sábado, agosto 30, 2008

Os Meus Eleitos

O
Título: Nascido a 4 de Julho
Título Original: Born On The Fourth Of July
Data Estreia: 1989
Origem: EUA
Realizador: Oliver Stone
Argumento: Ron Kovic (livro) e Oliver Stone (guião)
Género: Biográfico, Drama
Actores Principais: Tom Cruise
Comentário: O drama pessoal de um inconformado veterano inválido da guerra do Vietname, e a sua corajosa adesão ao movimento pacifista do povo americano que saiu à rua, a contestar o desastroso envolvimento no conflito, em confronto aberto com os seus dirigentes políticos. Uma mensagem a rever, nesta época em que a guerra no Iraque tarda em agitar e mobilizar as consciências.

Título: Dune
Título Original: Dune
Data: 1984
Origem: EUA
Realizador: David Linch
Argumento: Frank Herbert (romance)
Género: Ficção Científica:
Actores Principais: Kyle MacLachlan, Francesca Annis, Jürgen Prochnow, Linda Hunt, Kenneth McMillan, Sting
Comentário: Baseado no livro de Frank Herbert, publicado em 1965 e vencedor dos prémios Hugo e Nébula, DUNE, mais do que um filme de ficção científica, é uma reflexão sobre geoestratégia, interacção entre política, religião e messianismo, fontes de recursos e jogos de poder, num futuro tão longínquo quanto o ano 10.191, época em que as relações interplanetárias se estruturam à volta de um modelo de imperialismo galáctico, suportado por lealdades e soberanias de recorte feudal. A corporação ou guilda dos astronautas mutantes, detém o monopólio dos tráfegos interestelares, ao passo que a especiaria “melange” é a moeda-padrão de todo o universo conhecido, na medida em que possui o apetecido e precioso dom de expandir a consciência, prolongar a vida e ser vital para as viagens espaciais. Deste modo, quem controla semelhante produto, desde a extracção até à distribuição, controla todo o império. Dune é, simultaneamente, um singular e exuberante exercício, deixando bem claro que as maquiavélicas e farisaicas “regras” dos jogos de poder de ontem e de hoje, embora com outras cambiantes e noutros contextos, continuarão a ser as regras de amanhã.

Título: ET - O Extraterrestre
Título Original: ET - The Extra-Terrestrial
Data: 1982
Origem: EUA
Realizador: Steven Spielberg
Argumento: Melissa Mathison
Género: Drama, Ficção Científica
Actores Principais: Henry Thomas, Dee Wallace, Robert MacNaughton, Drew Barrymore, Peter Coyote
Comentário: Um extraterrestre, durante uma missão botânica de exploração à Terra, é abandonado acidentalmente no nosso planeta, a 3 milhões de anos-luz do seu planeta de origem. Para escapar à perseguição que lhe é movida pelos terrestres, vendo-se sozinho e assustado, acaba por estabelecer contacto e uma profunda e comovente amizade com um garoto de 10 anos, refugiando-se depois junto da sua surpreendida e solidária família. ET ficará para sempre como um exemplo, em que o universo, a sua diversidade e incomunicabilidade, se podem estreitar e desmontar, sem necessidade de recorrer a grandes meios, bastando pôr as crianças, com a sua ingenuidade e autenticidade, a resolver o problema.

Título: Inteligência Artificial
Título Original: Artificial Intelligence
Data: 2001
Origem: EUA
Realizador: Steven Spielberg
Argumento: Brian Aldiss (novela) Ian Watson (guião)
Género: Drama, Ficção Científica
Actores Principais: Haley Joel Osment, Jude Law, Frances O'Connor, William Hurt,
Comentário: Baseado numa ideia inicial de Stanley Kubrick e posteriormente desenvolvida por Steven Spielberg, conta a história de um rapaz- robot, encomendado a uma empresa de engenharia genética e destinado a substituir, temporariamente, o filho de um casal, vítima de doença incapacitante. Depois, é a história desse rapaz-robot que luta para que a sua mãe adoptiva e humana, o considere mais do que um mero instrumento de substituição do filho biológico. É a epopeia de um menino, que sem ser de carne e osso como os demais, também quer ser amado É quase uma versão do Pinóquio de Carlo Collodi, adaptada aos tempos que já não são tão do futuro, como se possa imaginar, ou ainda se quisermos, uma envolvente associação à inteligência cibernética do computador HAL 9000, do genial 2001 Odisseia no Espaço, do inimitável Kubrick. Fica a pergunta: amanhã, o que irá diferenciar a inteligência artificial de uma criatura andróide, daquela que qualifica um ser humano genuíno?

Título: África Minha
Título Original: Out of Africa
Data: 1985
Origem: EUA
Realizador: Sydney Pollack
Argumento: Karen Blixen (livros) Judith Thurman (adaptação)
Género: Biográfico, Drama
Actores Principais: Robert Redford, Meryl Streep, Klaus Maria Brandauer, Malick Bowens
Comentário: Ao contar a história de uma baronesa dinamarquesa que se estabelece na África oriental para gerir uma plantação de café, este filme é um fresco sobre o Quénia dos primórdios do século XX, quando os impérios coloniais se degladiavam em guerras europeias e mundiais, mas também quando muitos europeus começavam a lançar um olhar diferente sobre a África e os seus povos, já não tanto interessados na sua exploração desenfreada, mas sim na partilha de identidade, compreensão e preservação do continente. Hoje, vendo África Minha, os sentimentos que me assaltam são de nostalgia e de grande perda, não só para mim mas para toda a Humanidade, causada por tudo aquilo em que o homem branco tocou, contaminou e destruiu, sem preocupações de preservação, fosse de identidades ou de patrimónios, desde a Cidade do Cabo até Casablanca.
Eu que estive em África, também guardo bem fundo o minha paixão africana, à mistura com o cheiro a terra molhada da chuva, a pintura de colossais arcos-íris, os grandes espaços, os odores, os sons profundos e os ruídos quase insignificantes, de insectos e linhas de água a correr, sabe-se lá para onde. Por isso, sinto também como meu, o baptismo de voo de Karen Blixen (Meryl Streep), de uma beleza tão dominante e atroz, que o próprio ruído do motor do biplano se extingue no sobrevoo dos flocos de nuvens e dos extensos bandos de flamingos. Ou o grupo de guerreiros massai a atravessar a savana. Ou o leilão dos objectos pessoais de uma Karen falida, depois do seu projecto africano ter sido consumido pelo fogo. Sinto como se por lá tivesse passado, a esplanada sobranceira às majestosas montanhas Ngong, onde repousam os restos mortais de Denys Finch Hatton (Robert Redford), um homem que era de todos e de ninguém, visitados esporadicamente por um casal de leões, que ali vai partilhar o respeito e o silêncio. Depois da partida, também sinto como minha, a grande fogueira que a Karen teria que acender para que o criado Farah, deixado para trás, a pudesse reencontrar.

sexta-feira, agosto 29, 2008

Em Que Ficamos?

