terça-feira, outubro 11, 2011

Registo para Memória Futura (52)


"Alguma coisa está a acontecer. O que é, não é exactamente claro, mas podemos, finalmente, estar a ver o surgimento de um movimento popular que, ao contrário do Tea Party (*), está irritado com as pessoas certas."

Comentário do economista norte-americano Paul Krugman, galardoado com o Prémio Nobel da Economia de 2008, sobre o movimento Occupy Wall Street, o qual, tendo-se iniciado no centro financeiro de Nova Iorque, rapidamente se estendeu a outras cidades dos E.U.A., tais como Boston, Chicago, Los Angeles, Portland, São Francisco, entre outras, manifestando-se contra a ausência de repercussões legais sobre os responsáveis e beneficiários da crise financeira nos Estados Unidos, Europa e outras partes do mundo, e exigindo medidas contra as desigualdades sociais, a voracidade empresarial e o sistema capitalista como um todo.
 
(*) Tea Party – Movimento social e político norte-americano, populista, conservador, de ultradireita, constituído em 2009 após a eleição do presidente Barack Obama. Embora seja uma miscelânea de variados grupos ultra-radicais, as suas opiniões coincidem, em linhas gerais, com as do Partido Republicano. Defende uma política fiscal conservadora e tem por objectivo contestar as principais medidas de cariz social da administração Obama, nomeadamente os pacotes de estímulo para o relançamento da economia e, fundamentalmente, o projecto de reforma do sistema de Saúde. Consideram que os Estados Unidos estão à beira de resvalar para uma experiência socialista, e sob essa pretensa ameaça, trabalham afincadamente para evitar a reeleição de Barack Obama.

segunda-feira, outubro 10, 2011

Chamar os Bois pelos Nomes

«(...) As coisas estão neste estado porque se fizeram (e continuam a fazer) escolhas políticas criminosas. Porque os governos são estúpidos? Não. Porque são politicamente corruptos. Quando vemos António Borges a dirigir o Departamento Europeu do FMI e Mario Draghi à frente do Banco Central Europeu e sabemos que os dois foram vice-presidentes da Goldman Sachs - que foi quem ganhou com a crise do "subprime" e que ajudou a Grécia a mascarar a verdadeira dimensão do seu défice -, percebemos de quem estamos reféns. De gente com um currículo que deveria ser considerado cadastro.»

Excerto do artigo de opinião de Daniel Oliveira, intitulado "Capitalismo de Candonga", e publicado no semanário EXPRESSO de 8 de Outubro de 2011. O título do post é de minha autoria.

domingo, outubro 09, 2011

O Protectorado sob Ocupação


«(...) O Diário Económico avançou na sua edição "online" de hoje que Pedro Passos Coelho escreveu uma carta a Durão Barroso a pedir o envio de uma equipa de técnicos da Comissão Europeia para acompanhar em permanência, no Ministério das Finanças, as reformas impostas pelo memorando com a "troika" (Comissão, Banco Central Europeu e Fundo Monetário Internacional), tendo fonte comunitária confirmado à Lusa que o presidente do executivo comunitário deu o seu parecer favorável.

De acordo com o Diário Económico, a equipa de cinco técnicos, liderada por Herve Carré, antigo diretor do gabinete oficial de estatísticas da UE (Eurostat), irá ajudar as autoridades portuguesas a "agilizar a aplicação das reformas estruturais que estão a ser impostas pelo BCE, Comissão e FMI, ajudando a potenciar a aplicação dos cerca de 15 mil milhões de euros de fundos estruturais, de que Portugal beneficiará nos próximos anos, nas várias alterações legislativas que saltarão para o terreno com o Orçamento do Estado do próximo ano".»

Excerto da notícia do DIÁRIO DE NOTÍCIAS de 8 de Outubro de 2011

Meu comentário: Passos Coelho vai lavando as mãos, ao mesmo tempo que deixa no ar a ideia de que não lhe compete governar, na verdadeira acepção da palavra, mas sim fazer cumprir os compromissos assumidos com a "troika", acrescidos de mais umas coisitas de sua iniciativa, para não haver razões de queixa e deixar boa impressão. Assim, os censores e questores da EU, virão até ao protectorado para supervisionarem o cozinhado do Orçamento de Estado para 2012, e alinhavarem as condições para um segundo empréstimo, com o seu cortejo de mais austeridade e empobrecimento generalizado, o tal que os optimistas do costume, em planeada manobra de contra-informação, continuam a garantir que não será necessário.

quinta-feira, outubro 06, 2011

Uma História de Maçãs


A primeira maçã desprendeu-se de uma macieira, e por ter batido na cabeça de Isaac Newton, levou a que este tivesse a ideia de formular as leis da gravitação universal. Com isso prendeu-nos à Terra.

A segunda maçã veio pela mão de Steve Jobs, tornou-se o logotipo de todos os produtos da Apple Macintosh por ele criada, ajudando com isso a dar asas à nossa criatividade e imaginação.

Steven Paul Jobs nasceu em São Francisco, Califórnia, em 24 de Fevereiro de 1955 e faleceu em Palo Alto, Califórnia, em 5 de Outubro de 2011, vítima de cancro. Foi inventor e empresário do sector informático, sendo grande inovador nesta área. Em 2005, frente a uma plateia de estudantes da Universidade de Stanford, nos EUA, disse que  “a morte é muito provavelmente a melhor invenção da vida, e lembrar-me de que todos estaremos mortos em breve é a ferramenta mais importante que encontrei para me ajudar a fazer as grandes escolhas na vida”.

Sua Truculência


APESAR de fazer figura disso, deve evitar-se chamar “palhaço” a Sua Truculência, o régulo Alberto João Jardim, pois isso é estar a ofender, gravemente, os verdadeiros profissionais da nobre arte de fazer rir. Já quanto ao dedo em riste que ele costuma sacudir furiosamente, no auge dos seus discursos, deixo à imaginação de cada um, o que ele poderá fazer com ele.

quarta-feira, outubro 05, 2011

O Exemplo que vem da Islândia


O Landsdomur, tribunal especial de Reykjavik, vai julgar o ex-primeiro-ministro islandês, Geeir Haarde, pela sua implicação e responsabilidade no colapso do sistema financeiro do país, em 2008, quando chefiava o governo. Há situações que não se suplantam nem satisfazem com a mera invocação da responsabilidade política, e este é um bom exemplo, que não requer mais comentários. Apenas que frutifique.

sábado, outubro 01, 2011

A Paródia da Justiça

«As quase 23 horas que Isaltino Morais passou na cadeia - entre as 20h de quinta-feira e as 18h52 de ontem [sexta-feira] - abriram mais uma brecha na credibilidade da Justiça portuguesa. Com base numa decisão do Tribunal Constitucional (TC), que rejeitou um recurso da defesa de Isaltino, um procurador do Ministério Público (MP) promoveu a prisão do presidente da Câmara de Oeiras e uma juíza ordenou a sua execução. Sem que nenhum dos dois soubesse que havia outro recurso no TC, com efeitos suspensivos sobre a condenação - cujo prazo para entrega de alegações só termina na próxima quinta-feira. Quando souberam, por inciativa dos advogados e por diligências próprias, nenhum se opôs à libertação. (...)»

Excerto da notícia do semanário EXPRESSO de 1 de Outubro de 2011

Meu comentário: Ainda hei-de ouvir dizer que o culpado da falta de informação e do desnorte da Justiça, neste e noutros casos, seja imputado a algum problema informático, talvez ao incipiente Citius, pois os computadores sempre tiveram as costas largas, e os informáticos sabem bem do que se fala. Isaltino tem advogados competentes, que conhecem o terreno que pisam, e não rejeitam tirar partido destes desleixos da justiça portuguesa, ao traduzirem-nos em pedidos de indemnização ao Estado,  que se reflectirão, fatalmente, no bolso dos contribuintes, os quais serão convocados para colmatar a ofensa. Isto já não falando na aposta, desenhada ao pormenor, pelos ditos, competentíssimos e certeiros causidíacos, da prescrição dos crimes de que Isaltino é acusado. Conclusão: A Justiça portuguesa é uma paródia, continuando a contribuir substancialmente para o anedotário nacional, e Isaltino, e outros quejandos, riem-se perdidamente.

sexta-feira, setembro 30, 2011

Marco Catão vs Isaltino Morais


«Isaltino Morais, presidente da Câmara Municipal de Oeiras, foi detido, por volta das 20 horas de quinta-feira, pelo Grupo de Investigação Criminal da PSP de Oeiras, no "cumprimento de um mandado de detenção". O autarca foi levado para a zona prisional anexa à Polícia Judiciária (PJ), na Rua Gomes Freire, em Lisboa, onde deverá cumprir os dois anos de cadeia a que foi condenado pelo Supremo Tribunal de Justiça, por fraude fiscal, abuso de poder, corrupção passiva para acto ilícito e branqueamento de capitais. (...)»

