Depois do Patriot Act, levado a cabo nos EUA, pela administração Bush, com o objectivo de enfrentar o terrorismo, o qual vai materializando a visão “orwelliana” de envolver os cidadãos em constante e apertada vigilância, controlando-lhes os passos, a correspondência, os gostos, as preferências, as amizades, as opções políticas, limitando os direitos constitucionais, o primeiro ministro britânico Tony Blair, que não quer ficar para trás, voltou a pressionar os seus pares, para a possibilidade de instaurar legislação que possa vir a anular decisões judiciais, sempre que estas possam colocar em causa a segurança pública, com parâmetros tão largos, que não se sabe onde acaba o tal interesse público, e começam outros com inconfessáveis intuitos.
Quase cinco anos depois do 11 de Setembro, aperta-se o cerco, não ao terrorismo internacional, o qual continua de boa saúde, a recrutar, a expandir-se e a fazer das suas, mas sim às sociedades, habitualmente reconhecidas como bastiões da democracia e das liberdades. A pretexto da sua segurança, os cidadãos estão a consentir que as prerrogativas da liberdade e da democracia sejam restringidas, aceitando passivamente que o estado espie quem apresenta um perfil que rompe com certos conceitos de “normalidade”. Pé ante pé, a separação de poderes entre o legislativo, o executivo e o judicial, pedra angular dos regimes democráticos, tem os dias contados, e isso é a antecâmara para a insinuação de regimes autoritários e ditaduras, coisas que se pensavam banidas do nosso horizonte político, excepção feita para o resistente clube dos chamados “estados párias”. Puro equívoco! Esquecemo-nos que agora, para se enganarem os tolos, já não são precisas fardas rutilantes, nem paradas, nem rituais, nem a ostentação de símbolos nazi-fascistas, bastando que se explore exaustivamente o marketing político, que se apareça muito na TV, a prometer ou a inaugurar qualquer coisinha, que se agitem alguns medos e fantasmas, e uma vez por outra, que os líderes se mostrem e comportem como qualquer um de nós. Hitler chegou ao poder absoluto através de eleições democráticas, com promessas de fartura, segurança, um punhado de inimigos para abater e um Reich para durar mil anos, secundado por um tal Joseph Goebels, que foi seu inseparável ministro da propaganda. Tal como o povo alemão dos anos 30 do século XX, também nós agora estamos a condescender, sem questionar, nesta troca entre limitações das liberdades, e falsas promessas de estabilidade e segurança, que mais não é do que o preâmbulo para novos despotismos. Agora, por obra e graça da globalização, do espectro do terrorismo, e de um controverso conceito de modernidade, embrulhado na peregrina ideia do “fim da história”, o Rubicão volta a estar ali à mão de semear. Atravessá-lo vai ser uma brincadeira de crianças.
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