E
Inaugurada em 1887 e mais de um século sem ter acidentes, a linha do Tua (ou alguém por ela) começou a fazer vítimas. O último acidente, ocorrido em 22 de Agosto, saldou-se por mais um morto e 37 feridos, em consequência do descarrilamento da composição. Encerrada temporariamente e com o acidente a ser objecto de um inquérito preliminar, levado a cabo por entidades com interesses directos no acontecimento, a conclusão do mesmo é que tudo estava em conformidade, desde a via até ao material circulante, não havendo, portanto, causa para o acidente (?). Face a este impasse, o ministro Mário Lino, deu mais 30 dias, quase uma eternidade, para que haja um relatório conclusivo. A propósito, recorde-se que quanto aos anteriores acidentes, continuam a desconhecer-se quais as conclusões – se as há – das respectivas comissões de inquérito, nomeadas para apurarem as suas causas.
Entretanto, eu que sou um leigo na matéria, e nem sequer dei um passo para me deslocar ao local do acidente, tenho um ponto de vista diferente, pois apreciei com alguma atenção, duas excelentes fotografias do troço acidentado, e é bem claro nelas que a madeira das travessas está a desfazer-se em grandes lascas, evidenciando envelhecimento ou podridão, e sempre me disseram que as travessas, não só servem para apoio dos carris, com também para manter uniforme a distância dos mesmos entre si, caso contrário há o risco de descarrilamento. Além disso, diz quem sabe que, mais nuns sítios do que noutros, aquele é o estado deplorável em que se encontram as travessas da linha do Tua.Afinal, senhores “peritos e especialistas”, em que ficamos? Como é fácil de ver, no que respeita à assunção de responsabilidades, o país está a melhorar a olhos vistos.

Ensinamentos do Livro Vermelho

E
“Onde há luta há sacrifício, e a morte é uma coisa frequente. Como nós temos em mente os interesses do povo, os sofrimentos da grande maioria do povo, morrer por este é dar à nossa morte toda a significação. Contudo, há que reduzir ao mínimo os sacrifícios desnecessários.

Todo o homem tem que morrer um dia, mas nem todas as mortes têm a mesma significação. SEMA TSIEN, um escritor da China antiga, dizia: “É verdade que os homens são mortais; mas a morte de uns tem mais peso que o MONTE TAI, enquanto que a morte de outros pesa menos do que uma pena”. Morrer pelos interesses do povo tem mais peso que o MONTE TAI, mas esforçar-se ao serviço dos fascistas e morrer pelos exploradores e opressores do povo, pesa menos do que uma pena.”

Mao Tse-tung em “servir o povo”, 8 de Setembro de 1944, Obras Escolhidas, Tomo III

quarta-feira, agosto 27, 2008

Garagens!

G
É nas garagens, por esse mundo fora, que germinam os grandes projectos, desde os BEATLES até à MICROSOFT. Com a concepção deste logótipo, dei o meu contributo para que a actividade de mediador de seguros, do meu ex-colega e estimado amigo JOAQUIM GUERREIRO, seja coroada de êxito.
G

segunda-feira, agosto 18, 2008

O Pior Cego…

“…
Parece que só agora é que o governo, o Banco de Portugal e os defensores do pensamento económico único de cariz neoliberal, que domina os media portugueses, descobriram que Portugal é uma economia aberta, fortemente dependente do exterior e com um elevadíssimo grau de endividamento em relação ao estrangeiro, e que qualquer crise que se verificasse no mundo e se repercutisse na União Europeia – e particularmente em Espanha, em relação à qual o grau de dependência do nosso país é muito elevado – teria aqui consequências graves. A inércia e passividade em que se manteve e continua a manter o governo, assim como a desculpabilização que se está a procurar fazer (utilizando para isso a crise internacional como se ela fosse imprevisível), bem como a insistência do Banco de Portugal em defender a continuação da política seguida pelo governo, a qual contribuiu para o beco sem saída em que hoje nos encontramos, é que são dramáticas. A incapacidade total que o governo e os seus defensores, como Victor Constâncio, revelam para ter um pensamento próprio que não seja o imposto por Bruxelas e pelo Banco Central Europeu, e a sua quase doentia obsessão em relação à redução do défice, deixam o país quase indefeso.

O grave é que o governo não preparou o país para enfrentar uma crise totalmente previsível, embora com uma dimensão que poderia ser variável.”

Extractos do artigo “Governo sem plano para enfrentar a crise, dificuldades a crescer”, da autoria do economista Eugénio Rosa, publicado na edição portuguesa do LE MONDE DIPLOMATIQUE de Agosto 2008

O Monstro Espreita!

“…
Tenho sempre presente uma frase de Albert Speer, nas “Memórias” que escreveu nos anos 70, e que é uma frase terrível porque é verdadeira – “O nazismo foi uma coisa horrorosa, sou o primeiro a reconhecer (depois de 25 anos passados na prisão), mas uma coisa tenho por certa, quando “isto” se repetir, será muito pior!” Referia-se ele ao tremendo poder e à eficácia das novas tecnologias, das descobertas científicas e genéticas, dos bancos de dados…
Tudo isto pode vir a dar um conglomerado político-social-tecnológico do género da tal repetição de um fenómeno totalitário, que Albert Speer, com algum conhecimento interno do nazismo, previa como uma coisa medonha. Se analizarmos o sistema de satélites, as telecomunicações, a influência da televisão, vemos como os meios para o totalitarismo são muito superiores aos de há 50 anos. E ainda por cima são manuseáveis por muitos. Um dia, se disparar a loucura totalitária, será tremendo. Pode-se também referir, como é evidente, os aspectos positivos destes avanços tecnológicos. Mas o que eu acho é que não há um acompanhamento cultural dessas descobertas, dessa difusão tecnológica.
…”
Extractos de uma entrevista concedida por José Medeiros Ferreira à revista PÚBLICA, em Maio de 2003

quarta-feira, agosto 13, 2008

Paisagem (marítima)

P
Passavam pelo ar aves repentinas,
O cheiro da terra era fundo e amargo,
E ao longe as cavalgadas do mar largo
Sacudiam na areia as suas crinas.

Era o céu azul, o campo verde, a terra escura,
Era a carne das árvores elástica e dura,
Eram as gotas de sangue da resina
E as folhas em que a luz se descombina.

Eram os caminhos num ir lento,
Eram as mãos profundas do vento
Era o livre e luminoso chamamento
Da asa dos espaços fugitiva.

Eram os pinheirais onde o céu poisa,
Era o peso e era a cor de cada coisa,
A sua quietude, secretamente viva,
E a sua exalação afirmativa.

Era a verdade e a força do mar largo,
Cuja voz, quando se quebra, sobe,
Era o regresso sem fim e a claridade
Das praias onde a direito o vento corre.