Excerto da notícia do DIÁRIO DE NOTÍCIAS on-line de 30 de Setembro de 2011

Meu comentário: Isaltino Morais não seguiu os conselhos de Marco Pórcio Catão, magistrado, político e militar romano que viveu entre 234 e 149 A.C., quando dizia que não censurava os que tiravam partido dos saques dos inimigos derrotados, mas que, no seu caso, preferia rivalizar em virtude com os mais virtuosos a competir em riqueza com os ricos ou em cobiça com os rapaces.

quinta-feira, setembro 29, 2011

Memórias de uma Aula no Liceu de Setúbal

Barreiro, 4 de Outubro de 1967 (Quarta-feira)

SEGUNDO dia de aulas. Continua o desassossego, com o pessoal a trocar beijos, abraços e confidências, depois desta longa separação que foram 3 meses e meio de férias. Estávamos todos fartos do verão, com saudades uns dos outros. A sala é a mesma do ano passado, no 1º andar e cheirava a nova, tudo encerado e polido, apesar do material já ser mais do que velho. Somos o 7.º A e como não chumbou nem veio ninguém de novo, a pauta é exactamente igual à do ano passado. Eu sou o n.º 34, e fico sentada na segunda fila, do lado da janela, cá atrás, que é o lugar dos mais altos. Hoje tivemos, pela primeira vez, Organização Política e apareceu-nos um professor novo, acho que é a primeira vez que dá aulas em Setúbal, dizem que veio corrido de um liceu de Coimbra, por causa da política.
Já ontem se falava à boca cheia dele, havia malta muito excitada e contente porque dizem que ele é um fadista afamado. Tenho realmente uma vaga ideia de ouvir o meu tio Diamantino falar dele, mas já não sei se foi por causa da cantoria se por causa da política. A Inês contou que ouviu o pai comentar, em casa, que o homem é todo revolucionário, arranja sarilhos por todo o lado onde passa. Ela diz que ele já esteve preso por causa da política, é capaz de ser comunista. Diferente dos outros professores, é de certeza. Quando entrou na sala, já tinha dado o segundo toque, estava quase no limite da falta. Entrou por ali a dentro, todo despenteado, com uma gabardine na mão e enquanto a atirava para cima da secretária, perguntou-nos:

- Vocês são o 7.º A, não são? Desculpem o atraso mas enganei-me e fui parar a outra sala. Não faz mal. Se vocês chegarem atrasados também não vos vou chatear.

Tinha um ar simpático, ligeiro, um visual que não se enquadrava nada com a imagem de todos os outros professores. Deu para perceber que as primeiras palavras, aliadas à postura solta e descontraída, começavam a cativar toda a gente. A Carolina virou-se para trás e disse-me que já o tinha visto na televisão, a cantar Fado de Coimbra. Realmente o rosto não me era estranho. É alto, feições correctas, embora os dentes não sejam um modelo de perfeição e é bem parecido, digamos que um homem interessante para se olhar. O Artur soprou-me que ele deve ter uns 36 anos e acho que sim, nota-se que já é velho. Depois das primeiras palavras, sentou-se na secretária, abriu o livro de ponto, rabiscou o que tinha a escrever e ficou uns cinco minutos, em silêncio, a olhar o pátio vazio, através das janelas da sala, impecavelmente limpas.

Enquanto ele estava nesta espécie de marasmo nós começámos a bichanar uns com os outros, cada um emitindo a sua opinião, fazendo conjecturas. Às tantas, o bichanar foi subindo de tom e já era uma algazarra tão grande que parece tê-lo acordado. Outro qualquer professor já nos teria pregado um raspanete, coberto de ameaças, mas ele não disse nada, como se não tivesse ouvido ou, melhor, não se importasse. Aliás, aposto que nem nos ouviu. O ar dele, enquanto esteve ausente, era tão distante que mais parecia ter-se, efectivamente, evadido da sala. Quando recomeçou a falar connosco, em pé, em cima do estrado, já tinha ganho o primeiro round de simpatia. Depois, veio o mais surpreendente:

- Bem, eu sou o vosso novo professor de Organização Política, mas devo dizer-vos que não percebo nada disto. Vocês já deram isto o ano passado, não foi? Então sabem, de certeza, mais que eu.

Gargalhada geral.

- Podem rir porque é verdade. Eu não percebo nada disto, as minhas disciplinas, aquelas em que me formei, são História e Filosofia, não tenho culpa que me tivessem posto aqui, tipo castigo, para dar uma matéria que não conheço, nem me interessa. Podia estudar para vir aqui desbobinar, tipo papagaio, mas não estou para isso. Não entro em palhaçadas.

Voltámos a rir, numa sonora gargalhada, tipo coro afinado, mas ele ficou impávido e sereno. Continuava a mostrar um semblante discreto, calmo, simpático.

- Pois é, não vou sobrecarregar a minha massa cinzenta com coisas absolutamente inúteis e falsas. Tudo isto é uma fantochada sem interesse. Não vou perder um minuto do meu estudo com esta porcaria.

Começámos a olhar uns para outros, espantados; nunca na vida nos tinha passado pela frente um professor com tamanha ousadia.

- Eu estudaria, isso sim, uma Organização Política que funcionasse, como noutros países acontece, não é esta fantochada que não passa de pura teoria. Na prática não existe, é uma Constituição carregada de falsidade. Portugal vive numa democracia de fachada, este regime que nos governa é uma ditadura desumana e cruel.

Não se ouvia uma mosca na sala. Os rostos tinham deixado cair o sorriso e estavam agora absolutamente atónitos, vidrados no rosto e nas palavras daquele homem ímpar. O que ele nos estava a dizer é o que ouvimos comentar, todos os dias, aos nossos pais, mas sempre com as devidas recomendações para não o repetirmos na rua porque nunca se sabe quem ouve. A Pide persegue toda a gente como uma nuvem de fumo branco, que se sente mas não se apalpa.

- Repito: eu não percebo nada desta disciplina que vos venho leccionar, nem quero perceber. Estou-me nas tintas para esta porcaria. Mas, atenção, vocês é outra coisa. Vocês vão ter que estudar porque, no final do ano, vão ter que fazer exame para concluírem o vosso 7.º ano e poderem entrar na Faculdade. Isso, vocês têm que fazer. Estudar. Para serem homens e mulheres cultos para poderem combater, cada um onde estiver, esta ditadura infame que está a destruir a vossa pátria e a dos vossos filhos. Vocês são o amanhã e são vocês que têm que lutar por um novo país.

- Não vão precisar de mim para estudar esta materiazinha de chacha, basta estudarem umas horas e empinam isto num instante. Isto não vale nada. Eu venho dar aulas, preciso de vir, preciso de ganhar a vida, mas as minhas aulas vão ser aulas de cultura e política geral. Vão ficar a saber que há países onde existem regimes diferentes deste, que nos oprime, países onde há liberdade de pensamento e de expressão, educação para todos, cuidados de saúde que não são apenas para os privilegiados, enfim, outras coisas que a seu tempo vos ensinarei. Percebem? Nós temos que aprender a não ser autómatos, a pensar pela nossa cabeça. O Salazar quer fazer de vocês, a juventude deste país, carneiros, mas eu não vou deixar que os meus alunos o sejam. Vou abrir-lhes a porta do conhecimento, da cultura e da verdade. Vou ensinar-lhes que, além fronteiras, há outros mundos e outras hipóteses de vida, que não se configuram a esta ditadura de miséria social e cultural.

- Outra coisa: vou ter que vos dar um ponto por período porque vocês têm que ter notas para ir a exame. O ponto que farei será com perguntas do vosso livro que terão que ter a paciência de estudar. A matéria é uma falsidade do princípio ao fim, mas não há volta a dar, para atingirem os vossos mais altos objectivos. Têm que estudar. Se quiserem copiar é com vocês, não vou andar, feita toupeira, a fiscalizá-los, se quiserem trazer o livro e copiar, é uma decisão vossa, no entanto acho que devem começar a endireitar este país no sentido da honestidade, sim porque o nosso país é um país de bufos, de corruptos e de vigaristas. Não falo de vocês, jovens, falo dos homens da minha idade e mais velhos, em qualquer quadrante da sociedade. Nós temos sempre que mostrar o que somos, temos que ser dignos connosco para sermos dignos com os outros. Por isso, acho que não devem copiar. Há que criar princípios de honestidade e isso começa em vocês, os futuros homens e mulheres de Portugal. Não concordam? Bem, por hoje é tudo, podem sair. Vemo-nos na próxima aula.

