funcionalidade. Não será, pois, por acaso que é precisamente na penumbra do que a lei não prevê explicitamente que proliferam comportamentos contrários ao interesse da sociedade e ao bem comum. E que é justamente nessa penumbra sem valores que medra a corrupção, um cancro que corrói a sociedade e que a justiça não alcança.

4) CRIMINALIDADE, INSEGURANÇA E EXAGEROS
A criminalidade violenta progride e cresce o sentimento de insegurança entre os cidadãos. Se é certo que Portugal ainda é um país relativamente seguro, apesar da facilidade de circulação no espaço europeu facilitar a importação da criminalidade organizada. Mas a crescente ousadia dos criminosos transmite o sentimento de que a impune experimentação vai consolidando saber e experiência na escala da violência.
Ora, para além de alguns fogachos mediáticos, não se vê uma acção consistente, da prevenção, da investigação e da justiça, para transmitir a desejada tranquilidade.
Mas enquanto subsiste uma cultura predominantemente laxista no cumprimento da lei, em áreas menos relevantes para as necessidades do bom funcionamento da sociedade emerge, por vezes, uma espécie de fundamentalismo utra-zeloso, sem sentido de proporcionalidade ou bom-senso.
Para se ter uma noção objectiva da desproporção entre os riscos que a sociedade enfrenta e o empenho do Estado para os enfrentar, calculem-se as vítimas da última década originadas por problemas relacionados com bolas de Berlim, colheres de pau, ou similares e os decorrentes da criminalidade violenta ou da circulação rodoviária e confronte-se com o zelo que o Estado visivelmente lhes dedicou.
E nesta matéria a responsabilidade pelo desproporcionado zelo utilizado recai, antes de mais, nos legisladores portugueses que transcrevem para o direito português, mecânica e por vezes levianamente, as directivas de Bruxelas.

5) APELO DA SEDES
O mal-estar e a degradação da confiança, a espiral descendente em que o regime parece ter mergulhado, têm como consequência inevitável o seu bloqueamento. E se essa espiral descendente continuar, emergirá, mais cedo ou mais tarde, uma crise social de contornos difíceis de prever.
A sociedade civil pode e deve participar no desbloqueamento da eficácia do regime – para o que será necessário que este se lhe abra mais do que tem feito até aqui –, mas ele só pode partir dos seus dois pólos de poder: os partidos, com a sua emanação fundamental que é o Parlamento, e o Presidente da República.
As últimas eleições para a Câmara de Lisboa mostraram a existência de uma significativa dissociação entre os eleitores e os partidos. E uma sondagem recente deu conta de que os políticos – grupo a que se associa quase por metonímia “os partidos” – são a classe em que os portugueses menos confiam.
Este estado de coisas deve preocupar todos aqueles que se empenham verdadeiramente na coisa pública e que não podem continuar indiferentes perante a crescente dissociação entre o conceito de “res pública” e o de intervenção política!
A regeneração é necessária e tem de começar nos próprios partidos políticos, fulcro de um regime democrático representativo. Abrir-se à sociedade, promover princípios éticos de decência na vida política e na sociedade em geral, desenvolver processos de selecção que permitam atrair competências e afastar oportunismos, são parte essencial da necessária regeneração.
Os partidos estão na base da formação das políticas públicas que determinam a organização da sociedade portuguesa. Na Assembleia ou no Governo exercem um mandato ratificado pelos cidadãos, e têm a obrigação de prestar contas de forma permanente sobre o modo como o exercem.
Em geral o Estado, a esfera formal onde se forma a decisão e se gerem os negócios do país, tem de abrir urgentemente canais para escutar a sociedade civil e os cidadãos em geral.
Deve fazê-lo de forma clara, transparente e, sobretudo, escrutinável. Os portugueses têm de poder entender as razões que presidem à formação das políticas públicas que lhes dizem respeito.
A SEDES está naturalmente disponível para alimentar esses canais e frequentar as esferas de reflexão e diálogo que forem efectiva e produtivamente activadas.

Sedes, 21 de Fevereiro de 2008
O Conselho Coordenador
(Vitor Bento (Presidente), M. Alves Monteiro, Luís Barata, L. Campos e Cunha, J. Ferreira do Amaral, Henrique Neto, F. Ribeiro Mendes, Paulo Sande, Amílcar Theias)

As COUTADAS dos Ministros

A
Será que o Bastonário da Ordem dos Advogados, Dr. Marinho e Pinto, quando falou em “coutadas dos ministros”, se estava a referir a algum destes experimentadíssimos “caçadores”, na modalidade de “caça grossa”?

Fernando Nogueira:
Ministro da Presidência, Justiça e Defesa
- Presidente do BCP Angola

José de Oliveira e Costa:
Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais
- Presidente do Banco Português de Negócios (BPN)

Rui Machete:
Ministro dos Assuntos Sociais
- Presidente do Conselho Superior do BPN
- Presidente do Conselho Executivo da FLAD

Armando Vara:
Ministro-adjunto do Primeiro-ministro
- Vice-Presidente do BCP

Paulo Teixeira Pinto:
Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros
- Presidente do BCP - Depois de 3 anos de "trabalho", Saiu com 10 milhões de Euros de indemnização e mais 35.000€ x 15 meses por ano até morrer…

António Vitorino:
Ministro da Presidência e da Defesa
- Vice-Presidente da PT Internacional
- Presidente da Assembleia Geral do Santander Totta - (e ainda umas "patacas" como comentador RTP)

Celeste Cardona:
Ministra da Justiça
- Vogal do CA da CGD

José Silveira Godinho:
Secretário de Estado das Finanças
- Administrador do BES

João de Deus Pinheiro:
Ministro da Educação e Negócios Estrangeiros
- Vogal do CA do Banco Privado Português.

Elias da Costa:
Secretário de Estado da Construção e Habitação -
- Vogal do CA do BES

Ferreira do Amaral:
Ministro das Obras Públicas (que entregou todas as pontes a jusante de Vila Franca de Xira à Lusoponte)
- Presidente da Lusoponte, com quem se tem de renegociar o contrato.

Etc, etc, etc

terça-feira, fevereiro 19, 2008

Amena Cavaqueira

A
Em amena, inócua e inconclusiva cavaqueira, mais a cheirar a frete que a entrevista, os dois jornalistas da SIC e do EXPRESSO, embarcaram no jogo do primeiro-ministro Pinto de Sousa, também conhecido por José Sócrates. Deixaram-no palrar em roda livre, a vender a sua banha da cobra, como se estivesse em plena campanha eleitoral, ou no monólogo de um qualquer tempo de antena. Erro fatal! Como se fôssemos muito estúpidos, e porque ele sabe que tanto a oposição como este tipo de entrevistas que lhe são feitas, não conseguem contrariar isso, este cavalheiro continua demagogicamente a intercalar a fantasia da luz ao fundo do túnel com a ficção do paraíso, pintando o país com cores irreais, transformando promessas em objectivos, e sem que ninguém o contrarie nem explicite que uma promessa é sempre um compromisso inadiável, ao passo que um objectivo é uma meta que se pode alcançar ou não.
Mais uma vez, quase brilhante e artista como é, Pinto de Sousa dominou este jogo combinado na perfeição. Entretanto, estamos a habituar-nos com demasiada frequência, pateticamente e sem reagir, a estas demonstrações de ilusionismo e de falta de vergonha.