(Poema de Sophia de Mello Breyner Endresen)

sexta-feira, agosto 08, 2008

Computador “Sócrates”

C
Enviado pelo João Ricardo Mendes, recebi o seguinte e-mail:

""Magalhães" - o mais escandaloso golpe de propaganda do ano

Os noticiários abriram há dias, com pompa e circunstância, anunciando o lançamento do "Primeiro computador portátil português", o "Magalhães".
A RTP refere que é "um projecto português produzido em Portugal"
A SIC refere que é "um produto desenvolvido por empresas nacionais e pela Intel" e que a "concepção é portuguesa e foi desenvolvida no âmbito do Plano Tecnologico."
Na realidade, só com muito boa vontade é que o que foi dito e escrito é verdadeiro. O projecto não teve origem em Portugal, já existe desde 2006 e é da responsabilidade da Intel. Chama-se Classmate PC e é um laptop de baixo custo destinado ao terceiro mundo e já é vendido há muito tempo através da Amazon.
As notícias foram cuidadosamente feitas de forma a dar ideia que o "Magalhães" é algo de completamente novo e com origem em Portugal. Não é verdade. Felizmente, existem alguns blogues atentos. Na imprensa escrita salvou-se, que se tenha dado conta, a notícia do Portugal Diário: "Tirando o nome, o logótipo e a capa exterior, tudo o resto é idêntico ao produto que a Intel tem estado a vender em várias partes do mundo desde 2006. Aliás, esta é já a segunda versão do produto."
Pelos vistos, o jornalista Filipe Caetano foi o único a fazer um trabalhinho de investigação em vez de reproduzir o comunicado de imprensa do Governo.
A ideia é destruir os esforços de Negroponte para o OLPC. O criador do MIT Media Lab criou esta inovação, o portátil de 100 dólares...
A Intel foi um dos parceiros até ver o seu concorrente AND ser escolhida como fornecedor. Saiu do consórcio e criou o Classmate, que está a tentar impor aos países em desenvolvimento.
Sócrates acaba de aliar-se, SEM CONCURSO, à Intel, para destruir o projecto de Negroponte. A JP Sá Couto, que já fazia os Tsunamis, tem assim, SEM CONCURSO, todo o mercado nacional do primeiro ciclo.
Tudo se justifica em nome de um número de propaganda política terceiro-mundista.
Para os pivots (ex-jornalistas?) Rodrigues dos Santos ou José Alberto Carvalho, o importante é debitar chavões propagandísticos em vez de fazer perguntas.
Se não fosse a blogosfera - que o ministro Santos Silva ainda não controla - esta propaganda não seria desmascarada. Os jornalistas da imprensa tradicional têm vindo a revelar-se de uma ignorância, seguidismo e preguiça atroz.”

Meu comentário: O Fernão de Magalhães não merecia que lhe conspurcassem o nome e a memória; a condizer com outras travessuras que têm sido propaladas e cometidas pelo actual governo, o dito artefacto informático, podia muito bem ter sido baptizado para a posteridade com o nome de “Sócrates”.

Diz-me Com Quem Andas…

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Da autoria da jornalista Ana Cristina Pereira, o jornal PÚBLICO de quarta-feira, 6 de Agosto de 2008, publicou a seguinte notícia:
D
“Os jornalistas d' O Primeiro de Janeiro já não se concentram hoje à porta da redacção. Os 32 profissionais, aos quais se juntaram outros dois que trabalhavam no Norte Desportivo, já receberam as notas de despedimento. O deputado do Bloco de Esquerda José Soeiro visitou-os ontem, último dia de vigília. E decidiu questionar a Autoridade para as Condições de Trabalho, o Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social e o Ministério do Ambiente, a quem compete a gestão do mais recente pacote de fundos comunitários (QREN).Soeiro não percebe como é que o dono do Janeiro, "que trata assim os trabalhadores e em Março foi condenado por fraude na utilização de fundos do Estado", beneficiou de verbas do QREN e, em Abril, até "foi apresentado pelo Governo como empresário-modelo". Anteontem, ao visitar os trabalhadores, o deputado do Partido Comunista Honório Novo levantara a mesma questão.”
D
Meu comentário: Diz-me com quem andas, dir-te-ei quem és, aplica-se com propriedade aos governantes que pactuam com empresários do calibre do atrás indicado. Tal como diz o provérbio, os impostores, para sobreviverem, têm por costume ampararem-se uns aos outros.

segunda-feira, agosto 04, 2008

Descida ao Inferno

D
Título: Haverá Sangue
Título original: There Will Be Blood
Ano: 2007
Origem: E.U.A.
Realização: Paul-Thomas Anderson
Argumento: Baseado na novela de Upton Sinclair
Actores Principais: Daniel Day-Lewis, Paul Dano, Dillon Freasier,