Espantoso. Quando ele terminou estava tudo lívido, sem palavras. Que fenómeno é este que aterrou em Setúbal? Já me esquecia de escrever. Esta ave rara, o nosso professor de Organização Política, chama-se Zeca Afonso.

NOTA – Texto não assinado, recebido por e-mail.

O Jardim é como uma Madeira sem Flores


EMBORA continue a pavonear-se, de inauguração em inauguração, com o taxímetro da dívida sempre em contagem crescente, o régulo Alberto João Jardim, já não diz coisa com coisa. Num dia diz que não há nenhum buraco nas contas, para no dia seguinte dizer que escondeu esse buraco em legítima defesa. Num dia diz que o buraco é qualquer de coisa como 5 mil milhões euros, para logo a seguir dizer que é uma coisita pequena, uma coisita de nada. Num dia pede que o Estado português dê a independência à Madeira, para no dia seguinte dizer que é contra a independência da Madeira e que as suas palavras foram um desabafo contra os interesses financeiros e económicos do cont'nente. Logo a seguir veio agradecer a decisão da Procuradoria-Geral da República de abrir um inquérito-crime ao caso de ocultação da dívida pública da região, nada temendo e que até é um favor que lhe fazem. E todas estas contradições desenrolaram-se no curto espaço de uma semana, entre entrevistas, comícios, sandochas e copos de três.
E no meio desta bandalheira, lá vem o régulo multi-usos, todo lampeiro, depois de ter despachado mais uma inauguração, desta vez as patéticas obras de alargamento de uma rua, sempre rodeado pela moldura de tropa indígena, ataviada de fatinhos domingueiros e com perucas cheias de laca, cuja função é debitarem risos aparvalhados de aprovação pelas graçolas badalhocas do homenzinho que tanto faz de rei como de bobo, que logo remata que é preciso dar pancada em quem ofende o povo madeirense, comprometendo-se a continuar a lutar contra o Estado central até a região conseguir os seus direitos. Por cá, o governo garante que na próxima sexta-feira irão ser divulgados todos os pormenores do cambalacho madeirense, muito embora fique para mais tarde a decisão, assaz importante, de quem vai assumir os custos daquela jardinada, que por omissão só beneficia o infractor nas eleições legislativas regionais.
É por estas e por outras que acho que o presidente do Governo Regional da Madeira se está a tornar uma aberração botânica, uma espécie de Jardim sem flores. E a Madeira que se cuide, pois corre o risco de ficar sem norte, sem siso, sem dinheiro e com um tresloucado à solta…

quarta-feira, setembro 28, 2011

Ponto da Situação

TODOS os dias há novidades. Estão a vir às pinguinhas, com pézinhos de lã, para não assustarem e não doerem muito. Grão a grão vamo-nos habituando, ficando insensíveis, vendo desfilar os buracões no orçamento e aceitando os apertos sem tugir nem mugir, até chegarmos ao patamar da Grécia.

O Governo quer isentar as empresas do dever de informarem a Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) sobre as alterações aos horários laborais. Assim sendo, as crianças vão deixar de ver o pais, os divórcios vão disparar, em contraste com a indústria de sacos-cama que vai ganhar um grande impulso.

O ministro da Economia, Álvaro Santos Pereira, afirmou que o aumento das tarifas de electricidade vai ser muito menor do que os 30 e os 55 por cento que têm andado a ser anunciados, respectivamente para os consumidores particulares e as empresas. Seja muito ou pouco, o aumento prepara-se para levar à falência mais uns milhares de empresas, e por arrastamento, muitos mais portugueses e respectivas famílias.

Carlos Moedas, secretário de estado adjunto do Primeiro-ministro, admite que para 2012 a recessão irá ser mais profunda que o previsto.

Victor Gaspar, Ministro das Finanças, conclui que o pior ainda está para vir.

Embora Hillary Clinton tenha vaticinado que Portugal está no caminho certo para a resolução da dívida soberana, e o Presidente norte-americano Barack Obama tenha atribuído o fracasso do Euro à ausência de regulação do sector financeiro, por cá ainda não se conseguiu apurar quem é o responsável pelo que está a acontecer, havendo quem prefira simplificar, continuando a deitar as culpas para os sindicatos e os trabalhadores portugueses, que continuam a ser o principal obstáculo à competitividade das empresas, preferindo receber subsídios em vez de trabalharem, a serem gastadores e a terem um nível de vida superior às suas possibilidades.

segunda-feira, setembro 26, 2011

O Confessionário


OS PROJECTOS apresentados pela maioria PSD/CDS, pelo PCP e pelo BE para criminalizar o enriquecimento ilícito dos titulares de altos cargos públicos, foram todos aprovados na generalidade, na sessão da passada sexta-feira na Assembleia da República. Quanto ao projecto do PS, foi rejeitado por esses mesmos partidos (com excepção do PEV que se absteve), pois consideraram que apenas criminalizava as falsas declarações ou a inexistência de declarações sobre rendimentos. Entretanto, António José Seguro veio lamentar-se para o Facebook - que parece ter-se tornado o confessionário, por excelência, de alguns políticos cá do burgo - a propósito da insensibilidade dos outros partidos, em relação à proposta do PS, que teria tanto de bem-intencionada como de inócua.

Já João Marcelino, director do DIÁRIO DE NOTÍCIAS, em editorial, veio acrescentar mais algumas achegas à questão, isto é, que "o PS, quinze dias depois do Congresso de Braga, onde o combate à corrupção andou de boca em boca, (...) continua a ser o partido que não quer que os portugueses titulares de cargos públicos tenham de eventualmente explicar de onde lhes vieram as casas, os carros topo de gama e as contas bancárias incompatíveis com os ordenados praticados pelo Estado. Porquê?"

A resposta talvez não seja difícil de encontrar, se atendermos aos incontáveis casos de súbito, veloz e avantajado enriquecimento, que por cá têm proliferado, difíceis de explicar apenas através dos vencimentos auferidos com o desempenho de cargos públicos, e de umas episódicas quanto inofensivas ofertas de caixas de robalos. Há também quem diga que a lei, a ser aplicada com rigor, faria triplicar a população dos estabelecimentos prisionais do país, com o consequente agravamento do défice. Outros ainda, mais radicais, são peremptórios: se me oferecessem o lugar e a oportunidade, eu cá aproveitava-me também…

domingo, setembro 25, 2011

Auto do Jardim das Delícias

O JULGAMENTO do processo-crime contra os quatro ex-administradores do Banco Comercial Português (BCP), incluindo Jardim Gonçalves e Filipe Pinhal, foi adiado 'sine die' devido à sobreposição de datas com o processo movido pela CMVM, que também abrange estes arguidos, os quais têm direito a estar presentes em ambos os julgamentos. Embora estes senhores sejam conhecidos por possuírem muitos e valiosos talentos, não se lhes conhece o dom da ubiquidade. Quanto à Justiça portuguesa, continua a ser fértil em atrasos, erros e incidentes processuais, que quando bem explorados pelos senhores advogados, transformam os processos em comédias para todos os gostos. Esta acusação do Ministério Público data de Junho de 2009, e mais de dois (2) anos depois ainda estamos neste impasse. Gil Vicente se por cá aparecesse, teria assunto de sobra para mais um dos seus admiráveis autos; talvez um Auto do Jardim das Delícias…

quinta-feira, setembro 22, 2011

Prémio Nobel da Paz

O PRESIDENTE norte-americano, Barack Obama, confirmou ao líder da Autoridade Palestiniana, Mahmoud Abbas, que vai vetar a tentativa de os palestinianos serem reconhecidos como Estado pela Organização das Nações Unidas.