O Estado Em Que Estamos

“…
Dos 60.000 licenciados no desemprego (um escândalo difícil de esconder) nasceu recentemente uma tese peregrina: a tese da “empregabilidade” dos cursos, que sustenta a existência de cursos com ou sem “saídas profissionais”. Mariano Gago prometeu mesmo publicar uma lista com essa absurda discriminação. No fundo, e tirando os casos de uma enormidade notória, os responsáveis pela catástrofe querem transferir a culpa do desemprego para os desempregados: não escolheram bem, portanto não se queixem.
…”
Vasco Pulido Valente, in ESTUDAR PARA O DESEMPREGO, em jornal PÚBLICO de 17-Fev-2008

Mania da Perseguição

M
O nosso primeiro-ministro espanta-me e confunde-me. Então não é que ele acha que as pessoas que foram para a porta do PS, no Largo do Rato, no passado dia 16, durante uma reunião à porta fechada do primeiro-ministro, com a ministra, secretários de estado e professores socialistas, manifestarem-se contra as políticas da Educação, longe de constituírem uma genuína manifestação “espontânea”, eram militantes dos partidos políticos da oposição, que tentaram condicionar a actividade do PS! Então quem é que ele esperava que fossem? Então o que é ele esperava que eles ali fossem fazer? Mandar beijinhos? Eram da oposição, e não só, pois segundo consta também lá havia do PS e outros que nem partido têm. Que me conste, só não foram detectados marujos, camponeses e extraterrestres. Por isto se prova que além de uma angustiante falta de informação, este primeiro-ministro, continua a ter a mania da perseguição, e não consegue conviver com as legítimas reacções de quem discorda das suas políticas.
N
Nota - Para acalmar os nervos e inteirar-se dos problemas da Educação, e porque a ministra e os seus secretários de estado não são bons mensageiros, era bom que o primeiro-ministro se desse ao trabalho de ler as cartas abertas que o Professor Domingos Cardoso tem dirigido, respectivamente, ao Sr. Presidente da República e ao Sr. Procurador-Geral da República, e que podem ser lidas AQUI e AQUI .

CARTA ABERTA II

C
Carta aberta ao Sr. Procurador-Geral da República

Ílhavo, 11 de Fevereiro de 2008

Senhor Procurador-Geral da República

Excelência:

Temos assistido, nos últimos tempos, a uma campanha de desmoralização, desautorização e humilhação dos professores.
Esta tentativa de “diabolização” dos professores assenta em duas mentiras:
Primeira - sendo funcionários públicos são gastadores dos impostos de todos os cidadãos (como se eles os não pagassem também);
Segunda - não fazem nada, trabalham pouco, têm muitas férias e os alunos não aprendem.

Debrucemo-nos sobre a segunda porque a primeira não merece a atenção de ninguém minimamente inteligente.
A
A - Aposentei-me no dia 1 de Novembro do ano passado e só no dia 21 de Janeiro deste ano entrou ao serviço um novo professor para me substituir.
Isto quer dizer que as cinco turmas que eu tinha (quatro do 1º ano dos Cursos de Educação e Formação - CEF e uma do segundo ano dos mesmos cursos) estiveram mais de oito semanas sem aulas de Ciências Físico-Químicas (quatro semanas em Novembro, duas em Dezembro e duas semanas e dois dias em Janeiro).
Isto significa que, no primeiro ano, os alunos perderam, no mínimo, 24 tempos lectivos de 45 minutos cada (três por semana) e no segundo ano perderam, no mínimo, 16 tempos lectivos de 45 minutos cada (dois por semana).
Acresce o facto de no segundo ano a parte lectiva terminar no dia 31 de Maio para os alunos entrarem em estágio no dia 1 de Junho. Como terá de ser cumprido um número fixo de horas predeterminado o novo professor terá de dar aulas na Páscoa, aos sábados e, provavelmente, também aos domingos. Afinal, os professores nem são assim tão maus já que deles até se espera que façam milagres… No fim os alunos passam na mesma e foram quase três meses de vencimento que o governo poupou.
Mas desta falta de respeito que o governo mostra pelos professores, alunos e suas famílias o povo não sabe porque não convém que saiba para não estragar a imagem de sucesso tão querida dos governantes.
Quem pede contas ao governo por mais de oito semanas de aulas perdidas e por mais de dois meses e meio para a substituição de um professor? Quem é responsável por tamanha incompetência? Em que normas, regras, procedimentos, directivas, despachos e portarias esteve retida a simples substituição de um professor? Na classificação do desempenho do governo que nota lhe seria atribuída?
B
B - Quando os professores começarem a exigir cumprir as 35 horas de trabalho na escola, as escolas ficarão bloqueadas.
De facto, onde está escrito no contrato de trabalho entre o governo e um professor que o seu escritório será uma extensão da escola sem que receba pagamento pelo aluguer? Onde está escrito que terá de usar o seu computador, o seu tinteiro, a sua impressora e outro material no serviço da escola?
Quando os professores começarem a exigir gabinetes para preparem aulas, corrigirem testes, computadores para planeamento de aulas e elaboração de testes e relatórios onde estará o espaço para os albergar?
C
C - Se a progressão dos professores na sua carreira passar a depender, também, das classificações obtidas pelos alunos, Portugal correrá o sério risco de se transformar na aberração de ser um país só de génios com um QI, no mínimo, igual ao de Einstein.
De facto, qual será o professor que correrá o risco de dizer que, dos seus alunos, cinco, três, ou mesmo um só, não conseguiram transitar de ano? Um professor, tal como qualquer outro mortal, tem uma casa para pagar e uma família para sustentar e se o governo quer que o aluno passe mesmo sem saber, assim será feito.
Cairemos, então, no poço sem fundo da maior mentira e da maior vergonha do ensino público.
Se actualmente, nos CEFs, os alunos podem fazer o que lhes apetecer porque nem as faltas disciplinares assentes em participações relatando os comportamentos impróprios dos alunos aparecem registadas nas pautas, como se nada tivesse acontecido, para que é que hão-de estar com atenção e esforçarem-se nas aulas para aprenderem e assimilarem comportamentos sociais correctos se, no final do ano, o professor irá vender a sua assinatura a troco de pão na mesa? E quem lho poderá levar a mal já que é o governo que para isso o empurra encostando-lhe a faca ao peito?

Quem quer acabar com a dignidade dos professores? Quem quer destruir o ensino público? Quem anda a brincar com os professores, os alunos e as famílias? Quem anda a hipotecar o futuro do País?
Os professores não são, de certeza.
Agradeço que mande alguém investigar.

Grato pela atenção

Domingos Freire Cardoso
Professor aposentado de Ciências Físico-Químicas
Rua José António Vidal, nº 25 C
3830 - 203 ÍLHAVO
Tel. 234 185 375 / 93 847 11 04
E-mail:
dfcardos@gmail.com

domingo, fevereiro 17, 2008

Aquilo que o futuro nos reserva...

A
A propósito do que disse no meu “post” anterior, denominado “ABRIU A CAÇA!”, sei agora que há TERTÚLIAS e CLUBES de fotógrafos, tanto amadores como profissionais, que se deleitam a subverter as estúpidas, sádicas e castradoras normas e regulamentos, que impedem que o piscar das objectivas fotográficas, colham e devolvam ao domínio público, os momento únicos do mundo que nos rodeia. Será que no tempo de JOSHUA BENOLIEL também havia disto?
Actualmente, e muito bem, os direitos de imagem apenas se devem aplicar ao INDIVÍDUO, porém, não às coisas e acontecimentos que nos rodeiam. A partir do momento em que ninguém me pergunta se consinto ser filmado, quando há uma floresta de câmaras de vídeo, 24 horas por dia, desde que me levanto até que me deito, a seguir os meus passos, tudo o que se queira meter de permeio, e pretender ir para alem disso, não passa da mais torpe e retinta estupidez, para não falar de outra coisa. Por agora, deixo aqui o mote, porque nunca se sabe aquilo que o futuro nos reserva...

sábado, fevereiro 16, 2008

Abriu a Caça!

