Adaptação livre do Milagre das Rosas. Não vale saltar para o último período do texto, combinado?
CONTA A LENDA que o senhor ministro foi informado que um seu secretário andava a fazer, por portas e travessas, uns contratos muito pouco ortodoxos, senão mesmo ruinosos, e que isso poderia implicar sérias perdas para as contas públicas, e o que era mais grave, para o seu ministerial prestígio. Assim, o ministro, já muito desconfiado e com os nervos em franja, decidiu um dia surpreender o seu secretário no corredor do ministério, quando ele carregava a sua bojuda pasta, que nunca se separava nem deixava esquecida sob pretexto algum, e muito menos aberta, sujeita a olhares curiosos. À vista dele, e pensando que o ia apanhar em flagrante com material incriminatório, reparou que o secretário procurava esquivar-se ao encontro - o que era bom sinal -, mas tal não sucedeu. Ao cruzarem-se, foi então que o ministro perguntou: "Ora viva, o que levais aí nessa obesa pasta, senhor secretário, pode-se saber?". Ruborizado e cheio de suores frios, o secretário balbuciou a medo: "Nada de especial, senhor ministro, apenas papelada sem interesse, velharias já fora de prazo para ajudar a atiçar a lareira, isto é, acendalhas", ao que o ministro – farto de saber que os ministros e secretários têm por hábito mentir - ripostou: "Ah sim, papelada para atiçar a lareira no pino do Verão? Mostrai-me lá então, pois estou curioso". Perante o olhar incrédulo dos outros funcionários que passavam e paravam para assistir, o ministro encostou o secretário à parede e ordenou, colérico e com voz de trovão: "Abri já a pasta, seu vilão sacripanta, senão demito-o", ao que o outro respondeu, agora já todo empertigado: "Não é preciso, excelência, quem se demite sou eu!. E empurrando o ministro, deixou cair a pasta para o chão, e desandou direitinho para a saída, sem se dignar olhar para trás. Serenados os ânimos, cheio de curiosidade e a lamber os beiços, saboreando antecipadamente o petisco, o ministro pegou na pasta e logo ali a abriu, perante os olhos estupefactos dos circunstantes, que se debruçavam para contemplarem o seu recheio, coisa que até dava jeito – pensava ele - pois até podiam testemunhar a justa causa da exoneração do secretário. E o que viu deixou-o à beira de um ataque cardíaco: "Ora esta, isto acendalhas?", berrou ele, vendo a sua glória dissipar-se como por encanto. É que dentro da pasta estava muito bem arrumadinha, uma carrada de exemplares do último "Programa de Governo do PSD", dos muitos milhares que tinham ficado por distribuir.