terça-feira, julho 08, 2008

Regresso ao Século XIX

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O presente texto foi transcrito de um documento editado em Junho de 2008, pelo SINAPSA (Sindicato Nacional dos Profissionais de Seguros e Afins). É de uma grande clareza, sucinto e demonstra bem o que nos espera, isto é, um regresso à exploração desenfreada e às infernais condições de trabalho do século XIX. Portanto, acautelemo-nos: isto ainda não é o inferno, mas passo a passo lá chegaremos!

PROPOSTA DO GOVERNO PARA A REVISÃO DO CÓDIGO DO TRABALHO

A alteração do Código de Trabalho de Bagão Félix, foi efectuada com os argumentos da competitividade e produtividade, enquanto agora está tudo resumido à competitividade.
Pelo seu conteúdo, esta revisão é apresentada com o pressuposto de servir os interesses económicos das grandes empresas e grupos económicos.

Os efeitos das propostas apresentadas pelo governo, representam um retrocesso assinalável na legislação do trabalho em geral e no CCT de Seguros em particular.

Horários de trabalho

Eliminação do limite máximo do período normal de trabalho diário

Aumento da jornada de trabalho diária para 10, 12 ou mais horas, desaparecendo a figura do trabalho suplementar, desta forma contribuir para o embaratecimento dos custos do trabalho à custa da flexibilização, do alongamento dos horários de trabalho, da redução da retribuição do trabalho, e do empobrecimento da segurança social, para diminuir as reformas.

Período inactivo do tempo de permanência no local de trabalho

Com este conceito o tempo em que o trabalhador está na empresa, mas não está a prestar serviço efectivo não seria contabilizado como tempo de trabalho (banco de horas), novamente se pretende descontar as pausas e as interrupções de serviço (ex.:desconta-se no horário o tempo em que se está a efectuar a manutenção de máquinas ou equipamentos).
De relembrar que neste caso, a permanência do trabalhador ao não ser contabilizada como tempo efectivo não dá lugar à retribuição.

Adaptabilidade grupal

Criar a adaptabilidade necessária à empresa em matéria de horários, sendo que numa primeira fase só eram colocados nesses novos horários os trabalhadores voluntários. Contudo passado algum tempo fazia-se uma votação e se os trabalhadores voluntários fossem maioritários todos os outros passariam a estar obrigados à realização do horário a que até ali se opuseram.

Regime prolongado do trabalho ao fim de semana

Pretende-se a eliminação do domingo e do sábado como dia de descanso semanal e dia de descanso semanal complementar.

Horários concentrados

Possibilidade de concentrar todo o período de trabalho em apenas três ou quatro dias da semana. Desta forma o trabalho suplementar não é pago e nos restantes dias não recebe subsídio de almoço.
Atenção que é a entidade patronal que decide quando e o trabalhador só tem de estar disponível.

Mobilidade Funcional Geográfica

Esta é uma tese também perversa, já que, se passados dois anos o patrão não accionar o mecanismo de mobilidade deixa de o poder fazer. Assim, o patronato, para que possa ter este instrumento disponível vai sujeitar o trabalhador à mobilidade geográfica antes de decorridos os dois anos.
O trabalhador pode durante três anos exercer funções não compreendidas no seu contrato de trabalho.

Liberalização dos Despedimentos

Se em relação às outras matérias se procura reduzir direitos, nos casos dos despedimentos a proposta é a da completa liberalização, deixando às entidades patronais todos os poderes para despedir, independentemente da existência ou não de justa causa.
Quanto aos prazos para a impugnação do despedimento, em vez dos 12 meses a que o trabalhador tem direito, o governo propõe a sua redução para 3 a 6 meses, limitando ainda mais o acesso à justiça. Concertando estes prazos, com os prazos para a concessão do apoio judiciário, claro será dizer que, quem quer reclamar paga.

Simplificação dos processos de despedimento

Mesmo nos casos em que a entidade patronal não cumpra todos os procedimentos, não dá ao trabalhador o direito à reintegração no posto de trabalho.