A
Como preâmbulo anoto o seguinte:
O site PORTUGAL DIÁRIO noticia o seguinte: “Fiscais e polícias municipais identificaram, com vista à aplicação de coimas, um utilizador de câmara de filmar com tripé que não possui licença de ocupação da via pública.”
Logo a seguir o semanário EXPRESSO acrescenta: “António Limão, repórter de imagem da RTP, nem queria acreditar... "Isto deve ser para os Apanhados", pensou para os seus botões. Na quinta-feira de manhã, quando filmava no Terreiro do Paço, em Lisboa, acompanhado pelo jornalista Luís Fonseca, foi abordado por um fiscal municipal. Este perguntou-lhe se tinha licença de ocupação da via pública, pois estavam a utilizar uma câmara com tripé… "O tratamento é igual para todos", disse-lhes o fiscal. E informou que actuava ao abrigo de "um regulamento que existe na Câmara desde 1991". De acordo com estas normas, quem for apanhado sem licença de ocupação da via pública paga uma coima entre um e 4,5 salários mínimos.”
A reacção imediata, é a vontade de rir, mas há coisas que merecem atenção, pois não são tão inocentes ou desajustadas quanto parecem. Senão vejamos:
Para além das mais inconcebíveis e despropositadas proibições e interdições que grassam por aí, de fotografar ou filmar, que carecem de fundamento e ninguém consegue razoavelmente explicar - seja elas as mais insignificantes coisas, ou os mais incríveis ou inofensivos lugares - conta-se agora que, porque a ocupação da via pública necessita de autorização especial, também não é permitido montar um tripé para filmar ou fotografar na dita via pública, sob de pena do infractor sofrer uma coima. Nem o dejecto do canídeo passeador ou o descontraído escarro do espécime humano são tratados com tanta subtileza! O artista que monta o seu cavalete no Jardim da Estrela ou na Praça do Império, para pintar a sua tela, também estará abrangido por esta postura camarária? O homem-estátua que fica ali no passeio público da Rua Augusta, semi-congelado, na sua postura e expressão, a deliciar quem passa, também é um perigoso invasor do património urbano?
Vamos fazer comparações. Lembram-se das famigeradas licenças de isqueiro, do tempo da ditadura salazarenta, e dos pidescos fiscalotes que andavam pela baixa lisboeta, à cata do primeiro que acendesse um cigarro e não tivesse a dita licença, para passar a multa e apreender a pederneira? Pois bem, com esta postura (que dizem ser camarária, dos idos de 1991) o ridículo (ou talvez não) tomou definitivamente conta deste patético lugarejo! Só posso concluir uma coisa: os zelosos fazedores e mandantes dos mais absurdos e incríveis regulamentos e normas deste tipo, transportam consigo um problema muito grave, que não foi detectado a tempo, antes de ocuparem o seu posto de trabalho: o seu cérebro, fonte daquelas preciosas ideias, está directamente ligado ao intestino grosso, e o resultado está bem à vista. Assim, por este andar virá o dia em que o acto de parar para conversar com alguém, ou apenas apertar o atacador dos sapatos, também será considerado ocupação indevida da sacra via pública, logo passível de licença camarária, e o cívico lá estará, de esferográfica em riste para rabiscar a respectiva multazinha, ao mesmo tempo que vai dizendo: - Enquanto o autuo, não fique aí parado, circule, circule!
Onde é que eu já ouvi isto? Se não reclamarmos, se não nos acautelarmos, não sei onde iremos parar.
Disse.

sexta-feira, fevereiro 15, 2008

Recortes

R
“Diz o DN de hoje, 12-2-2008, que a participação do sindicalista João Serpa, trabalhador da empresa Pereira da Costa, empresa que tinha salários em atraso, numa manifestação que não foi comunicada ao Governo Civil e previamente autorizada, rendeu-lhe... 75 dias de prisão, remíveis a multa. Não foi na Coreia do Norte, nem na Síria, mas num sistema perto de si...”
Balbino Caldeira, in blogue DO PORTUGAL PROFUNDO em 12-2-2008

E sobre o mesmo assunto:
“…
Mas o que ainda é mais extraordinário é que, segundo a notícia, este sindicalista foi notificado para ir a Tribunal sem explicitação do objectivo da notificação, só lá é que percebeu que ia julgado, não tinha em consequência nem testemunhas nem advogado por si nomeado e foi defendido por um defensor oficioso.Eu, como sempre me confesso, sou apenas um antigo e fracassado estudante de Direito. Mas, se a notícia do DN é exacta e rigorosa, então salta à vista neste caso um inacreditável conjunto de atropelos e violações dos direitos dos cidadãos que, só por si, teriam de ser considerados nulidades essenciais deste julgamento.A notícia inclui a referência a que João Serpa vai recorrer da sentença. E certamente não será preciso que seja eu a dizer que o seu Sindicato, ou mesmo o movimento sindical no seu conjunto, têm toda a obrigação de recorrer aos mais qualificados meios jurídicos para, numa instância superior, obter a anulação desta sentença. E não é evidentemente por causa dos 75 dias de prisão remíveis a multa mas sim pelo gravíssimo e absolutamente intolerável precedente que esta sentença representa do ponto de vista dos direitos individuais e colectivos.
…”
Victor Dias, in blogue O TEMPO DAS CEREJAS em 15-2-2008

“Mesquitas serão proibidas na Áustria. Combater ideias é uma coisa, impedir a liberdade religiosa é outra, inaceitável para a democracia. Como ateu, manifesto o mais vivo repúdio por tal decisão, de contornos fascistas.”
Carlos Esperança, in blogue DIÁRIO ATEÍSTA em 13 Fev 2008

“Já agora depois de pedir perdão aos aborígenes, "our fellow australians", só falta perguntar-lhes se eles querem ser australianos. Dado o tom do pedido de perdão, tem todo o sentido pôr em causa a colonização branca da Austrália. Nunca lhes foi pedida autorização, nem licença, pelo uso das terras, não é? O país era deles há 25.000 anos, os brancos são na verdade guest workers, ainda por cima indesejados porque vinham degradados, fugidos, presos. Isto de pedir desculpas pela história não tem pés nem cabeça, porque os pedidos de desculpa acabam por ser sempre selectivos. Nós, por exemplo, já pedimos desculpa por expulsar os judeus e ainda não pedimos desculpa por expulsar os árabes. Pode ser que o Bin Laden nos obrigue.”
José Pacheco Pereira, in blogue ABRUPTO em 14-2-2008

“…
Se Obama for eleito, durante uns anos viveremos num mundo surpreendente em que o Presidente dos Estados Unidos da América se chama Barak Hussein Obama, enquanto, por exemplo, no Gana, o Presidente é um tipo chamado John (a sério, acabei de verificar). É tão estranho como ter um Antunes a comandar os destinos da Suécia – o que seria, aliás, benéfico: há muitos anos que eu mantenho que a única maneira de Portugal atingir o nível de vida dos suecos é pôr um português a mandar na Suécia. Era num instante que os apanhávamos. Infelizmente, ninguém me dá ouvidos no que à política internacional diz respeito.
…”
Ricardo Araújo Pereira, in BOCA DO INFERNO da revista VISÃO em 14-2-2008