Assim, o primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, sensibilizado com tanto apoio, fez um sonoro elogio a Obama, declarando-o merecedor de uma “medalha de honra”. Face a esta postura do presidente dos E.U.A. (que foi, espantem-se, Prémio Nobel da Paz em 2009), em relação à pretensão dos palestinianos, os israelitas vão respirar de alívio, aprofundar a ocupação da Cisjordânia e ao mesmo tempo continuar a matar neles. Entre a defesa de uma causa justa, e a satisfação dos interesses judaicos, que podem condicionar a sua futura recondução na presidência, Obama escolheu a opção que mais contradiz o que dele se esperava: ser um símbolo de mudança e um construtor de PAZ.

terça-feira, setembro 20, 2011

Segredos de Estado


CAVACO Silva e Passos Coelho reuniram e fecharam-se em copas, tratando o assunto das "acções directas" e dos encobrimentos do Alberto João, como se não passassem de palhaçadas e traquinices de um fulano mal comportado, a quem tudo se desculpa e que convém manter sob reserva, como se a coisa merecesse o tratamento equivalente a um segredo de estado. Cavaco e Coelho acabaram por optar por um silêncio comprometedor, como se nada se passasse, dando corpo à ideia de que quem cala, consente. Onde é que eu já vi isto? Ah, já sei! Foi na sequência do envolvimento com o caso BPN, quando Cavaco Silva teve igual relutância em sanear Dias Loureiro do Conselho de Estado.

Entretanto, o Tribunal de Contas detectou que há mais 220 milhões de euros descobertos nas contas públicas da Madeira, elevando o buraco financeiro para valores próximos dos mil e novecentos milhões de euros, enfim, coisa pouca, apenas mais uns trocos para arredondar o buraco. Em resumo: tudo isto fede...

segunda-feira, setembro 19, 2011

Brincar às Laranjadas

O SOBA Alberto João, vinte e quatro horas depois de ter negado a existência de uma dívida oculta nas contas do Governo Regional da Madeira, deu o dito por não dito, reconhecendo que afinal sempre a dissimulou, diz ele que numa manobra de "legítima defesa", contra a nova Lei das Finanças Regionais que não tolera gastos à "tripa forra", e o governo do Sócrates, que não era sério, talvez porque mentia tanto ou mais do que ele.
É fácil de ver que este cavalheiro, empoleirado em mais de trinta anos de poder ininterrupto, e sempre bem guardado e protegido, já experimentou de tudo. Faltava-lhe apenas dar o golpe de mestre e brincar às escondidas com a legalidade. Estou com grande curiosidade para ver quais vão ser os resultados práticos da laranjada doméstica que vai ter lugar, para debater o assunto, entre os correligionários Cavaco Silva e Passos Coelho em pessoa, e com a figura tutelar do atrevido e insolente Alberto João Jardim a pairar entre eles.

sábado, setembro 17, 2011

Eclipses Orçamentais

É MUITO difícil que o encobrimento orçamental de 1,6 mil milhões de euros da Região Autónoma da Madeira, tenha passado despercebido, sem ninguém ter dado por ele. Na minha terra, contas são contas, e não se pode gastar o que não há, assim como não é possível esconder os gastos do que se tinha e deixou de ter. Por isso, apreciei sobremaneira, o encolher de ombros e a expressão de papalvo desentendido de Victor Constâncio, o ex-governador de um Banco de Portugal que fez tanta regulação bancária, ao ponto de deixar o BPN andar à deriva por aí, servindo de fachada para uma gigantesca roubalheira, e que agora se foi acoitar no BCE como vice-presidente de Jean-Claude Trichet. Já o "economista" Cavaco Silva, ex-apoiante e subscritor da saga BPN, defensor intransigente do são tomense emigrante de luxo Dias Loureiro, e agora Presidente da República, diz que o assunto é grave, exibe os seus habituais esgares de consternação artificial, mas fica-se por aí, à espera que os próximos eclipses astronómicos, sejam eles do Sol ou da Lua, sirvam para esconder mais qualquer coisita. A verdade é que talvez seja oportuno relembrar que a Grécia está como está, porque houve grandes encobrimentos orçamentais, que foram dando como saudável, ao longo dos anos, um país à beira do colapso, ao ponto de estar como hoje se encontra.

O descalabro madeirense, velho de tanto tempo quantos os anos de caciquismo jardinista, e respectivas cumplicidades, não pode ser varrido para debaixo de tapete, ou disso lavar-se as mãos, como cínicamente o faz Pedro Passos Coelho, ao dizer que aquele é um problema das escolhas políticas da Madeira e do PSD-Madeira, e que ambos vão ter que o resolver, o que não é verdade, pois quem vai ser chamado para isso, voltando a revirar os bolsos do avesso, são os "cubanos" do costume. 0 problema é que a Madeira não se pode "extinguir", como se fosse uma qualquer direcção-geral ou organismo público, mas o mesmo já não digo do seu intragável, cabotino e impenitente presidente do governo regional, e de todos aqueles que lhe têm dado apoio e cobertura.

quarta-feira, setembro 14, 2011

Preocupações

MARIA de Belém Roseira, a novel presidente do PS (mas ainda sua líder parlamentar interina), diz que o partido está "preocupadíssimo" com a actualização do memorando de entendimento assinado com a 'troika', ao mesmo tempo que lamenta a falta de "cortesia" do Governo, ao não dar a "mínima das informações" sobre tal matéria, fazendo por ignorar que o PS também está envolvido nos compromissos assumidos. 

Maria de Belém já devia saber que os fretes que se fazem não exigem reciprocidade, e não vale a pena estar a mostrar-se ofendida com a tal desconsideração, ensaiando uma espécie de choro sobre o leite derramado. Nas votações ocorridas na Assembleia da República, na passada semana, e excluindo todos os discursos recheados de intenções, para o observador atento, continua a não haver dúvidas, de que lado do espectro político o "novo" PS se continua a posicionar, reforçando uma folgada maioria de direita.

domingo, setembro 11, 2011

Qual 11 de Setembro?

DE HÁ uma semana a esta parte, temos vindo a ser bombardeados (passe a expressão!) pelos habituais comentadores residentes - não por falta de outros temas, mas porque este “vende” sempre bem - que voltam a perorar sobre o 11 de Setembro de 2001 (não confundir com o chileno 11 de Setembro de 1973), aquela data fatídica que o indigesto filho dos Bush resolveu instituir como o "dia em que o mundo mudou" (como se o mundo não mudasse todos os dias...), e que depois foi ficando como emblema para introduzir a planetária "guerra ao terrorismo", outra coisa que é tão velha, como a mais velha profissão do mundo. Há outras datas bem mais marcantes e mensageiras de mudança que o tal 11 de Setembro de 2001, como a implosão da União Soviética, essa sim, data que imprimiu uma mudança de rumo à Humanidade, e por sinal, sem derramamento de sangue, embora com não poucos efeitos perversos. Citando outras maldades, são afloradas, de vez em quando, e de raspão, as carnificinas da Primeira Guerra Mundial, do Holocausto, dos sucessivos genocídios que têm brotado por esse mundo fora, mas nada que se compare à veemência com que é tratado o 11 de Setembro. E já que se fala de carnificinas, porque não recuarmos até às fogueiras da Santa Inquisição, outra barbaridade praticada em nome de Deus, e com a chancela da Santa Madre Igreja?

Assim, todos os anos, o 11 de Setembro é evocado, porém, este ano com mais acutilância, passada que correu uma década, como se fosse uma peregrinação obrigatória, à semelhança de quem vai até à Cova da Iria. E na nossa praceta, até há uma senhora escrevinhadora que arranca uma conclusão de antologia, quando garante que aquilo não foi apenas um massacre de pessoas, mas sim o primeiro que visou uma civilização, e ao falar de civilização, penso eu que estaria a referir-se à civilização dos MacDonalds, da Coca Cola, de Wall Street, da CIA, do Pentágono, de Guantánamo e outras tantas marcas de prestígio. Infelizmente, esqueceu-se de falar de umas quantas contabilidades que faltam fazer sobre as vítimas civis que a guerra do Afeganistão e do Iraque provocaram (e que deixam as 2.982 vítimas nova-iorquinas a uma grande distância), à sombra do pretexto e da retaliação, tanto do 11 de Setembro, como daquela ameaça fantasma de umas quantas armas de destruição maciça, que foram fabricadas pelas mentes perversas de um punhado de políticos, tão criminosos e alucinados como aqueles que andam por aí a brandir o sagrado Corão.