Paul-Thomas Anderson já me tinha surpreendido com MAGNOLIA. Agora, com HAVERÁ SANGUE, baseado no livro “Oil”, de Upton Sinclair, publicado em 1927, deixou-me atónito e com a agradável sensação de que se está a voltar a criar cinema de qualidade, com substância e letra maiúscula. Feitas as contas, este HAVERÁ SANGUE tem tudo para vir a tornar-se numa obra de referência, senão mesmo um clássico.
Situado temporalmente entre fins do século XIX e princípios do século XX, no começo da corrida às jazidas do “ouro negro”, conta a história de Daniel Plainview (Daniel Day-Lewis), um empresário prospector de petróleo independente, que quer sobreviver a todo o custo, ao assédio das grandes companhias emergentes, e que utiliza todas as ferramentas para singrar naquele meio. É um homem mau, egocêntrico, determinado e manipulador, que sabe que para atingir os seus fins, não pode olhar a meios. É um homem visceralmente mau, que com o passar do tempo se vai tornando cada vez pior. Para ele, as relações humanas, não são relações de amor ou de entreajuda, mas apenas competição pura e dura, entre sujeitos da mesma espécie. Ele sabe que todo o ser humano é tendencialmente venal, e o preço para chegar à riqueza, vale bem um sacrifício, nem que seja uma conversão a algo em que não se acredita. No entanto, a sua avidez por riqueza, não é uma ânsia de poder, mas sim frenesi pela materialização de um projecto muito pessoal: ser tão independente quanto possível, para que isso lhe permita isolar-se da abominável sociedade humana, que ele odeia. Por isso, a vida para ele é um jogo arriscado, em que o importante é ganhar sempre, custe o que custar, doa a quem doer, e sendo o petróleo o seu veículo de libertação, onde há petróleo, mais tarde ou mais cedo, também haverá sangue.
Assim, o curso da existência de Daniel Plainview acaba por retratar uma parcela da história dos E.U.A. que muitos fazem por ignorar, mas que Paul-Thomas Anderson teve a coragem de abordar e desnudar. Capitalismo e religião sempre foram dois notáveis aliados. Enquanto o primeiro explora desenfreadamente os corpos, o segundo cuida que os espíritos se mantenham submissos, atentos à visão do paraíso, qual prémio final depois do corpo abandonar o inferno terreno. E é aí que HAVERÁ SANGUE vai ganhar raízes e desenvolver-se, entre um fundamentalismo de feira, misto de crendice e terrorismo emocional, e um capitalismo que estrategicamente se deixa baptizar, vai à missa, senta-se ao lado dos operários e declama os salmos com piedoso fervor, ao mesmo tempo que vai acumulando riqueza.
Tal como acontece com o “Citizen Kane” de Orson Welles ou “O Gigante” de George Stevens, este Daniel é uma espécie de doutor Fausto dos tempos modernos, que vende a alma, não ao diabo, mas ao deus de uma certa Igreja da Terceira Revelação, não a troco da imortalidade, mas como expediente para angariar a tal fortuna que o liberte da dependência e proximidade da abjecta e execranda espécie humana, que ele detesta, mas de que é também um exemplar acabado. “Odeio todos os homens” diz ele sem embaraço, no raro momento em que se confessa a um burlão, que o veio procurar, reclamando ser seu suposto irmão. No outro extremo da história, o seu antagonista é Eli Sunday (Paul Dano), um auto-proclamado pastor evangélico da tal Igreja da Terceira Revelação, misto de curandeiro, oportunista e chantagista, tão alucinado quanto Daniel, porém, mais conforme o clássico de Goethe. Acaba a renegar tudo em que dizia acreditar e vende a alma, desta vez ao diabo, pelo possível lucro que obteria da venda de uma herdade cujo valor julgava medir-se em muitos barris de petróleo, mas que afinal está seca, valendo menos que um tostão furado. Quer isto dizer que todo o ser humano é tendencialmente corruptor e corruptível, pois a concretização de certos sonhos e desejos, muitas vezes por terem um preço demasiado alto, ou custam muito dinheiro, ou acabam por nos levar a hipotecar a coerência, a dignidade e aquilo que se convencionou designar por bons princípios.
Quando Daniel Plainview diz que "não suporta que mais alguém tenha sucesso", mesmo que esse alguém seja o seu próprio filho, HAVERÁ SANGUE lança mais um olhar crítico sobre o capitalismo, como arma devastadora, escorada na competição desenfreada e na obsessão do sucesso, sobre as ambições desmedidas e outras ignomínias que imperam no grande laboratório darwiniano, onde evoluciona o género humano (onde os mais fortes e aptos, serão os sobreviventes da espécie), e deixando adivinhar nesse preceito comportamental a ideia-chave que acabou por modelar o tão conhecido “american away of life”. Assim, HAVERÁ SANGUE é a história paralela da edificação de uma nação no alvor do século XX, e o amadurecimento de uma personagem, que para alcançar o êxito, empreende, numa sucessão de cataclismos pessoais, uma repugnante descida aos infernos da condição humana, sem dissimulações nem arrependimentos. Neste filme nada é gratuito, nada é trivial, tudo tem sentido, a par de uma carga emocional impar, contribuindo cada cena para moldar a personalidade e a vida do seu protagonista, e apontar também a trajectória de uma nação. Depois, é também um filme sem mulheres activas e interventivas. Quando elas se mostram, funcionam apenas como peças secundárias de uma paisagem humana onde os homens eram considerados o cerne da sociedade, os grandes protagonistas, os únicos criadores de factos e de riqueza.
A soberba fotografia de Robert Elswit, aliada à banda sonora, uma vezes feita de simples ruídos do meio circundante, outras por música acompanhada pelo som cavo e monocórdico da bombagem das torres de petróleo, sublinha com eficácia e perfeição o ambiente ora cru ora patético que percorre todo o filme. Quanto a Daniel Day-Lewis, é mais do que magistral no seu desempenho, pois autentica a encarnação de uma personagem complexa, que se vai transformando com a passagem dos anos, e isto é um talento que nem todos os actores são capazes de transpor para a representação.
Por tudo o que deixei dito, mas não só, considero HAVERÁ SANGUE um grande e genial filme, direi mesmo, uma potencial obra-prima da sétima arte.

sábado, julho 26, 2008

A Aula foi Adiada!