“Ontem à noite, depois de sair com um grupo de amigos, fomos mandados parar por uma brigada de trânsito da BT. Até certo ponto, achamos normal por se tratar de um fim-de-semana e ser costume haver a caça ao condutor com álcool. Depois de o condutor soprar no balão, qual o nosso espanto quando o polícia pergunta se temos leitor de CD no carro. Tínhamos leitor de CD e logo a seguir pediu-nos para ver os CD's que tínhamos no carro, para ver se eram cópias! Sobre isto, já eu tinha ouvido falar num mail que recebi recentemente e que dizia que a GNR-BT, nos auto-stops, começou a fiscalizar os CD's piratas que temos no carro. Se os CDs não forem originais ou então se não possuir­mos o original que deu origem à cópia, (é permitido por lei efectuar UMA cópia de segurança), a viatura pode ser apreendida e sujeitamo-nos às respectivas sanções. O que é incrí­vel é que, depois de ver os CD's, o polí­cia manda-nos sair do carro e começou a olhar para a nossa roupa! Verí­dico! Nisto, chama uma mulher-polí­cia para junto das minhas colegas e um outro polí­cia para junto de nós e... PEDEM-NOS PARA VER A ETIQUETA DAS NOSSAS ROUPAS! Recusámo-nos imediatamente e eles informaram-nos que, naquela operação STOP, estava incluída uma busca por contrafacção! Um dos meus colegas tinha um casaco Paul & Shark, comprado na feira de Espinho, e eles identificaram-no. O meu colega já contactou o advogado e este informou-o de que o que os polícias fizeram está dentro da lei! Pelos vistos, quando compramos roupa na feira, sabemos que estamos a comprar material ilegal e isso é crime! Estamos a pactuar com uma actuação fora da lei e por isso sujeitos a coimas por conivência de forma de delito. Pelo que percebemos, só algumas marcas é que estão sujeitas a fiscalização, tipo, bolsas Gucci, óculos Channel, roupas Lacoste, Nike, Gant, Louis Vuitton, etc etc.
Façam chegar este mail a toda a gente para que todos saibam.”
Recebido por e-mail em 15-2-2008

Comentário meu sobre o último recorte: Cuidado, cuidado, que ainda acabamos todos num campo de concentração e/ou reeducação para consumidores, uma espécie de Gulag / António Maria Cardoso / Guantanamo, em versão ligeira do estado policial, que camuflado na legalidade democrática, não queima, mas magoa (isto por agora!), para nos levar a confessar a quem comprámos o artefacto. Quanto aos contrafactores, lá vão contribuindo, alegre, esforçada, calma e (des)honestamente, para a melhoria da situação económica desta fanquaria, conduzida alarvemente por um ministrozinho falsificado, que dá pelo nome de Mané Pinho.

Sociedade Portugal-Sol, SGPS, S.A.

S
A promessa de entregar à Sociedade Estoril-Sol, de “mão beijada” e por uma bagatela, o Pavilhão do Futuro, foi estabelecida em 2003, durante o governo do saudoso e querido “camarada Veiga”, também conhecido por Durão Barroso, tendo depois transitado, sido gerido e despachado pelo governo do Sr. Lopes (Santana), ambos de triste memória, e tudo isto a propósito daquela maratona de despachos que o ministro Telmo Correia teve de efectuar, em 2005, pela madrugada dentro, horas antes da tomada de posse de Pinto de Sousa, também conhecido por José Sócrates. Assim, cinco anos depois da traficância, Durão Barroso e Santana Lopes, voltam a ser assunto, isto sem esquecermos que o primeiro, talvez pelos “bons serviços”, foi premiado com a presidência da União Europeia, ao passo que o segundo vai “andando por aí”, a visitar o “país profundo”, a ganhar juízo e à espera de nova oportunidade.
Não há que enganar. Sobre este assunto é a própria Sociedade Estoril-Sol, SGPS, SA que em comunicado aos accionistas, disponível no seu site, põe os pontos nos “iis”, nos seguintes termos:
C
“Comunicado
Na sequência da informação prestada em Outubro de 2002, dá-se conhecimento que foi outorgado ontem, 16 de Outubro de 2004, o contrato promessa de compra e venda pelo qual a PARQUE EXPO 98, S.A. prometeu vender à ESTORIL-SOL III – TURISMO, ANIMAÇÃO E JOGO, S.A., o edifício denominado “Pavilhão do Futuro” sito no Parque das Nações, em Lisboa, para nele ser instalado o futuro Casino
de Lisboa.
A compra e venda que engloba, igualmente, uma fracção autónoma de um edifício vizinho destinada a parque de estacionamento de apoio ao Casino, envolve o montante global de 17.600.000,00 €, a pagar em três prestações: a primeira já paga com a assinatura do contrato promessa de compra e venda, a segunda dependente das autorizações para a realização de obras, que se estima seja paga até ao final do corrente ano, e a última a liquidar com a realização da escritura de compra e venda, que deverá ser outorgada no ano de 2005.
O Pavilhão do Futuro irá ser objecto de obras para a sua adaptação ao fim em vista, prevendo-se que as mesmas estejam terminadas e o Casino seja inaugurado, em Setembro de 2005.
Como é do conhecimento público, a instalação do casino no Parque Mayer, em Lisboa, como inicialmente previsto, ficou prejudicada pela não promulgação pelo Senhor Presidente da República do diploma legal que previa essa localização, tendo, entretanto, sido publicado o Dec.Lei nº 15/2003, de 30 de Janeiro, que não estabelecia uma localização precisa para o casino na cidade de Lisboa, tendo-se então iniciado um longo processo para encontrar um local apropriado para esse efeito, o qual culminou com a escolha do Pavilhão do Futuro, que agora se formalizou.
Estoril, 17 de Setembro de 2004
A Administração”
A
Entretanto, para que o negócio tivesse efeito e fosse legal, era necessário que a legislação que rege as concessões de jogo fossem alteradas, o que veio a verificar-se já em Fevereiro de 2005, dando origem àquela ciclópica sessão de despachos. Portanto, jogos de sorte e de azar é o futuro que espera aquilo que em tempos foi um ícone para as gerações vindouras, isto é o “Pavilhão do Futuro” da Expo98.
Em Portugal não se fazem negócios em conformidade com as leis, mas correm a alterar-se as leis para que estas fiquem em conformidade com os negócios anteriormente combinados à socapa, e esta será, provavelmente, uma das facetas mais hediondas da promiscuidade que grassa entre o poderes políticos e os grandes negócios, de que falava o bastonário da Ordem dos Advogados, Dr. Marinho e Pinto.
Assim fossem cumpridas, com o mesmo rigor e grau de determinação, as promessas que os políticos fazem ao eleitorado, e que raramente cumprem, isto quando não sucede fazerem exactamente o contrário do que anunciaram. Eles continuam a andar por aí, sorridentes e indiferentes, porque sabem que jamais serão responsabilizados pelas delapidações que levaram a cabo. Alguns deles foram premiados, outros foram medalhados, e outros ainda estão à espera da próxima oportunidade para voltarem a estar à frente dos destinos de um país - que já é uma espécie de Sociedade Portugal-Sol, SGPS, SA, - para irem ensacar o que lhes escapou da primeira vez. Bem vistas as coisas, não sei se casos como este, verdadeiros buracos negros da gestão da coisa pública, por excederem os parâmetros da responsabilidade política, não deveriam ser classificados como autênticos casos de polícia.

