quinta-feira, junho 19, 2008

Cinema para Entreter

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Título Português: Eu Sou a Lenda
Título Original: I Am Legend
Origem e Data: EUA - 2007
Realizador: Francis Lawrence
Duração: 101 minutos
Actores principais: Will Smith - Alice Braga
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Baseado numa história escrita em 1954 por Richard Matheson, este filme trazia uma auréola elaborada a partir da mística que anda colada às ideias do Apocalipse. Afinal, não passa de mais um produto que se situa entre o género de antecipação e terror “zombie”, para ser consumido à mistura com pipocas estaladiças.
Estamos na cidade de New York, 3 anos após o súbito colapso da civilização, em consequência do aparecimento de um mortífero surto epidémico, à escala planetária, resultante de uma mal avaliada solução científica de combate ao cancro, que provoca a quase total eliminação da raça humana. De dia a cidade é uma floresta de betão que se vai desmantelando, invadida por plantas infestantes e animais selvagens, enquanto que à noite se transforma numa câmara de horrores, habitada por seres humanos mutantes, que têm horror à luz e subsistem através da prática do canibalismo. Naquela grande urbe, apenas um homem, portador de uma singular imunidade, sobreviveu à hecatombe, na companhia da sua cadela. É um cientista militar que, dia após dia, cercado pela solidão, tenta manter a sanidade mental, insistindo em continuar a pesquisar um antídoto para a epidemia, ao mesmo tempo que através da rádio tenta contactar outros possíveis sobreviventes da tragédia.
O filme está pontilhado de algumas flagrantes incoerências. É muito pouco provável que 3 anos depois de tão radical colapso da humanidade, bem como de todos os dispositivos que suportavam a civilização tecnológica, continuasse a haver energia eléctrica para alimentar toda uma vasta linha de equipamentos, que vão desde o frigorífico até ao leitor de DVD, os computadores continuassem a funcionar normalmente e sem sobressaltos, houvessem ainda medicamentos dentro dos prazos de validade, e a água, bombeada a preceito, corresse nas canalizações como se nada tivesse acontecido. Isto para não falar de episódios de caça aos veados em plena 5.ª Avenida, com o protagonista a fazer perseguições às manadas de cervídeos, ao volante de um reluzente e imaculado desportivo, altamente roncador e bem afinado.
No meio destes improváveis cenários e contradições, move-se um convincente Will Smith (fazendo equipa com uma actriz de quatro patas, a inesquecível cadela Samantha), o qual fica com a grande responsabilidade de dar alguma consistência e credibilidade à história. O actor tenta salvar o filme com um desempenho solitário, altamente concentrado, onde tem lugar de destaque aquela válvula de escape que são - por ausência de interlocutores humanos - aqueles diálogos tão trágicos e vazios quanto inconclusivos, entre o homem e o seu companheiro canino, sempre atento aos solilóquios do dono. Estes são momentos invulgarmente bem conseguidos, porque mobilizam e sintonizam todos os nossos sentidos e sentimentos, não chegando, contudo, para elevar o nível do filme, tudo porque a realização não teve grande engenho e arte para explorar os efeitos e a angústia daquela atmosfera apocalíptica, e a assustadora solidão urbana de uma Manhattan arruinada, armadilhada e deserta. Apesar do tema ser prometedor, a realização de Francis Lawrence acabou por dispersar-se e escolher o caminho fácil do catastrofismo planetário, embrulhado na vertigem dos efeitos especiais, e deixando por explorar outros caminhos que o tema insinuava.
Parece que o filme tem outros finais alternativos, mas o que é exibido na edição portuguesa de DVD, tem tanto de previsível como de banal, adensando ainda mais a desilusão, e fazendo dele, no seu conjunto, uma obra algo inconsistente, quase a roçar o medíocre.

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