Contratação Colectiva

Mantêm a caducidade das convenções, mesmo daquelas que têm cláusula de salvaguarda (clª. 3ª do CCT seguros) e por esse motivo serem o garante da permanência dos direitos e, neste caso, os parceiros aprovaram que no prazo máximo de cinco anos a convenção caduque. Embora cinco anos possam parecer bastante tempo o objectivo é a imposição da caducidade de todas as convenções, a partir da última publicação, por via legislativa, mesmo daquelas que, por força da luta desenvolvida, as associações patronais não as tenham conseguido fazer caducar e, neste caso, os trabalhadores de seguros veriam desaparecer direitos importantes, tais como:

- Os dois dias de descanso semanal;
- Antiguidades (diuturnidades);
- Complemento de reforma;
- Complemento do subsídio de doença;
- Promoções obrigatórias;
- Transferência do local de trabalho, com as limitações que o CCT ainda estipula;
- Regulação dos horários de trabalho (diferenciado, flexível; referência)
- Os suplementos retributivos, tais como:
. Horário diferenciado – 20%;
. Subsídio de turnos – 20%;
. Subsídio nocturno – 25%;
. Suplemento trabalho ao sábado;
. Trabalho suplementar (horas extras);
. etc...

É tempo de relembrarmos que os Contratos Colectivos de Trabalho foram feitos em confronto com o capital, jamais lhes foram oferecidos ou aceites sem protesto e luta.
Sob o falso argumento de que "a possibilidade de a convenção cessar a sua vigência pode ser um elemento determinante de negociações construtivas e acordos", o governo pretende introduzir novos mecanismos de caducidade da contratação colectiva. De facto, trata-se de levar mais longe o ataque de Bagão Félix e visa destruir os direitos que a contratação colectiva consagra, fruto de décadas de luta de gerações de trabalhadores. As propostas violam até a Convenção da OIT e a Constituição portuguesa.

ASSIM, O GOVERNO PRECONIZA QUE A CONTRATAÇÃO COLECTIVA CADUQUE AO FIM DE 18 MESES

Com esta proposta a grande maioria das convenções colectivas corre o risco de caducar no segundo semestre de 2010 caso a proposta do Governo vá por diante.

A proposta do Governo, que foi acordada pela UGT em “concertação social” limita a sobre vigência (que actualmente vai até dois anos e meio) a 18 meses. Isto é, a partir do momento em que uma das partes denuncie o contrato, começa a decorrer um prazo de 18 meses ao fim do qual é declarada a caducidade.
Dado o desagrado das entidades patronais com grande parte da contratação colectiva que dizem, “está refém do conservadorismo dos sindicatos”, espera-se que as organizações patronais avancem, em muitos sectores, com a denúncia logo que o novo CT entre em vigor, em Janeiro de 2009.

Aplicando o prazo de 18 meses, as convenções caducarão a partir de Junho de 2010, aplicando-se a partir daí as normas do CT.

Sendo um exemplo disso as afirmações de Vieira da Silva, ministro do trabalho:

a) Em 12 de Maio de 2008, em que garantiu que a possibilidade de caducidade das convenções colectivas, prevista na proposta de revisão do Código do Trabalho, só ocorre a pedido de uma das partes. José António Vieira da Silva esclareceu que a caducidade após dez anos não é automática, só acontecendo se uma das partes a solicitar;

b) O Ministro Vieira da Silva (cinicamente) veio dizer que ninguém terá jornadas de trabalho diárias de 24h, até porque o trabalhador tem de efectuar uma pausa após 5h de actividade. Da forma como estas afirmações são ditas, perante os trabalhadores menos esclarecidos, passam como sendo algo que não os prejudica, mas qualquer trabalhador esclarecido sabendo que as entidades patronais, só lucram com o entorpecimento da contratação colectiva, aguardam olímpica e serenamente que as convenções caduquem, esgotados os prazos previstos no Código do Trabalho.

O que se pretende com o regime em vigor é, ao fim de contas, domar os sindicatos e pôr na ordem os trabalhadores, obrigando-os a desistir das suas reivindicações justas, nomeadamente as salariais, porque para a ideologia neoliberal, de que enferma o Código, os trabalhadores devem submeter-se aos interesses económicos, desistir de lutar pelos seus direitos e pela justiça social e desistir mesmo da sua representação por este ou por aquele sindicato e da cidadania, deixando-os à porta da empresa.

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