quinta-feira, fevereiro 14, 2008

Daqui a Vinte Anos

D
Daqui a vinte anos (ou menos) haverá um canal de televisão europeu, que terá programas para todos os gostos e apetites, tais como:

O Político do ano, do mês, da semana e do dia;
O Jogador de Futebol do ano, do mês, da semana e do dia;
O Artista (de todas as artes, corruptas e criminosas incluídas) do ano, do mês, da semana e do dia;
A Figura (riquíssima e inútil de quem se fala) do ano, do mês, da semana e do dia;
A Dona de Casa do ano, do mês, da semana e do dia;
A Vítima (de qualquer coisa) do ano, do mês, da semana e do dia;
O Inteligente do ano, do mês, da semana e do dia;
O Estúpido do ano, do mês, da semana e do dia;
O Sortudo do ano, do mês, da semana e do dia;
O Desgraçado (ou azarado) do ano, do mês, da semana e do dia;
O Acontecimento do ano, do mês, da semana e do dia;

Será um LIVE SHOW permanente, com direito a comentários, votações e prémios. As versões do ano, do mês, da semana e do dia, têm a ver com o facto de continuar a haver quem veja muita, pouca ou quase nenhuma TV (só não está informado quem não quer), sem contar com os cortes de energia por causa da crise do petróleo.

domingo, fevereiro 10, 2008

A Nova História do Capuchinho

A
Em Portugal há uma floresta de leis, e atrás de cada árvore, espreita um Lobo Mau para as contornar e subverter. O engenheiro arrasa. O ministro despacha. O presidente mastiga. O bastonário brada. O general adverte. A menina do capuchinho perdeu o norte e não encontra o caminho de casa. O Alegre está triste e diz que há um buraco negro na democracia. E o povo continua silencioso, ao passo que a matilha, de dente em riste, continua à solta e desceu ao povoado. Em política e em democracia, a tristeza, o negrume e o silêncio são maus conselheiros.

A Falta de Vergonha

A
Sem comentários e de forma descomprometida, transcrevo um artigo do Gen. Garcia Leandro, publicado no semanário EXPRESSO de 2008-Fev-2.

“O modo como se tem desenvolvido a vida das grandes empresas, nomeadamente da banca e dos seguros, envolvendo BCP e Banco de Portugal, incluindo as remunerações dos seus administradores e respectivas mordomias, transformou-se num escândalo nacional, criando a repulsa generalizada.
É consensual que o país precisa de grandes reformas e tal esforço deve ser reconhecido a este Governo (mesmo com os erros e exageros que têm acontecido).
Alguém tinha de o fazer e este Governo arregaçou as mangas para algo que já deveria ter ocorrido há muito tempo. Mas não tocou nestes grandes beneficiários que envergonham a democracia, com a agravante de se pedirem sacrifícios à generalidade da população que já vive com muitas dificuldades.
O excesso de benefícios daqueles administradores já levou a que o próprio Presidente da República tivesse sentido a obrigação de intervir publicamente.
Mas tudo continua na mesma; a promiscuidade entre o poder político e o económico é um facto e feito com total despudor.
Uma recente sondagem Gallup a nível mundial, e também em Portugal, mostra a falta de confiança que existe nos responsáveis políticos deste regime.
Tenho 47 anos de serviço ao Estado, nas mais diferentes funções de grande responsabilidade, sei como se pode governar com sentido de serviço público, sem qualquer vantagem pessoal, e sei qual é a minha pensão de aposentação publicada em D.R..
Se sinto a revolta crescente daqueles que comigo contactam, eu próprio começo a sentir que a minha capacidade de resistência psicológica a tanta desvergonha, mantendo sempre uma posição institucional e de confiança no sistema que a III República instaurou, vai enfraquecendo todos os dias.
Já fui convidado para encabeçar um movimento de indignação contra este estado de coisas e tenho resistido.
Mas a explosão social está a chegar. Vão ocorrer movimentos de cidadãos que já não podem aguentar mais o que se passa.
É óbvio que não será pela acção militar que tal acontecerá, não só porque não resolveria o problema mas também porque o enquadramento da UE não o aceitaria; não haverá mais cardeais e generais para resolver este tipo de questões. Isso é um passado enterrado. Tem de ser o próprio sistema político e social a tomar as medidas correctivas para diminuir os crescentes focos de indignação e revolta.
Os sintomas são iguais aos que aconteceram no final da Monarquia e da I República, sendo bom que os responsáveis não olhem para o lado, já que, quando as grandes explosões sociais acontecem, ninguém sabe como acabam. E as más experiências de Portugal devem ser uma vacina para evitar erros semelhantes na actualidade.
É espantosa a reacção ofendida dos responsáveis políticos quando alguém denuncia a corrupção, sendo evidente que deve ser provada; e se olhassem para dentro dos partidos e começassem a fazer a separação entre o trigo e o joio? Seria um bom princípio!
Corrija-se o que está errado, as mordomias e as injustiças, e a tranquilidade voltará, porque o povo compreende os sacrifícios se forem distribuídos por todos.”

quinta-feira, fevereiro 07, 2008

Soneto de Neruda

S
Não te amo como se fosse rosa de sal, topázio
Ou flecha de cravos que propagam fogo;
Amo-te como se amam certas coisas obscuras,
Secretamente, entre a sombra e a alma.
Amo-te como a planta que não floresce e
Leva dentro de si, oculta, a luz daquelas flores.
E graças a teu amor, vive oculto em meu
Corpo o apertado aroma que ascende da terra.
Amo-te sem saber como, nem quando, nem onde.
Amo-te directamente sem problemas nem orgulho;
Assim te amo porque não sei amar de outra maneira,
Senão assim, deste modo, em que não sou nem és.
Tão perto de tua mão sobre meu peito é minha,
Tão perto que se fecham teus olhos com
Meu sonho...

In CEM SONETOS DE AMOR, de Pablo Neruda, Santiago do Chile, Ed. Universitária, 1959.

quarta-feira, fevereiro 06, 2008

Voltar a Ler para Crer

V
Os textos que se seguem têm origem no blogue de Victor Dias, “o tempo das cerejas”. Quando comecei a ler, apercebi-me que tudo aquilo transpirava a qualquer coisa que já tinha existido nos anos 50 do século passado, nos Estados Unidos, e que deu pelo nome de “comissão para as actividades anti-americanas”. Foi presidida pelo senador McCarthy de triste memória, que investigou, perseguiu e liquidou a carreira profissional de muitos milhares de americanos que caíram sob a sua alçada, suspeitos de serem militantes do partido comunista dos EU, ou apenas seus simpatizantes.