Face a este débito opinativo, apenas posso deixar registada a minha mágoa e comiseração, em relação aos cidadãos americanos (e não só) que naquele dia 11 de Setembro foram engolidos pela voragem da destruição das Torres Gémeas, sem saberem o que lhes estava a acontecer, bem como em relação a todos os civis afegãos e iraquianos, que antes e depois de 11 de Setembro deixaram de estar entre nós, vítimas inocentes de drones e bombardeamentos cirúrgicos, sem saberem o que lhes estava a acontecer. Eu sei!

quinta-feira, setembro 08, 2011

Aviso


O QUE será que Pedro Passos Coelho quis insinuar, quando disse que "em Portugal, há direito de manifestação, há direito à greve. São direitos que estão consagrados na Constituição e que têm merecido consenso alargado em Portugal, mas nós não confundiremos o exercício dessas liberdades com aqueles que pensam que podem incendiar as ruas e ajudar a queimar Portugal". E mais ainda: "Pode haver quem se entusiasme com as redes sociais e com aquilo que vê lá fora, esperando trazer o tumulto para as ruas de Portugal".

Provavelmente, não houve ninguém que dissesse a Passos Coelho que os meninos não devem brincar com fósforos, e já sendo crescidos, nos tempos que correm, ameaçar com a intimidação, polícia de choque e afins, não é a melhor forma de governar um país.

quarta-feira, setembro 07, 2011

Registo para Memória Futura (51)

«O Ministério da Educação nomeou novos directores regionais de Educação no dia 2, no preciso dia em que anunciou a extinção daqueles órgãos. Entre os nomeados destaca-se o até agora presidente da Associação Nacional de Professores, João Grancho, que vai liderar a Direcção Regional de Educação do Norte até ao final de 2012, altura em que o processo [de extinção] fica concluído.»

Notícia do DIÁRIO DE NOTÍCIAS on-line de 6 de Setembro de 2011

Meu comentário: Para quê novas indigitações, se os organismos têm a morte anunciada? Terá sido a necessidade premente de dar emprego aos boys alaranjados, mesmo que com um contrato a prazo, o que motivou estas nomeações?

terça-feira, setembro 06, 2011

Más Companhias

Anders Fogh Rasmussen, o novel secretário-geral da NATO, desloca-se na próxima quinta-feira a Lisboa, estando previstos encontros com o primeiro-ministro, o Presidente da República e os ministros dos Negócios Estrangeiros e da Defesa, durante os quais, além dos habituais cumprimentos, serão abordados assuntos relacionados com a situação na Líbia, as mudanças no Comando de Oeiras, a vinda da STRIKEFORNATO para Portugal, a reconfiguração da participação portuguesa nas missões da NATO e a futura participação dos caças F-16 da Força Aérea Portuguesa, no policiamento aéreo da Islândia, tudo iniciativas tão necessárias a Portugal como o pão para a boca. Como é óbvio, estas iniciativas não estão abrangidas por qualquer plano de austeridade, pois uma coisa é a inadiável e perpétua guerra contra o terrorismo e os inimigos da civilização, e outra coisa é a luta contra o subdesenvolvimento, o empobrecimento, a miséria, e as nefastas consequências do obsoleto estado social, que como toda a gente sabe é de inspiração comunistóide.
Aliás, o senhor Rasmussen, é a pessoa certa no lugar certo. Oriundo da família política do centro-direita, foi um corajoso e resoluto primeiro-ministro da Dinamarca durante oito anos. Sendo um teórico da linha neo-liberal e inimigo declarado do estado social, enquanto teve poder para isso, dedicou-se à sua demolição. Foi também um convicto e fervoroso crente de que Saddam Houssein era detentor de um poderoso arsenal de armas de destruição maciça, logo exacerbado apoiante da invasão do Iraque de 2003, tendo feito questão de que a Dinamarca se empenhasse na participação da força multinacional estacionada em Camp Danevang, perto de Bassora, com meio milhar de militares. Como é fácil de ver, é uma pessoa que não deixa os seus créditos por mãos alheias, sendo os seus atributos muito apreciados entre os seus pares.
A avó Bernarda, com a sua habitual propensão para o gracejo, quando viu a foto do senhor, saiu-se com um curioso comentário: "ai Jesus, abrenúncio, o homem coitadinho não tem culpa da cara que tem, mas o certo é que não ficava nada a destoar em qualquer filme de gangsters...

segunda-feira, setembro 05, 2011

Fácil, Mais Fácil, Cada Vez Mais Fácil


O Partido Comunista Português e o Bloco de Esquerda apresentaram no plenário da Assembleia da República, através de iniciativas independentes, as suas propostas para solucionar o problema dos trabalhadores a falsos recibos verdes. Na passada sexta-feira, 2 de Setembro, PS, PSD e CDS-PP, cada um com os seus argumentos, chumbaram ambas as iniciativas, embora, ironia das ironias, manifestem que estão empenhados na sua erradicação, mas não dando um único passo nesse sentido.

O PSD utilizou o já normal argumento da chantagem do desemprego para justificar a continuação da precariedade, isto é, antes a precariedade que mais desemprego, só faltando dizer que acabar com esta ignomínia, no meio da crise que o país o vive, seria desrespeitar e pôr em causa os objectivos traçados e acordados com a troika. Contudo, não se dispensou de dizer que a concretizar-se a aprovação de tais iniciativas, aquelas iriam tirar o ganha-pão aos milhares de trabalhadores que são efectivamente independentes, o que corresponde a um rotundo disparate.

O CDS põe trabalhadores e patrões em pé de igualdade - como se nas relações laborais não existisse uma parte mais fraca - justificando que a inversão do ónus da prova não pode ser utilizada, havendo que fazer prova de que os recibos verdes correspondem a uma forma de subversão dos modelos e regras de contratação. Tanto o PSD como o CDS-PP, além de hipocrisia e argumentos falaciosos, manifestam ignorância da realidade e dos mecanismos subjacentes às relações laborais, ficando a pairar a ideia de que o conhecimento e as suas relações com este meio, sempre foram, e continuam a ser, muito superficiais.

O PS, na sua nova linha política (versão António José Seguro), mais comedida em relação à precariedade, reconhece-a agora como má, depois de anos a suportar um Governo (a versão José Sócrates) que ajudou a implementá-la como modelo no mundo do trabalho, contudo, sugere que o problema possa ser solucionado por consenso entre as partes (trabalhadores e empregadores) e não através de iniciativas legislativas, como se as ilegalidades pudessem ser objecto de qualquer negociação particular. À falta de melhor argumento, a bancada rosa fez dissertações à volta de nódoas de gordura.

Conclusão: vai continuar a ser fácil despedir, mais fácil pagar menos, e cada vez mais fácil explorar muitíssimo.

No meu blog CARTÓRIO DO ESCREVINHADOR podem ser consultadas as propostas do Partido Comunista Português e do Bloco de Esquerda.

domingo, setembro 04, 2011

O Preço da Salvação

«(…) Quando se trata de taxar grandes fortunas os analistas tornam-se filosóficos: mas o que é um rico?, perguntam. Fazia falta um destes analistas no Evangelho segundo São Mateus. Quando Jesus dissesse que é mais fácil um camelo entrar pelo buraco de uma agulha do que um rico entrar no Reino de Deus, o analista havia de contrapor: “Mas, Senhor, o que raio é um rico? Abstendo-vos de usar conceitos vagos e populistas”. No entanto, Jesus Cristo, talvez por ser filho de quem é, pode dizer o que lhe apetece sem ser acusado de demagogia. Uma sorte que Jerónimo de Sousa não tem. (…) Américo Amorim constitui, por isso, um mistério tanto para a fiscalidade como para a teologia. Sendo o homem mais rico de Portugal, talvez não entre no reino de Deus. No entanto, na qualidade de pobre de espírito, tem entrada garantida.»

Excerto do artigo de opinião de Ricardo Araújo Pereira, intitulado “Ceci n’est pas un riche”, publicado na revista VISÃO de 1 de Setembro de 2011. O título do post é de minha autoria.

sábado, setembro 03, 2011

«O director, o gerente, a mulher deles e as lojas dela»

Artigo integral de João Semedo, médico e deputado do BE, publicado no jornal PÚBLICO em 30 de Agosto de 2011. Os comentários são desnecessários.

«Aquilo que o director de um serviço não faz no seu hospital público, põe a sua empresa privada a fazer.

A história conta-se em poucas palavras. O Conselho de Administração da Unidade Local de Saúde da Guarda (que integra hospital e centros de saúde do distrito) autorizou uma empresa privada de serviços médicos de oftalmologia a realizar, nesses centros de saúde, rastreios à visão para despiste das principais causas de cegueira. A empresa em questão (M.A. Dias dos Santos, Lda) tem como sóciogerente o director do serviço de oftalmologia do hospital da Guarda (M. A. Dias dos Santos, dr).