A
… ou um conto às três pancadas

Talvez tivesse sido do cansaço, mas naquele dia de Setembro, mesmo com o despertador programado, o Vasco deixou-se dormir, e quando finalmente saltou da cama para ir para as aulas, o tempo já era escasso para um asseio a preceito. A barba, como de costume, é que pagou as favas. Tinha estado até às tantas da madrugada a preparar a dissertação sobre Newton e as leis da gravitação, e o descanso é que ficara a perder. Posta de lado a hipótese de um pequeno-almoço simulado, vestiu-se quase às cegas, depois pegou nos apontamentos do curso, meteu-os na pasta, desligou as luzes e saiu porta fora. Enquanto esperava pelo elevador sentiu o prédio estremecer ligeiramente.
– Olá, querem ver que vamos ter sismo! disse ele para os seus botões, a pensar que, mesmo sendo um acontecimento insignificante, apenas um susto, já tinha ali uma desculpa, assaz esfarrapada, para o atraso. A Terra, de vez em quando precisava de acomodar as suas entranhas, e isso acabava a reflectir-se na superfície da sua pele, e na vida quotidiana dos parasitas que a habitavam, com os incómodos que são conhecidos, que podem ir do simples sobressalto, até à demolição de cidades inteiras. Parou, olhou à volta e esperou meia dúzia de segundos, enquanto a vizinha do apartamento contíguo, a dona Sandra, corria espavorida pelas escadas abaixo, sem sequer gemer o tradicional “bom-dia”. As tremuras não voltaram. Por precaução, tal como a vizinha, desistiu do elevador e optou por descer as escadas, mas sem grandes correrias. Já na rua, instalou-se no velho Fiat a cair de podre, e fez-me ao caminho. O dia estava esquisito, ostentando uma luminosidade ambiente de cor âmbar com pinceladas de sépia (parecia um pergaminho envelhecido), tempo encoberto e demasiado abafado para aquela estação e para aquela hora da manhã. A meio da Avenida de Roma circulava-se a passo de caracol. Havia um acidente complicado, enquadrado por muitos mirones e gente a gesticular, qualquer coisa parecida com um invulgar choque em cadeia, coisa esquisita dado que aquela artéria não era propícia a grandes velocidades. No entroncamento da Avenida do Brasil com a Rio de Janeiro, enquanto esperava, no meio do tráfego que o semáforo voltasse ao verde, o chão voltou a tremer, só que agora de forma mais prolongada e acompanhado de um ruído cavo e surdo, oriundo das profundezas da terra, ao mesmo que tempo que o Vasco era ligeira e inexplicavelmente arremessado para cima, batendo com a cabeça no tejadilho, como se tivesse perdido o peso, ao mesmo tempo que o estafado Fiat, mesmo parado, se bamboleava estranhamente na sua decrépita e rangedora suspensão. As luzes dos semáforos tremeram, apagaram-se, voltaram a acender-se, tremeluziram e acabaram por se apagar em definitivo, iniciando-se o habitual concerto de buzinas. A fila de trânsito estava imobilizada e assim ficou. Lá à frente, gesticulando e dizendo coisas inaudíveis, os condutores começavam a sair dos carros, visivelmente amedrontados, e com ar inquiridor sondavam a fila que serpenteava a perder de vista. Começava a ficar instalada a confusão, e o atraso para as aulas começava agora a tornar-se escandaloso.
- Irá haver aulas? Interrogou-se ele falando para os seus botões, ao mesmo tempo que as tremuras do pavimento voltaram mais insistentes, e alguns carros que estavam imobilizados no engarrafamento, sabe-se lá devido a que força, começaram a chocar entre si, como se subitamente se tivessem transformado naqueles velhos brinquedos de meados do século passado, prensados em levíssima folha-de-flandres. Depois de uma manobra quase impossível aproveitou uma nesga desimpedida sobre o passeio e lá estacionou o carro. A universidade ficava a pouco mais de mil metros dali, alcançável numa corridinha esforçada, para aquela hora matinal, mas oportuna para quem tentava escapar à barafunda circundante. Trancou o carro e começou a correr. Em dada altura sentiu-se mais leve e o chão parecia fugir-lhe debaixo dos pés. Tropeçou meia dúzia de vezes, fintou contentores do lixo que andavam a rebolar e protegeu-se de veículos que pareciam carrinhos de choque desgovernados, umas vezes já sem condutor, outras vezes com pessoas ao volante, incrédulas, paralisadas e aterrorizadas.
Atingiu o campus universitário pelas 10h e 50m quando as primeiras pessoas, a gritarem e de olhos esbugalhados, começavam a deixar de ter os pés assentes na terra, e aquela, do chão até às copas das árvores, tremia como se tudo quisesse mudar de lugar. A partir daquele momento o atraso tinha perdido todo o significado. Mudo e assombrado com o que estava a acontecer, o Vasco sabia que as desculpas tinham perdido o sentido, e verdade, verdadinha, era que aquela lei que dizia que a força da gravidade depende da massa dos corpos e da distância entre eles, e que é proporcional ao inverso do quadrado desta distância, tinha começado a deixar de funcionar, e o mundo, talvez o próprio universo, estavam em vias de mudar de forma, talvez mudar de lugar ou de sentido, talvez a caminho da extinção, sem avisar nem pedir licença a ninguém, no meio de um grande caos e terror.
O Vasco, com um misto de pavor e desânimo a esgravatar-lhe as entranhas, achou-se a esbracejar junto às copas das árvores, agarrado à pasta que já aberta espalhava pelos ares os seus agora inúteis tópicos e apontamentos, misturando-se com bandos de passarada em pânico, um carrinho apagado de castanhas assadas, pedras, pedrinhas e pedregulhos em remoinho, a mochila de criança, cabines telefónicas, telhas, muitas telhas, toneladas de telhas, bicicletas, uma baliza de futebol, contentores de lixo, muito lixo, montanhas de lixo, na mais colossal demonstração de ausência de gravidade de que há memória. Se naquele momento, por qualquer razão, o seu efeito cessasse, seria pior a emenda que o soneto, porque ninguém tinha o costume de sair de casa de capacete e com um pára-quedas amarrado às costas, para o que desse e viesse. Ao mesmo tempo, entre a dúvida e a angústia continuava a dizer de si para si: - O raio da aula deve ter sido adiada de certeza absoluta! Para já, e sem avançar com grandes conjecturas ou explicações, aquele iria ser um dia diferente, talvez para recordar, talvez para esquecer.
Dois ou três minutos depois, já a uma altura considerável, talvez uns dois mil metros, deixou de se ver a superfície da terra, o traçado das ruas, a mancha do Campo Grande e a geometria da Cidade Universitária, tanto era o pó que rodopiava, à mistura com a mais extravagante amálgama de pessoas, objectos e detritos. Havia muita gente a espernear, desde vestidos a rigor, embora já muito amarrotados, até outros de pijama ou em nu integral, uns de cabeça para baixo, uma velhinha com o cão preso pela trela, um casal abraçado, outros a ensaiarem um estranho bailado ou uma espécie de tentativa de voo, expresso num misto de esbracejar e bater de asas, outros aos berros, muitos a urinarem-se, outros a vomitarem o pequeno almoço, outros paralisados, como que hipnotizados, com o terror estampado no rosto, quase todos a tentarem agarrar-se a qualquer coisa que passasse perto, nem que fosse o telhado do quiosque dos jornais, como se estivessem no alto mar, debatendo-se à procura de uma tábua de salvação. Como algum do seu sentido de humor se mantinha intacto, imaginou que para o cenário ficar composto, só estava mesmo a faltar ver passar ali por perto o primeiro-ministro, a prometer solenemente que ia baixar os impostos, a dar autógrafos aos graúdos e computadores aos miúdos, arrastando consigo, cinco ou seis guarda-costas, pendurados nas bainhas das suas calças e nas bandas do seu casaco.
Mesmo a propósito, veio-lhe à memória aquele romance do Douglas Adams, que estivera a ler a semana passada, mas até agora, e tal como acontecia no livro, antes da Terra ser riscada do sistema solar, não tinha aparecido pelas imediações, in extremis, qualquer espécie de nave alienígena para lhe dar uma boleia. Como é compreensível, naquela aflição, uma coisa dessas vinha mesmo a calhar!
Sempre a subir rumo às alturas, até à estratosfera rarefeita, e pensando que à falta de um fato de astronauta, ou algo melhor, seria bom ter por ali uma garrafa de oxigénio, achou por bem voltar a matutar no mau uso que tinha andado a fazer do seu tempo:
- E eu que perdi uma noite agarrado às leis de Newton, quando bastava ter dormido como um justo, para agora as ver comprovadas na prática! Este universo, descomunal e talvez imensurável, não respeita nada nem ninguém. Raios partam os buracos negros, as galáxias em colisão, o efeito doppler, as energias radiantes, os quasares e os pulsares, o Isaac Newton e as suas leis da atracção universal…
E foi então que o Vasco, a pairar no vazio, entre aquela dramática, singular e colossal desordem, tomou uma decisão radical: atirou fora a pasta vazia, as chaves do carro, adoptou a posição fetal, pousou a cabeça sobre as mãos entrelaçadas, aconchegou-se, fechou os olhos e voltou a pegar no sono interrompido.

sexta-feira, julho 25, 2008

Com a Verdade me Enganas!