Passo a palavra a Victor Dias e ao seu bloque
O TEMPO DAS CEREJAS

terça-feira, fevereiro 05, 2008

O Beco da Bandalheira

A
Meu caro CESNA de Pancevo, Sérvia (ex-Jugoslavia):

Viver numa viela sem saída é uma desgraça, mas como todas as desditas, vamo-nos habituando a ela, até passamos a gostar dela. Os becos costumam ser lugares, além de claustrofóbicos, por natureza, um microcosmo do género e da condição humana, um sítio com poucas perspectivas e nenhuma saída. Portugal, pese embora o sol radioso que ainda nos vai visitando, a boa mesa, os bons vinhos e os bons costumes, que entretanto se vão perdendo, está a tornar-se, de dia para dia, num beco a descambar para o fétido, para o abandalhado, para o mal frequentado, e pior que tudo, sem saída, exactamente por ser um beco.
Senão vejamos:
Caso 1 - Que me lembre, houve pelo menos um director da Polícia Judiciária que foi afastado das investigações sobre o caso Madeleine McCann, por ter prestado declarações que não agradaram à hierarquia, pois colocariam em causa as averiguações. Entretanto, vem agora o douto Director Nacional da mesma polícia, sr. Alípio Ribeiro, dar pareceres, em entrevista à Rádio Renascença, RTP e ao jornal PÚBLICO, dizendo que houve precipitação na constituição dos arguidos, nomeadamente os pais da criança desaparecida. De uma penada desrespeitou o sacrossanto segredo de justiça de um processo em curso, e deitou por terra, desacreditando-a, uma das várias linhas de investigação sobre o desaparecimento da criança, de tal forma que os advogados do casal McCann já teriam avançado com um pedido de retirada do estatuto de arguidos, e a sua passagem a assistentes do processo. Ora bem, outra coisa não seria de esperar. Assim sendo, e sem tento na língua, é o próprio director nacional da polícia portuguesa que de uma penada, desacredita a instituição que dirige, tanto dentro como fora das fronteiras. Não se percebe porque é que este senhor, 72 horas depois de ter proferido tais declarações ainda está, impávido e sereno, como se nada tivesse acontecido, à frente dos destinos da “sua” Polícia Judiciária. Coisas do Carnaval deste beco…
Caso 2 – Telmo Correia, militante do CDS/PP, enquanto ministro do Turismo do governo do impagável Santana Lopes, e apesar de estar na condição de gestão corrente, assinou, numa inacreditável prova de esforço, na madrugada em que José Sócrates Pinto de Sousa tomou posse (Fevereiro de 2005), cerca de 300 despachos. No imediato pode pensar-se que o ministro, assoberbado com outros compromissos e actividades, tenha descurado as suas obrigações governativas, e num acto indómito e voluntarista, tenha tentado acertar contas com a História. Mas não! No meio da saraivada de papeis e assinaturas, despachou uma coisa muito polémica, que foi objecto de muitas trocas de telefonemas comprometedores e de cariz altamente melindroso, escutados pela DCIAP (Departamento Central de Investigação e Acção Penal), e entre os quais se falava de submarinos, do abate clandestino de sobreiros na Herdade da Vargem Fresca e do tráfico de influências no caso “Portucale”, projecto turístico do Grupo Espírito Santo, mas que se mantêm, por força da nova legislação, na situação de indivulgáveis à opinião pública. Assim, entre os tais 300 documentos assinados pela calada, estava a segunda versão do parecer da Inspecção-Geral de Jogos, que implicava a não devolução ao Estado (isto é, à posse pública) do edifício do Casino de Lisboa (ex-Pavilhão do Futuro da Expo-98), no Parque das Nações, no final do período de concessão à empresa Estoril Sol, documento esse que vincula o Estado, desde que assinado, a tal parecer. O diligente ex-ministro veio dizer que com a sua assinatura não aprovou nada, limitando-se a “tomar conhecimento” do tal parecer. Até agora, as altas instância não tugiram nem mugiram, e por isto se prova que basta ter um amigo certo, no lugar certo, mesmo que a horas incertas, para que tudo bata certo. Como é óbvio, três anos passados sobre a ocorrência dos factos, e de tanta investigação e diligência, ninguém acredita que as “averiguações” cheguem alguma vez a alguma conclusão, quanto mais a algum lugar. Nasceram no beco e no beco irão apodrecer.
Caso 3 – Paulo Portas, militante do CDS/PP, também ministro da Defesa do governo do impagável Santana Lopes, mandou efectuar a digitalização de 61.893 documentos do “seu” Ministério da Defesa, muitos deles confidenciais ou classificados como segredo de Estado, que levou algures para parte incerta, antes de abandonar o governo.
- Paguei o serviço do meu bolso e são os meus documentos de sete anos de presidente do CDS e de três à frente do ministério, terá explicado ele quando questionado sobre o surrealismo do caso, já que estava em causa um procedimento que tanto tem de invulgar como de misterioso, isto para não dizer de suspeito. Por outro lado, um seu assessor, veio adiantar que se tratavam de documentos pessoais, tais como cartas, memorandos, despachos, programas, etc., destinados à compilação de um acervo pessoal, tanto para documentar as suas memórias, como para se defender de ataques políticos, só que, note-se bem, não foi uma bagatela qualquer, mas nada mais, nada menos que 61.893 documentos de um ministério de soberania.
Curiosamente, e para que a bandalheira fique completa e seja convenientemente branqueada, não é consensual entre os “especialistas” que tenha havido violação de segredos de Estado, já que o Código Penal apenas prevê a penalização para a divulgação de documentos e não a sua cópia, pelo que o Ministério Público, embora tenha decidido levar a cabo uma investigação, que ninguém sabe em que fase se encontra, fez vista grossa e entendeu não dar seguimento a qualquer procedimento criminal.
Como se pode ver, apesar do beco ser pequeno, grandes são as traficâncias e nenhumas as consequências. O crime compensa altamente, e de que maneira! Uma mão lava a outra, para que depois as duas lavem a cara destas criaturas, que todos os dias se continuam a cruzar connosco à hora dos telejornais e dos tempos de antena.
Podes crer, meu caro CESNA, que há coisas fantásticas que eu só esperava encontrar em filmes de terror da série B, mas que na verdade, continuam a ser o pão nosso de cada dia, neste beco poluído e abandalhado, local de poiso e encontro de muitas escumalhas, bem parecidas, bem vestidas e untadas.

Ler Para Crer

L
Transcrevo o artigo de Miguel Sousa Tavares, com o título "Da Opus Dei à maçonaria: a incrível história do BCP", publicado no semanário EXPRESSO, em 29 Dezembro 2007.

Da Opus Dei à maçonaria: a incrível história do BCP

Em países onde o capitalismo, as leis da concorrência e a seriedade do negócio bancário são levados a sério, a inacreditável história do BCP já teria levado a prisões e a um escândalo público de todo o tamanho. Em Portugal, como tudo vai acabar sem responsáveis e sem responsabilidades, convém recordar os principais momentos deste "case study", para que ao menos a falta de vergonha não passe impune.

1-Até ao 25 de Abril, o negócio bancário em Portugal obedecia a regras simples: cada grande família, intimamente ligada ao regime, tinha o seu banco. Os bancos tinham um só dono ou uma só família como dono e sustentavam os demais negócios do respectivo grupo.
Com o 25 de Abril e a nacionalização sumária de toda a banca, entrámos num período “revolucionário” em que "a banca ao serviço do povo" se traduzia, aos olhos do povo, por uns camaradas mal vestidos e mal encarados que nos atendiam aos balcões como se nos estivessem a fazer um grande favor. Jardim Gonçalves veio revolucionar isso, com a criação do BCP e, mais tarde, da Nova Rede, onde as pessoas passaram a ser tratadas como clientes e recebidas por profissionais do ofício. Mas, mais: ele conseguiu criar um banco através de um MBO informal que, na prática, assentava na ideia de valorizar a competência sobre o capital.
O BCP reuniu uma série de accionistas fundadores, mas quem de facto mandava eram os administradores - que não tinham capital, mas tinham "know-how". Todos os fundadores aceitaram o contrato proposto pelo "engenheiro" - à excepção de Américo Amorim, que tratou de sair, com grandes lucros, assim que achou que os gestores não respeitavam o estatuto a que se achava com direito (e dinheiro).