Em resumo, aquilo que o director de um serviço não faz no seu hospital público põe a sua empresa privada a fazer e a administração do hospital aprova e aplaude. Como deputado, questionei o Governo sobre esta estranha situação e o PÚBLICO disso deu notícia. Até hoje, nem o Governo respondeu, nem a administração da ULS disse fosse o que fosse.


Apenas o promotor dos rastreios se queixou quer da notícia quer das minhas perguntas. E para que não se tome por igual aquilo que é diferente, diga-se que quem se queixou foi o director da oftalmologia e não o sócio-gerente da empresa. O que tem a sua lógica: que razão levaria uma empresa privada a queixar-se de ser chamada por um hospital público? Em geral, esse é o maior desejo de qualquer privado.

De que se queixa o director da oftalmologia? De ter tido necessidade de recorrer a uma empresa privada para fazer um rastreio que o hospital e os centros de saúde deviam fazer, consumindo, mais uma vez, recursos públicos para pagar a privados? Não, disso o director não se queixa. Aliás nem podia porque, segundo consta, a empresa MADS não cobrou nada ao hospital do director MADS. O próprio confessa ter sido um “serviço cívico”, isto é, uma borla desinteressada, altruísmo em estado puro: o director MADS reconheceu a necessidade, o sócio-gerente MADS comoveu-se e o rastreio fez-se.

O director queixa-se pelo sócio-gerente, chorando as dores deste que é o mesmo que aquele. Porque, apesar das suas boas intenções, acusam malevolamente a empresa de que é sócio-gerente de ser “proprietária, sócia ou de qualquer forma associada de quaisquer ópticas existentes no país”, afirmação que desmente.

Diga-se que aquela empresa não é nem podia ser proprietária ou sócia de lojas de óptica porque, em Portugal, é proibida qualquer relação societária ou equivalente entre quem faz oftalmologia e quem vende óculos e lentes. Mas, claro, não se pode exigir que a lei impeça ou previna simples coincidências.

Primeira coincidência: em cinco localidades – Guarda, Trancoso, Sabugal, Pinhel e Belmonte – há cinco lojas da mesma rede de ópticas, Óptica Lince, SA, passe a publicidade. Nessas mesmas localidades – por vezes na mesma rua – funcionam cinco consultórios da empresa de serviços médicos de oftalmologia MADS. Segunda coincidência: na gerência da Óptica Lince está a esposa de MADS. Sem bigamia: para este efeito, director e sócio-gerente são a mesma pessoa.

Em resumo: quem decide o rastreio e quem o realiza, quem prescreve os óculos e quem os vende é tudo da mesma família. Só não vê quem não quer ver. Não é preciso pôr óculos para ver que isto não está certo e que este cruzamento de interesses colide com os princípios e as boas práticas dos serviços públicos de saúde.

Este caso é um caso mas, infelizmente, não é único. O SNS está poluído por promiscuidades em tudo semelhantes. Degradam a qualidade dos serviços e promovem o despesismo. Eliminá-los favoreceria a sustentabilidade financeira do SNS e evitaria muitos dos cortes que o Governo está a fazer e que afectam a capacidade do SNS e prejudicam os doentes.

No SNS, contas equilibradas e qualidade assistencial são incompatíveis com o amiguismo nas decisões e a promiscuidade com os interesses privados. O Governo exige e promete rigor, seriedade e determinação na gestão da coisa pública. Este caso da Guarda põe à prova a coerência deste discurso.»

sexta-feira, setembro 02, 2011

Um Rico Senhor no País das Maravilhas


Depois de confirmar que é autêntico, passo a transcrever este requerimento, tal como chegou à minha caixa de correio (e-mail). A ser verdade, o senhor Américo Amorim não será apenas o homem mais rico de Portugal, cuja fortuna e património ficaram livres de serem tributados, por obra e graça dos fastios do senhor Coelho, mas será também o respeitável beneficiário - entre mais uns quantos – de um monumental logro, que só é possível ter acontecido com muitas cumplicidades, e que só a muito custo chegou ao domínio público. Américo Amorim já veio desmentir que tenha havido artimanha, garante que mal conhece o BPN e nunca recorreu aos seus serviços. Porém, considerando que até agora, já me obrigaram a “contribuir” com perto de 1.000 euros, não sei se para tapar as “colossais” crateras do BPN, se para engrossar o mealheiro do senhor Amorim, é óbvio que também estou interessado em saber como isto vai acabar, ou se não acabou já, sem disso nos apercebermos.
Então vejamos:
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«Exmo. Senhor Presidente da Assembleia da República
O Bloco de Esquerda tomou conhecimento, através da comunicação social, da possível existência de um crédito concedido pelo BPN à Amorim Energia para a compra de uma participação na Galp.
Segundo a notícia, o crédito, da ordem dos 1600 milhões de euros, teria sido concedido pelo BPN à Amorim Energia em 2006, antes do processo de nacionalização. A mesma fonte avança que o empréstimo não chegou a ser pago pela holding ao BPN, mantendo-se assim a divida de 1600 milhões de euros durante todo o período em que o Banco esteve na posse do Estado.
Acresce a esta informação o facto de a Amorim Energia ser uma holding detida, não apenas por Américo Amorim, mas que tem como accionistas a Santoro Holding Financial, de Isabel dos Santos, e a Sonangol. Como é conhecido, a Santoro Holding Financial, para além de accionista da Amorim Energia, é também accionista maioritária do Banco Internacional de Crédito, a quem o Estado irá vender o BPN. Desta forma, a venda do BPN, com os seus créditos, ao BIC, poderá implicar que o crédito de 1600 milhões de euros seja pago pela Amorim Energia a um banco que tem como principal accionista a própria devedora.
A confirmar-se, a situação acima descrita configura mais um episódio inaceitável de falta de transparência associado ao processo de reprivatização do BPN. O Banco Português de Negócios, nacionalizado em 2008, representa, neste momento, cerca de 1000 euros por contribuinte em Portugal, e um prejuízo directo para o Estado de pelo menos 2,4 mil milhões de euros.
Em nome da transparência e do direito à informação que assiste a todos os contribuintes que pagaram e estão a pagar o prejuízo do BPN, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda gostaria de ver esclarecidas algumas questões relacionadas com a situação acima descrita.
Atendendo ao exposto, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda vem por este meio dirigir ao Governo, através do Ministério das Finanças, as seguintes perguntas:
1. Confirma o Governo a existência de um crédito, por liquidar, da Amorim Energia ao BPN? Em caso afirmativo, qual o seu valor?
2. Caso exista, como explica o Governo a não execução do referido crédito para fazer face aos prejuízos associados ao BPN, durante os anos em que o banco esteve na posse do Estado?
3. Confirma o Governo que o referido activo se encontra num dos três veículos constituídos pela Caixa e transferidos para o Tesouro?
4. Perante o cenário de venda do BPN ao BIC, qual a situação do referido activo? Ficará em posse do Estado ou será incluído no pacote a privatizar?
5. Pode o Governo divulgar a lista de todos os créditos, incluídos nos veículos transferidos para o Tesouro, acima dos 250 milhões de euros?

Palácio de São Bento, 08 de Agosto de 2011.
O Deputado
João Semedo»