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Tem que se reconhecer que o primeiro-ministro Pinto de Sousa, também conhecido por José Sócrates, uma vez por outra, foge-lhe a boca para a verdade. A propósito das pretensas boas intenções do novo Código do Trabalho, antes de assestar as suas baterias contra a esquerda, começou por declarar, patéticamente, que a direita está ausente desta discussão sobre aquele documento. Pudera, não houvera de estar! Para defender e levar à prática os pontos de vista dessa muda e serena direita, estão lá em peso, nada mais, nada menos que as iniciativas deste (des)governo, que enganosamente se auto-qualifica de esquerda “moderna”, coadjuvado por um seguidista e irreconhecível PS.

segunda-feira, julho 21, 2008

Protecção do Trabalho

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Dizem as notícias que os Tribunais de Trabalho estão a ser esvaziados, tanto de funcionários como de magistrados, com ambos os quadros reduzidos para metade, por força da aplicação de uma portaria do ano passado, ao passo que se verificou um acréscimo de recurso a estas instâncias, por parte do mundo laboral, pelos motivos óbvios. Isso reflecte-se em 15.000 processos pendentes, só no Tribunal de Lisboa, e os trabalhadores que a ele recorrem chegarem a esperar 18 meses por uma sentença. Dizem os sindicatos que há “indícios que permitem concluir que existe um projecto do poder político de esvaziamento das competências, ou mesmo de extinção dos Tribunais do Trabalho”.
Fora as novas “maldades” que a revisão do Código do Trabalho promete, temos agora mais este episódio. É caso para dizer que a protecção do mundo do trabalho nunca foi tão precária nem conheceu condições tão adversas.

Ciclos de Impunidade

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“O procurador-geral da República disse anteontem, por outras palavras, que o Código de Processo Penal está a matar as investigações de crime económico. Esta possibilidade, denunciada por várias vozes logo após a aprovação do Código, é contestada pelo ministro da Justiça, que teima em defender a sua dama, argumentando com o pouco tempo de vida que as novas leis penais têm. Em teoria, o ministro até pode ter razão: não se muda códigos de um ano para o outro. Neste caso, porém, os primeiros meses dão já indicações muito claras de que no campo do crime económico caminhamos para o desastre.
C
A ‘Operação Furacão’ está em risco e o mesmo acontece com outros processos que implicam fortes investimentos periciais e a cooperação judiciária internacional. O que está na forja, não tenhamos ilusões, é a criação de mais um ciclo de impunidade brutal, daqueles a que o sistema político já nos habituou. Primeiro os fundos comunitários, depois a negociação política de grandes dívidas fiscais – criando fundos partidários e outros que estão na origem de instituições financeiras que nunca primaram pela transparência. A seguir as facturas falsas e o erro legislativo que originou milhares de prescrições. Agora temos tudo mais às claras e sob a cobertura inequívoca da lei. Será isto o que queremos para Portugal?”
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(Autor: Eduardo Dâmaso, Director-Adjunto do jornal Correio da Manhã)

OMAR KHADR, Guantanamo e Portugal

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“OMAR KHADR foi preso no Afeganistão e transferido - segundo dados oficiais americanos comunicados aos advogados - para Guantanamo, onde chegou no dia 28 de Outubro de 2002.
Nesse dia, sobrevoaram o espaço aéreo português, com destino a Guantanamo, dois aviões militares americanos, tipo C-17, com as matriculas RCH184Y e RCH319Y. O primeiro proveniente da Base americana de Rota (Espanha). O segundo proveniente da base americana de Incirlik (Turquia). Dois aviões militares do mesmo tipo de muitos que passaram para Guantanamo carregadinhos de prisioneiros (há documentos oficiais americanos que o comprovam).A data da chegada de OMAR KHADR consta do relatório da REPRIEVE de 28.1.2008. Relatório que foi objecto de uma rejeição liminar e indignada por parte do actual governo português, sem se dar ao trabalho de demonstrar como incorrecta ao menos uma vírgula (e há algumas pequenas incorrecções naquele primeiro relatório da REPRIEVE sobre Portugal) .Convém notar que, por sua vez, os dados da REPRIEVE se baseiam no cruzamento dos dados obtidos de fontes militares americanas com a lista de voos, de e para Guantanamo, com passagem por Portugal, entre 11.2.2002 e 24.6.2006, que eu consegui obter e divulguei, apesar de ela ter sido sonegada ao PE e à AR. Nessa lista estão identificados os dois voos militares que poderão ter transferido OMAR KHADR e mais 26 outros prisioneiros para Guantanamo nesse dia 28 de Outubro de 2002, passando pelo espaço aéreo português.

“Os media de todo o mundo – portugueses incluídos – estão a dar o relevo merecido ao vídeo de um dos interrogatórios repugnantes a que o jovem canadiano, de ascendência afegã, OMAR KHADR está há anos a ser submetido na ignomínia que é a prisão americana de Guantanamo.Os media sublinham – como eu tenho repetidamente sublinhado - que a detenção de OMAR KHADR configura uma das mais escandalosas violações da legalidade internacional e dos direitos humanos por parte da Administração Bush, pois era ainda apenas uma criança de 15 anos quando foi encerrado em Guantanamo.Fiquei atenta ao caso de OMAR depois de ter encontrado o seu irmão, ABDURAHMAN KHADR, em Toronto, em Dezembro de 2006, na sequência de uma importante reportagem publicada pelo jornalista Ricardo Lourenço no EXPRESSO em 9.9.2006. Recordo que Abdurrahman Kadhr também esteve detido uns meses em Guantanamo, para onde foi com apenas 17 anos, até ter sido levado pela CIA, com escala em Santa Maria, Açores, para trabalhar como informador na Bósnia em 2003, de onde conseguiu escapulir-se para voltar ao Canadá. De Abdurahman trouxe eu um “affidavit”, de que fiz entrega à PGR; nele se faz referência à situação do seu irmão mais novo Omar, ainda detido em Guantanamo. Dos estranhos voos (civis) da CIA com passagem por Portugal, que a transferência de Abdurrahman implicara, havia eu já em meados de 2006 devidamente alertado o governo português.Por ter seguido estes dois casos em particular, entendo aqui destacar um ponto muito relevante que não vi nenhum órgão de informação português notar. Um ponto muito relevante para o apuramento de eventuais responsabilidades portuguesas (do Estado e de agentes do Estado português) no sequestro, detenção e tortura de uma criança em Guantanamo: OMAR KHADR.É que há dados que indicam que OMAR KHADR poderá ter passado por Portugal, num voo militar americano autorizado políticamente pelas autoridades portuguesas (MNE/MDN – governo Barroso/Portas) a sobrevoar espaço aéreo nacional, a caminho da prisão de Guantanamo.”
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(Publicado por Ana Gomes, em16 e 17 de Julho de 2008 no blog CAUSA NOSSA)

O admirável mundo dos ‘chips’