2-Com essa imagem, aliás merecida, de profissionalismo e competência, o BCP foi crescendo, crescendo, até se tornar o maior banco privado português, apenas atrás do único banco público, a Caixa Geral de Depósitos. E, de cada vez que crescia, era necessário um aumento de capital. E, em cada aumento de capital, era necessário evitar que algum accionista individual ganhasse tanta dimensão que pudesse passar a interferir na gestão do banco. Para tal, o BCP começou a fazer coisas pouco recomendáveis: aos pequenos depositantes, que lhe tinham confiado as suas poupanças para gestão, o BCP tratava de lhes comprar, sem os consultar, acções do próprio banco nos aumentos de capital, deixando-os depois desamparados perante as perdas em bolsa; aos grandes depositantes e amigos dos gestores, abria-lhes créditos de milhões em "off-shores" para comprarem acções do banco, cobrindo-lhes, em caso de necessidade, os prejuízos do investimento. Desta forma exemplar, o banco financiou o seu crescimento com o pêlo do próprio cão - aliás, com o dinheiro dos depositantes - e subtraiu ao Estado uma fortuna em lucros não declarados para impostos. Ano após ano, também o próprio BCP declarava lucros astronómicos, pelos quais pagava menos de impostos do que os porteiros do banco pagavam de IRS em percentagem. E, enquanto isso, aqueles que lhe tinham confiado as suas pequenas ou médias poupanças viam-nas sistematicamente estagnadas ou até diminuídas e, de seis em seis meses, recebiam uma carta-circular do engenheiro a explicar que os mercados estavam muito mal.

3-Depois, e seguindo a velha profecia marxista, o BCP quis crescer ainda mais e engolir o BPI. Não conseguiu, mas, no processo, o engenheiro trucidou o sucessor que ele próprio havia escolhido, mostrando que a tímida "renovação" anunciada não passava de uma farsa. E descobriu-se ainda uma outra coisa extraordinária e que se diria impossível: que o BCP e o BPI tinham participações cruzadas, ao ponto de hoje o BPI deter 8% do capital do BCP e, como maior accionista individual, ter-se tornado determinante no processo de escolha da nova administração... do concorrente! Como se fosse a coisa mais natural do mundo, o presidente do BPI dá uma conferência de imprensa a explicar quem deve integrar a nova administração do banco que o quis “opar” e com o qual é suposto concorrer no mercado, todos os dias...

4-Instalada entretanto a guerra interna, entra em cena o notável comendador Berardo - o homem que mais riqueza acumula e menos produz no país - protegido de Sócrates, que lhe deu um museu do Estado para ele armazenar a sua colecção de arte privada. Mas, verdade se diga, as brasas espalhadas por Berardo tiveram o mérito de revelar segredos ocultos e inconfessáveis daquela casa. E assim ficámos a saber que o filho do engenheiro fora financiado em milhões para um negócio de vão de escada, e perdoado em milhões quando o negócio inevitavelmente foi por água abaixo. E que havia também amigos do engenheiro e da administração, gente que se prestara ao esquema das "off-shores", que igualmente viam os seus créditos malparados serem perdoados e esquecidos por acto de favor pessoal.

5-E foi quando, lá do fundo do sono dos justos onde dormia tranquilo, acorda inesperadamente o governador do Banco de Portugal e resolve dizer que já bastava: aquela gente não podia continuar a dirigir o banco, sob pena de acontecer alguma coisa de mais grave - como, por exemplo, a própria falência, a prazo.

6-Reúnem-se, então, as seguintes personalidades de eleição: o comendador Berardo, o presidente de uma empresa pública com participação no BCP e ele próprio ex-ministro de um governo PSD e da confiança pessoal de Sócrates, mais, ao que consta, alguém em representação do doutor "honoris causa" Stanley Ho - a quem tantos socialistas tanto devem e vice-versa. E, entre todos, congeminam um "take over" sobre a administração do BCP, com o "agréement" do dr. Fernando Ulrich, do BPI. E olhando para o panorama perturbante a que se tinha chegado, a juntar ao súbito despertar do dr. Vítor Constâncio, acharam todos avisado entregar o BCP ao PS. Para que não restassem dúvidas das suas boas intenções, até concordaram em que a vice-presidência fosse entregue ao sr. Armando Vara (que também usa “dr.”) - esse expoente político e bancário que o país inteiro conhece e respeita.

7-E eis como um banco, que era tão independente que fazia tremer os governos, desagua nos braços cândidos de um partido político - e logo o do Governo. E eis como um banco, que era tão cristão, tão "opus dei", tão boas famílias, acaba na esfera dessa curiosa seita do avental, a que chamam maçonaria.

8-E, revelada a trama em todo o seu esplendor, que faz o líder da oposição? Pede em troca, para o seu partido, a Caixa Geral de Depósitos, o banco público. Pede e vai receber, porque há "matérias de regime" que mesmo um governo com maioria absoluta no parlamento não se atreve a pôr em causa. Um governo inteligente, em Portugal, sabe que nunca pode abocanhar o bolo todo. Sob pena de os escândalos começarem a rolar na praça pública, não pode haver durante muito tempo um pequeno exército de desempregados da Grande Família do Bloco Central.

Se alguém me tivesse contado esta história, eu não teria acreditado. Mas vemos, ouvimos e lemos. E foi tal e qual.

segunda-feira, fevereiro 04, 2008

A Tal Remodelação

A
“Finalmente, Sócrates, em desespero de causa, tratou da saúde a Correia de Campos. Antes que ele desse cabo da sua. Não em defesa do SNS, mas em (i)legítima defesa. Para disfarçar deu um rebuçadinho às descontentes gentes da cultura. Não fez uma remodelação. Começou a remodelar-se.
Sócrates viu-se livre, apenas, de um incomodativo enfeite que ameaçava tornar a sua impopularidade insuportável, provocar uma cisão no PS e liquidar-lhe o futuro político. Não foram as boas razões que o motivaram. Foram as piores. E nunca se verá livre de toda uma ostensiva política de destruição do SNS que ele próprio apadrinhou e sustentou. Ana Jorge vai limitar-se a pôr água na fervura. Gerir os estragos.

Com o descarte do ministro, Sócrates inicia uma tentativa de expiação dos seus pecados. Vestiu o fato de treino e arrancou para a mais longa das suas maratonas. A corrida às legislativas de 2009.
…”
João Marques dos Santos in “O plano inclinado”, jornal Correio da Manhã, de 2008-Fev-2

domingo, fevereiro 03, 2008

Vinte Valores

V
O Partido Comunista Português foi o único partido político da oposição que não deu grande importância às engenhosas façanhas e tropelias do senhor Pinto de Sousa, também conhecido por José Sócrates, enquanto engenheiro-técnico e simples deputado, preferindo direccionar a sua atenção (e muito bem) sobre as responsabilidades políticas do dito cavalheiro, enquanto primeiro-ministro do governo de Portugal, e responsável pelo actual estado do país. Vinte valores por esta atitude, que até tem um sentido pedagógico.
Quer isto dizer que os políticos avaliam-se e são censuráveis, não por aquilo que foram ou são na vida pessoal ou profissional, mas pelo seu passado ou actual desempenho enquanto políticos ou governantes, o que é correcto, embora na opinião pública predomine a tendência ou tentação para transformar a vida privada em assunto de estado, amalgamando ambas, e acreditando que o que de bom ou mau se faz numa, fatalmente influenciará a outra, indo afectar a credibilidade da pessoa enquanto cidadão e político. Habitualmente, os juízos de comportamento e de carácter não coabitam pacificamente com ambiguidades, sobretudo em indivíduos que usam e abusam da exposição mediática, como forma de promoção pessoal. José Sócrates Pinto de Sousa, pelos motivos óbvios, tinha obrigação de sabê-lo e acautelar-se.

sábado, fevereiro 02, 2008

Meia Dúzia de Miudezas

M
Bastava Fazer Um Clique!