quinta-feira, setembro 01, 2011

O Coelho saiu da Toca

DE VISITA a Espanha, Pedro Passos Coelho, em entrevista ao jornal EL PAIS, e manifestando cobardia política, acabou por dizer lá fora, aquilo que não teve coragem para dizer cá dentro, isto é, que quem é detentor das grandes fortunas e quem aufere rendimentos de capital pode respirar fundo e ir de fim-de-semana descansado, pois Passos Coelho já manifestou a sua discordância em tributá-los, porque isso, garante ele, em vez de atrair fortunas para investirem no país e criar riqueza (onde, onde?), conduziria à fuga de capitais para o estrangeiro (como se isso não acontecesse já). Curiosamente, o seu “delfim” Ângelo Correia, à margem de uma conferência na Universidade de Verão do PSD, afinou pelo mesmo diapasão, que não senhor, que estas medidas são um mal necessário e que os mais ricos, quanto a impostos, pois claro, já têm a sua conta, e coisa e tal.
Dito isto, fiz umas contas por alto e cheguei à conclusão que cada vez que um senhor accionista vai levantar os dividendos das suas acções, não é difícil imaginar quantas dezenas, centenas ou milhares de postos de trabalho ele vai criar, contribuindo para a reanimação da economia nacional, ou então, quantos "porches" e "lamborghinis" vai encomendar, em quantas "regatas" vai participar, quantas propriedades e obras de arte vai acrescentar ao seu património, quantas festanças vai frequentar, quantas empresas-fantasma vai criar, assim contribuindo (à sua maneira) para a reanimação da economia nacional.
Ao mesmo tempo que o Coelho saía da toca por terras de Espanha, cá em Portugal, o ministro das finanças, Vítor Gaspar, num exercício deveras demorado e muito sincopado, tocou uma música diferente: sentenciou que a estratégia orçamental é carregar a população trabalhadora com mais impostos, sobretudo a função pública e trabalhadores com salários elevados (como se quem é bem remunerado a trabalhar por conta de outrem, tivesse pretensões a ser rico), fazer cortes nos benefícios fiscais das despesas com a habitação, a saúde e a educação, ao passo que os cortes na despesa do Estado (e não nas prestações sociais) vão aguardar melhores dias. Quanto às mais-valias mobiliárias são timidamente agravadas em 1% (uma insignificância!). Entretanto, fazendo um jeito ao PS, que tinha reclamado a medida, as empresas com lucros superiores a 1,5 milhões de euros pagarão, no próximo ano, um imposto extra de 3%, o que quer dizer por via disso, haverá justificação para não haver reinvestimentos, e o pretexto para mais uma mão cheia de falências e despedimentos. A receita a conseguir com as sete medidas principais ronda os 1300 milhões de euros. Para além do que ontem foi anunciado, as receitas do aumento no IVA darão ao Estado mais 1190 milhões de euros.
Entretanto, o senhor Coelho, antes de voltar para a toca, achou por bem fechar a sua lengalenga com mais um aviso sério: ainda faltam as restantes 70 (setenta) medidas para concretizar…

quarta-feira, agosto 31, 2011

Entre Mulas e Bailinhos

AS CONTAS, melhor, os prejuízos de uma empresa detida pelo Governo Regional da Madeira e a extinção de uma sociedade que promovia obras rodoviárias, em regime de parceria público-privada, numa manobra de traficância financeira, foram parar às contas do Estado, agravando o défice das contas públicas em 223 milhões de euros, situação que irá ter que ser colmatada com mais uns quantos "empréstimos" que o governo irá garantir, fazendo mais uma visita aos bolsos dos portugueses. Entre os Bailinhos da Madeira no Chão da Lagoa e uns quantos coices da Mula da Cooperativa, Alberto João Jardim e a próspera corte que o rodeia, continuam a somar e a seguir em frente, sempre a bailar, a facturar e sem medo de ninguém.

ADENDA - Quando o deputado e vice-presidente da bancada do PSD, Carlos Abreu Amorim, afirmou em entrevista que Alberto João Jardim era um bom governante e responsável por uma obra extraordinária, será que já sabia disto?

segunda-feira, agosto 29, 2011

Despacho com Vista para o Tejo


«(...) Um cidadão português, que sempre desejou ter uma casa com vista para o Tejo, descobriu finalmente umas águas-furtadas algures numa das colinas de Lisboa que cumpria essa condição. No entanto, uma das assoalhadas não tinha janela.
Falou então com um arquitecto amigo para que ele fizesse o projecto e o entregasse à câmara de Lisboa, para obter a respectiva autorização para a obra. O amigo dissuadiu-o logo: que demoraria bastantes meses ou mesmo anos a obter uma resposta e que, no final, ela seria negativa. No entanto, acrescentou, ele resolveria o problema.
Assim, numa sexta-feira ao fim da tarde, uma equipa de pedreiros entrou na referida casa, abriu a janela, colocou os vidros e pintou a fachada. O arquitecto tirou então fotos do exterior, onde se via a nova janela e endereçou um pedido à CML, solicitando que fosse permitido ao proprietário fechar a dita cuja janela.
Passado alguns meses, a resposta chegou e era avassaladora: invocando um extenso número de artigos dos mais diversos códigos, os serviços da câmara davam um rotundo não à pretensão do proprietário de fechar a dita cuja janela.
E assim, o dono da casa não só ganhou uma janela nova, como ficou com toda a argumentação jurídica para rebater alguém que, algum dia, se atreva a vir dizer-lhe que tem de fechar a janela! (...)»

Excerto de um artigo de Nicolau Santos, in EXPRESSO online. O título do post é de minha autoria.

domingo, agosto 28, 2011

Registo para Memória Futura (50)

«(...) A Madeira também tem razões de queixa do poder central e Alberto João Jardim, que continua a ter o apoio dos madeirenses e é responsável por uma obra extraordinária, é muito injustiçado. (...) A haver uma diferença [com o resto do país], é que a Madeira tem sido bem governada – é a segunda região mais rica do país, num salto impressionante, tendo em conta a pobreza em que vivia há 30 anos. (...)»

Excertos da entrevista concedida por Carlos Abreu Amorim, deputado e vice-presidente da bancada do PSD, ao semanário SOL de 26 de Agosto de 2011

sábado, agosto 27, 2011

O Melhor do Pior


SABEMOS que Portugal é um país pequeno, que há pouco espaço, mas o mais preocupante é o reduzido discernimento de algumas cabeças pensantes. Este exemplo demonstra-o bem. Um destes dois objectos está no local errado. Nem o ar condicionado funcionará em condições, nem a sinalética toponímica cumpre a sua função.
Rua do Sacramento, em Lisboa, em 26 de Agosto de 2011.Foto de F.Torres.Clicar para aumentar.

quarta-feira, agosto 24, 2011

Lavar os Cestos da Vindima

AS sucessivas heranças que vão passando de uns governos para outros, muitas delas recheadas de grandes e onerosas fraudes - como parece ser agora o caso das facturas não contabilizadas e por pagar do Instituto do Desporto de Portugal, no valor de 6,78 milhões de euros (1,360 milhões de contos), de que ninguém reclama o pagamento, o que é curioso, para não dizer suspeito - são sempre "resolvidas" pelo ilimitado bolso dos contribuintes, abafadas com a rápida extinção das instituições onde se geraram as ilegalidades, sem serem apuradas responsabilidades, deixando à solta, alegremente impunes, os seus autores e beneficiários, quando o braço da Justiça, sobretudo nestes casos, devia ser longo, expedito e rigoroso.
Entre o terem sido encontradas incógnitas facturas numa sala da instituição, e serem um suposto "mal-entendido", explicação avançada pelo ex-secretário de estado do desporto, Laurentino Dias, são devidas explicações ao país, pois cesto a cesto, milhão a milhão, faz-se a vindima, e até ao lavar dos cestos ainda é vindima.
O caso veio a público numa sessão da Comissão Parlamentar de Educação, Ciência e Cultura. O agora deputado Laurentino Dias, após ter avançado com a tese do "mal-entendido”, ausentou-se dos trabalhos da sessão, provavelmente para diligenciar a rápida e cabal explicação do sucedido, e nós vamos ficar à espera.

domingo, agosto 21, 2011

Registo para Memória Futura (49)

NO TOTAL, em 2011, as 25 maiores fortunas portuguesas, somam 17,4 mil milhões de euros, mais 17,8% do que em 2010. Estas fortunas equivalem a 10,1% do PIB português de 2010 (preços de mercado), isto apesar da crise, da recessão, do endividamento, do aumento de impostos, do desemprego galopante, das falências em cascata, do crescimento da pobreza, e quando Warren Buffett, o terceiro homem mais rico do mundo, feitas as contas, vem dizer, em tom de provocação (só pode ser isso), que os mais ricos deviam contribuir com mais qualquer coisita, para aliviar os males do mundo e todos os outros que andam a pagar por eles, e para eles.

sábado, agosto 20, 2011

Tubarões há Muitos!


SABEDORES de que a variante humana se passeia, alegre e intocável, por todo o território nacional, com a crise a passar-lhes ao lado, alguns exemplares de tubarões autênticos, de barbatana ameaçadora e dente afiado, vieram rondar as praias de Vila do Bispo, na esperança de que os veraneantes, habituados como estão a serem rilhados de todas as formas e feitios, se deixassem abocanhar. Tiveram pouca sorte. Os nadadores-salvadores deram pela intromissão, e forçaram os banhistas a saírem da água. Já sabíamos que tubarões há muitos, porém, a vantagem destes é que não conseguem passar despercebidos.

quarta-feira, agosto 17, 2011

Revisitando o Quarteto de Alexandria (Clea)

Consultar este post para prévia apreciação global do QUARTETO DE ALEXANDRIA.