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"A ideia de deixar obrigatoriamente registo da passagem quando se circula na auto-estrada é um primeiro passo em direcção a um mundo perigoso.
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Pedro Adão e Silva
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Este fim-de-semana ficámos a saber que o Governo vai apresentar uma proposta de autorização legislativa para introduzir um ‘chip’ na matrícula de todos os veículos. A novidade foi apresentada assentando num conjunto de soluções virtuosas para todos (Estado, concessionários das auto-estradas e naturalmente os proprietários dos automóveis). Tudo feito com um fascínio com a inovação tecnológica que se tornou moda e recurso acrítico para superar as dificuldades que enfrentam as políticas públicas. Afinal, de acordo com o Expresso, “Portugal quer ser pioneiro nas matrículas electrónicas” ou, nas palavras do secretário de Estado das Obras Públicas, “potenciar um ‘cluster’ na área da telemática rodoviária”. O ‘chip’ terá informação sobre o seguro automóvel, a inspecção periódica e permitirá pagar portagens. Aliás, os sinais de que a introdução do ‘chip’ visa essencialmente permitir a cobrança de portagens nas SCUT, nas quais não foram inicialmente construídas praças de portagens e onde se afigura difícil construí-las, são evidentes. Contudo, nas palavras do membro do Governo, o objectivo do ‘chip’ é bastante prosaico: “aumento da segurança rodoviária, pelo acréscimo de fiscalização. Fiscalizar veículos e não pessoas”. Afinal, uma solução não muito diferente da da Via Verde, pelo que os riscos de estarmos a construir um ‘big brother’ através da circulação rodoviária estariam afastados. Estarão de facto?Aparentemente não. Desde logo porque a adesão à Via Verde é duplamente voluntária. Só subscreve o serviço quem o deseja e mesmo quem tenha o dispositivo é livre de não o utilizar, podendo optar por pagar portagem de modo tradicional se assim lhe aprouver. A ideia de deixar obrigatoriamente registo da passagem quando se circula na auto-estrada é um primeiro passo em direcção a um mundo perigoso, em que autonomia individual e direito à privacidade começam lentamente a ser confiscados pelo Estado.Claro que há benefícios em termos de organização social resultantes desta solução, mas alguém duvida que há muitos mecanismos de engenharia social que permitiriam tornar mais eficaz o funcionamento das nossas sociedades, não fora o facto de colocarem em causa direitos, liberdades e garantias? Acontece que a superioridade da democracia liberal não radica nas boas soluções para a organização social, baseadas na modernização tecnológica, mas, acima de tudo, no primado da lei e no respeito pelas liberdades individuais. Neste ‘trade-off’ temos de ser intransigentes, até porque, se sabemos como começam estas coisas, temos boas razões para temer o modo como elas acabam. Afinal, não é difícil pensar em justificações para a introdução de um ‘chip’ individual que, por exemplo, ajude no controlo sanitário ou na busca de crianças desaparecidas.Como sempre acontece nestes temas, é-nos dito que as razões para alarme são injustificadas: haverá uma entidade que regulará o sistema e que administrará a informação. Uma entidade insuspeita e repleta de mecanismos de controlo. Ora, não é preciso fazer um grande esforço de memória para nos recordarmos de uns quantos exemplos de informação que deveria ser absolutamente privada, sigilosa (e aliás nunca deveria ter sido recolhida) e que foi impunemente divulgada em vários órgãos de comunicação social. O que é que nos garante que outro tipo de informação uma vez recolhida não possa ser usada de modo abusivo?Dir-me-ão que se trata apenas de um ‘chip’, cuja introdução não viola a Constituição e que os riscos associados à sua introdução são inexistentes e que os benefícios são evidentes. Pode ser tudo verdade, mas a sua introdução aponta para um admirável mundo em que se combina fascínio com a modernização tecnológica e erosão das liberdades individuais. Há, aliás, umas quantas descrições literárias de distopias que começaram assim.
A
P.S. A semana passada, escrevi aqui que o caso Maddie, até por confirmar um padrão de actuação da Polícia Judiciária, devia colocar em sobressalto todos os que defendem intransigentemente o Estado de Direito. Esta semana ficámos a saber que Robert Murat foi constituído arguido pelo desaparecimento de uma criança, situação em que se mantém há 13 meses, porque uma jornalista achou que ele tinha um comportamento estranho. Isto já não vai lá com indemnizações que reparem danos. Se os responsáveis por este tipo de situações continuarem impunes, só podemos concluir que o país está, no mínimo, a ficar irrespirável. E perigoso."
A
(Autor: Pedro Adão e Silva, Investigador do Instituto Universitário Europeu)

quarta-feira, julho 16, 2008

Provedor da Causa Nuclear

P
Isto é apenas uma suposição: o que é que aconteceria se um qualquer ministro do governo do senhor Sócrates, por exemplo, o ministro da ciência e tecnologia, numa qualquer sessão da Assembleia da República, a dado passo, depois de dar informações sobre assuntos da sua tutela, resolvesse começar a dizer que o Banco de Portugal e o seu governador, deviam dar mais atenção aos indicadores macroeconómicos e exercer mais e melhor fiscalização sobre as actividades financeiras? Se calhar não ia acontecer nada.
No entanto, ontem, foi isso exactamente o que sucedeu, embora com as personagens trocadas. O governador do Banco de Portugal, senhor Victor Constâncio, depois de fornecer aos presentes, projecções e informação actualizada sobre a situação económica do país, que vai de mal para pior, resolveu dar um ar da sua graça. A propósito das escolhas energéticas que o país deverá equacionar no futuro, aliás, matéria que não é da sua competência, resolveu debitar as suas opiniões pessoais, nomeadamente, propondo como alternativa o reequacionamento da opção nuclear. Deu-lhe para ali, como lhe podia dar para falar sobre as virtudes do queijo de Serpa ou a escassez de nadadores salvadores fora da época balnear. Também agora, pouco ou nada aconteceu, tal é a indigência que por cá grassa, excepto, claro está, a imediata aparição de algumas eminências do “lobby” nuclear, que logo aproveitaram tão oportuna deixa, para virem a terreiro dizer de sua justiça e fazer finca-pé.
Sem esquecer que o senhor Victor Constâncio tem todo o direito de exprimir as suas ideias e pontos de vista, fora do âmbito das suas atribuições como governador do Banco de Portugal, a verdade é que não estávamos em qualquer “talk show” televisivo, de tipo “prós e contras”, “as escolhas de marcelo” ou “diga lá excelência”. Estávamos sim na Assembleia da República, na Sala do Senado, numa sessão de cariz informativo, e nada fazia prever que o senhor Constâncio se fosse assumir com “conselheiro” governativo ou desempenhar o papel de provedor da causa nuclear. Este país e a sua fauna de especialistas e cabeças pensantes, cada dia me surpreendem mais.

segunda-feira, julho 14, 2008

Operação Quê?