No passado dia 1 de Fevereiro, tinha acabado de acordar e fiquei logo com os olhos arregalados. Uma das estações de televisão, num dos seus telejornais dos alvores do dia, voltou a cuidar muito pouco do rigor e da verdade histórica. O jornalista, assinalando o dia 1 de Fevereiro como o aniversário do regicídio, explicou que o rei D. Carlos e o príncipe D. Luís Filipe, foram assassinados há 100 anos, na altura em que passeavam na baixa de Lisboa. Na verdade, toda a família real, que se fazia transportar em landau aberto, sofreu uma emboscada levada a cabo pelos atiradores Manuel Buiça e Alfredo Costa, após desembarcar do vapor no Terreiro do Paço, vinda do Barreiro, de regresso de uma estadia em Vila Viçosa, logo não se tratou de uma passeata para ver as montras. A única coisa certa é que as vítimas mortais foram o rei e o príncipe herdeiro, facto que deixou ferida de morte a monarquia e abreviou a proclamação da república. Para serem rigorosos, não era preciso ir muito longe; numa emergência, bastava fazer um clique e consultar a Wikipédia!

Viva A República!

À última hora a Assembleia da República pôs os pontos nos “iis” e rejeitou as absurdas tentativas de a solidarizarem com as comemorações monárquicas do regicídio. Algumas instituições militares, símbolos da república, e convidadas para abrilhantarem a efeméride, também escolheram o mesmo caminho, como lhes competia, isto é, declinarem o convite e não comparecerem no Terreiro do Paço, também conhecida por Praça do Comércio. A República lá vai salvando a face, tentando esconder, com mais ou menos pudor, com mais ou menos boas maneiras, a tendência que há para que a levem a prostituir-se. Se não tivesse havido uma genuína reacção e indignação cívica, não sei se não teríamos visto um Presidente da República a assumir o papel de “compére”, e as bandas militares a comportarem-se com qualquer grupo coral de Rebimbalha das Couves, que presta honoráveis e prestimosos serviços, sem ver a quem, e sem fazer perguntas.
Se houvesse que prestar uma justa homenagem, seria aos patriotas Manuel dos Reis Buiça e Alfredo Luís da Costa, que em boa hora abriram, com coragem, martírio, sangue e lágrimas, os caminhos para a implantação da República.

Trafulhices e Mamarrachos

Há pessoas que são como imãs. Andem por onde andarem, façam o que fizerem, parece que atraem sempre problemas complicados e situações pouco claras. Depois da polémica à volta da sua licenciatura em engenharia, o senhor Pinto de Sousa, também conhecido por José Sócrates, vê agora ser dissecada a sua actividade profissional, quando ainda andava pela “cova da Beira”, na década de 80 do século passado. Embora no seu curriculum não haja qualquer referência a tal actividade, dizem os jornalistas do PÚBLICO que teria andado a pôr assinaturas em projectos de arquitectura e engenharia, em conluio com técnicos camarários que não tinham mãos a medir para as encomendas, mas sim razões de ordem legal que os impediam de autenticarem os projectos, recorrendo assim aos préstimos e “assinaturas de favor” daquele jovem e resoluto engenheiro-técnico. Assim, mamarracho aqui, mamarracho ali, José Sócrates Pinto de Sousa e a sua assinatura lá foram vingando e fazendo pela vida, apesar de alguns pareceres muito críticos de técnicos e especialistas, e de ser colocada em causa a lei e a ética profissional dos engenheiros técnicos.
- Assumo a responsabilidade de tudo o que assinei, disse ele, convicto que com aquelas pequenas traficâncias e trafulhices de outrora, já não virá grande mal para ele em particular, nem para o mundo em geral. Talvez sim, talvez não! Ao ouvi-lo falar a refutar os factos apontados pelas investigações dos jornalistas, acrescida da muralha defensiva que Vital Moreira lhe tece, só falta implantar-lhe umas asinhas para que suba ao céu e vá ocupar um lugar no panteão dos perseguidos pela quadrilha maquiavélica dos jornalistas de investigação. Para compor o ramalhete e a carnavalada, o mesmo jornal PÚBLICO, veio à última da hora acrescentar mais alguns dados, com o seguinte desenvolvimento que se transcreve: “O ex-deputado José Sócrates recebeu indevidamente um subsídio de exclusividade da Assembleia da República, entre finais de 1988 e princípios de 1992, por acumular as suas funções parlamentares com a actividade profissional de engenheiro técnico, enquanto projectista e como responsável pelo alvará de uma empresa de construção civil. Sócrates nega que tal tenha acontecido, mas diversos documentos por ele assinados confirmam a violação do regime legal de dedicação exclusiva.”
Facto indesmentível é que Sócrates errou na profissão! Pelos motivos óbvios, em vez de engenharia ou de política devia ter optado pela carreira de ilusionista. O Luís de Matos, de sobrolho carregado, ainda não se queixou nem aceitou o repto, mas lá chegaremos!

Inflações

Todos anos, aquando da negociação dos novos salários para a função pública, a taxa de inflação, depois de “aturados” estudos e projecções, é exibida com um valor, para algum tempo depois, quando tal já é inócuo, ser divulgada então a verdadeira taxa, habitualmente com um valor superior à inicialmente “prevista”. Assim se enganam sindicatos, os trabalhadores e quejandos, para degradar ainda mais o poder de compra do povo, e para que nunca falte a justificação razoável para serem reajustadas e reabastecidas as reformas, honorários e mordomias dos “gestores públicos”, indómitos timoneiros da nossa economia, e da ansiada prosperidade que cresce, dia a dia, a olhos vistos.

Pensamento Profundo!

As remodelações ministeriais, causadas por contestação social às políticas em curso, não aquecem nem arrefecem, se não forem acompanhadas de uma competente e eficaz alteração dessas mesmas políticas.

Do Manual de Sobrevivência

Quando estiveres metido em sarilhos, não digas nada e tenta passar despercebido.

Definição

De quando em vez convém recordar que a ditadura é o regime político autoritário em que os poderes legislativo, executivo e judiciário estão nas mãos de uma única pessoa ou grupo de pessoas, os quais exercem a soberania sobre o povo e outras coisas mais, de forma absoluta e inquestionável.

Tormentos, Tratamentos ou Ensinamentos?

Um procurador de justiça dos E.U.A., provavelmente porque nunca o experimentou, veio dizer para a comunicação social, que tinha dúvidas que o “afogamento simulado” fosse considerado uma forma de tortura. Não admira! Já ouvi alguém dizer que no tempo da PIDE/DGS, a tortura com “choques eléctricos” não passava de uma diversão inofensiva, equiparada a uma sessão de cócegas, e que a “estátua” ou “tortura do sono” só era aplicada, não como suplício mas como tratamento, a quem sofresse de insónias. Claro está que quanto ao tal “afogamento simulado” poderá muito bem tratar-se de uma forma radical de ensinar alguém a nadar.
Com coisas sérias não se brinca, mas temos que reconhecer que alguns americanos (e não só) são exímios praticantes do humor negro, o qual, como é óbvio, não tem nada a ver com raças humanas.