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Alexandria, a capital da memória! Todos os escritos que eu fui buscar aos vivos e aos mortos, até eu próprio me tornar numa espécie de “post-scriptum” de uma carta que nunca foi remetida. (…) Agora encontrava-me perante a natureza do tempo, essa doença da alma humana. Tive de admitir a minha derrota como cronista. E todavia, de forma bastante curiosa, o mero acto de escrever dotou-me ainda de outra espécie de amadurecimento, pelo próprio fracasso das palavras que se afundam e se perdem uma após outra nas insondáveis cavernas da imaginação. (considerações de Darley, o narrador)

- Passaram-se muitas coisas depois de ter começado a guerra. O doutor Balthazar esteve muito doente. Sabe das intrigas de Hosnani na Palestina? Toda a organização se desmantelou. Os egípcios tentam confiscar-lhe os bens. Já se apoderaram de muita coisa. Sim, agora são pobres e longe de estarem livres de apuros. Ela tem residência fixa em Karm Abu Girg. Há muito tempo que ninguém a vê. Por privilégio especial, ele trabalha como condutor de ambulâncias nas docas. Muito perigoso. Durante um bombardeamento, ele perdeu um olho e um dedo. (…)
- Mas a guerra tem também outras vantagens. Corto o cabelo a todo o exército. A minha barbearia está sempre cheia. Três salões, doze empregados! Você vai ver, é estupendo. Como diz o nosso amigo Pombal: “você agora faz a barba aos mortos enquanto eles ainda estão vivos”. (Mnemjian, o barbeiro, põe Darley, o narrador, ao corrente do que se passou na sua ausência)

Eu tinha-a gasto como a um velho par de meias e o absoluto dessa desaparição surpreendeu-me e revoltou-me. Podia o “amor” gastar-se assim? Melissa, repeti, ouvindo o eco desse nome bem-amado ressoar no silêncio. O nome de uma planta triste, o nome de um peregrino a Elêusis. Era ela agora menos que um perfume ou que um sabor? Seria simplesmente um feixe de referências lioterárias gatafunhadas nas margens de um poema insignificante? (…) Melissa não passara de um dos muitos disfarces do amor. (Darley, o narrador, conjecturando sobre Melissa)

- Eu que julgava saber tudo sobre o amor – disse ele com ar sonhador, como falando com a sua imagem, enquanto compunha a barba com os dedos – nunca tinha imaginado uma coisa semelhante. Se há um ano me tivessem dito as coisas que estou prestes a contar-lhe, eu teria respondido: Bah! Isso não passa de uma obscenidade trovadoresca! São detritos da Idade Média. (confidências de Pombal)

Parecia muito mais magra. Erguendo alto o candelabro aproximou-se um passo e, depois de mergulhar ansiosamente os seus olhos nos meus, pousou os lábios num beijo gelado e breve sobre a minha face direita. Aquilo era frio como um obituário, seco como um pergaminho. (Darley, o narrador, reencontra Justine)

- A morte de Narouz recaiu sobre Nessim porque os coptas do povo dizem que foi ele quem a ordenou. Tornou-se para ele numa espécie de maldição familiar. A mãe dele está doente, mas afirma que nunca mais voltará a esta casa. (…) E assim aqui nos encontramos os dois encerrados. Passos as noites lendo – sabe o quê? – um maço de cartas de amor que ela abandonou. Cartas de amor de Mountolive! Mais confusão, mais recantos inexplorados. (confissões de Justine a Darley, o narrador)

O homem inventou a música para confirmar a sua solidão. (pensamento de Clea)

Mas que tarefa! Ficamos para aqui, enquanto o tempo passa, a fazer conjecturas. Todas as espécies de tempo que se escoam pela ampulheta, o tempo de uma eternidade, o tempo de um instante e o tempo do esquecimento; o tempo do poeta, do filósofo, da mulher grávida, do calendário… (dissertação de Balthazar)

Ela estava sentada no mesmo lugar onde (naquele primeiro encontro) eu tinha visto Melissa contemplando a sua xícara de café com um ar de ceptismo divertido, o queixo apoiado nas mãos. (…) Mas agora não era Melissa quem estava ali, era Clea, com a sua cabeça loura debruçada sobre a xícara de café, guardando um ar de meditação infantil. (Darley, o narrador, reencontra Clea)

A chuva caía em torrentes, como sucede frequentemente em Alexandria antes da alvorada, refrescando o ar, lavando as folhas ressequidas das palmeiras e dos jardins municipais, as grades de ferro… (…) Do porto, os odores de alcatrão, do peixe e das redes salgadas inundando as ruas vazias para enfrentar as rajadas inodoras do deserto… (imagens de Alexandria)

E se a personalidade humana for uma ilusão? E se, como nos diz a biologia, cada célula do nosso corpo é substituída por outra num período de sete anos? Quando muito, o que eu tenho nos braços é uma fonte de carne, jorrando continuamente, e no meu espírito um arco-íris de poeira. (pensamentos de Darley, o narrador)

Ela encontrava-se à janela vendo por detrás das cortinas corridas a aurora romper sobre os telhados da cidade árabe, nua e esbelta como um lírio do oriente.
(…) Chamei docemente Clea mas ela não me ouviu; voltei a adormecer. Sabia agora que Clea partilharia tudo comigo, sem restrições – sem mesmo ocultar aquele olhar de cumplicidade que as mulheres reservam para os espelhos.
(…) Volto-me para Clea adormecida e ponho-me a estudar o perfil sereno a fim de ingeri-la, bebê-la toda sem perder uma gota, fundindo nas suas as palpitações do meu coração. (…)
- É desleal olhar para uma mulher adormecida. (Darley e Clea)

Comprámos-lhe todos qualquer coisa, com a intenção de lhe restituir quando a tormenta passasse. Os Cervoni compraram os cavalos árabes, Ganzo o automóvel, que depois revendeu a Pombal, e Pierre Balbz o telescópio. Como não tinha lugar onde guardá-lo, Mountolive permitiu-lhe depositá-lo da residência de Verão, um sítio ideal. (recordações de Clea)

Dei por mim lendo estas passagens dos cadernos de Pursewarden com toda a atenção e humor que eles mereciam e sem pensar em ofender-me – para usar a expressão de Clea. (…) Em suma, é sempre salutar saber o que pensa francamente de nós uma pessoa a quem admiramos. (Darley, o narrador, lendo escritos do falecido Pursewarden)

Por exemplo, eu não habitava permanentemente em casa dela, porque quando Clea trabalhava numa tela que reclamasse toda a sua atenção tinha necessidade de vários dias de solidão. (Darley, o narrador, falando sobre Clea)

- Peço-lhe desculpa, mas… é o meu único meio de conhecer as feições das pessoas.
E senti bruscamente os seus dedos doces e tépidos deslocando-se rapidamente sobre o meu rosto, como se estivessem lendo um texto em Braille… (Liza, a noiva cega de Mountolive, conhecendo Darley, o narrador)

Clea tinha ido ao Cairo, e não a esperava. Levei a maleta para o apartamento dela e, sentando-me no chão, abri-a. (…) Comecei a tremer como na presença de um grande génio, a tremer e a balbuciar. Com um choque interior descobri que em toda a literatura conhecida nada existia de comparável! Todas as obras-primas de Pursewarden empalideciam diante dessas cartas de um brilho e de uma prolixidade furiosa e expontânea. (…) Nesta estranha e arrepiante experiência tive por um momento a intuição do verdadeiro Pursewarden – o homem que sempre me escapara. (Darley, o narrador, lendo a correspondência de Pursewarden para sua irmã Liza)

Eu, Darley, tudo o que posso afirmar é que cinco ou seis amantes francesas, várias voltas ao mundo e numerosas aventuras em tempo de paz não me ensinaram tanto como esta guerra. (confissão de Darley, o narrador)

Enquanto eu saía, fechando docemente a porta do quartinho, veio-me ao espírito uma frase de Pursewarden: “o amor mais rico é o que se entrega ao arbítrio do tempo.” (recordação de Darley, o narrador)

Sim, nesse dia surpeendi-me a escrever com a mão trémula as três palavras que todos os rapsodos da Terra pronunciam desde que o mundo é mundo para concitar a atenção do auditório. Palavras que simplesmente anunciam a maturidade de um artista: “era uma vez…”
E senti-me como se o Universo me tivesse piscado o olho!

Apêndice

Sim, ao lado da janela, a cama
Banhada pelo sol daquela tarde,
Separámo-nos às quatro horas
Apenas por uma semana…
Nunca pensei que esses sete dias
Pudessem não ter fim.

NOTA – Ilustração de Fernando Torres