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Informaram os jornais que em 11 de Julho foi levantado o segredo interno de justiça à operação “furacão”, a tal que, de há quatro anos a esta parte, detectou a andou a investigar a existência de uma mega-fraude, “democraticamente” distribuída por um largo universo de mais de duas centenas de pequenas, médias e grandes empresas, muitas delas ligadas as grandes grupos económicos, que através dos mais variados expedientes, burlaram o Estado, em muitos milhões de Euros. Em poucas palavras, isto quer dizer que os processos poderão, a partir de agora, ser “devassados” pelos advogados dos arguidos, à cata de sinais ou pistas da investigação, que possam ser usados contra os seus clientes, ou outras entidades que ainda não foram indiciadas.
Assim, esta investigação e o processo, corre o risco de colapsar. Não há arquivamento, não há prescrição, houve apenas uma simpática ajuda do Tribunal da Relação de Lisboa, de valor incalculável. A investigação irá enfraquecer, arrastar-se, acabando por tornar-se mais um caso paradigmático de como os poderosos, sendo arguidos, conseguem mover muitas e gradas influências, de forma a transformar um monumental crime de colarinho branco, punível por lei, num mero e venial pecadilho, benzido por sentenças, mais ou menos indulgentes, dando razão a quem diz que em Portugal o crime compensa.
Como já era previsível, a operação “furacão” acabou por perder força, e neste momento está a caminho de se transformar numa banal tempestade tropical.

domingo, julho 13, 2008

Um Filme Pessimista

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Título: Este País não é para Velhos
Título original: No Country for Old Men
Ano: 2007
Origem: E.U.A.
Realização: Joel Coen & Ethan Coen
Argumento: Baseado na novela de Cormac McCarthy's
Actores Principais: Tommy Lee Jones, Javier Bardem, Josh Brolin

Naqueles anos 80 do século passado, época em decorre a acção deste filme dos irmãos Coen, o mundo, e não só aquela pequena cidade da América fronteiriça e rural, tutelada por um velho e desalentado marshall, estava a tornar-se um sítio perigoso e incontrolável, face à criminalidade resultante do narcotráfico. Ele pressente que se aproxima uma guerra grande demais para os escassos meios de que dispõe, e que ele, consequentemente, já não consegue controlar. Daí o pretexto para ele se decidir por uma prematura aposentação. Em qualquer guerra, quando uma das partes começa a perceber que está a ser ultrapassada pelos acontecimentos, a par da desilusão de não ter conseguido cumprir, com sucesso, o seu dever, é altura de decidir: ou veste a pele de herói e enfrenta o inimigo, ou bate em retirada e desiste. Por isso, aquele marshall (Tommy Lee Jones), num magistral papel de anti-herói, sendo um homem amargurado que se sente impotente para enfrentar a violência crescente, que cerca a sua circunscrição, dispõe-se a baixar os braços. A angústia que assola o seu espírito só é comparável à desolação da paisagem texana que o cerca. Chega a confessar que depois de muitas provações, cada vez mais descrente, e com o pessimismo já instalado e empedernido na sua alma, ficou à espera que Deus viesse ao seu encontro, mas a espera foi em vão. A mensagem é indubitável: se Deus é Deus e se ausentou para parte incerta, sendo ele um simples mortal, o que estão à espera que faça?
Entretanto, envolvido na teia do tráfico, surge um novo protagonista. Ele é um predador nato (Javier Bardem), matador de novo tipo, uma voraz máquina assassina que se move orientada com uma missão, baseada numa “filosofia” e numa “ética”, tão elementar como um jogo de “malmequer-bemmequer”, que pretende assumir-se como modelo e prática do mal absoluto. Por onde passa, como uma pestilência, vai deixando um sulco de morte, eliminando, uma após outra, todas as testemunhas com quem se cruza. Para ele, decidir se as suas vítimas irão viver ou morrer, é tão simples como lançar uma moeda ao ar. Tal processo serve para lavar a sua consciência, com a mesma eficácia com que a água lava o sangue das suas mãos. Naquela personagem, a fronteira entre o humano e o monstro nunca foi tão ténue. Por isso, todo o filme é uma dupla caçada, feita perseguição tenebrosa, onde os três protagonistas quase nunca se cruzam, e onde os destinos ficam à solta, sabe-se lá com que novos rumos e vítimas, e onde a crueldade é servida a frio e magistralmente sublinhada, pela total ausência de banda sonora.
Superiormente interpretado por Tommy Lee Jones, Javier Bardem e Josh Brolin, este é mais um filme dos irmãos Coen, genial e soberbamente realizado, mas que marca uma certa inflexão nas subtilezas da sua anterior produção artística, de onde desapareceram os habituais apontamentos grotescos, para serem substituídos por uma substancial dose de pessimismo, neste caso, expresso através de uma violência quase demencial. Parece um filme paradoxal, assim como paradoxal parece o seu desfecho, a sugerir que a história poderá não ter fim à vista, mas não é! Se a história quer provar que aquele país não é para descrentes e desalentados velhos, também é verdade que este filme não é para incautos, nem consumidores de entretenimento puro. É um filme que obriga a reflectir profundamente sobre as mutações das sociedades e da condição humana, sobretudo naquela (e esta) época tão alienada quanto carente, em que uma mala cheia de dinheiro exerce um poder tão hipnótico e mórbido, quanto fatal. Quem não conseguir fazer uma leitura profunda, o remédio é deixar passar os anos, e um dia, voltar a rever este grande filme. Isto porque a idade, ao progredir, se por um lado provoca erosão na audácia e na eficácia, por outro também promove acumulação de experiências e vivências, que vão aperfeiçoar o entendimento e refinar os sentimentos.

sábado, julho 12, 2008

Um Espanto!

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No passado dia 8 de Julho ocorreu um debate promovido pela SEDES (Associação para o Desenvolvimento Económico e Social), na livraria Byblos, onde entre outras personalidades, pontuava o jurista e ex-banqueiro Dr. Paulo Teixeira Pinto. A reunião tinha por objectivo abordar e discutir alguns dos problemas com que se debate o país, problemas esses previamente abordados pela organização, no seu documento sobre o estado da nação. Até aí tudo bem. Espanto, espanto, é quando ouvimos sair da boca do Dr. Paulo Teixeira Pinto, conclusões do estilo:

- É um mito afirmar que as leis laborais afectam a produtividade. O problema é de gestão e de enquadramento do Governo.
- Temos piores gestores que operários; o problema está mais na liderança que na execução.
- Tudo o que seja evocado por causa da legislação laboral é desculpa.
- Não é preciso menos Estado, o grande problema é a arquitectura do Estado, não a reforma do Estado.

Fiquei siderado! Não esperava tal tipo de afirmações, vindas de quem veio. Quase certo é que com ideias deste jaez, o Dr. Paulo Teixeira Pinto dificilmente poderá alimentar a esperança de vir, alguma vez, a presidir a uma qualquer confederação empresarial.